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Revista Escuela de Historia

versión On-line ISSN 1669-9041

Rev. Esc. Hist. vol.15 no.2 Salta dic. 2016

 

ARTICULO ORIGINAL

Da União à Restauração: considerações sobre o comércio, a administração e os lusitanos na Buenos Aires seiscentista

(From Union to Restauration: considerations about commerce, administration and the lusitanians in the 17th Century Buenos Aires)

Rodrigo Ceballos
Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Formação de Professores
ECT, Caixa Postal 31, Cajazeiras, 58900-000, Paraíba, Brasil.
rcovruski@gmail.com


Resumo:

Este atigo tem como objetivo apresentar a formação de algumas redes de cumplicidade em Buenos Aires durante a primeira metade do século XVII e a existência de conflitos locais para o controle do comércio no seu porto. Conhecida pela forte presença lusitana, partimos do pressuposto de que os portugueses foram parte estruturante da formação social portenha, do seu equipamiento político e administrativo, participando como comerciante e morador na região. Para compreender a participação lusitana na América espanhola discutimos o significado da (i)legalidade comercial na cidade-porto, e as formalidades e informalidades instituintes da própria manutenção do Império espanhol por meio das práticas extralegais. Mais do que uma rejeição de lusitanos contrabandistas por vecinos – conhecidos como os beneméritos e o seu ethos social –, percebemos um complexo envolvimento de grupos dinâmicos compostos por governadores, moradores/comerciantes (portugueses ou não) e oficiais régios na busca pelo controle administrativo e, consequentemente, pelo monopólio comercial de uma rota que ligava o Oceano Atlântico com o Tucumán e o Alto Peru.

Palavras-chave: América espanhola; Redes sociais; Comércio; Contrabando; Administração

Abstract:

The aim of this paper is to present the formation of some complicity networks in Buenos Aires during the first half of the 17th Century and the existence of local conflicts on the control of trade in its port. With a massive Lusitanian presence in the port, we presume that the Portuguese were a social structural part of the city participating as a trader and resident in the region and its politic and administrative equipamiento. To understand the Lusitanian participation in Spanish America we discussed the meaning of (i)legal commerce in the port of Buenos Aires, and the (in)formalities for the maintenance of the Spanish Empire through this extralegal practices. More than a rejection of Lusitanian smugglers by vecinos – natives with their social ethos –, we see a complex involvement of dynamic groups constituted by governors, residents/merchants (Portuguese or not) and royal officials for the administrative control and, consequently, the commercial monopoly of a route that connected the Atlantic Ocean with the Tucumán and the Alto Peru regions.

Keywords: Spanish America; Social networks; Commerce; Smuggling; Administration


Em 1585, o bispo de Tucumán, Francisco de Victoria, investiu na primeira viagem comercial documentada desde Buenos Aires rumo às costas do Estado do Brasil. Por ser também um conhecido comerciante português não teve dificuldades em manter um breve, mas vivo contato com o governador-geral da América portuguesa e com seus amigos, como o governador Salvador Correia de Sá (o velho), no Rio de Janeiro.1 Alguns anos antes, o presidente da Audiência de Charcas, o licenciado Juan López de Cepeda, havia comunicado ao rei Felipe II de Castela (Felipe I de Portugal) sobre os excessivos preços das mercadorias em ricos centros mineiros devido à falta de uma produção agrícola e à facilidade do uso de metais preciosos para o comércio.2

Aproveitando um lucrativo negócio, as cidades da gobernación de Tucumán mantiveram-se economicamente ativas produzindo algodão, carne, trigo, arroz, azeites, legumes, frutas, além de gado bovino, caprino e muar. Seus encomenderos comercializavam especialmente com centros mineiros, como Potosí, e obtinham através de Lima os recursos necessários para compra de artigos de procedência européia.3 Mas novos interesses vieram à tona quando da fundação da estratégica cidade de Santísima Trinidad y Puerto de Santa María de los Buenos Aires. A autorização da Audiência de Charcas dada a clérigos e comerciantes, em nome do bispo português de Tucumán, para transportar ouro e prata rumo ao Brasil com a intenção de comerciar e importar escravos também buscava abrir um caminho que barateasse os custos do transporte das mercadorias européias e promovesse o desenvolvimento da região.

Já em 1566 o ouvidor da Audiência, o licenciado Juan de Matienzo, defendia a necessidade de uma comunicação de toda a região com o Oceano Atlântico por meio de um porto instalado no rio da Prata. Dizia que seus moradores seriam ricos pelo grande número de contratos comerciais que se estabeleceriam entre Tucumán, Cuyo e o Rio da Prata e Paraguai com a Espanha.4 Do Alto Peru levaria-se muita prata e mercadorias, barateando e facilitando um transporte realizado, até então, através do istmo do Panamá. O licenciado afirmava que desde a ilha de San Gabriel no rio da Prata ou por meio de um novo porto na abandonada Buenos Aires as mercadorias subiriam pelos rios até Assunção e Tucumán. Nesta governación a mercadoria poderia seguir em mulas ou cavalos. Alguns produtos ainda serviriam ao Chile e outros proveriam o Alto Peru e até de Lima e Quito. Mesmo enganado em relação à possibilidade de navegação em certos rios, Matienzo percebia a importância da formação de uma rota comercial que ligasse as cidades do Rio da Prata e Tucumán ao Alto Peru.

Em 1588, após várias investidas do bispo de Tucumán no Brasil e seu envolvimento com portugueses, o fiscal da Audiência de Charcas, o licenciado Ruano Tellez – ele mesmo com ligações parentais com o governador da capitania do Espírito Santo no Estado do Basil, Vasco Fernandes Coutinho (filho) – alertou ao rei que o novo caminho formado pelas relações comerciais entre Buenos Aires e o Brasil encheria o Peru de portugueses e outros estrangeiros. Em carta, o fiscal comentou sobre navios lusitanos que vindos do Brasil traziam produtos da Inglaterra, Flandres e França; e enquanto entravam mercadorias e escravos, temia a saída de prata e um perigoso trânsito de passageiros ilegais. Mesmo apelando à Real Audiência e ao vice-rei para que se fechasse o porto, continuou a reclamar da falta de resultados para essa questão. Finalmente, menos de quinze anos após a fundação de Buenos Aires o seu comércio foi proibido pela coroa espanhola. As Cédulas Reais de 1602, 1618 e 1622 continuaram a restringir o livre comércio, limitando as mercadorias que poderiam ser desembarcadas, trazidas por navios vindos do Brasil e de Angola. Em 1618 foi fundada a alfândega seca em Córdoba, cobrando impostos de até 50% dos produtos que obrigatoriamente passavam por essa cidade rumo ao Alto Peru.5

Independentemente dos sucessos ou acusações contra o bispo Victoria, suas tentativas promoveram e intensificaram o comércio de Tucumán e do Rio da Prata com as cidades costeiras do Estado do Brasil através do porto de Buenos Aires. Este desenvolvimento comercial produziu disputas e a formação de grupos de interesses pelo controle do caminho comercial e, especialmente, do porto rio-platense ao longo da união das coroas ibéricas.

As práticas do contrabando, da corrupção, do sentido de (i)legalidade nas Índias, especialmente nas margens do Império espanhol, conformavam-se com as ações de seus agentes locais, fossem elas exercidas por governadores interinos como Leal de Ayala e a sua proximidade com o Cabildo em 1614, fossem mediante a influência de abastados comerciantes como o cristão-novo Diego da Vega. Estes comerciantes portugueses ou não, desde fins do século XVI, criaram na cidade-porto de Buenos Aires uma série de mecanismos estratégicos para obtenção de prestígio social junto aos primeiros moradores, fosse por meio dos negócios, dos casamentos arranjados ou participação na política local.6

Buenos Aires foi uma cidade seiscentista estratégica, marginal às Índias de Castela e com forte presença lusitana. Por sua condição periférica, especialmente durante o período da união das coroas ibéricas, comerciantes, pilotos, marinheiros, artesãos portugueses se instalaram na cidade e se inseriram nas redes constituintes dos espaços produtores de uma mecânica particular de organização e administração da cidade-porto. Por meio de redes de cumplicidade cuidadosamente construídas em fins do século XVI e na primeira metade do século XVII muitos lusitanos foram capazes de participar das rotas comerciais no Atlântico ou no interior da região platina, rumo ao Alto Peru.

Argumentos historiográficos favoráveis ou não à presença lusitana existem desde fins do século XIX e começo do XX. Para Juan Agustín García, em seu trabalho de 1898 sobre o desenvolvimento da “cidade-nação” de Buenos Aires, o distanciamento dos colonos das bases da civilização européia fez a sua “natureza moral” descer “alguns pontos”. Esta barbarização do homem persistiu entre os séculos XVII e XIX até o momento em que a anarquia resultante da independência fosse controlada e se iniciasse em Buenos Aires o momento de prosperidade, justiça e honra do homem nacional.7 Esta leitura de García será reproduzida, com modificações em seu contorno, por outros estudos sobre o tema. Entravam em cena os portugueses, considerados pela historiografia argentina como um elemento ambíguo: os salvadores da cidade por suas riquezas comerciais no porto, mas também vilões contrabandistas e corruptos que interferiam na política local ora desentendendo-se com governadores e funcionários reais, ora aliando-se a eles.

Em “Evolución de las ideas argentinas”, José Ingenieros defendeu que os comerciantes portugueses foram um progressivo “elemento racial” que rompeu os atrasados valores morais e sociais dos criollos, contribuindo para o crescimento econômico da região.8 Nesta linha, o historiador Ricardo de Lafuente Machain reforçou o papel positivo da participação lusitana no porto, entendendo-a como um elemento essencial para o desenvolvimento de uma cidade marginal, em situação econômica delicada. Para Lafuente Machain os portugueses eram o grupo de estrangeiros mais numeroso por estarem mais capacitados a suportarem as condições de vida que a pobre cidade de Buenos Aires impunha aos seus habitantes. Os portugueses foram capazes de romper o molde de colonização imposto a outras regiões da América espanhola, permitindo o crescimento da cidade através do contrabando e os usos das ordens régias de acordo com as necessidades do momento. Como a coroa restringiu drasticamente o comércio no porto de Buenos Aires a partir do século XVII, os portugueses foram uma “válvula de escape” indispensável para o alívio de um comércio comprimido excessivamente por uma legislação inadequada e arredia às riquezas proporcionadas por produtos que chegavam diariamente ao porto.9

O objetivo deste artigo é analisar as estratégias produtoras de espaços de pertencimento social de lusitanos e a criação de seu ethos social na cidade de Buenos Aires durante a união das coroas ibéricas e logo após a Restauração portuguesa. Partimos do pressuposto de que os portugueses não foram uma “válvula de escape” da marginal cidade porto do Rio da Prata, mas parte constituinte de uma sociedade construtora de equipamientos políticos e adminsitrativos originais, capazes de criar meios extralegais para manter ativo um caminho que ligou o seu interior ao Oceano Atlântico.

Através desta perspectiva de análise os conceitos de “contrabando” e “corrupção” ganham um novo sentido por percebermos que a própria coroa se apoiava nestas práticas para exercer a cobrança de impostos e a administração nas Índias. Já o acatamento por parte dos vecinos de valiosas quantias para realização do comércio no ultramar deveria cobrir muito bem os gastos através de práticas extralegais. A coroa também aproveitava-se dos subterfúgios e recriava normas para o controle comercial.10

Torna-se ainda difícil discernir nas relações comerciais no Rio da Prata uma dicotomia entre os beneméritos defensores das diretrizes régias (os antigos vecinos, “primeros pobladores” ou seus descendentes) e os comerciantes contrabandistas (muitos deles lusitanos). As redes familiares e de compadrazgo conectavam “primeiros pobladores” a comerciantes, portugueses ou não. Os próprios beneméritos eram os negociantes que mantinham ligações com cidades costeiras do Estado do Brasil e estabeleciam as mesmas estratégias comerciais atribuídas aos confederados.

Torna-se também difícil encontrar o contrabando ejemplar, discutido pelo historiador Raúl Molina, nas mãos de um único “grupo de contrabandistas portugueses”.11 A prática comercial em Buenos Aires fazia parte de uma economia de saberes que movia a própria cidade e envolvia diversos interesses entre os vecinos, comerciantes e oficiais régios. As disputas pelo controle do Cabildo, envolvendo os governadores, as alianças com tesoureiros e contadores, as nomeações impostas por governadores para a justicia mayor, a prática do obedecer, pero no cumplir, as constantes visitas de jueces comisionados para investigar os descaminos no porto mostram-nos a própria lógica produtora de uma extralegalidade.12 Estas relações políticas e econômicas na localidade estão envoltas nos próprios equipamientos territoriais moldados pelos descendentes de conquistadores – os beneméritos com sua “nobreza” local –, os comerciantes vindos de outras partes do Vice-Reino do Peru e do Estado do Brasil e a prórpia coroa castelhana.

Barriera mostra-nos na construção dos equipamentos políticos do Rio da Prata seiscentista, uma monarquia espanhola preocupada em observar e respeitar as liberdades de ação dos agentes responsáveis em manter a boa ordem da respublica no território ocupado.13 Quando necessário, exerciam-se formas legais que legitimavam ações consideradas inadequadas pelo centro político, formando grupos leais capazes de manter o controle administrativo local e a sua economia.

Como nos diz Víctor Anzoátegui, a documentação dos séculos XVI e XVII mostra que as províncias hispano-americanas ocupavam uma posição institucional equiparável a outros territórios da monarquia madrilena, inclusive dos reinos e províncias peninsulares.14 Com a longa experiência da conquista das Índias e o assentamento de um regime institucional surgiram novas modalidades políticas que alcançaram seu vigor através da autonomia adquirida nas províncias. A monarquia também se adaptou e se constituiu através destas experiências, sabendo negociar e estimular o intercâmbio nos mais recônditos domínios do seu Império.

Mas por mais auto-suficientes que as localidades pudessem parecer elas não podiam e nem estavam fechadas em si mesmas. O governo central e as localidades necessitavam de uma colaboração mútua e não desejavam que essa relação se quebrasse. O centro e suas localidades estabeleceram canais de colaboração, mantidos formalmente ou não, que criaram redes de interesses comuns pautadas nas necessidades cotidianas.

Apesar de toda a malha burocrática criada para América, o processo constitutivo de sua política não deixou de ter uma dinâmica muito distinta das relações estabelecidas nas monarquias compósitas na Europa. A administração criada para as Índias propiciou um campo de disputas que possibilitou a formação e a manutenção de uma elite local, assim como possibilidades de negociação e criação de formas de autoridade. Os moradores locais também se consideravam espanhóis e com o direito a serem consultados e ouvidos nas decisões do centro.

Movendo-se pelas malhas permissionárias tecidas na cidade de Buenos Aires, os vecinos (novos ou antigos, portugueses ou não), oficiais régios e governadores exerceram o comércio no porto, abriram possibilidades para outros negócios, driblaram através de redes de interesses que envolviam o interior da região a aduana seca de Córdoba e continuaram a permitir a entrada, legalizada ou não, de escravos. As ações administrativas para o controle comercial nas margens do Império funcionaram, mas de acordo com a lógica das redes de cumplicidade que moviam o porto.

Uma rede de notáveis: beneméritos, governadores e portugueses.

Algumas leituras sobre a participação lusitana em Buenos Aires apóiam-se especialmente no processo de 19.000 páginas movido por Hernan Arias de Saavedra em seu último governo contra o contrabando ejemplar, culminado em 1628 quando retorna à cidade como juiz comissionado da Audiência de Charcas. Será neste momento que denunciará a presença de um “grupo confederado” (apoiado por lusitanos), “cruel aos vecinos”e aos representantes da coroa.

Criollo nascido em Assunção e genro de Juan de Garay (o fundador de Buenos Aires), Hernandarias ficou conhecido na historiografia argentina como o grande defensor das Cédulas Reais no Rio da Prata (“el guardián del puerto”), ao mesmo tempo em que um dos seus aliados foi justamente um dos maiores traficantes de escravos da cidade, Miguel de Rivadeneyra.

Hernandarias, em 1617, persistindo no que considerava um descontrole comercial, decidiu até que “se sirva proveer de remedio conveniente” que os vecinos negociassem com o Brasil apenas com três embarcações, mas duas delas portuguesas.15 Uma destas “permissões”, por exemplo, foi dada a Agustín Peres, mestre do navio português Santo Antônio. Neste mesmo ano de 1617, Peres e o negociante Gonzalo Rodrigues Minaya (respectivamente capitão e mestre do navio “Nossa Senhora da Batalha”, e conhecidos pela prática do contrabando de escravos) comercializaram no Rio de Janeiro couro vindo de Buenos Aires.16 Segundo o próprio Hernandarias, os portugueses costumavam levar a prata escondida exatamente nos couros comercializados no porto.

O mesmo governador, por volta de 1616, tentou enviar sem permissão régia à Casa de Contratação de Sevilha duzentos couros e recados importantes para o real serviço de Sua Majestade com a intenção de trazer em troca pólvora, armas e munições para a defesa da terra. Para o caso do comércio proibido realizado por Minaya, assim como de outros três mestres de navios que também foram instruídos a levar couros a Sevilha, Hernandarias foi considerado livre de penas por estar respaldado pelas intenções de trazer benefícios à cidade e aos seus vecinos. Mas a mesma decisão não valeu para todas as situações criadas pelo governador, sendo considerado culpado mediante punição de pagamento de multa por distribuir ao longo de seu governo várias permissões de comércio de couro para negociar com o Brasil. Entre os beneficiados estava o próprio contador da real hacienda, Luis de Salcedo.17 Nas duas primeiras décadas do século XVII, Hernandarias buscou comandar um lucrativo monopólio do comércio local mantido por vecinos, oficiais régiose demais governadores.

O caso destas práticas da “formalidade” e da “informalidade” na administração hispano-americana nos permite perceber a intrínseca relação entre o reino e suas localidades. Os juicios de residencia são uma importante possibilidade para esse estudo. O final de governo de um alto funcionário era um momento singular nas Índias, sendo obrigado a defender-se abertamente das mais variadas denúncias contra a sua pessoa: perseguições políticas durante sua administração, chantagens, assassinatos, prática de contrabando, excesso de autoridade. Mais do que as acusações em si, os juicios faziam parte de um “ritual político” onde se sabia que um governador teria, antes mesmo de chegar às Índias para assumir seu cargo, construir suas redes de solidariedade. Estas eram as tramas do político (re)construtoras do contínuo diálogo que os governadores eram obrigados a manter, por um lado, com a coroa e, por outro, com os vecinos-comerciantes. Os juicios permitiram que cada um pudesse fazer uso por si de sua funcionalidade, utilizando-a contra seus desafetos ou para livrar-se de responsabilidades.18 O juiz da residencia, por sua vez,costumava ser seu futuro substituto que, também relacionado a novas redes de interesses locais, fazia justiça em seu veredicto final baseado nas falas de seus moradores. Não por acaso em 1618, após Hernandarias retirar-se do governo com a chegada do novo governador dom Diego de Góngora, o Cabildo iniciou uma série de acusações até mesmo contra seu amigo e parente, o ex-procurador Manuel de Frías.19

As redes de cumplicidade para manter os espaços de poder no porto ocorriam principalmente através de laços de parentesco e amizade. Ao longo do seu governo Hernandarias não manteve apenas ao capitão Frías como representante de seus interesses na corte madrilena, mas nomeou como teniente da cidade o seu cunhado, e de alguacil mayor o seu sobrinho.20 Tendo um informante em Madri e buscando o controle do Cabildo e da justiça local, Hernandarias podia acusar e punir da melhor forma que lhe conviesse.

Em 1619, vecinos como Diego de Trigueros, parente do vecino e comerciante Juan de Vergara, e mesmo o antes beneficiado Luis de Salcedo acusaram o governador de consentir o comércio dos produtos, inclusive couros, em navios portugueses e, quando lhe interessava, proibir as navegações no porto: “[...] el quita y pone cuando quiere sin que nadie le pueda ir a la mano [...]”, diziam.21 As acusações contra o governador continuaram com o defensor de la real hacienda, o lusitano Juan Cardoso Pardo, afirmando que Hernandarias além de enviar ilegalmente ao Brasil certa quantidade de couro, contrariou a importação de açúcar com a intenção de valorizar os produtos de suas fazendas.22 O jurista português denunciou que o ex-governador utilizou-se de estratégias para comercializar com cidades do Estado do Brasil e reinos de Castela estabelecendo fraudes ao dar a algumas embarcações que frequentavam o porto o privilégio exclusivo de transportar mercadorias no Rio da Prata e obrigando os vecinos a se associarem aos capitães destes navios para legalizar as transações comerciais. Além disso, foi um grande apoiador dos manifiestos de negros, permitindo através de autos que os proprietários de escravos trazidos sem permissão a Buenos Aires se apresentassem mediante pagamento de 70 pesos por cada escravo para legalizar seu desembarque e comércio.23

Hernandarias, por sua vez, denunciava o perigo que representavam os vecinos comerciantes e suas alianças com portugueses. Com isso ele não desejava apenas apresentar ao rei seu bom governo, mas manter uma economia de privilégios capaz de controlar o porto. Para isso lutou pela nomeação de parentes e amigos de sua confiança para serem oficiais de justiça locais, facilitou o comércio no porto aliando-se até mesmo a portugueses quando lhe convinha e proibiu a negociação de determinadas mercadorias para valorizar sua produção local.

Entre os governos de Martínez de Irala e de Cueva y Benevides (um período que compreende os anos de 1587 a 1639), o segundo governo de Hernandarias (1615-1616) destacou-se por possuir a segunda maior média de importações de escravos (492 entradas anuais). A intensidade do trato de viventes durante o governo de Hernadarias impressiona ainda mais se levarmos em consideração que o governo de cinco anos de Diego de Góngora (novembro de 1618 a maio de 1623), que obteve a maior média, registrou a entrada anual de 987 escravos. Não podemos esquecer que Hernandarias ainda foi governador entre 1602 e 1608, permitindo nesse período a entrada anual de 215 escravos.24

Na economia de saberes constituintes do cotidiano no porto estabeleceram-se confrontos para o exercício do governo e a legitimação de grupos locais por meio da formação de equipamientos políticos e jurisdicionais. Isto não significou a existência de grupos coesos ao longo do século XVII, mas uma maleabilidade de interesses capaz de remodelar alianças de acordo com o seu contexto local e sob os auspícios do centro. De acordo com Jorge Gelman, devido às medidas restritivas comerciais estabelecidas por uma série de Cédulas Reais para evitar o contrabando de metais preciosos, nas primeiras décadas do século XVII formou-se o conhecido grupo contrabandista dos “confederados”, constituído entre outros por Juan de Vergara, por funcionários régios como o tesoureiro Simón de Valdes e por negociantes portugueses com vecindad em Buenos Aires, como Diego da Vega. Para Gelman, foi este grupo (que perduraria até a década de 1650) que desafiou as diretrizes da coroa e impulsionou os negócios ilegais em conluio com seus funcionários para manter o controle da economia do porto.25

Gelman afirma que a partir da segunda metade do século XVII o comércio já se concentrava nas mãos de comerciantes locais, novos avecindados da cidade e alguns funcionários. Este “setor dominante da região” monopolizador dos negócios do porto passou a controlar a vida da cidade política e economicamente, criando uma grande rede de cumplicidades e dependências entre seus moradores. O novo grupo, então, não apenas passou a controlar a atividade comercial entre o Atlântico e o interior da região, mas também todo o conjunto da economia local através de uma “autotransformação” social que manteve aspectos da velha economia de seus antigos vecinos. Por meio da corrupção dos funcionários e do comércio de contrabando constituiu-se, para Gelman, uma sociedade coesa e de difícil caracterização entre aqueles que pertenciam a grupos comerciais ou aos agrícolas.26

Baseado nos estudos de Gelman, Moutoukias chama atenção de que Buenos Aires também possuía uma estrutura estatal a ser mantida: uma guarnição militar e funcionários reais que tinham o dever de cumprir suas funções. Certamente muitos estiveram ligados aos vecinos locais ou mesmo adquiriram direito de vecindad ou, ainda, participaram da prática de contrabando. Mas o que não se pode negar é que foram as redes sociais locais que propiciaram as possibilidades econômicas para a coroa manter seu aparelho militar e administrativo. A venda e mercês de cargos e a incorporação dos funcionários a uma elite local criou uma “estrutura informal de relações pessoais” coexistente à estrutura formal do poder imperial.27

A arquitetura do equipamiento político no porto de Buenos Aires, como informa Amadori, deu-se por meio de complexas relações capazes de enfrentar e redefinir o projeto de organização territorial e comercial defendidos pelo poder central. Por meio de ações autônomas e clientelares do Cabildo e a integração social de agentes externos – comerciantes vindos do interior do Vice-Reino do Peru e do Estado do Brasil –, os principais mantenedores das políticas de privilégio locais conhecidos como beneméritos foram lentamente se incorporando à nova dinâmica local. A participação cada vez maior de grupos de comerciantes e regidores envolvidos, possibilitada por meio da compra de ofícios administrativos, tornou o poder central da monarquia espanhola cada vez mais dependente às localidades para assegurar o bom governo da respublica. Esta característica singular propiciou um maior cuidado da coroa para garantir a manutenção de um espaço marginal no Império espanhol, negociando-se “la obediencia y relativizando el cumplimento de las disposiciones”.28

O grupo dos “confederados”, assim, nada mais foi do que agentes partícipes das redes sociais no porto: comerciantes (muitos deles portugueses), vecinos de Buenos Aires e de cidades circunvizinhas, funcionários régios ou clérigos; todos criadores e reprodutores de uma inteligibilidade para comerciar e viver num espaço periférico no Império espanhol. Eles ou seus parentes povoaram a região e organizaram campañas sobre novas terras, cristianizaram nações indígenas, construíram fortes, pediram armamentos para a segurança do porto. Em outras palavras, arquitetaram um equipamiento político do território em nome do rei.

Mais do que imaginar uma separação arraigada entre “confederados” e “beneméritos” podemos ver estas relações dentro de uma dinâmica rede de notáveis que construíram os passos da cidade de Buenos Aires no seu primeiro século de existência.29 Este dinamismo deve ser compreendido, como defende Perusset, por meio de uma tênue cortina que confunde a prática do formal e do informal, tal como duas fronteiras que se borram em um único tecido de ações.30

Certamente os portugueses não estiveram à parte desta relação. Eles não foram simplesmente intermediários das relações comerciais, uma “válvula de escape” para alívio da situação econômica da cidade ou membros dos “confederados” defensores de uma política de integração com vecinos livres da “facção benemérita”.31 Acreditamos que se o governo local caracterizou-se por sua diversidade dentro da unidade do Império espanhol32, a elite criolla em que os portugueses estiveram envolvidos preocupou-se mais por sua unidade dentro da diversidade.

O tamanho das famílias pertencentes à província do Rio da Prata do século XVII não passou da média dos 3,5 membros. Para o caso de Buenos Aires, estima-se que em 1602 sua população não ultrapassou 285 famílias. Número que modificou-se lentamente até 1615, quando a cidade chegou a ter 111 vecinos, isto é, aproximadamente 390 famílias com direito à participação na administração local, licenças comerciais, caça do gado selvagem, chacras e encomiendas e solares na cidade. Para os anos de 1622 a 1664 calcula-se que seu crescimento populacional não passou dos 0,68%.33 Acreditamos que a população de Buenos Aires chegou a ter aproximadamente 300 habitantes (de famílias de vecinos)em 1603. Considerando as 16 famílias formadas por portugueses levantadas em 1607 pode-se supor que elas representaram na primeira década do século XVII aproximadamente 18% da população do porto.34

Mesmo havendo restrições e perseguições em períodos de conflito entre grupos locais, os portugueses foram agentes sociais que praticaram ativamente o comércio, foram vecinos ou simples artesãos, ou tiveram funções administrativas através de estruturas informais de relações pessoais na Buenos Aires seiscentista.

O pertencimento às redes de cumplicidade, certamente unidas aos interesses comerciais, permitiu a alguns sua participação efetiva como moradores com “casa y chacra poblada”, direito ao gado cimarrón e à administração local e, portanto, à economia de saberes e práticas estruturantes e mantenedoras do Império espanhol.

Este grau de unidade dentro da diversidade e suas redes de cumplicidade ficaram ainda mais latentes quando do processo da Restauração portuguesa em 1640 e o fim da união das coroas ibéricas. A situação delicada em que se encontrou o governador interino, teniente de gobernador Roxas y Acevedo, no estratégico porto de Buenos Aires diante da presença lusitana é exemplar. Ele mesmo fazia parte de redes familiares que o ligavam a importantes comerciantes lusitanos, permitindo a entrada de embarcações quando necessário. Inclusive torna-se difícil identificar vecinos ou funcionários que não estivessem ligados a lusitanos, comerciantes ou não, ou a seus descendentes ainda na primeira metade do século XVII. Quando de seu falecimento, a esposa de Roxas y Acevedo viu-se obrigada a defendê-lo como testemunha de um dito homem honrado e fiel ao real serviço do rei espanhol, protegendo o porto contra invasões e levando lusitanos presos ao Chile ou enforcando-os.35

O substituto de Roxas y Acevedo, o governador dom Gerónimo Luís de Cabrera (parente de Hernandarias e do ex-governador de Tucumán e fundador de Córdoba), desembarcou no porto de Buenos Aires carregando Cédula Real sugerindo novas ações a serem tomadas pelos governadores das províncias hispano-americanas com os moradores portugueses. Como de costume, o novo governador foi recebido pelos vecinos, cabildantes, clérigos e a milícia do forte, representada inclusive por uma infantaria formada por lusitanos.

Se por um lado, quando da sua chegada o governador ordenou que os estrangeiros solteiros fossem desarmados e remetidos para Córdoba ou para o reino do Chile, por outro sentiu a necessidade de armar a cidade por meio de uma nova companhia de portugueses, nomeando como capitão a Diego Ruiz de Ocaña, vecino da cidade com ligações em Córdoba e parentescos com lusitanos.36 Para as campanhas contra reduções rebeladas o vecino general Francisco Velazquez Melendez também testemunhou o armamento de alguns lusitanos pelo governador. Quando não podiam seguir a cavalo, os vecinos portugueses seguiam a pé ou disponibilizavam homens de sua confiança (provavelmente escravos africanos ou índios), pagando todas as custas da viagem. Aqueles que não podiam participar das malocas ou não possuíam soldados particulares ajudavam as tropas doando produtos da terra.37 Até mesmo a guarda marítima lusitana, inicialmente desmontada por Cabrera, foi reorganizada para investigar um navio sem permissão vindo da Bahia do Estado do Brasil para comerciar e que havia atracado na outra banda do rio.38 Reforçando a importância da presença lusitana no porto, o reitor da catedral da cidade, monsenhor Luís de Abalos, afirmou que junto aos soldados do forte embarcaram no Riachuelo portugueses “gente de mar”, marinheiros provavelmente solteiros e sem vecindad,conhecedores dos caminhos do rio.39 Esta aproximação inicial de Cabrera com os portugueses não foi notável apenas no forte. Em uma carta escrita provavelmente no final de 1641 ou em 1642 e dirigida ao vecino lusitano Gonzalo Álvarez, o governador deu autorização para que lusitanos continuassem utilizando mão-de-obra indígena em suas chácaras.40

A Cédula Real datada de sete de janeiro de 1641, trazida por Cabrera, já permitia a expulsão de lusitanos do Rio da Prata, mesmo os avecindados, caso parecesse conveniente ao governador. Mas ele mesmo titubeava para pô-la em prática. O que havia era mais um problema jurídico do que uma ação preventiva (e tardia) resultante da Restauração portuguesa. O temor de uma invasão lusitana, apesar de real, não encontrava maiores justificativas pela simples presença de vecinos portugueses com ligações parentais pela cidade e região. Ao que parece, o segundo semestre de 1643 resumiu-se mais ao cerco de Cabrera e de seu grupo àqueles lusitanos que mantinham relevantes posições locais. Em setembro desse ano, lusitanos como o comerciante Antonio Martinez Piolino, Ambrosio Pereyra, Tomás Machado e Gonzalo Álvarez foram presos junto com outros treze ou quatorze portugueses. Álvarez, assim como Pereyra e Machado, apesar das tentativas de aproximação e de amizade realizadas pelo governador teve seus bens tomados. Suas casas e chácaras foram destruídas, a sua colheita perdida, canoas apreendidas e os nativos que possuíam foram retirados de suas terras.

Entretanto, tal como viria a defender-se Tomás Machado cinco anos depois de sua expulsão, o auto do registro e desarmamento do vice-rei exigia a permanência dos lusitanos na cidade. Machado reclamava que o governador foi de encontro às ordens das Cédulas Reais de Sua Majestade “[...] que manda que seamos tratados como vasallos suyos pues no tenemos culpa en el alzamiento del tirano duque de Bragança”. E insistia que: “Ni yo he cooperado con ellos sino siempre he estado, estoy y estante en medio de mis trabajos y persecuciones muy firme y leal vasallo de Su Majestad porque el alterar sus ministros sus Reales ordenes no me ha de obligar a mi a faltar a la obligación en que nací”.41 O monsenhor Luís de Abalos confirmou a execução da expulsão sem que antes fosse revogada a ordem de que os portugueses não podiam sair da cidade sem autorização do vice-rei do Peru, marquês de Mancera.

Entre os perseguidos por Cabrera não estiveram apenas lusitanos. Ao menos dois espanhóis, Antonio Gutiérrez Barragán e Jacinto Vela de Hinojosa, também perderam seu gado e tiveram suas casas e chácaras destruídas. Hinojosa sofreu ainda a apreensão de seus escravos para o trabalho de recuperação do forte.42 Contra Gutiérrez Barragán, a justificativa de Cabrera não foi distinta da utilizada contra os portugueses. Sem citar as redes parentais dos Barragán com lusitanos, o governador justificou-se por meio do perigo que a chácara oferecia à cidade por sua localização à beira do rio, próximo ao Riachuelo dos navios. Chamou atenção que as suas terras poderiam servir de porto natural a embarcações inimigas.43 Expulso Barragán de suas terras, o governador deslocou um caudillo com vinte homens para guardar a entrada do Riachuelo.

Mesmo com a expulsão dos lusitanos, anos depois alguns vecinos como Ambrosio Pereyra e Tomás Machado estavam de volta à cidade. O governador Cabrera viu-se obrigado a obedecer as ordens do vice-rei e da Audiência de Charcas. Até mesmo o comerciante sem vecindad Domingo Thomé, acusado por Cabrera de cumplicidade na fuga de marinheiros lusitanos ao Rio de Janeiro durante o governo de Roxas y Acevedo, obteve o direito de retornar à cidade e reaver seus bens. Em Cédula de 1644 expedida pelo presidente e os ouvidores da Audiência de Charcas, julgou-se improcedente a ação movida por entender-se que o nome de Thomé, apesar de lisboeta, não fora levantado no bando de expulsão dos portugueses. Apesar de perder sua embarcação, o capitão de navio obteve o direito de transportar armas em qualquer reino ou província administrada por Charcas.44           

Um dos motivos da apreensão dos bens dos lusitanos (e seus aliados) foi o uso, por parte de Cabrera, da mão de obra que eles dispunham e dos navios retidos no rio desde 1641. Afirmando a necessidade de reformar o frágil forte para a defesa da cidade e armar uma embarcação para seguir para a Espanha com clérigos e notícias da situação do Rio da Prata após a Restauração portuguesa, Cabrera reteve madeira e pequenas embarcações para transporte de produtos pertencentes, em parte, aos vecinos lusitanos presos. Outra parte do material obteve-se das embarcações apreendidas no governo de Roxas. Quando finalmente um novo navio foi reformado, o governador deu permissão ao seu capitão para embarcar 700 couros (a serem entregues na Casa de Contratação de Sevilha) e de mais 300 sob responsabilidade de um padre da ordem de São Francisco.45 Entre os tripulantes da embarcação estava Francisco Luis, um mameluco do Brasil que não necessitou de licença do governador por estar sob responsabilidade de seu parente, Andrés de Cabrera. Se ao menos o governador tentou justificar a presença deste tripulante, permaneceu em silêncio sobre a escolha do piloto da embarcação, um lusitano chamado Manuel Fariña que havia sido expulso pelo próprio Cabrera logo na sua chegada a Buenos Aires.          

Autoridades locais numa economia de favores: a produção de um ethos social           

Esta participação direta ou indireta de grupos de vecinos, imiscuidos com funcionários régios ou governadores nos negócios e na administração do espaço em que se vivia permite-nos reconsiderar as práticas comerciais ilegais e corruptas na Buenos Aires seiscentista. Não se trata de negá-las, mas de reavaliar as possibilidades de análise de um porto tido pela historiografia como na contramão do processo de controle colonial, repleto de maus funcionários e contrabandistas em conluios com portugueses.          

Apesar de toda a malha burocrática criada para América, o processo constitutivo de sua política não deixou de ter uma dinâmica muito distinta das relações estabelecidas nas monarquias compósitas na Europa. A administração criada para o Novo Mundo propiciou um campo de disputas para a formação e a manutenção da elite local, assim como possibilidades de negociação e criação de formas de autoridade. Os moradores locais também se consideravam espanhóis e com o direito a serem consultados e ouvidos nas decisões do centro. A monarquia espanhola nas Índias se constituiu através destas experiências, sabendo negociar e estimular o intercâmbio entre o centro e as localidades. Seu espaço de poder real não foi questionado, o que não significou a ausência de formas de barganha e exercícios de autoridade por parte das localidades.          

Como em outras partes da América, em Buenos Aires os negociantes selaram suas redes comerciais com moradores avencidados por laços de parentesco e amizade. Se por um lado a formação destas redes sociais permitiu-lhes abrir caminho aos negócios, também possibilitou especialmente o direito a mercês de terras e títulos e a participação na administração local. A compra de cargos ou sua nomeação transformaram seus agentes em funcionários locais do Cabildo, em governadores provisórios, em alguaciles de mar (oficiais inferiores de justiça) do porto. Da mesma forma, os vecinos beneméritos, soldados e funcionários régios buscaram através destas alianças caminhos comerciais, permitindo entrelaçamentos com o aparelho administrativo.

Aramendi explica que numa sociedade típica do Antigo Regime, como a monarquia espanhola, as articulações políticas se davam por meio de compadrazgos, formadoras de redes clientelares.46 Estas redes de poder tecidas estavam vinculadas às mercês régias, envolvendo um delicado jogo de relações de dom e contradom. Para Gil Pujol, as monarquias seiscentistas não desejavam tanto uma centralização, mas a imposição de um símbolo de autoridade a ser respeitada e obedecida pelos seus súditos.47 Elliott defende que o domínio castelhano sobre seus reinos foi mais participativo do que absolutista e, ainda menos, centralizador. Isto não significa que a coroa castelhana deixou de criar meios de intervenção nas sociedades incorporadas através de uma nova disciplina social, política e econômica. Se houve resistências passivas por um lado, as intervenções externas foram muitas vezes solicitadas pelas próprias autoridades locais para resolver seus problemas.48

É possível entendermos as relações sociais nas Índias espanhola (e portuguesa) por meio de sua “economia moral” do dom, em que suas cadeias de compromisso constituíam as principais fontes da dinâmica administrativa das localidades. Estas possibilidades propiciaram práticas informais no sistema hierárquico e na formulação de mecanismos próprios e específicos. O dom tornou-se um símbolo de status e força política, dando ao indivíduo a capacidade de pertencer às relações do “dar”, “receber” e “retribuir”, propiciando uma “economia de favores”. Era o valor moral e as relações mantidas pelos mais variados interesses entre as partes que mantinham atados os laços sociais.49 Tais redes de poder permitiam, por um lado, o acesso à limitada preponderância política, econômica e simbólica mantida por alguns membros da hierarquia social. Por outro, a formação destas redes exercia uma resistência às políticas de centralização que o aparelho administrativo central buscava estabelecer nas áreas que tradicionalmente já possuíam “seu senhor”.

As monarquias do Antigo Regime criaram um complexo sistema de remuneração de serviços, ou seja, uma polítia de mercês em que até mesmo os mais distantes súditos sentiam-se no direito de poder participar. Os signos de distinção, mesmo nos confins do Império, representavam um ethos social ligados aos poderes locais.50 Assim, a cultura política da justiça distributiva da monarquia ibérica não se restringiu apenas ao reino. Numa sociedade estamental de difícil mobilidade, até mesmo os mais distantes súditos da coroa participaram desta economia de mercês.51 Dizer-se um leal vassalo do rei espanhol não se resumia ao interesse pessoal respaldado na possibilidade de criar lucros financeiros, mas de comprovar símbolos de engrandecimento social – seu ethos – vinculados ao pertencimento à terra, uma linhagem com os beneméritos, ter cargos civis e armas. Estas redes de interesses foram constituintes de uma economia que, como vimos, tiveram participação direta de muitos lusitanos. Estas distintas formas de participação e integração nas estruturas locais de poder foram fontes de prestígio que ampliaram a possibilidade de construir e mobilizar laços sociais, especialmente através do matrimônio.52Quando da perseguição aos lusitanos por Cabrera, não foram raras nas defesas apresentadas o enraizamento daqueles a determinados espaços de pertencimento: o de serem soldados ou capitães do forte, serem proprietários de chácaras produtivas, possuírem embarcações para a defesa ou de poderem carregar armas, ou mesmo de ocuparem ofícios na governança da terra e manterem família. Na própria Cédula Real vinda com o novo governador contra os portugueses, o rei recomendava que “[...] a los que habitan en esta tierra basta ahora les advertiréis la obligación en que de nuevo les pongo e están de ser buenos y leales vasallos, pues les tolero por el bien publico […]”.53 Mesmo em plena Restauração portuguesa, concedeu-se mercês a três irmãos lusitanos residentes no Alto Peru que lutaram contra naus holandesas que ameaçavam invadir o porto de Callao. Um deles, Antonio de Sosa Hurtado, foi alferes da gente de guerra da cidade de La Plata, obtendo de Felipe IV o direito de carregar armas e manter seu cargo militar.54

A chegada do governador Cabrera (um descendente de beneméritos do Prata) ao porto de Buenos Aires significou uma readequação das redes de privilégios formadas décadas antes de sua chegada. O novo governador, antes de repelir vecinos detentores de mercês régias buscou uma aproximação inicial, especialmente com os portugueses. Em uma carta escrita provavelmente no final de 1641 ou em 1642 e dirigida a Gonzalo Álvarez, reforçou suas palavras afirmando que “[…] amigos pueden mucho con el sin decirle del señor gobernador palabra, porque si se lo dijera, si no le que le excusara el, que es señor gobernador”.55

Em suas súplicas à Charcas, lusitanos defenderam sua importância para as localidades em que viviam, mostraram-se como leais súditos da monarquia espanhola e basearam-se num ethos social ligado à terra e à sua defesa. Como benemérito do Prata, Cabrera não desconhecia a importância e influência de muitos portugueses na região. O novo governador tateou mais pela sua incorporação às redes de privilégio locais e suas poupanças sociais já existentes – fontes materiais de poder presentes no controle comercial ou no situado do presídio –, do que na total desestruturação política e econômica de uma cidade-porto voltada ao Atlântico e não muito temerosa pela presença lusitana.56 Esta mesma postura podemos perceber nas políticas adotadas por Hernandarias, décadas antes, ora vinculando-se a Vergara e alguns lusitanos, ora repelindo-os em busca do controle comercial e administrativo do porto.

Apesar da documentação trazer-nos informações dos conflitos existentes pelo controle do porto de Buenos Aires, percebe-se como os tecidos sociais e políticos confundiam-se em uma única trama de relações pessoais. Mesmo formadas por pequenos grupos que ora se aliavam, ora se enfrentavam, sua ação coletiva pode permitir o funcionamento das instituições imperiais. A coroa também participava destas redes de cumplicidade recebendo queixas, destituindo funcionários do cargo, impondo pagamento de multas. Daí a importância dos juicios de residencia que, mesmo presididos por funcionários envoltos em interesses locais, produziam mais uma das tantas “leituras do real” que chegavam ao Conselho das Índias.

Isto exigiu tanto a permissividade como a reprovação da coroa, mas também a possibilidade do uso de uma riqueza local para a manutenção de uma oficialidade no porto de Buenos Aires; de embarcações particulares com ligações com o Rio da Prata para envio de ajuda militar ao Chile; e, certamente, da aquisição de mais recursos monetários.

* * *

A economia de saberes do Império espanhol reproduziu-se no seu cotidiano; nas arenas de exercício de poderes. Para estudá-las torna-se necessário conhecer as redes de cumplicidade locais e supra-locais, ou seja, seus agentes promotores das dinâmicas sociais criadoras e reelaboradoras de sua mecânica. Esta perspectiva é importante para rompermos com a concepção de que os agentes sociais ou grupos adequam-se previamente a estamentos pré-fixados onde se identificarão e lutarão por seus interesses. Segundo Zacarias Moutoukias, é mais produtivo inverter esta metodologia de estudo das redes sociais entendendo-as como as principais produtoras e reordenadoras do meio experimentado.57 Reapropriando-se do conceito de “consenso colonial”, Moutoukias defende que da mesma forma que as redes sociais legitimaram os negócios autônomos de grupos da elite local, elas também propiciaram mecanismos para que representantes da coroa organizassem cadeias informais de ordenamento político e militar, indispensáveis ao bom funcionamento das instituições imperiais.

Governadores, funcionários régios, visitadores: todos foram representantes reais que não deixaram de praticar uma extralegalidade, isto é, de legitimar o direito de fiscalizar e comerciar no porto por meio de estratégias pessoais respaldadas por diretrizes de centros políticos. Foi este entrelaçamento de deveres e poderes que rompeu com a dicotomia entre as ações e deveres de um oficial régio e o obedecer de um vecino-comerciante. Nos estudos sobre o Rio da Prata e consequentemente sobre a fundação de Buenos Aires, percebe-se que a sua constituição social e sua própria existência foram possíveis por manterem-se numa lógica elaboradora das malhas do Império até mesmo após a Restauração portuguesa.

 

Fontes

Archivo de la Nación Argentina. Reales Cedulas y Provisiones (1517-1662). Buenos Aires, 1911. Tomo 1.

Archivo General de las Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires: 892A, 892B e 892C.

Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, Cartório do Primeiro Ofício de Notas (1612-1650), Escritura de Venda, 1617.

Levillier, Roberto (org.). Correspondencia de la Ciudad de Buenos Aires con los reyes de España (1615-1635). Madrid, 1918. Tomo 2.

Levillier, Roberto (org.). Correspondencia de la ciudad de Buenos Ayres con los Reyes de España (1588-1615). Buenos Aires: Municipalidad de Buenos Aires, 1915. Tomo 1.

Levillier, Roberto (coord.). Correspondencia de los Oficiales Reales del Río de la Plata con los Reyes de España (1540-1596). Madrid: Sucesores de Rivadeneyra, 1910. Tomo 1.

Salvado, João Paulo; Miranda, Susana Münch (ed.). Livro Primeiro do Governo do Brasil (1607-1633). Brasília: Centro de História e Documentação Diplomática, MRE, 2001.

Trelles, Manuel Ricardo (org.). Registro Estadístico de Buenos Aires (1863). Buenos Aires: Sociedad Tipográfica Bonaerense, 1865. Tomo 2.

 

Notas:

1. O dominicano Fray Francisco de Victoria foi proposto como bispo da província de Tucumán em 1577, mas apenas assumiu o cargo em 1581. Foi negociante em Lima e responsável pela abertura de uma via comercial entre Tucumán e o Chile. Ventura, Maria da Graça A. Mateus. “A participação dos portugueses no comércio regional e inter-regional hispano-americano, a partir do Rio da Prata (1580-1640)” (paper apresentado no Colóquio internacional Território e Povoamento – a presença portuguesa na região platina, Instituto Camões, Colonia del Sacramento, Uruguai, Março 23-26, 2004). Raul Molina. “Las primeras navegaciones del Río de la Plata, después de la fundación de Juan de Garay (1580-1602)”, Historia 10 40 (1965): 24-34.

2. Alice Piffer Canabrava, O comércio português no Rio da Prata, 1580-1640 (Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1984), p. 36.

3. Jorge Luis da Silvafrí Grespan, “Urbanização e economia mineradora na América: o caso de Potosí”, in Raízes da América Latina, ed. Francisca L. Nogueira de Azevedo and John Manuel Monteiro (São Paulo: Edusp, 1996), 314. Ver também: Hugo Humberto Beck, “Distribución territorial de la conquista. Red de urbanización y vías de comunicación,” In Nueva Historia de la Nación Argentina, ed. Academia Nacional de la Historia (Buenos Aires: Planeta Argentina, 1999), 22-25.

4. Teodoro Hampe Martinez, “Los funcionarios de la monarquía española en América. Notas para una caracterización política, económica y social,” Revista Interamericana de Bibliografía 3 XLII (1992): 443-445.

5. Archivo de la Nación Argentina, Reales Cedulas y Provisiones (1517-1662) (Buenos Aires, 1911), 51-52.

6. Macarena Perusset, Contrabando y sociedad en el Río de la Plata colonial (Buenos Aires: Dunken, 2006): 29-60.

7. Juan Agustín García, La ciudad indiana. Buenos Aires desde 1600 hasta mediados del siglo XVIII. (Buenos Aires: Emecé, 1954).

8. José Ingenieros, Evolución de las ideas argentinas (Buenos Aires, 1918), 18.

9. Ricardo de Lafuente Machain, Los portugueses en Buenos Aires (siglo XVII) (Madrid, 1931), p. 11.

10. Zacarias Moutoukias, Contrabando y control colonial en el siglo XVII (Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, 1988).

11. Raul A. Molina, Hernandarias. El hijo de la tierra (Buenos Aires, 1948).

12. Zacarias Moutoukias, Contrabando y control colonial en el siglo XVII (Buenos Aires: Centro Editor de América Latina, 1988): 57-62. Rodrigo Ceballos, “Extralegalidade e autotranfromação no porto: a presença portuguesa na Buenos Aires colonial (século XVII)”, Fronteiras 11 (2009): 229-248

13. Darío Barriera, “Un rostro local de la monarquía hispânica. Justicia e equipamento político del território al sureste de Charcas, siglos XVI e XVII”, Colonial Latin American Historical Review 15, 4 (2006): 389.

14. Victor Tau Anzoátegui, “La Monarquía. Poder Central y Poderes Locales”, in Nueva Historia de la Nación Argentina, ed. by Academia Nacional de la Historia, vol. 2, (Buenos Aires: Planeta Argentina, 1999), 216.

15. Auto do governador Hernan Arias de Saavedra, 14 de junho de 1617. João Paulo Salvado and Susana Münch Miranda (ed.), Livro Primeiro do Governo do Brasil (1607-1633) (Brasília: Centro de História e Documentação Diplomática, MRE, 2001): 190-193.

16. Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, Cartório do Primeiro Ofício de Notas (1612-1650), Escritura de Venda, 1617. Archivo General de las Índias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, “Buenos Aires, año de 1618 [tachado] 1624. Traslado de la causa de capitulos que Simón de Valdez siguió=contra el gobernador Hernandarias de Saavedra en su residencia”, Escribanía 892A, fls. 13 e 13v.

17. Testimonio de la sentencia dictada en la residencia que se tomó a Hernandarias de Saavedra del tiempo en que estuvo ejerciendo la gobernación del Río de la Plata, Juez, licenciado Alonso Pérez de Salazar, oidor de Charcas. Raul A. Molina, Hernandarias, 482-485.

18. Oscar J. Trujillo, “Los gobernadores de Buenos Aires a mediados del siglo XVII: mediación y conflicto en los confines de la monarquía hispânica,” História, Histórias, 2 3 (2014): 96. Acessado em 24 de novembro de 2016. Disponível em: http://periodicos.unb.br/index.php/hh/search/authors/view?firstName=Oscar&middleName=Jos%C3%A9&lastName=Trujillo&affiliation=Universidad%20de%20Luj%C3%A1n&country=AR. Ver também: Oscar J. Trujillo, “La mano poderosa’: los gobernadores de buenos aires y los juicios de residencia a mediados del siglo XVII” (paper apresentado nasXº Jornadas Interescuelas/Departamentos de Historia, Santa Fé, Rosário, Setembro, 2005).

19. Jack Autrey Dabbs, “Manuel de Frías and the rioplatine free trade,” Revista de Historia de América 48 (1959): 378-383, 391-394. Consulta del Consejo a S.M. en la que trata de la división del gobierno de las provincias del Río de la Plata, y en el interín propone sujetos para el cargo de gobernador, El Rey nombra a Hernandarias de Saavedra e Consulta del Consejo de Indias a S.M. proponiendo sujetos para el gobierno del Paraguay, El Rey nombra a Manuel de Frías. Roberto Levillier (coord.), Correspondencia de la Ciudad de Buenos Aires con los reyes de España (1615-1635) (Madrid, 1918), 389-345.

20. Testimonio de la sentencia dictada en la residencia que se tomó a Hernandarias de Saavedra del tiempo en que estuvo ejerciendo la gobernación del Río de la Plata, Juez, licenciado Alonso Pérez de Salazar, oidor de Charcas. Raul A. Molina, Hernandarias, 482.

21. Carta del Cabildo de Buenos Aires al Rey, quejándose del gobierno de Hernandarias de Saavedra y pidiendo se renueve por tres años más una permisión de comércio que éste no dejó cumplir. Roberto Levillier (coord.), Correspondencia de la Ciudad de Buenos Aires con los reyes de España (1615-1635) (Madrid, 1918), 149.

22. Roberto Levillier (org.), Correspondencia de la ciudad de Buenos Ayres con los Reyes de España (1588-1615) (Buenos Aires: Municipalidad de Buenos Aires, 1915), 168.

23. Um exemplo deste auto, mas referente ao ano de 1624 e feito por dom Alonso Pérez de Salazar (ouvidor da Audiência de Charcas, responsável pela residencia de Hernandarias e pelo estabelecimento da aduana seca de Córdoba em 1623, e governador interino após o falecimento de dom Diego de Góngora) encontra-se em: Manuel Ricardo Trelles (org.), Registro Estadístico de Buenos Aires (1863) (Buenos Aires: Sociedad Tipográfica Bonaerense, 1865), 36.

24. Mesmo com a grande dificuldade de realizar um estudo deste tipo, em que nem todas as entradas ilegais de escravos eram registradas, Liliana Crespi consegue elaborar, através de uma série de fontes contábeis e jurídicas, um amplo quadro sobre a cumplicidade dos oficiais régios e governadores com os comerciantes do porto em Buenos Aires. Liliana Crespi, “La complicidad de los funcionarios reales en el contrabando de esclavos en el puerto de Buenos Aires, durante el siglo XVII,” accessed August 3, 2016, biblioteca.clacso.edu.ar/ar/libros/aladaa/crespi.rtf.

25. Jorge Gelman, “Economia natural – economia monetaria. Los grupos dirigentes de Buenos Aires a princípios del siglo XVII”, Anuario de Estudios Americanos 44 (1987): 89-104.

26. Idem, 106.

27. Zacarias Moutoukias, “Burocracia, contrabando y autotransformación de las elites. Buenos Aires a fines del siglo XVII”, AIEHS 3 (1988): 221.

28. Arrigo Amadori, “El comercio rioplatense y la construcción discursiva de un espacio político por el Cabildo de Buenos Aires”, Historica 39.2 (2015): 18.

29. Zacarias Moutoukias, “Burocracia, contrabando y autotransformación de las elites. Buenos Aires a fines del siglo XVII”, 225.

30. Macarena Perusset, Contrabando y sociedad en el Río de la Plata colonial, 2006.

31. Eduardo R. Saguier, “The social impact of a middleman minority in a divided host society: the case of the portuguese in early Seventeenth-Century Buenos Aires”, Hispanic American Historical Review, 65 3 (1985), 471.

32. Manuela Cristina García Bernal, “Las élites capitulares indianas y sus mecanismos de poder en el siglo XVII”, Anuário de Estudios Americanos 57 1 (2000): 93.

33. Susana R. Frías, “La expansión de la población”, in Nueva Historia de la Nación Argentina, edited by Academia Nacional de la Historia, vol. 2 (Buenos Aires: Planeta Argentina, 1999), 110.

34. Archivo de la Nación Argentina, Reales Cedulas y Provisiones (1517-1662), 66. Ver também: Jorge F. Lima Gonzalez Bonorino e Hernan Carlos Lux-Wurm, Colección de documentos sobre los conquistadores y pobladores del Río de la Plata, Revista del Instituto Historico Municipal de San Isidro (2001): 160-164.

35. Rodrigo Ceballos, “A rebeldia dos Bragança no Rio da Prata: redes comerciais e laços parentais portugueses na Buenos Aires seiscentista,” Estudos Ibero-Americanos 41 (2015): 126-142.

36. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892C – “Luis Gomes de Sossa vecino de esta ciudad de la Trinidad puerto de Buenos Aires, en nombre de los portugueses [...]”, 1647, fl. 10v.

37. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892C – “Luis Gomes de Sossa vecino de esta ciudad de la Trinidad puerto de Buenos Aires, en nombre de los portugueses [...]”, 1647, fl. 2v.

38. Idem, fl. 45.

39. Archivo General de Indias, “Luis Gomes de Sossa vecino de esta ciudad de la Trinidad puerto de Buenos Aires, en nombre de los portugueses [...]”, 1647, fl. 85v.

40. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892B – “Gonçalo Albarez contra el gobernador don Gerónimo Luis de Cabrera”, 1647. fl. 3v.

41. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892B – “Thomas Machado contra el governador don Gerónimo Luis de Cabrera”, 1647, fls. 1 e 5.

42. Jacinto Vela de Hinojosa possuía plantações de trigo e fabricava pão com trabalho escravo. Possuía “negras de gato” que vendiam o produto na cidade. Hinojosa reclamou ao juiz de residencia, dom Jacinto de Lariz, que no período do desarme dos portugueses seus escravos de ganho foram perseguidos pelos soldados perdendo-se muitas vezes o pão fabricado. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892B – “Capitan Jacinto Bela de Inojosa contra el gobernador Gerónimo […]”, 164, fls. 1-22v.

43. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892C – “Antonio Gutierres Barragán, vecino de esta ciudad en aquella vía y forma que mejor en derecho [...]”, 1647, fls. 1-19v.

44. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892B – “Demanda de Residencia.1647. Demanda puesta por Pedro Sanches Rendon en nombre del capitán Domingo Thome sobre el navío que le destruyeron a D. Gerónimo Luis de Cabrera, gobernador que fue de esta provincia”, 1647, fls. 1-47v.

45. Segundo Cabrera, os couros vieram das reduções de índios para que fossem adquiridos na Espanha “ornamentos de culto divino”. Archivo General de Indias, Escribanía de Cámara y Justicia del Consejo de Indias, Residencias de la Audiencia de Buenos Aires, Escribanía, 892C – “El capitán Antonio Martinez Piolino residente en la ciudad y puerto de Buenos Aires en aquella vía y forma [...]”, 1647, fls. 42-54.

46. Bárbara M. Aramendi, ¿Poder local versus oder real? Conflictos entre el Cabildo de Córdoba y el gobernador don Joaquín Espinosa y Dávalos, Andes, 22 (2011). Acessado em 25 de novembro de 2016. Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=12719967003

47 Xavier Gil Pujol, “Centralismo e localismo? Sobre as relações políticas e culturais entre capital e territórios nas monarquias européias dos séculos XVI e XVII”, Penélope. Fazer e desfazer a história, 6 (1991): 124 e 127.

48. Elliott, John H, “A Europe of Composite Monarchies”, Past and Present 137 (1992): 57.

49. Ângela Barreto Xavier e António Manuel Hespanha, “As redes clientelares”, in História de Portugal. O Antigo Regime (1620-1807), edited by José Mattoso, vol. 4 (Lisboa: Estampa, 1993): 382.

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