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Anales del Instituto de Arte Americano e Investigaciones Estéticas. Mario J. Buschiazzo

On-line version ISSN 2362-2024

An. Inst. Arte Am. Investig. Estét. Mario J. Buschiazzo vol.52 no.1 Buenos Aires June 2022

 

ARTICULO

Para ler, entender e divulgar um jardim. O “Guia Botânico da Praça da República e do Jardim da Luz” (1919)

Para leer, entender y divulgar un jardín. La “Guía Botánica de la Plaza de la República y del Jardín de la Luz” (1919)

Reading, understanding and publicizing a garden. the “botanical guide of praça da república and the jardim da luz” (1919)

Marta Enokibara *

https://orcid.org/ 0000-0002-4790-7756

* Arquiteta e Urbanista pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP) e doutora em Estruturas Ambientais Urbanas pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). Professora no curso de graduação (desde 1995) e no Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo (desde 2013) da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design (FAAC) da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus na cidade de Bauru, Estado de São Paulo, Brasil. Membro da Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas (ABAP) e vice-coordenadora do Grupo de Pesquisa em Sistemas Integrados Territoriais e Urbanos (SITU), sediado na FAAC/UNESP-Bauru.

Av. Affonso José Aiello 14-100 QE L34. Villaggio II / Vila Aviação. Bauru-SP 17.018-520. Brasil. E-mail: marta.enokibara@unesp.br

Esse artigo é parte de uma investigação mais ampla denominada “Saberes teóricos e técnicos na configuração e reconfiguração das cidades formadas com a abertura das zonas pioneiras no Oeste do estado de São Paulo”, inserido no Projeto Temático intitulado “Saberes eruditos e técnicos na configuração e reconfiguração do espaço urbano. Estado de São Paulo, séculos XIX e XX”, financiado pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

RECIBIDO: 5 de enero de 2022.
ACEPTADO: 24 de enero de 2022.


RESUMO

O “Guia Botânico da Praça da República e do Jardim da Luz” foi elaborado pelo botânico suíço Alfred Usteri (1869-1948) e publicado em 1919. A intenção era “tornar os parques susceptíveis de serem lidos e entendidos pelos leigos curiosos de se iniciarem em história natural”. Mas, além da instrução, pretende-se explorar neste artigo como o Guia foi um importante material de divulgação. Assim, neste artigo, pretende-se elucidar como esse Guia e alguns dos profissionais envolvidos diretamente ou indiretamente em sua elaboração, contribuíram para a difusão de um repertório vegetal e paisagístico no Estado de São Paulo.

Palavras-chave: Jardim da Luz; Praça da República; Alfred Usteri; Guia botánico; repertório vegetal; Estado de São Paulo; Brasil.
Referências espaciais e temporais: São Paulo; século XX.

RESUMEN

La “Guía Botánica de la Plaza de la República y del Jardín de la Luz” fue elaborada por el botánico suizo Alfred Usteri (1869-1948) y publicada en 1919. La intención era “volver a los parques susceptibles de ser leídos y entendidos por los curiosos que se iniciaran en la historia natural”. Pero, además de esto, se pretende explorar en este artículo cómo la Guía fue un importante material de divulgación. Así, se pretende dilucidar cómo esa Guía , y algunos de los profesionales que participaron directa o indirectamente en su elaboración , contribuyeron a la difusión de un repertorio vegetal y paisajístico en el Estado de San Pablo .

Palabras clave: Jardín de la Luz; Plaza de la República; Alfred Usteri; Guía botánica; repertório vegetal.
Referencias espaciales y temporales: San Pablo; Siglo XX.

ABSTRACT

The “Botanical Guide to Praça da República and Jardim da Luz” was prepared by the Swiss botanist Alfred Usteri (1869-1948) and published in 1919. The intention, was “to make the parks susceptible to being read and understood by lay people curious to get started in natural history”. But, in addition to the instruction, this article intends to explore how the Guide was an important dissemination material. Thus, in this article, we intend to elucidate how this Guide, and some of the professionals directly or indirectly involved in its elaboration, contributed to the dissemination of a plant and landscape repertoire in the State from São Paulo.

Keywords: Jardim da Luz; Praça da República; Alfred Usteri; Botanical guide; plant repertoire.
Time and space references: São Paulo; XXth Century.


Introdução

O “Guia Botânico da Praça da República e do Jardim da Luz” foi elaborado pelo botânico suíço Alfred Usteri (1869-1948) e publicado em 1919. Impresso por ordem da Prefeitura Municipal de São Paulo, era em formato de bolso, com 17,5 x 12,5 cm, 66 páginas, ilustrações da capa (Figura 1), contracapa (Figura 2) e de algumas vinhetas feitas por Usteri (Figura 3). O pequeno Guia estava organizado em 4 partes: Prefácio, do escritor Monteiro Lobato; uma breve explicação sobre a organização da obra e agradecimento a colaboradores; um quadro analítico, sobre a identificação das plantas; a relação e indicação numérica das plantas de maior vulto existentes nos dois jardins, separadas pela proveniência, com informações sobre os nomes científicos e populares mais conhecidos e algumas peculiaridades; e, no final, um índice alfabético, seguido de uma Errata. Em anexo, haviam os “mappas” do Jardim da Luz, com 44,00 x 48,00 cm, e da Praça da República, de 31,50 x 39,00 cm, com a localização numérica das plantas.


Figura 1 e 2: Capa e contracapa do Guia Botânico da Praça da República e do Jardim da Luz. Fonte: Usteri, 1919.


Figura 3: Vinhetas ilustrando o Guia. Desenhos de Alfred Usteri. Fonte: Usteri, 1919.

O presente artigo está dividido em 6 partes. Na primeira são apresentados alguns dados da trajetória profissional de Alfred Usteri; na sequência de Monteiro Lobato e dos demais colaboradores citados, aferindo suas atuações no período de publicação do “Guia Botânico” e as contribuições diretas ou indiretas em sua elaboração; a verificação de algumas espécies representativas presentes no Jardim da Luz e na Praça da República e sua correlação com a arborização urbana da capital e cidades do interior paulista, incluindo considerações sobre alguns dos equipamentos presentes nesses jardins; as considerações finais e as referências bibliográficas.

Alfred Usteri (1869-1948)

O botânico suíço Alfred Usteri (1869-1948) mudou-se para o Brasil logo após a defesa de seu doutorado na Universidade de Basel, em 1905, quando foi contratado em março do mesmo ano, por um período de 3 anos, como professor substituto do Curso de Engenheiros Agrônomos da Escola Politécnica de São Paulo, para as disciplinas de Botânica Geral e Especial e Agricultura Especial (Prontuários da Escola Politécnica; Siguemoto, 2011; Site Jstor Global Plants).1 Não temos a informação de quem indicou Usteri para o cargo, mas havia uma proximidade do então diretor e um dos fundadores da Escola Politécnica, o engenheiro Antônio Francisco de Paula Souza (gestão de 1893 a 1917), com a Suíça, onde iniciou seus estudos no “Polytechnikum da Universidade de Zurik” (Site da Escola Politécnica de São Paulo).2
No mesmo ano de sua chegada a São Paulo, Usteri tornou-se sócio da “Sociedade Scientifica de São Paulo”, fundada em 1903 pelo botânico Edmundo Krug, professor do Colégio Mackenzie. Nesta Sociedade, Usteri pode ter contato não só com cientistas profissionais (como o botânico sueco Alberto Löfgren, fundador e diretor do Horto Botânico de São Paulo e membro da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo),3 mas também com os “interessados em ciências” (como o engenheiro e escritor Euclides da Cunha). A Sociedade Scienifica tinha o objetivo de “melhorar o conhecimento da sociedade sobre descobertas científicas e lutar pelo ensino de ciências nas escolas” (Marcolin, 2013).4 A divulgação científica se dava pelas palestras que ocorriam sem um lugar fixo, mas informados previamente através da imprensa, como no jornal Correio Paulistano, e também através das publicações na Revista da Sociedade Scientifica. Usteri publicou um artigo logo no ano que se associou, sobre a inflorescência das coníferas existentes em São Paulo (Usteri, 1905) que, segundo Marcolin (2013), foi um dos raros textos ilustrados da revista.
Em suas pesquisas, Usteri coletou e identificou a flora dos arredores da cidade de São Paulo, que foram organizadas no Herbário da Escola Politécnica e publicadas inicialmente nos Anuários da Escola Politechnica (Usteri, 1906; 1907 c; 1908). Posteriormente, esses textos foram reunidos e ampliados em uma publicação em alemão, de 1911 (Figura 4), com mais de 800 espécies listadas (Usteri, 1911). Trata-se, segundo a pesquisadora Maria das Graças da Lapa Wanderley,5 do Instituto de Botânica de São Paulo, do primeiro levantamento da flora da cidade de São Paulo (Figura 5). Neste estão retratados, entre outros, os campos,6 e outras espécies presentes outrora em abundância nas paisagens paulistas, como as Araucárias (Araucaria angustifolia) (Figura 6).


Figura 4: Capa do livro de Usteri (1911).


Figura 5: Mapa anexo interno a publicação com a identificação da vegetação dos arredores da cidade de São Paulo. Fonte: Usteri, 1919.


Figura 6: Foto de Araucárias (Araucaria angustifolia) na Avenida Paulista. Fonte: Usteri, 1919.

Usteri também ensaiava espécies no Campo de Culturas da Escola Politécnica (Usteri, 1907a; 1907b), sob responsabilidade do paisagista e patologista belga Arsènne Puttemans (1873-1937) (Siguemoto, 2012; Moryama, 2012; Site do Patrimônio Belga no Brasil). O Campo de Culturas ficava próximo ao Jardim da Luz, como pode ser visto no mapa abaixo (Figuras 7 e 8).


Figura 7: Localização do Jardim da Luz e do Campo de Culturas da Escola Politécnica de São Paulo. Legenda: A – Jardim da Luz, B – Estação da Luz, C – Campo de Culturas da Escola Politécnica. Fonte: Mapa Sara Brasil, 1930.


Figura 8: Campo de Culturas com frente para a Rua Três Rios. Fonte: Escola Polytechnica, 1908, p.48.

Entre o fim do contrato de Usteri na Escola Politécnica (1908) até a publicação do “Guia Botânico da Praça da República e do Jardim da Luz” (1919), foram encontradas algumas notícias veiculadas no Jornal Correio Paulistano e em seu Prontuário na Escola Politécnica. No Jornal, consta a informação de que em 29 de março de 1914 foi requerida sua naturalização brasileira7. Em 1 de junho de 1914 há em seu Prontuário uma carta redigida por Usteri e dirigida ao diretor Paula Souza, que solicita, entre outros, um certificado de que ministrou aulas por 3 anos na Escola Politécnica e sua recomendação “como professor no gymnasio (physica e chimica)” (Prontuários da Escola Politécnica, carta do 1 de junio de 1914).  Em 13 de fevereiro de 1915, no Jornal Correio Paulistano, há a informação de Usteri se candidatando ao concurso para professor de Física, Química e História Natural a ser realizado na Escola Normal da capital (ao lado da Praça da República), mas para a cidade de Casa Branca, interior paulista. No dia 16 de junho de 1915, Usteri se candidata ao concurso para professor de História Natural no Ginásio de Campinas, também interior paulista. Não se localiza a informação se Usteri foi aprovado em um desses concursos, mas no início de 1920 ele retorna ao seu país natal (Site Jstor Global Plants).

O Prefácio do escritor Monteiro Lobato

José Bento Monteiro Lobato (1882 – 1948) foi um escritor e editor brasileiro, e a primeira pergunta que se faz, ao vermos seu nome estampado na capa do “Guia Botânico”, é o motivo desta escolha.
Monteiro Lobato teve uma produção inicialmente jornalística “por acaso”. Proprietário de uma fazenda produtora de café herdada de seu avô no Vale do Paraíba, Monteiro Lobato recorreu ao jornal O Estado de São Paulo “para expor sua indignação com relação à desinformação do homem do campo que, como recurso para a lavoura, ateava fogo no solo fértil para reiniciar a plantação” (Silva, 2012, p.38). O texto, denominado “Uma Velha Praga”, publicado em 12 de novembro de 1914, “mais precisamente uma carta reclamando da situação, transformou-se em artigo, e Lobato, em colaborador do jornal” (Silva, 2012, p. 38). Logo em seguida escreveria “Urupês”, em 23 de dezembro de 1914, “que serviria de base para seu primeiro livro em 1918 e o colocaria na posição de escritor no cenário nacional” (Silva, 2012, p.38).
Em 1916, segundo Santos (2021), um material impactou a obra do escritor: um periódico intitulado “Memórias do Instituto Oswaldo Cruz”, com as fotos das pesquisas realizadas por cientistas do Instituto Oswaldo Cruz, em 5 expedições científicas realizadas pelo Brasil, de 1911 a 1912. Particular impacto teve “a viagem de cerca de sete meses feita pelos sanitaristas Belisário Penna (1868-1939) e Arthur Neiva (1885-1945), em 1912, entre o norte da Bahia, o sudeste de Pernambuco, o sul do Piauí e Goiás de norte a sul” (Albuquerque, 2021, p. 5). O material produzido “registrava em detalhes a miséria em que viviam as populações” e o “contato de Lobato com o diário provocou uma mudança de perspectiva do escritor a respeito do camponês”, fazendo com que o autor “se engajasse numa campanha pelo saneamento do país” (Santos, 2021, p. 5, 6).

“Em março de 1918, motivado pelos médicos sanitaristas Belisário Pena e Artur Neiva, Monteiro Lobato escreveria uma série de artigos sobre saúde pública n’O Estado de S. Paulo, reunidos posteriormente no livro “Problema Vital”. Em um dos textos, redefiniria o perfil do personagem Jeca Tatu: indolente não pela natureza racial, mas pela falta de condições de higiene e saúde. Em junho desse mesmo ano, adquire a Revista do Brasil” (Silva, 2012, p. 41).

Entusiasmado com o sucesso editorial, fundou em 1919 a Editora Monteiro Lobato, “a primeira editora nacional, através da qual publicou seus primeiros livros infantis” (Frazao, 2021).
Neste contexto, o convite e o aceite de Monteiro Lobato para fazer o Prefácio do “Guia Botânico” de Usteri em 1919, não poderia ser mais assertivo: um escritor preocupado com as questões ambientais; defensor da divulgação da ciência e com uma linguagem acessível ao público infantil e adulto.

Os colaboradores do “Guia Botânico”

Na apresentação do “Guia Botânico”, Usteri agradece a colaboração de Antônio Etzel (1856-1930), Administrador dos Jardins Públicos da capital; do botânico Frederico Carlos Hoehne (1882-1959), que dirigia a Seção Botânica do Instituto Butantan; e de Herman Luederwaldt (1865-1934), “conservador das coleções do Museu do Ypiranga” (Usteri, 1919).

Antônio Etzel (1856-1930)

O jardineiro austríaco Antônio Etzel (1856-1930) foi indicado, em 1899, pelo primeiro prefeito da capital, Antônio Prado (gestão 1899-1910), ao cargo de Administrador dos Jardins Públicos. Na época, Etzel era o jardineiro da mãe de Antônio Prado, Dona Veridiana Prado. Em sua gestão, realizou uma série de transformações no Jardim da Luz (antigo Horto Botânico, fundado em 1798 e aberto ao público em 1825). Inicialmente construiu a residência do administrador, que abrigou a família por várias gerações e atualmente é a sede da administração do Parque. Eduardo Etzel, seu filho, comenta que o pai “foi contratado com a intenção de se fazerem novos jardins urbanizando os largos pré-existentes num esforço de embelezar a cidade” (Etzel, 1987 apud Prefeitura Municipal de Sao Paulo, 2008, p. 13). As ruas, complementa, não eram arborizadas “por serem estreitas e irregulares [e] não comportavam árvores de porte. [...] No mais, o arvoredo estava nos grandes quintais e chácaras da cidade e na mataria residual, mantendo-se uma situação por assim dizer secular, setecentista” (Etzel, 1987 apud Prefeitura Municipal de Sao Paulo, 2008, p.13).
Foi a partir da primeira década do século XX que não só os largos foram remodelados e ajardinados, mas também as novas, largas e retificadas avenidas passaram a ser arborizadas de forma sistematizada. A chamada “arborização de alinhamento” trazia os ares de uma cidade moderna, salubre e bela. Nos jardins, as reformulações, segundo Etzel (1987), tiveram início no Jardim da Luz, “com a implantação dos grandes gramados e novo traçado com a rua circular toda arborizada com jaqueiras, aproveitamento dos grupos de árvores antigas formando alguns bosques, permanecendo o tanque central em forma de cruz, a cascata e a ilha” (Etzel, 1987 apud Prefeitura Municipal de Sao Paulo, 2008, p.20). Também foi na gestão de Antônio Etzel que foram introduzidos novos equipamentos: o coreto, o quiosque e animais, que funcionava como “mini zoológico” e particular atração para as crianças. Coube a Antônio Etzel, também, o gerenciamento de viveiros “para as futuras árvores de São Paulo”, além de um viveiro menor, no interior do Jardim da Luz, “onde se criavam as plantas de flores que eram transplantadas para os canteiros dos jardins” (Etzel, 1987 apud Prefeitura Municipal de Sao Paulo, 2008, p.15).
O próximo espaço público a receber ajardinamento após o Jardim da Luz foi a Praça da República, localizada no chamado “centro novo”, propiciado pela transposição do vale do Anhangabaú através do Viaduto do Chá, inaugurado em 1892 (Guaraldo, 2020). Segundo Guaraldo (2020, p. 59), “a remodelação da praça num jardim pitoresco seria modelo para os futuros logradouros na cidade” (Figura 9). Também vemos a referência desse modelo de jardim em cidades do interior do Estado, como na cidade de Bauru, com seu Jardim Público inaugurado em 1914 (Figura 10), que incluía um coreto.8


Figura 9: Ponte em arco, lago e rochas artificiais na Praça da República em São Paulo, cerca de 1910. Fonte: Foto de Vincenzo Pastore. Acervo Brasiliana Fotográfica. Recuperado de: https://brasilianafotografica.bn.gov.br/brasiliana/handle/20.500.12156.1/2080


Figura 10: Jardim Público de Bauru (interior paulista), inaugurado em 1914, contendo os mesmos elementos da Praça da República. Fonte: Arquivo Sr. Luciano Pires, recuperado de: https://www.jcnet.com.br/noticias/bairros/2018/03/519731-o-dia-e-a-noite-na-praca-rui-barbosa.html

Guaraldo comenta que a Praça da República recebeu propostas de vários autores: “Carlos de Sérico, Tommaso Gaudenzio Bezzi, Arsène Puttemans. A definitiva parece ter derivado do projeto de Bezzi, o arquiteto do Museu do Ipiranga. O lugar foi cercado no final de 1902 e inaugurado dois anos mais tarde” (Guaraldo, 2002, p. 59).
Arsène Puttemans, como visto anteriormente, era o responsável pelo Campo de Culturas da Escola Politécnica e foi o autor, também, do Jardim frontal (1909) ao Museu Paulista (edifício inaugurado em 1894), também conhecido como Museu do Ipiranga, nome do riacho onde, às suas margens, foi proclamada a Independência do Brasil (1822)9. Aos fundos do Museu Paulista, existia o Horto, cujos primeiros plantios foram feitos pelo próprio diretor, o alemão Hermann von Ihering, em 1898. Mas apenas em 1906 “foram iniciados os trabalhos mais efetivos, como a abertura de caminhos, que desde então ficou sob os cuidados de Herman Luederwaldt (1865-1934), assistente de zoologia do Museu” (Goes, 2021), o segundo personagem a quem Usteri presta agradecimentos pelo auxílio de informações para a conclusão do “Guia Botânico”.

Herman Luederwaldt (1865-1934)

Autodidata, Luederwadlt irá acumular várias funções no Museu Paulista. Além das já citadas, também fazia coletas de espécimes animais e vegetais e, portanto, colaborou com o acervo e a organização do Herbário do Museu. Em 1914 foram incorporadas duas importantes coleções: as de Usteri e da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, iniciada em 1887 e “reunida pelos srs. Alberto Löfgren, Gustavo Edwall e outros” (Luederwaldt, 1918, p.288).  Muitas das espécies coletadas e introduzidas por Luederwaldt no Horto eram dos arredores de São Paulo e havia, ainda, uma porção do campo original preservado na área do Horto, de modo que, provavelmente, as trocas de informações foram profícuas com Usteri.
No Horto, seriam expostos “typos selecionados da flora de S. Paulo”, além de “plantas indígenas uteis e decorativas” (Hoehne, 1925, p. 128 apud Goes, 2021, p.4). A ideia era que ambos, Museu e Horto, se complementassem. “Enquanto no Museu predominaria a “sistemática”, com a exposição das exsicatas das plantas do Herbário da Seção Botânica; o Horto deveria “mostrar ao visitante a beleza do reino vegetal em plena liberdade da natureza” (Luederwaldt, 1918, p.288 apud Goes, 2021, p. 4). Já o jardim frontal, projeto original de 1909 de Arsène Puttemans, seria reformulado em 1922 para celebrar o Centenário da Independência do Brasil, com projeto do paisagista francês Francisque Couchet e o ajardinamento da firma Dierberger & Cia (Santos, 2021; Savio, 2021; Enokibara, 2016a).
Em 1917, o Museu é assumido por um novo diretor, Affonso Teixeira d’Escragnolle Taunay, que pede afastamento como professor da Escola Politécnica de São Paulo para assumir este cargo. Para chefiar a Seção Botânica foi convidado Frederico Carlos Hoehne (1882-1959), o terceiro personagem a quem Usteri menciona nos agradecimentos.

Frederico Carlos Hoehne (1882-1959)

Também autodidata, o brasileiro Frederico Carlos Hoehne (1882-1959) iniciou suas atividades no Museu Nacional do Rio de Janeiro como jardineiro-chefe em 1907, e em 1908 participou de sua primeira expedição, como auxiliar de botânico, da Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas do Mato Grosso ao Amazonas (a denominada Comissão Rondon). Posteriormente, participou das expedições Roosevelt-Rondon de 1913 a 1914 (Carvalho, 2019 e 2020). Em 1917 foi convidado a fundar e dirigir o Horto Oswaldo Cruz no Instituto Butantan, localizado na cidade de São Paulo, e destinado ao cultivo de espécies medicinais e tóxicas, mas também previa “enriquecer o patrimônio therapeutico, fornecer informações e recursos à medicina, orientar o público a arte de curar as moléstias” (Hoehne, 1925, p.39 apud Tiseo e Enokibara, 2021, p. 13).
Mas a preocupação de Hoehne para com o Horto Oswaldo Cruz transcendia a questão da experimentação de espécies e a instrução ao público. Sendo ele o responsável “para a concepção do desenho, o botânico aponta como modelo o Jardim Botânico de Dahlem, em Berlim, e afirma que, ‘de acordo com os processos e methodos mais modernos da esthética, arranjamos o plano de forma a fazer predominar as linhas curvas’” (Hoehne, 1925, p.41 apud Tiseo e Enokibara, 2021). O mesmo cuidado se dava em relação às ruas, “arborisadas com ‘Alfeneiros’, ‘Tipus’, ‘Congonheiros’, ‘Coração negro’, ‘Suinans’, ‘Ipês’, ‘Canelleiras’, etc. e teem mais ou menos seis metros de largura e são emolduradas com filetes de gramados de ‘Pello de urso’” (Hoehne, 1925. p. 49). Em 1923, a Seção Botânica foi transferida para o Museu Paulista, ficando Hoehne responsável não só pelo Horto Oswaldo Cruz e a Estação Biológica, mas também pelo Horto do Museu.
No início do século XX, havia na capital paulista, portanto, 3 hortos botânicos10 (Figuras 11, 12 e 13): o Horto Botânico do Museu Paulista (com os primeiros plantios iniciados em 1898), visando expor a flora paulista e ser um complemento às exsicatas expostas no Museu; o Horto Oswaldo Cruz (fundado em 1917 e inaugurado em 1918), destinado ao cultivo de espécies medicinais e tóxicas, além da instrução à população; e  o Horto Botânico de São Paulo, mais conhecido como Horto da Cantareira, localizado na Serra de mesmo nome, fundado em 1896 pelo botânico sueco Alberto Löfgren (1854-1918) (Tiseo e Enokibara, 2021). Todos os responsáveis publicaram sobre as espécies presentes nos respectivos hortos ou sobre suas expedições botânicas para coletas e identificação de plantas.11


Figura 11: Foto aérea do Horto do Museu Paulista.


Figura 12: Planta do Horto do Museu Paulista com as divisões por regiões. Legenda: (1) Plantas úteis no Brasil, (2) Região das “Mattas”, (3) Região dos “Campos”, (4) Pinheiral e “Madeiras Legítimas”, (5) “Várzea Artificial” ou “Prado”, (6) “Lagoa Artificial”, (7) perímetro com“Bambus Exóticos”.


Figura 13: Área de transição no Horto do Museu Paulista (esquerda mata e a direita campo). Fonte: Tiseo e Enokibara, 2021.

Apesar de Löfgren não estar citado nos agradecimentos de Usteri no “Guia Botânico ”, acreditamos que tiveram intercâmbio de informações, haja vista que o Herbário de Usteri, da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo (sob a responsabilidade de Löfgren) se somaram ao do Museu Paulista em 1914, inicialmente formado por Luederwaldt e posteriormente dirigido por Hoehne. Monteiro Lobato, também estava indiretamente nestas ações. Carvalho (2019, p. 83) identificou que Monteiro Lobato participou da primeira excursão feita por Hoehne no ano seguinte à sua contratação no Instituto Butantan (1917), “para o Vale do Ribeira de Iguape e Juquiá”. Nas pesquisas, pudemos identificar que muitas das espécies presentes no Jardim da Luz e na Praça da República estavam presentes nesses hortos e, neste contexto, pudemos ver que os responsáveis e citados nos agradecimentos do “Guia Botânico”, de fato puderam colaborar para a conclusão do trabalho de Usteri. Mas que espécies haviam nesses dois jardins?

As regiões e plantas representadas no “Guia Botânico”

As 178 espécies listadas na publicação estão agrupadas em 11 regiões: “Brasil” (p.33), com um elenco de 55 espécies; “Paizes ao norte do Brasil, America Central, Mexico e India Occidental” (p.37), com 13 espécies; “America do Norte” (p.38), com 11 espécies; “Europa” (p.39), com 6 espécies; “Africa” (p. 40), com 17 espécies; “Asia Occidental e Himalaya” (p.41), com 7 espécies; “Asia do Sul” (p.42), com 12 espécies; “China, Japão” (p. 43), com 33 espécies; “Archipelago Austral Asiatico” (p.45), com 6 espécies; “Austrália e Nova Zelândia” (p.46), com 13 espécies; e “Ilhas do Pacifico” (p. 48), com 5 espécies.12 Algumas das espécies são mais representativas na composição do jardim, formando grande aleias. Citaremos algumas, identificando como estarão presentes, também, na arborização viária da capital e em cidades do interior paulista.

O Plátano (Platanus orientalis)

O Plátano (Platanus orientalis) foi identificado por Usteri como sendo da  região da “Asia Occidental e Himalaya” (Usteri, 1919). Esta foi uma das espécies mais utilizadas na arborização viária de Paris, durante as transformações conduzidas na gestão do Prefeito George Eugènne Hausmmann (1853-1870). Aparece como uma das espécies mais recomendadas para a arborização de alinhamento, no tratado de jardins do paisagista francês Edouard André - L’Art des Jardins – Traité général de la composition des parcs et jardins, de 1879. Um exemplar desse tratado encontra-se na Biblioteca Central da Escola Politécnica13.
O Plátano foi uma espécie bastante expressiva na composição da Praça da República. Foi implantada não só no alinhamento das ruas, mas também em parte do perímetro externo do jardim (Figura 14), e em uma aleia de 4 fileiras a partir da diagonal de um de seus 8 acessos (Figura 15), possibilitando uma continuidade visual com a avenida São Luiz. Essa espécie, segundo Guaraldo (2020), predominou durante todo o período das Intendências (de 1890 a 1899) na arborização urbana e deixou de ser utilizado em 1911, em função de um problema sanitário com a espécie.


Figura 14: Cartão postal com as aleias de Plátanos na Praça da República. Fonte: Recuperado de: https://sampahistorica.wordpress.com/2015/02/03/bucolico.


Figura 15: Planta do Jardim da Praça da República, com a indicação dos plátanos (1919). Fonte: Usteri, 1919. Intervenção no mapa por Jéssica Tiseo (2021).

A espécie Platanus orientalis constava na produção dos viveiros do Horto da Cantareira e do Instituto Agronômico de Campinas que “tem feito larga distribuição desta espécie” e, segundo Löfgren, “aclimatada há muito em S. Paulo está já espalhada em todo o Estado onde prospera quasi em toda a parte em que a secca não for muito prolongada” (Löfgren, 1919, p.166).
Mesmo após a interrupção de uso na capital, continuou sendo distribuída no interior. Romero (2019), que pesquisou sobre as Cartas de Solicitação de Mudas ao Instituto Agronômico de Campinas do Serviço de Distribuição de Mudas e Sementes (SDMS), identificou a solicitação do plátano no período que pesquisou, de 1909 a 1912, bem como a rede de cidades que receberam mudas através da rede ferroviária do estado.

O Alfeneiro ou Ligustro do Japão (Ligustrum japonicum)

O Alfeneiro ou Ligustro do Japão (Lisgustrum japonicum) era uma das espécies da região da “China, Japão” identificadas por Usteri (1919). A aleia de Alfeneiros ligava um extremo a outro do jardim, sendo uma das entradas em frente à Estação da Luz (Figuras 16 e 17). Também foi a escolhida para a arborização da Avenida Paulista, um dos primeiros boulevards de São Paulo, inaugurada em 1891. O Alfeneiro foi uma das 11 espécies mais utilizadas na arborização urbana da capital no que Guaraldo (2020) caracterizou como um 2º período, de 1900 a 1911, onde houve um predomínio de espécies exóticas e uma clara inspiração “nos réseaux e boulevards de Paris”. O Alfeneiro permaneceu por todo o período estudado por Guaraldo (até 1923) (Guaraldo, 2020). No interior paulista foi a espécie mais requerida ao SDMS. Foram mais de 20 mil mudas solicitadas no período de 1909 a 1912 (Romero, 2019).


Figura 16: Cartão postal com a aleia de Alfeneiros no Jardim da Luz. Fonte: Recuperado de: https://sampahistorica.wordpress.com/2015/02/03/bucolico/


Figura 17: Planta do Jardim da Luz com a indicação dos Alfeneiros ou Ligustros do Japão. Fonte: Usteri, 1919.  Intervenção no mapa por Jéssica Tiseo (2021).

A Tipuana (Tipuana tipu) e o Jacarandá mimoso (Jacaranda mimosifolia)

A tipuana (Tipuana tipu) estava reunida no conjunto de espécies representativas dos “paizes ao norte do Brasil, America Central, Mexico e India Occidental”, segundo Usteri (1919). É uma espécie que foi introduzida como ornamental no paisagismo e na arborização das cidades brasileiras (Angélico, 2020). Já o jacarandá mimoso (Jacaranda mimosifolia) estava no conjunto de espécies do Brasil, segundo Usteri (1919). Entretanto, de acordo com Lorenzi (2003), é uma espécie nativa da Argentina, Bolívia e Paraguai.
A Tipuana e o Jacarandá mimoso estão aqui representadas conjuntamente pois foram largamente utilizadas pelo paisagista francês Carlos Thays14 em Buenos Aires e ambas estão como espécies representativas do 3º período identificado por Guaraldo (2020), de 1912 a 1918, caracterizado pela presença desses “novos repertórios vegetais”. Ambas foram e ainda são características dos bairros jardins implantados no início do século XX pela Companhia City e também foram largamente utilizadas nas demais cidades do Estado de São Paulo.15
Segundo Guaraldo (2002, p.57), o “jacarandá mimoso (Jacaranda mimosifolia) fez sua primeira aparição pública em 1915, na rua Bresser e na avenida Celso Garcia (antiga avenida da Intendência) [...], substituindo a arborização anterior (respectivamente plátano, eucalipto e alfeneiro do japão)”. No SDMS comparecia nas solicitações do período de 1909 a 1912, portanto anteriormente a capital (Romero, 2019). Ao se referir às “substituições”, fica claro através dos dados coletados por Guaraldo, como a cidade constituía-se, nesse período, em um verdadeiro “laboratório”, onde eram ensaiadas várias espécies.

Palmeiras: o exótico e o nativo

O conjunto de palmeiras presentes na Praça da República eram de diferentes nacionalidades: a Palmeira Imperial (Roystone oleracea) era da “Asia do Sul” (Usteri, 1919, p.42); a Palmeira Fênix (Phoenix canariensis) da “África” (Usteri, 1919, p.40) e a Palmeira Jerivá (Syagrus romanzoffiana) do “Brasil” (Usteri, 1919, p. 33).
A palmeira imperial (Roystonea oleracea) teve seu primeiro exemplar plantado em 1809 por D. Pedro II no Jardim Botânico do Rio de Janeiro (Rodrigues, 1893), mas sua aparição documentada em logradouro público em São Paulo é de 1910, segundo Guaraldo (2020). É provável, ainda segundo a autora, que tenha chegado juntamente com o Teatro Municipal (inaugurado em 1911). “A palmeira imperial foi assim incluída na paisagem paulistana associada a um dos símbolos da riqueza trazida pelo café: o teatro, o lugar do espetáculo” (Guaraldo, 2020, p. 65).
No caso da Praça da República, próxima ao Teatro Municipal, a Palmeira imperial marcava as 8 entradas do jardim, emoldurando seus acessos como podemos ver na imagem acima (Figura 18), seguido pelas Palmeiras Fênix. Mas todo o perímetro interno da Praça é cercado por Jerivás, palmeira tipicamente brasileira (Figuras 19 e 20). Este, somado a outras espécies nativas, irá caracterizar o 4º período estudado por Guaraldo (2020), de 1918 a 1923.16 Todas, igualmente serão solicitadas ao SDMS e distribuídas para várias cidades do interior paulista no período de 1909 a 1912 (Romero, 2019).


Figura 18: Planta da Praça da República. Fonte: Usteri, 1919. Intervenção no mapa por Jéssica Tiseo (2021).


Figura 19 e 20: Fotos da Praça da República. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Pra%C3%A7a_da_Rep%C3%BAblica_ (S%C3%A3o_Paulo)

Considerações finais

O “Guia Botânico da Praça da República e do Jardim da Luz” elaborado por Alfred Usteri em 1919 foi destinado não só aos “entendidos em botânica”, mas também “àqueles em visita aos jardins”. Divulgado na imprensa e em formato de bolso, o propósito de instrução é claro, assim como foi a preocupação no Horto do Museu Paulista e no Horto Oswaldo Cruz, cujos responsáveis, Herman Luederwaldt e Frederico Carlos Hoehne, estão citados nos agradecimentos na colaboração do Guia.  As espécies presentes nos dois jardins, identificadas em “mapas”, poderiam guiar os transeuntes não só pelos jardins, mas também, por toda cidade. Haja vista que, como vimos, esse repertório estava presente também na arborização viária.
Muitas destas espécies estarão presentes, também, em mais de 100 cidades do estado de São Paulo que receberam mudas através do Serviço de Distribuição de Mudas e Sementes do governo do Estado. Com um centro produtor na capital (o Horto da Cantareira), outro no interior (o Instituto Agronômico de Campinas) e demais campos experimentais espalhados pelo interior, a divulgação desse repertório vegetal se fará através das linhas ferroviárias (Figura 21 e Figura 22).

Figura 21: Mapeamento das cidades que receberam mudas do IAC através do SDMS e a rede ferroviária (solicitantes públicos e privados). Período: 1909 a 1912. Fonte: Romero, 2019.


Figura 22: “Trem sahindo do Horto da Cantareira, carregando 42.000 mudas de árvores e plantas frutíferas” (1915). Fonte: Revista O Fazendeiro, 1915, p. 10.

Mas não só o repertório vegetal chegou até essas cidades, os equipamentos presentes nesses dois jardins também. Dentre eles, o coreto foi, sem dúvida, o elemento mais reproduzido nas praças e jardins das cidades do interior do estado de São Paulo. Inicialmente de ferro fundido (como no Jardim da Luz) e posteriormente em madeira ou alvenaria, ainda estão presentes em várias cidades na atualidade (Enokibara, 2016c).
O “Guia Botânico”, portanto, mais do que um material para “ler e entender os jardins”, como destacado no Prefácio de Monteiro Lobato, foi um importante material de “divulgação” de novos repertórios vegetais e de equipamentos para os jardins criados ou reformulados no início do século XX no Estado de São Paulo.

NOTAS

1. Site JSTOR Global Plants com informações sobre Alfred Usteri: https://plants.jstor.org/stable/10.5555/al.ap.person.bm000008686

2. Site da Escola Politécnica de São Paulo: https://www.poli.usp.br/institucional/diretoria/galeria-de-diretores/prof-dr-antonio-francisco-de-paula-souza

3. Sobre Alberto Löfgren e as Ciências Naturais ver: Enokibara (2016a) (2016b); Enokibara y Romero (2019).

4. Usteri entrou como sócio efetivo da Sociedade Scientifica em 1905. Notícia recuperada de: http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=090972_06&pagfis=6519. “Entre os primeiros a formar a sociedade, além de Krug, estavam os botânicos Alberto Loefgren e Gustavo Edwall, da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo, Vital Brazil, diretor do Instituto Soroterápico do Butantan, Job Lane, professor de biologia, Antonio Barros Barreto, engenheiro e professor da Escola Politécnica, Paulo Florence, professor particular, e Erasmo de Carvalho, professor de literatura do Mackenzie. Mais tarde uniram-se a eles Adolfo Lutz, médico, bacteriologista e entomólogo, Victor Dubugras, engenheiro e professor da Poli, e Belfort Mattos, futuro chefe do Serviço Meteorológico de São Paulo. Outras personalidades tornaram-se membros efetivos ou correspondentes, como Oswaldo Cruz, Emílio Goeldi, Euclides da Cunha e até políticos do Partido Republicano Paulista” (Marcolin, 2013).

5. Projeto Temático FAPESP denominado “Flora Farenogâmica do Estado de São Paulo” coordenado originalmente por Hermógenes de Freitas Leitão Filho (Unicamp), falecido, e posteriormente coordenado por Maria das Graças Lapa Wanderley (Instituto de Botânica de São Paulo) e George Shepherd, da Unicamp (Fioravanti, 2005, p. 55).

6. Tal reconhecimento pelo trabalho de Usteri expressa-se pela indicação de seu nome a um parque em 2010, o Parque Ecológico Municipal de Campo Cerrado Dr. Alfred Usteri. Trata-se do primeiro parque a contemplar essa vegetação no Município de São Paulo. Recuperado de: https://arvoresdesaopaulo.wordpress.com/2010/06/21/decretada-a-preservacao-dos-campos-cerrados-do-jaguare/

7. No Jornal Correio Paulistano de 29/03/1914 consta que os títulos de naturalização encontram-se “no gabinete da presidência, que vai encaminhá-los à Secretaria da Justiça e da Segurança Pública”. Recuperado de: http://memoria.bn.br/docreader/090972_06/32359

8. Sobre as Praças e Jardins das 29 cidades levantadas no transcurso do Projeto Temático ver: Enokibara (2016 c). Sobre o Projeto Temático ver: Retto, Enokibara y Constantino (2012).

9. O edifício monumento construído para celebrar o local da Independência do Brasil abrigará, posteriormente, o Museu Paulista. Este localiza-se na esplanada do riacho do Ipiranga, local onde foi proclamada a Independência do Brasil (1822). Ver Goes, R. N., O Horto do Museu Paulista (1898-1928). Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Arquitetura e urbanismo da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Campus de Bauru, 2021. Orientadora: Profa. Dra. Marta Enokibara.

10. Não foi inserida nesta lista o Jardim da Luz, pois, apesar de originalmente ter sido o primeiro Jardim Botânico de São Paulo, fundado em 1798, já em 1838 teve seu nome alterado para Jardim Público, por não atender a sua função original (Rocha e Cavalheiro, 2001).

11.  Luederwaldt relatou sobre as espécies presentes no Horto do Museu Paulista em 1914, 1915 e 1919 (Luederwaldt, 1918; 1919). Hoehne publicou sobre as espécies presentes no Horto em 1925 (Hoehne, 1925) e também sobre a série de espécies que coletou em suas expedições (Carvalho, 2019). Löfgren publicou um material, de distribuição gratuita, para esclarecer o público das espécies em ensaio e em distribuição no Horto da Cantareira e no Instituto Agronômico (Löfgren, 1906).

12. Os números que identificam as plantas ultrapassam 200, mas na listagem constam 178 espécies.

13.  Um exemplar desse Tratado de Edouard André encontra-se na Biblioteca Central da Escola Politécnica de São Paulo e consta, na capa, a informação da doação feita por Alexandre Albuquerque, ex-aluno e depois professor da Escola Politécnica e filho de Frederico Albuquerque, administrador do Jardim da Luz e dos jardins públicos de São Paulo de 1889 a 1892 (Dourado, 2011).

14.  Segundo Guaraldo (2020), apoiada em Berjman (1998), “sua introdução, constata-se, ocorreu diretamente de Buenos Aires, quando Bouvard e sua equipe – de 4 a 6 profissionais, - foram chamados por Carlos T. Alvear para apresentar propostas de melhoramentos. Seus projetos são de 1906 e 1909, e sua passagem pelo Brasil aconteceu durante uma das últimas viagens à capital argentina. Como a equipe de Bouvard continha profissionais paisagistas, como Vacherot, responsáveis pelo desenvolvimento arquitetônico das suas propostas de parques e espaços livres, podemos crer que elementos de repertório já comuns em Buenos Aires possam ter sido trazidos por profissionais como esse” (Guaraldo, 2020, p. 75,76).

15. A Tipuana já consta como distribuída pelo Horto Botânico de São Paulo pelo menos desde 1906, ano da publicação do livro Notas sobre as plantas exóticas introduzidas no Estado de S. Paulo, elaborado pelo Diretor do Horto, o botânico Alberto Löfgren (Logren, 1906, p. 200 y 201). Mas no mesmo livro não é feita menção de distribuição pelos Hortos do Instituto Agronômico do Estado (posteriormente denominado Instituto Agronômico de Campinas). Também não consta nas solicitações ao SDMS, no período estudado por Romero (2019) de 1909 a 1912 (Romero, 2019, p. 366).

16. Entre as nativas mais utilizadas no período, segundo Guaraldo (2020), constam o Alecrim de Campinas (Holocalyx glaxiovii); Quaresmeira (Tibouchina sp.), Jacarandá mimoso (Jacaranda mimosifolia), Palmeirinha de Petrópolis, Jerivá paulista (Syagrus romanzoffiana), Araribá (Centroloblum tomentosum) e Pau-Brasil (Paubrasilia echinata).

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