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Revista del Museo de Antropología

versión impresa ISSN 1852-060Xversión On-line ISSN 1852-4826

Rev. Mus. Antropol. vol.12 no.2 Córdoba ago. 2019

http://dx.doi.org/10.31048/1852.4826.v12.n2.19836 

ARQUEOLOGÍA

http://dx.doi.org/10.31048/1852.4826.v12.n2.19836

Cerritos no Brasil. Pensando os mounds do litoral e interior do estado do Rio Grande do Sul
Cerritos in Brazil. Thinking about the coast and interior mounds of Rio Grande do Sul state

Anderson Marques Garcia1


1Pesquisador associado ao Laboratório de Ensino e Pesquisa em Antropologia e Arqueologia, Universidade Federal de Pelotas (LEPAARQ-UFPEL). Egresso do curso de doutorado do Programa de Pós-graduação em Arqueologia, Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: andersonmarquesgarcia@gmail.com

Recibido 09-04-2018.

Recibido con correcciones 29-04-2019.

Aceptado 20-08-2019

Resumo

No Brasil a utilização do termo Cerrito foi adotada tradicionalmente no Rio Grande do Sul para designar fenômenos arqueológicos que se apresentam de forma monticular em diferentes paisagens, atribuídos pelo Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA) como materiais da tradição ceramista Vieira, classificada como as quatro fases (Cerritos, Vieira, Torotama e Ibirapuitã) tardias da tradição Umbu, relacionada a caçadores-coletores. A classificação em fases e tradições para este contexto parece ter agrupado dentro de uma mesma denominação sítios de grupos sociais distintos, sob a premissa de que os Cerritos litorâneos seriam construções tardias de caçadores-coletores do interior, resultando em generalizações para com os sítios monticulares. Com a exceção de recentes pesquisas desenvolvidas no Sudoeste da Laguna dos Patos, poucos avanços ocorreram no estudo dos Cerritos no Brasil após o término do PRONAPA. Com o objetivo de investigar a hipótese da existência de diferentes especificidades no atual território do Rio Grande do Sul, buscou-se entender as particularidades entre os Cerritos litorâneos e os do interior, como ocorreu a criação das tradições Umbu e Vieira, e quais foram suas consequências para o estudo dessas estruturas.

Palavras-chave: Cerrito; Caçadores-coletores; Tecnologia Lítica; Umbu; Vieira

Abstract

In Brazil the use of the term Cerrito was traditionally adopted in Rio Grande do Sul to designate archaeological expressions that appeared in a monticular shape in different landscapes, assigned by the Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA) as materials of the ceramic tradition Vieira, classified as the four late phases (Cerritos, Vieira, Torotama and Ibirapuitã) of the Umbu tradition, related to hunter-gatherers. The classification in phases and traditions for this context grouped under a same denomination sites of distinct social groups, with the premise that the coastal Cerritos would be late constructions of hunter-gatherers of the interior, resulting in generalizations towards the monticular sites. With the exception of recent researches developed in the Southwest of Laguna dos Patos, few advances occurred in the study of Cerritos in Brazil after the end of PRONAPA. In order to investigate the hypothesis of the existence of different specificities in the current Rio Grande do Sul territory, this research sought to understand the particularities between the coastal and the interior Cerritos, how the creation of Umbu and Vieira traditions occurred and what their consequences were for the study of these structures.

Keywords: Cerrito; Hunter-gatherers; Lithic Technology; Umbu; Vieira

A transição do Pleistoceno para o Holoceno, há cerca de 12000 AP, culminou com mudanças climáticas que levaram a uma gradual extinção da megafauna que habitava as terras sul-americanas. Como solução às restrições ambientais desta região, bastante fria até então, os grupos humanos que habitavam essas áreas – geralmente designados como paleoíndios – teriam lidado com as mudanças ambientais investindo em outras fontes alimentícias que passaram a vigorar em áreas energeticamente pouco ricas durante o Pleistoceno (Kern, 1985; Politis, 2008).

No início do Holoceno Médio – há aproximadamente 7000 AP – com clima seco e úmido, alguns grupos começaram a explorar de modo intenso recursos aquáticos na faixa litorânea da Planície Costeira. Em sequência, nessa área teriam surgido sítios com evidências de reocupações, onde surgem os primeiros registros de bolas de boleadeiras. Nesse espaço surgiram lagoas que aumentaram a produtividade ambiental na planície costeira, como consequência das flutuações do nível do mar derivadas de degelo das glaciais, formando reservas alimentícias então exploradas por populações caçadoras-coletoras, que teriam ido para estas áreas antes temperadas de clima seco com poucas chuvas e que se tornaram úmidas e marcadas por chuvas intensas (Kern, 1985; Dias, 2004).

Em meio a esse cenário de ambientes costeiros alagadiços, há aproximadamente 5000 AP, grupos estrategicamente munidos para investir nessas áreas começaram a implementar os primeiros acampamentos e, em seguida, construíram os primeiros Cerritos em contextos de banhados lacustres na atual região de Rocha no Uruguai, estendendo-se posteriormente a ambientes similares ao Sul e Norte dessa área (Mazz, 2001; Capdepont et al., 2004; Iriarte & Marozzi, 2009).

Entende-se por Cerritos as estruturas monticulares construídas com sedimentos e rochas pelas sociedades pré-coloniais que habitavam e exploravam a região pampiana, passíveis de terem sido idealizadas para múltiplas funcionalidades, conforme suas especificidades temporais e espaciais. Junto a isso, pondera-se a possibilidade da existência de fenômenos ímpares que possam ter levado diferentes grupos à construção desses montículos regionais.

Politis (2008) e Mazz & Bracco (2010) consideram as mudanças ocorridas no Holoceno Médio como o “estopim” do início das explorações dessas áreas com produtividade ambiental perene, tendo íntima relação com as transformações dos sistemas de subsistência – e talvez de organização social – de populações neste complexo paisagístico. Essa intensa exploração das áreas alagáveis foi complementada com o surgimento dos Cerritos, o que a partir desta ampla visão – por não haver indícios de eventuais substituições populacionais no Pampa – relacionaria ancestralmente os grupos construtores de Cerritos com as primeiras populações do início do Holoceno.

Cerritos, os mounds da Região Platina

Até o presente momento são conhecidos Cerritos na Argentina nos departamentos de Victoria, Gualeguay, Islas de Ibicui, Diamante, San Fernando, Campana, Zárate, Escobar e Tigre. No Uruguai, nos departamentos de Rocha, Cerro Largo, Maldonado e Tacuarembó. No território brasileiro os Cerritos estão no Sudeste do Rio Grande do Sul, na região dos municípios de Chuí, Rio Grande, Pelotas, Jaguarão, Camaquã e Bagé, e na porção central interiorana, próximos das margens dos rios Pardo, Jacuí, Vacacaí, Ibicuí e Butuí (Figura 01)

 

a04f1

Figura 1. Mapa representativo das áreas informadas como Cerritos no espaço platino. Elaborado a partir dos acervos do LEPA-UFSM, LEPAARQUFPEL e fontes bibliográficas (Naue et al., 1971; Naue, 1973; Caggiano, 1984; Copé, 1985; Rüthschilling, 1989; Blanco, 1997; Schmitz et al., 1997; Mazz, 1999; Iriarte, 2000; Mentz-Ribeiro & Calippo, 2000; Mazz & Moreno, 2002; Pereira, 2005; Rogge, 2004; Inda et al.,2006; Gianotti et al., 2008; Rosa, 2008; Mazz & Bracco, 2010, Bonomo et al., 2011a).
Figure 1. Representative map of areas reported as Cerritos in the platinum space. Elaborated from data from LEPA-UFSM, LEPAARQ-UFPEL and bibliographic sources. (Naue et al., 1971; Naue, 1973; Caggiano, 1984; Copé, 1985; Rüthschilling, 1989; Blanco, 1997; Schmitz et al., 1997; Mazz, 1999; Iriarte, 2000; Mentz-Ribeiro & Calippo, 2000; Mazz & Moreno, 2002; Pereira, 2005; Rogge, 2004; Inda et al.,2006; Gianotti et al., 2008; Rosa, 2008; Mazz & Bracco, 2010, Bonomo et al., 2011a).


Cerrito é denominação recorrente na região platina para essas estruturas em que se pode encontrar materiais líticos, cerâmicos e arqueofaunísticos, além de enterramentos humanos e estruturas de fogueiras, em alguns casos. Tais estruturas arqueológicas alcançam uma temporalidade máxima entre 5458 e 4977 AP1 em Rocha no Uruguai, onde atingem dimensões de até 100 metros de diâmetro por 7 metros de altura (Mazz, 2001; Iriarte, 2000; Capdepont et al., 2004; Villagrán, 2005).

Porém, na Argentina, bem como na maior parte do Rio Grande do Sul, os Cerritos são encontrados no ambiente de forma menos imponente, alcançando no delta do rio Paraná dimensões próximas de 70 m de diâmetro e 2 m de altura, com datações máximas entre o intervalo de 1570 a 1299 AP2. No Rio Grande do Sul possuem dimensões em torno de 70 m de diâmetro e 1,2 m de altura, com datações máximas entre o intervalo de 2990 a 2210 AP3 (Schmitz, 1976; Schmitz et al., 1991; Soares, 2004; Bonomo et al., 2011a; Castiñeira et al., 2014). Essas estruturas possuem, ainda, datas nesses três países que margeiam a temporalidade do contato com os colonizadores ibéricos.

Os estudos relativos à função destas estruturas possuem interpretações diversas conforme as particularidades locais dessas ocorrências de largas abrangências espaciais. Sinteticamente pode-se dizer que os Cerritos, ao longo do tempo, têm sido pensados como cemitérios, demarcadores territoriais, locais de descarte de refugo, praças centrais de aldeias, lugares erguidos para a habitação em áreas alagadiças e aproveitamento de elevações naturais, bem como monumentos ligados à memória e identidade dos grupos que os construíram (Naue, 1973; Schmitz, 1976; Rüthschilling, 1989; Blanco, 1999; Iriarte, 2000, 2006; Mazz, 2000; Villagrán, 2005; Becker, 2006; Silva jr., 2006; Mazz & Bracco, 2010; Bonomo et al., 2011a; Gianotti, 2016).

Evidências de inovações tecnológicas como a horticultura e o domínio de técnicas de produção cerâmica, teriam possibilitado a estes grupos uma maior estabilidade junto às áreas de banhado, uma diminuição significativa em sua mobilidade e um gradual aumento demográfico, pois a alta produtividade ambiental e as inovações tecnológicas teriam permitido maior estabilidade a partir de recursos mais acessíveis, sem necessidade exclusiva de percorrer longas distâncias para a sua aquisição (Politis, 2008; Gianotti, 2016).

As primeiras pesquisas sobre cerritos no Brasil

Os estudos arqueológicos no Estado brasileiro do Rio Grande do Sul começaram a partir da década de 1960 em consequência do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA), o qual deu início às pesquisas realizadas de forma sistemática no Brasil, com a identificação de milhares de sítios por todo território nacional (Brochado et al., 1969; Prous, 1992). Esse programa teve a coordenação dos arqueólogos estadunidenses Betty Meggers e Clifford Evans, bem como orientações teóricas de James Ford, que juntas conduziram as pesquisas arqueológicas apoiadas no Histórico-culturalismo e no evolucionismo cultural, estabelecendo-se tradições e fases arqueológicas ao longo do território nacional (Brochado et al., 1969; Hilbert, 2007).

Nesse período as atividades nesse Estado foram desenvolvidas, principalmente, por José Proenza Brochado, Eurico Miller e Pedro Ignácio Schmitz, que apoiados na metodologia proposta pelo PRONAPA, estabeleceram tradições como a Umbu e a Vieira. A tradição Umbu foi caracterizada por Bety Meggers e Cliford Evans em 1977, englobando sítios arqueológicos a céu aberto e sob-rocha que apresentassem pontas de projéteis pedunculadas e apedunculadas, vinculadas a grupos caçadores-coletores (Meggers & Evans, 1983). A tradição Vieira foi definida por Brochado et al. (1969), reunindo fases cerâmicas de caçadores-coletores encontradas em Cerritos, sítios sobre dunas, barrancas perto de corpos de água e sobre colinas com menor frequência (Schmitz, 1991).

Os materiais recolhidos em campo foram analisados pelo método de Ford, com o agrupamento de artefatos e tipos de sepultamentos em sequências seriadas, consideradas demarcadores territoriais, locais de descarte de refugo, praças centrais de aldeias, lugares erguidos para a habitação em áreas alagadiças e aproveitamento de elevações naturais, bem como monumentos ligados à memória e identidade dos grupos que os construíram (Naue, 1973; Schmitz, 1976; Rüthschilling, 1989; Blanco, 1999; Iriarte, 2000, 2006; Mazz, 2000; Villagrán, 2005; Becker, 2006; Silva jr., 2006; Mazz & Bracco, 2010; Bonomo et al., 2011a; Gianotti, 2016).

Evidências de inovações tecnológicas como a horticultura e o domínio de técnicas de produção cerâmica, teriam possibilitado a estes grupos uma maior estabilidade junto às áreas de banhado, uma diminuição significativa em sua mobilidade e um gradual aumento demográfico, pois a alta produtividade ambiental e as inovações tecnológicas teriam permitido maior estabilidade a partir de recursos mais acessíveis, sem necessidade exclusiva de percorrer longas distâncias para a sua aquisição (Politis, 2008; Gianotti, 2016).

As primeiras pesquisas sobre cerritos no Brasil

Os estudos arqueológicos no Estado brasileiro do Rio Grande do Sul começaram a partir da década de 1960 em consequência do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA), o qual deu início às pesquisas realizadas de forma sistemática no Brasil, com a identificação de milhares de sítios por todo território nacional (Brochado et al., 1969; Prous, 1992). Esse programa teve a coordenação dos arqueólogos estadunidenses Betty Meggers e Clifford Evans, bem como orientações teóricas de James Ford, que juntas conduziram as pesquisas arqueológicas apoiadas no Histórico-culturalismo e no evolucionismo cultural, estabelecendo-se tradições e fases arqueológicas ao longo do território nacional (Brochado et al., 1969; Hilbert, 2007).

Nesse período as atividades nesse Estado foram desenvolvidas, principalmente, por José Proenza Brochado, Eurico Miller e Pedro Ignácio Schmitz, que apoiados na metodologia proposta pelo PRONAPA, estabeleceram tradições como a Umbu e a Vieira. A tradição Umbu foi caracterizada por Bety Meggers e Cliford Evans em 1977, englobando sítios arqueológicos a céu aberto e sob-rocha que apresentassem pontas de projéteis pedunculadas e apedunculadas, vinculadas a grupos caçadores-coletores (Meggers & Evans, 1983). A tradição Vieira foi definida por Brochado et al. (1969), reunindo fases cerâmicas de caçadores-coletores encontradas em Cerritos, sítios sobre dunas, barrancas perto de corpos de água e sobre colinas com menor frequência (Schmitz, 1991).

Os materiais recolhidos em campo foram analisados pelo método de Ford, com o agrupamento de artefatos e tipos de sepultamentos em sequências seriadas, consideradas representativas de fases integradas a distintas tradições arqueológicas (Brochado et al, 1969; Neto, 2014). Os pesquisadores costumavam entender as diferenças entre as tradições como consequências de contatos entre populações com materiais distintos, adoção de objetos por difusão e alterações relativas à migração ou difusão. As semelhanças entre os conjuntos materiais eram compreendidas como uniformidades ao longo do espaço e como comprovações de difusão cultural (Noelli, 1999/2000).

O estabelecimento da Tradição Umbu

Levando em consideração as pontas de projétil distintas das denominadas como rabo de peixe no Brasil, associadas tradicionalmente a populações paleoindígenas, os exemplares que divergiam desse tipo foram utilizados como “fóssil guia” para caracterização da tradição Umbu, agrupando sob tal designação uma série de sítios arqueológicos classificados em diferentes fases, conforme sua temporalidade e localização. A tradição Umbu foi caracterizada da seguinte forma4:
“Duas tradições líticas gerais têm sido reconhecidas no sul do Brasil, uma com pontas de projétil líticas e outra onde estas estão ausentes. Esta última designada tradição Humaitá é representada por inúmeros sítios em locais florestais, ao longo de rios, lagos e banhados. (...) Pontas de projétil líticas são antigas na América do Sul e persistem no sul do Brasil após 5000 a.C., na tradição Umbu. Quatro subtradições foram reconhecidas, assim como inúmeros sítios de filiação ancestral. Os primeiros vestígios são contemporâneos com os sítios da tradição Humaitá e ocorrem em abrigos sob-rocha e áreas abertas perto da costa, junto aos arroios, lagoas e banhados. Não são limitados pelas dimensões dos abrigo rochosos, os vestígios estão distribuídos em áreas que vão de 30 por 40 a 80 por 150 metros. Entre a variedade de pontas apedunculadas e pedunculadas, há algumas com margens serrilhadas e outras com retoque unifacial. A forma mais comum é triangular alongada, com pedúnculos de lados paralelos ou expandidos e com base reta, côncava ou convexa. Trituradores e pequenas bigornas líticas com concavidade central são típicos, assim como choppers, raspadores terminais e lascas com marcas de uso. Frequentemente, estão também associados bolas de boleadeiras, lâminas de machados polidas e semi-polidas e afiadores líticos” (Meggers & Evans, 1983, p. 295-296).

As fases foram estipuladas por diferentes autores em regiões e períodos também distintos: Schmitz (1985) cita 19 fases e Mentz-Ribeiro (1990), 21. A partir desses dois autores foi possível considerar a identificação de 24 fases. No Estado do Rio Grande do Sul foram estabelecidas as seguintes fases: Uruguai, Vinitu, Piraçá, Capivara, José Vieira VIII, Batinga, Umbu, Araponga, Amandaú, Camuri, Panambí, Rio Pardinho, Itapuí, Lagoa, Patos e Chuí. No Paraná: Bituruna, Iguaçu, Potinga, Céu Azul e Ribeirão. Em Santa Catarina: Itaió, Suruvi e Itajaí. Contudo, Schmitz (2007) expressa que:
“A divisão em tipos morfológicos, estatísticos, estratigráficos e/ou por matéria-prima foi usada para criar fases cronológicas e/ou locais, à semelhança do que se fazia para cerâmica. Mas grande parte destas classificações obedeceu mais a intuição do que critérios cientificamente testados” (Schmitz, 2007, pg.25).

Como visto em Schmitz (2007), os critérios empregados para distinguir essas fases foram muitas vezes pertinentes a cada pesquisador, de modo que Mentz-Ribeiro (1990) considerava que as fases Panambi e Rio Pardinho eram a mesma. Por outro lado, a fase Uruguai, que juntamente com a Ibicuí correspondiam à tradição paleoindígena definida por Miller (1987), foi tomada como pertencente à tradição Umbu.

Schmitz (1985) considerava que essas duas fases seriam o início da tradição Umbu, mas não as incluía em seu quadro evolutivo por falta de maiores evidências. Milder (1994) via a amplitude da tradição Umbu com ressalvas, pois não acreditava na incorporação das fases Uruguai e Ibicuí nesse conjunto por possuírem características tecnológicas distintas das demais fases da tradição Umbu no Rio Grande do Sul, associando-as a grupos contemporâneos à transição do Pleistoceno para o Holoceno que habitavam a região Oeste desse Estado e áreas contínuas no atual território uruguaio.

Além das pontas de projéteis, seriam característicos da tradição Umbu os núcleos, lascas, lâminas, artefatos bifaciais, pequenos bifaces, trituradores, percutores, instrumentos com depressões semiesféricas, instrumentos de perfuração e instrumentos plano-convexos de diferentes morfologias e proporções. Também estariam presentes, mas em menor frequência, lesmas, talhadores, grandes bifaces, bigornas, lâminas de machado polidas, polidores, picões, mós, rompecabezas5 e bolas com e sem sulco (Mentz-Ribeiro, 1979, 1990; Schmitz, 1985; Dias, 2007).

Schmitz (1985; 2007) define que haveria uma preferência por assentamentos em abrigos sob-rocha frente a céu aberto, mas que de uma forma geral estes últimos seriam mais numerosos, já que tais formações geomorfológicas não estão presentes em muitas áreas. Os sítios estariam próximos a rios – algumas vezes junto a banhados e lagos, mas raramente junto ao mar –, geralmente nas zonas de transição entre campos abertos e vegetação de maior porte, sejam os sítios mais ao Norte do Rio Grande do Sul juntos à floresta de Araucária, ou no Sul próximo a capões e matas de galeria, sendo raros em campos abertos e matas fechadas. De forma geral, segundo o autor, muitos desses sítios teriam servido ao mesmo tempo como sítios moradia e áreas de produção artefatual, assim como relata Dias (2007) para o Vale do Rio dos Sinos e Arroio Campestre.

Em relação aos sítios a céu aberto, Mentz-Ribeiro (1990) coloca que a maior parte está localizada junto a pequenos cursos d’água, em locais mais elevados do que o circundante, sejam em áreas planas ou vales. As partes mais altas e planas não atingíveis por cheias, como as coxilhas, seriam predominantes, com diâmetros entre 30 m e 50 m junto a ambientes campesinos e florestais. De modo geral foram essas características que abarcaram alguns sítios da região central do Rio Grande do Sul, compostos predominante ou unicamente por materiais líticos típicos à tradição Umbu, mas denominados como Cerritos vinculados à tradição Vieira, assim como aqueles construídos no Sudeste desse Estado e Leste uruguaio.

Os sítios relacionados à tradição

Vieira eram vistos como uma continuidade da presença dos caçadores-coletores vinculados à tradição Umbu, onde a indústria lítica era considerada a mesma, a cerâmica era entendida como influência de grupos Jê e Guarani, e os Cerritos como frutos de uma adaptação às áreas marginais, pois grupos horticultares estariam ocupando seus espaços tradicionais e forçando-os a mudar.

“A construção de cerritos e, posteriormente, a cerâmica não representa uma distinção entre a tradição Umbu e a tradição Vieira. Isso parece estar representando uma nova forma de adaptação ecológica diante de uma pressão causada pelas populações que vinham colonizando áreas da Região Sul e adjacências a partir de 3.000 AP. Essas colonizações vinham reduzindo e restringindo as áreas de circulação das populações Umbu. Enquanto nas áreas do Planalto não parece haver mudanças materiais e adaptativas, como foi comentado na parte sobre a Tradição Umbu, as populações da área com registros Vieira parecem ter passado por um processo de adaptação às áreas alagadiças, pois passaram a habitar o seu interior, bem como a novas formas de processar os alimentos utilizando a cerâmica” (Noelli, 1999/2000, p. 236-237).

Os sítios relacionados à tradição Umbu são mais numerosos na região central do Rio Grande do Sul, o que levava Schmitz (1985) a considerar inicialmente a possibilidade de uma alta densidade populacional entre os caçadores-coletores dessa região, todavia descartava essa hipótese no mesmo artigo por não estar de acordo com os pressupostos então vigentes, ponderando que deveria haver datas mais recuadas para tais áreas ainda não encontradas que melhor explicariam a quantidade de sítios nesses locais, imaginando que no centro do Rio Grande do Sul estaria o epicentro da tradição Umbu. Posteriormente Bueno & Dias (2015) sugeriram que a origem da tradição Umbu teria se dado através de uma rota de colonização por grupos vindos do Norte, através dos rios Paraguai, Paraná e Uruguai no início do Holoceno.

Não há unanimidade sobre os limites entre a tradição Umbu e os sítios com pontas de projéteis de São Paulo e Minas Gerais, entretanto, tradicionalmente, pensava-se que estariam ao Norte do rio Paranapanema (Mentz-Ribeiro, 1979; Schmitz, 1985). Como visto em Meggers & Evans (1983) – e acrescentado por MentzRibeiro (1979; 1990), Schmitz (1985) e Dias (2007) – a caracterização da tradição Umbu apresenta critérios de identificação bastante vagos, sendo a ela associada a largas espacialidades e cronologias, assim como uma amplitude de tipos de pontas de projéteis e outros materiais.

Pensando criticamente a respeito de tais definições, nota-se que poderiam ser filiados incontáveis grupos do Sul da América do Sul sob a denominação de tradição Umbu, situação bem observada anteriormente por Silva (2014). Coloca-se como um ponto de atenção nessa discussão a amplitude de indicadores líticos propostos para a identificação dessa suposta tradição e a diversidade dos espaços ocupados, uma vez que esses englobariam todos os caçadores-coletores da região Sul do Brasil. Tal homogeneização dos grupos caçadores-coletores de todo esse espaço sob o termo Umbu torna-se complicada, pois acaba reduzindo-os à produção de um tipo de artefato, uma vez que o principal argumento suporte dessa proposta é a presença de pontas de projéteis líticas nos sítios arqueológicos dessa região. Desse modo, não parece adequado utilizar a definição de tradição Umbu para todos grupos que habitavam esse espaço.

Utilizar a existência das variadas pontas de projéteis presentes no Sul do Brasil como elemento de união de diversos grupos em torno de uma tradição parece muito perigoso, além de convergir em primeira instância com ideias já superadas de aquisição de inovações tecnológicas por meio de difusão e migração.

Por outro lado, são perceptíveis semelhanças consideráveis entre os materiais presentes nas regiões central e Nordeste do Rio Grande do Sul. Contudo, opta-se por não designar esses grupos como portadores da tradição Umbu, evitando associações diretas com grupos de espaços distintos abrangidos por tal tradição. Dias (2007; 2008) estudou uma parcela desses sítios no Nordeste do Rio Grande do Sul, os quais apresentam uma organização tecnológica semelhante a encontrada em sítios líticos da região central desse Estado, como o visto no sítio arqueológico do Pororó em Pinhal Grande (Garcia, 2017).

A suposta homogeneidade da Tradição Umbu

Para outras áreas não são seguras as supostas semelhanças que consolidaram essa tradição, de modo que há diferenças marcantes entre o que é apresentado como Umbu em São Paulo, assim como em relação ao lítico dos Cerritos das terras baixas do Sudeste do Rio Grande do Sul, tradicionalmente agrupados dentro desse mesmo termo classificatório.
Tal situação ocorreu porque havia a busca pela construção das fases temporais e espaciais dessa tradição, de maneira que algumas vezes o termo Cerrito foi estendido para sítios líticos de campo aberto sobre coxilhas no interior, tidos como montículos pré-cerâmicos relacionados aos Cerritos litorâneos, classificados como as fases mais tardias da tradição Umbu: Lagoa, Patos e Chuí (Schmitz, 1985; Mentz-Ribeiro, 1990).

O uso da classificação “tradição Umbu” é problemático devido ao fato de constituir uma tradição arqueológica muito ampla, além de pesquisas serem desenvolvidas muitas vezes de modo insuficiente, com filiações de materiais a essa tradição como se apenas isso explicasse automaticamente a realidade estudada sem o devido questionamento a respeito da suposta homogeneidade, que une amplas temporalidades e largas extensões espaciais. O que ocorre é que a utilização de “fósseis guias” dificulta, muitas das vezes, possíveis avanços interpretativos.

As generalizações vistas como autoexplicativas não estão restritas apenas à relação das pontas de projéteis com a tradição Umbu, mas também incidem no Brasil sobre o termo Sambaqui – para os montículos fluviais e do litoral brasileiro, construídos com conchas e repletos de esqueletos humanos –, e com o termo Cerrito, para todos os montículos construídos predominantemente com terra na região platina (Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina). Assim, tais generalizações em torno de um termo podem ter agrupado realidades arqueológicas distintas em conjuntos únicos.

Exemplos de divergências nesse conjunto foram estudados por Penin (2005) ao pesquisar o Capelinha 1, localizado no Vale do Ribeira em Cajati (São Paulo), sítio com expressiva quantidade de pontas de projéteis. O autor sugeriu como possibilidade interpretativa para esse sítio a probabilidade de a área possuir uma ocupação tão antiga quanto a do Sul, com uma origem relacionada às ocupações pleistocênicas no atual território de São Paulo. Penin (2005) fundamenta essa hipótese na ocorrência de pontas de projétil paleoindígenas em Itaóca, a 65 km do vale do Ribeira, contudo não propôs uma interpretação que rompesse com a tradição Umbu em sua área de pesquisa.

Também tratando do conjunto de sítios de São Paulo, genericamente relacionados à tradição Umbu, Okumura (2014) pondera diferenças entre tais sítios e os do Sul do Brasil, salientando para a região de Rio Claro a possibilidade da forma diferenciada dos pedúnculos das pontas de projeteis serem marcadores estilísticos, onde a aparência não teria papel no desempenho dos projéteis, podendo a forma dos pedúnculos de tais objetos evidenciarem escolhas dos grupos e indicar fronteiras. A autora destaca a diferença entre os grupos portadores de pontas de projétil da região Sul e de São Paulo, ao menos quanto à forma de produzir esses artefatos.

Tal situação, evidenciada por esses pesquisadores no Estado de São Paulo, traz um alerta ao desenvolvimento de suposições generalistas de caráter homogeneizante a respeito da tradição Umbu. A diversidade dessa tradição é discutida inclusive por Schmitz (2007), contudo interpretações reducionistas sobre os caçadores-coletores do Sul e Sudeste do Brasil continuam sendo feitas, com, até mesmo, a utilização do termo “grupo” para fazer referência à tradição Umbu, como se tal tradição arqueológica fosse produto de um único grupo social.
“O fato de classificarmos os sítios na mesma tradição lítica não significa que os imaginemos pertencentes a um mesmo grupo, etnia, ou tronco linguístico. Pelo contrário, supomos que, através do tempo e do espaço, tenha havido múltiplas apropriações diferenciadas dos elementos básicos por populações diferentes, que deles se apropriaram de maneiras diferentes e os incorporaram a sua cultura” (Schmitz, 2007: 28).

O autor ilustra e exemplifica o que expõe ao citar a ocorrência de pontas de projéteis em sítios com casas subterrâneas no Estado de Santa Catarina, sugerindo que grupos Jê ou Xokleng teriam se apropriado de tais técnicas naquela situação. Por outro lado, grupos etnohistóricos, como os Charrua e os Minuano, são tidos como descendentes longínquos dos portadores dessa tradição arqueológica na região pampiana, tendo utilizado em períodos históricos a boleadeira e os rompecabezas.

Essas interpretações evidenciam os problemas que ocorrem com a homogeneização de diferentes grupos indígenas em uma tradição arqueológica com definição vaga. Grupos sociais e tradições muitas vezes são tratados como sinônimos, como se uma tradição arqueológica fosse representativa de um único grupo pretérito, ignorando-se o fato de que diferentes grupos sociais poderiam possuir uma mesma tradição arqueológica.

As consequências da seriação em fases e tradições para o estudo de cerritos no Brasil

Como apresentado anteriormente, os estudos sobre Cerritos no Brasil começaram em decorrência das atividades do PRONAPA no Rio Grande do Sul a partir da década de 1960, sendo então aplicado o método de seriação aos materiais encontrados e os sítios classificados entre as fases Cerritos, Vieira, Torotama e Ibirapuitã da tradição Vieira, caracterizada pela presença de um tipo cerâmico inicialmente entendido como simples (Brochado et al., 1969; Schmitz, 1976).

A tradição Vieira seria reconhecível por sua cerâmica e por sua localização em áreas sujeitas às inundações periódicas em ambientes com lagoas, banhados e rios, com materiais depositados em Cerritos, dunas, barrancas de corpos de água e sobre colinas com menor frequência. Foram, assim, consideradas como fases cerâmicas de caçadores-coletores (Brochado, et al 1969).

“A cerâmica é temperada com areia e, predominantemente, não decorada. Rara decoração consistindo de uma ou duas fileiras de marcas impressas abaixo da borda, executadas por instrumento com 2, 3 ou 4 dentes. Os vasos têm larga base plana, paredes inclinadas internamente e borda apontada. Orifícios para suspensão ocorrem abaixo do lábio em dois ou mais opostos” (Brochado et al., 1969, p. 12).

Oxigenando as interpretações acerca das cerâmicas classificadas como Vieira, Ricardo Ribeiro (2016), ao estudar cerâmicas provenientes de Cerritos da região de Pelotas, atenta para a existência de objetos que receberam um maior número de detalhes de acabamentos do que em outros, interpretando a existência de objetos “mais simples” não como uma inaptidão técnica daqueles oleiros, e sim como uma escolha por assim proceder.

O autor salienta, também, sobre a originalidade e a heterogeneidade dessa cerâmica, demonstrado que as decorações plásticas não seriam imitações Guarani, como tradicionalmente é reproduzido na literatura regional. Tal observação é ainda fortalecida pela anacronia dos grupos na região, uma vez que a chegada dos horticultores naquele espaço ocupado pelos construtores de Cerritos teria ocorrido em um período contemporâneo à conquista ibero-europeia (Milheira, 2008).

Segundo Schmitz (1976), os Cerritos foram interpretados inicialmente como sítios de pesca sazonal, adaptados para moradia entre o verão e a primavera, devido a pressupostos de que seriam assentamentos das fases finais da tradição Umbu em decorrência de pressão exercida no Norte com a chegada de horticultores Jê ou Guarani (Noelli, 1999/2000).

Os sítios seriam ocupados por longos períodos, onde as paisagens alagadiças das proximidades Sul da Laguna dos Patos funcionariam como atrativos para mamíferos e aves. A hipótese dos Cerritos como estruturas de acampamentos sazonais foi defendida também pela presença de buracos associados a pequenos postes, pensados como vestígios de frágeis choupanas (Naue, 1973; Schmitz, 1976; Schmitz et al., 1991).

No Brasil os mamíferos e as aves começaram a ser indicados como importantes fontes alimentícias para os construtores dos Cerritos conhecidos até aquele momento no município de Rio Grande, porém, sem superar a exploração de peixes capturáveis, hipoteticamente com uso de redes. Com base na análise dos recursos alimentícios recuperados nos sítios estudados, entendiase que os Cerritos seriam ocupados sazonalmente durante a primavera e o começo do verão, e abandonados durante o outono e o inverno.

Tanto a caça de cervídeos e de capivaras até o início da primavera na Lagoa Mirim, como uma possível colheita de butiá (Butia odorata) entre o fim do verão e inicio do outono na Serra do Sudeste, foram consideradas como possíveis fontes alimentícias aptas para o sustento destes grupos no período não assentado junto à Laguna dos Patos (Schmitz, 1976). Foi considerada também a existência de áreas de cultivos junto à Serra do Sudeste em Piratini:
“Estes cultivos podem ser feitos nos areais pleistocênicos junto da lagoa, ou em pontos da serra não utilizados pelo Tupiguarani. A recente fase Piratini, localizada em pequenos vales, cobertos com vegetação de galeria, já na periferia da floresta, poderia ser um local de cultivo do grupo Vieira na serra do Sudeste” (Schmitz et al., 1991. pg. 119).

Brochado (1974) definiu a fase Piratini a partir de seis sítios próximos da borda Sul do Escudo Sul Rio Grandense, perto de áreas alagadiças junto a pequenos cursos hídricos, compostos predominantemente por material lítico lascado em quartzo, semelhante aos dos Cerritos litorâneos. Quatro desses sítios também tiveram ocorrências de fragmentos cerâmicos, com características apontadas pelo autor como semelhantes às da cerâmica Guarani e da cerâmica Vieira.

Na década de 1970, os pesquisadores entendiam que os Cerritos estavam construídos sobre suaves elevações preexistentes – como albardões –, onde os localizados mais distantes da Laguna dos Patos seriam mais antigos que os mais próximos, partindo do princípio que as construções ocorriam imediatas às águas, e adicionavam que os mais afastados seriam “pré-cerâmicos”, enquanto os mais próximos seriam cerâmicos (Schorr, 1975; Schmitz & Brochado, 1982; Schmitz et al., 1991). Schmitz et al. (1991) entendiam que os Cerritos seriam ocupados sazonalmente por alguns séculos e abandonados devido aos recuos da Laguna dos Patos, que tornariam as planícies pantanosas e a pesca mais difícil.

Contudo, haviam apenas cinco Cerritos datados até essa ocasião, sendo essa uma hipótese especulativa, embasada na posição dos Cerritos sobre terraços pleistocênicos e holocênicos. Schmitz & Brochado (1982) informaram também que, na última parte da fase mais recente das estipuladas para os Cerritos (fase Vieira), aparecem abundantes pontas de projéteis pedunculadas e com aletas, informação que contrasta com as demais fontes sobre os níveis mais superficiais de Cerritos da região.

Mentz-Ribeiro (1979) afirmava que, em áreas da planície costeira a Sul, os portadores da tradição Umbu teriam se tornado os ceramistas da tradição Vieira, sendo os Cerritos litorâneos, sob a sua perspectiva, adaptações dos portadores da tradição Umbu a ambientes alagadiços. Tais linhas de pensamento permaneceram por toda produção desse pesquisador, visto que, quase trinta anos após seus primeiros ensaios, seguia tratando a então tradição Vieira como uma evolução da tradição Umbu nas terras baixas do sudeste do Rio Grande do Sul, onde os Cerritos seriam produtos de recorrentes assentamentos de grupos pequenos, com possibilidade de serem breves acampamentos de grupos grandes (Mentz-Ribeiro, 1990; 1995; Mentz-Ribeiro et al., 2004).

A contribuição desses primeiros pesquisadores de Cerritos no Rio Grande do Sul é destacada por Mazz (2000) pelo pioneirismo com a introdução dos estudos com materiais arqueofaunísticos; o reconhecimento dos padrões funerários flexionado, parcial flexionado e em urna; o estabelecimento de hipóteses de sequências cronológico-culturais, em que foram identificados um período pré-cerâmico e um cerâmico; e as primeiras datações radiocarbônicas para estes tipos de estruturas.

Por mais que existam críticas teórico-metodológicas sobre a abordagem histórico-culturalista, implementada nas investigações sobre Cerritos no Brasil durante as décadas de 1960 e 1970, Schmitz (1976) ainda é a referência mais completa sobre o tema no país, sendo esta pesquisa a única, até então, a propor uma interpretação sobre a ocupação dos grupos pescadores-caçadores-coletores no extremo Sul de forma conexa, abordando uma série de Cerritos de uma vasta amplitude espacial e sugerindo uma possibilidade interpretativa ao conjunto.

A produção bibliográfica sobre o interior do Rio Grande do Sul

Como colocado anteriormente, os Cerritos foram objetos de poucas pesquisas no Rio Grande Sul, sobretudo aqueles indicados para a região central e interiorana do Estado, onde a maior parte desses trabalhos foi pontual. Tais Cerritos passaram a emergir em meio à bibliografia da área inicialmente por Schmitz et al. (1991) e depois por Rogge (2004), ao trabalhar zonas de fronteiras entre os portadores das tradições cerâmicas Tupiguarani, Taquara e Vieira.

Além das áreas litorâneas anteriormente apresentadas no Sul do Rio Grande do Sul, Schmitz et al. (1991) apresentam outras localidades no interior com a presença de Cerritos, apontados em seu trabalho como áreas de ocorrência da tradição Vieira. Essas áreas encontram-se nas regiões de Bagé (Schmitz et al., 1967), Santa Maria (Brochado, 1969), Alegrete (Miller, 1969b), Vera Cruz (Mentz-Ribeiro, 1983), Herval (Copé, 1985) e Rosário do Sul (Guilherme Naue, por informação pessoal). Contudo, ao analisar as referências citadas na obra analisada, é possível perceber que não existe uma homogeneidade que sustente a existência da chamada tradição Vieira em todas essas áreas.

A cerâmica apresentada como diagnóstica de tal tradição está ausente na maior parte desses Cerritos. Por outro lado, existem nesses sítios características como as preteritamente utilizadas na definição de tradição Umbu, como, por exemplo, as pontas de projéteis utilizadas como materiais de filiação de tradição.

Schmitz et al. (1967) apresentaram a ocorrência de “aterros” e “cômoros” na região de Bagé e Dom Pedrito, identificados em prospecções por Fernando La Salvia, naquele ano, próximo às nascentes dos rios Negro e Ibicuí, bem como em planícies de inundação ligadas a esses rios. Foram encontrados 19 Cerritos nessa ocasião, distribuídos em quatro sítios arqueológicos implementados em terrenos alagadiços, porém sobre pontos mais elevados e geralmente afastados dos corpos hídricos.

Essas estruturas tinham alturas entre 0,5 e 2,5 m, diâmetros entre 7 e 80 m e morfologia geralmente elíptica ou alongada com topos planos. Os autores informam que esses “cômoros” possuíam uma estratigrafia constituída por um pacote de sedimento cinzento superficial com aproximadamente 30 cm de espessura, seguido por uma camada de terra preta com até 50 cm associada a carvões, ossos de animais, lascas e pontas de projétil. Como se pôde ver, não foi encontrada a cerâmica característica da tradição Vieira nessa área, mas apenas implementos líticos, havendo abaixo da terra preta areia ou sedimentos cinza como o superficial.

Brochado (1969) identificou na região de Santa Maria um agrupamento de “aterros”6, um conjunto de estruturas que denomina como “túmulos de pedras” e dois alinhamentos de pedras, além de outros tipos de sítios. O sítio com “aterros”, segundo o autor, estaria próximo de um afluente do rio Vacacaí (Arenal), com estruturas de formato circular ou elíptico com dimensões médias de 4 m de comprimento por 1 m de largura e altura de até 0,8 m. Essas estruturas estariam reunidas em grupos distantes entre si em torno de 5 m.

Alguns destes foram escavados, todavia o autor diz não ter encontrado materiais líticos ou cerâmicos que permitissem filiar tais montículos a nenhuma fase estabelecida até aquele momento. Brochado (1969) informa que junto desses aterros existiriam áreas interpretadas como locais de empréstimo de solo para construção dessas estruturas, que teriam sido erguidas, segundo sua descrição, sobre “covas rasas” relacionadas a ameríndios Guaianá (grupos Jê), próximas de um conjunto de sete “túmulos de pedra”.

Em nova incursão a essa área, Brochado (1971) não identificou novos montículos. Cabe destacar que, exatamente na mesma área do mapa onde Brochado (1969) plotou um conjunto de “aterros” – e, bem próximo, pontos que seriam de “túmulos” das fases Toropi e Vacacaí (ligadas à tradição Tupiguarani) –, outros sítios foram identificados por Brochado (1971) como subfase Vacacaí A.

Quanto a estes sítios da região de Santa Maria, nota-se na bibliografia citada que as descrições sobre “aterros” correspondem a pequenos montículos, geralmente interpretados como funerários, associáveis a grupos Jê, e não aos Cerritos litorâneos. Ainda cabe frisar que não é mencionada a presença de cerâmica Vieira, elemento utilizado como diagnóstico de tal tradição, não podendo tais sítios ser entendidos como parte dos Cerritos do litoral.

A referência sobre a tradição Vieira na região de Alegrete vem de Miller (1969b), que definiu a fase Ibirapuitã a partir de fragmentos cerâmicos percebidos naquele momento como distintos da cerâmica Tupiguarani, com material lítico semelhante ao da fase Itaqui7, porém sem informações estratigráficas. Miller (1969b) tratou a fase Ibirapuitã como distinta das tradições até então conhecidas, e acreditava que essa teria associação às outras existentes na região pampiana.

Os sítios atribuídos à tal fase estariam próximos às dunas móveis e banhados junto ao rio Ibicuí, com algumas pequenas áreas superficiais aflorando cerâmica e produtos de talha lítica abundantes. Segundo o autor, “em dois banhados, restos de enterramentos jaziam sob matacões, acompanhados por pequenos potes fragmentados” (Miller, 1969b, pg.17). Contudo, no referido artigo não há menção a Cerritos ou “aterros” para esse contexto, apenas a definição da fase Ibirapuitã, que posteriormente foi incorporada à tradição Vieira. Dessa maneira não está garantida a presença desse tipo de estruturas na área.

O mesmo autor no mesmo ano ao tratar sobre a região do alto rio Uruguai, também relatou a presença de fragmentos cerâmicos que não estariam relacionados às seriações realizadas até aquele momento, as quais seriam apêndices de “asas” ou “pezinhos”, bem como “pequenos pássaros” (Miller, 1969a). Essas descrições não ilustram a cerâmica Vieira relacionada aos Cerritos costeiros ao longo do Rio Grande do Sul e do Uruguai, porém há possibilidade de que se trate de uma descrição da cerâmica Goya Malabrigo, presente em Cerritos ao logo do delta do rio Paraná e rio Uruguai em território argentino (Politis & Bonomo, 2012).

Na região de Vera Cruz, no vale do Rio Pardo, Mentz Ribeiro (1983) considerou quatro entre dez sítios da tradição Umbu (fase Rio Pardinho) como Cerritos. Entre estes, o primeiro foi identificado em um terreno da prefeitura de Vera Cruz e os demais em outras áreas, são eles: Capão Grande (Ervino Schaefer) A e B, e Gomercindo Nunes de Oliveira. No primeiro foram abertas duas áreas de 1,5x1,5 m; no segundo, uma área de 1,5x1,5 m; no terceiro, uma quadra de 1x1 m; e no quarto não foram feitas intervenções. Os sítios não apresentaram cerâmica Vieira e o lítico mostrou-se diverso, com pontas de projéteis, instrumentos bifaciais, instrumentos planoconvexos, instrumentos com depressão semiesférica, núcleos, lascas sem uso e lascas com retoques. Em superfície foram encontradas pontas de projéteis, lascas, bolas de boleadeiras e bifaces.

Nessa área foram efetuados testes para verificar se as estruturas eram naturais ou artificiais, através de três cortes de 40x40 cm distribuídos entre a área externa da elevação, a encosta e o topo. As camadas estratigráficas não são apresentadas, mas Mentz-Ribeiro (1983) relata que os Cerritos seriam naturais até o início da ocupação e, após, artificiais, com usos semelhantes aos outros seis sítios. O primeiro dos Cerritos foi interpretado como uma oficina lítica e os demais como acampamentos, onde o autor sugeriu que a ocupação teria ocorrido nos meses de verão, pois as cheias de inverno cobriam pelo menos três dos quatro estudados.

Nenhum dos Cerritos foi datado, nem apresentaram sepultamentos ou cerâmica. Contudo, quando o autor encontrou cerâmica na região, classificou como Vieira as que tinham antispástico grosso e, como Taquara, as de antispástico médio e fino, não utilizando outros critérios diagnósticos devido à suposta simplicidade atribuída para a cerâmica Vieira. No sítio Jandor Hanssen, relacionado à tradição Umbu, o autor interpretou que os dois sepultamentos evidenciados seriam da tradição Vieira, devido à posição fletida dos indivíduos. Como visto, tais dados também não corroboram com os indicativos estabelecidos pelo PRONAPA para definir a tradição Vieira nesses Cerritos, de modo que a maior parte dos indicativos são apenas especulações.

Copé (1985; 1991) dedicou-se à pesquisa da margem esquerda do Rio Jaguarão ente 1979 e 1985, no município de Herval, onde foram localizados 81 sítios, dos quais 54 líticos, 12 lito-cerâmicos e um cerâmico. A maior parte era constituída de “aterros” construídos em áreas alagadiças e de ocupações de colinas em terraços do rio Jaguarão. Identificou unidades isoladas, pequenos grupos de três unidades e outros maiores de até 19, implementados junto a pequenos corpos de água em planuras altas do rio Jaguarão.

O material lítico encontrado na área classificado como pertencente à tradição Umbu, com 98%, foi predominante frente ao cerâmico, com exemplares de instrumentos plano-convexos, pontas de projéteis, estilhas, núcleos e lascas com e sem indícios de uso, bem como percutores, mós e bolas de boleadeiras. A maior parte da cerâmica foi considerada como Vieira e uma pequena parte como Tupiguarani (corrugada). Os sítios foram tidos como acampamentos estacionais de curto período de tempo para caça e coleta de vegetais, onde ocorriam atividades de confecção de artefatos, processamento e consumo de alimentos. Copé (1985; 1991) entende os sítios sobre colinas e os aterros como partes integrantes de um mesmo padrão de assentamento, que correspondem a usos semelhantes no espaço.

Os “aterros” encontravam-se nas áreas baixas e alagadiças e as ocupações de colinas em áreas secas, contudo nenhum era atingido pelas enchentes de inverno. A partir dessa observação e pelo fato dos sítios estarem perto de pequenos córregos que secavam no verão, a autora entende que os sítios seriam utilizados sazonalmente, entre o outono e o inverno, como acampamentos estratégicos junto de nascentes de rios. Esses sítios eram tidos como acampamentos de grupos que se reuniriam entre a primavera e o verão no litoral.

Não existem publicações que tragam maiores detalhes sobre os Cerritos da região de Rosário do Sul, no vale do rio Santa Maria, contudo Mentz-Ribeiro (1983) escreve, valendo-se de informação pessoal de Guilherme Naue, que aqueles seriam também ocupações sobre elevações naturais, como informado para o vale do rio Pardo. As informações sobre esse contexto restringem-se ao exposto, ficando a impressão de que na área de Rosário do Sul os Cerritos não teriam cerâmica Vieira e que apresentariam materiais líticos como os da região de Vera Cruz.

Outros Cerritos localizados no interior e discutidos em trabalhos mais recentes, como de Quintana (2010), em São Borja, e os de Marion (2010), em Santa Margarida do Sul, vêm também trazendo dados interessantes sobre a questão da cerâmica utilizada como diagnóstica da tradição Vieira entre os Cerritos do interior. Quintana (2010) identificou apenas um fragmento de cerâmica encontrado no Butuy 2, que supostamente poderia ser relacionável à tradição Vieira. Marion (2010), em análise crítica ao exposto em Milder et al. (2002), reinterpretou todos os materiais cerâmicos presentes nas camadas mais superficiais do sítio Corredor do Bolso como integrantes da tradição Tupiguarani.

Também entre as contribuições recentes sobre os Cerritos do interior do Rio Grande do Sul, Garcia (2016) no estudo de caso sobre o sítio Pororó em Pinhal Grande, discute sobre aspectos da construção de um Cerrito identificado distante das terras baixas, repleto de materiais líticos, mas sem evidências de cerâmica. Desse modo, a bibliografia existente sobre Cerritos do interior, que foi utilizada como fundamentação para a associação do que se entendia por tradição Vieira a esses sítios arqueológicos, mostrase muito expedita no que diz respeito aos indicativos utilizados.

Conclusão

Os Cerritos foram entendidos pelos primeiros pesquisadores brasileiros como fases tardias de caçadores relacionados à chamada tradição Umbu. Desse modo, foram discutidos os paradigmas teóricos utilizados como base nessa proposta e a amplitude temporal e espacial atribuída a essa tradição, bem como a homogeneização de diferentes grupos sociais consequente da generalização para com os sítios com montículos presentes na metade Sul do Rio Grande do Sul.

As tradições Umbu e Vieira foram associadas de forma contínua e direta, sem ter havido reflexão aprofundada sobre a natureza dessa ligação, de tal modo que houve mais suposições integrativas a respeito da continuidade entre as tradições – devido ao envolvimento dos pesquisadores com o sistema de fases e tradições estipulados por seriação –, do que questionamentos sobre a sua natureza. Entretanto, considera-se a existência de uma relação entre os grupos sociais historicamente agrupados dentro dessas duas tradições, mas encarando-a com ressalvas, devido a marcadas diferenças entre as evidências dos grupos.

Para pensar a relação entre os grupos responsáveis das terras baixas e do interior, considera-se como possibilidade que tenha havido continuidade, contudo as inovações representadas pelos Cerritos litorâneos – com evidências de sedentarismo possibilitado por horticultura, cerâmica e pela produtividade ambiental que os banhados possuíam – parecem ter modificado significativamente a organização social dessas populações. Esses indicativos sugerem que se desconsidere a associação entre os grupos construtores dos Cerritos litorâneos e os dos Cerritos conhecidos do interior, até então em torno de uma mesma tradição.

O início da construção de Cerritos entre as terras baixas de Rocha no Uruguai, há cerca de 5000 AP, parece representar uma ruptura entre o contingente populacional de caçadores-coletores no Pampa, onde uma parcela teria começado a transformar sua economia mediante, entre outros motivos, a produtividade ambiental que se estabelecia nessas áreas.

Por outro lado, a partir da década de 1990, foi apontada para o interior do Rio Grande do Sul uma série de Cerritos que não se enquadram nas características das terras baixas lagunares. Quando Schmitz et al. (1991) expandiram a tradição Vieira para essas áreas, apoiaram-se em publicações prévias de poucos autores que descreveram os sítios em suas publicações relacionando-os de alguma forma aos Cerritos litorâneos (Miller, 1969b; Copé, 1985, 1991). Contudo, as demais publicações tratavam de Cerritos construídos sem evidências de cerâmica (Schmitz, 1967; Mentz-Ribeiro, 1983), sítios que foram originalmente relacionados aos grupos Jê do Planalto (Brochado, 1969), e outros aos portadores da cerâmica Goya Malabrigo (Miller, 1969a). Tais constatações demonstram a fragilidade da definição de tradição Vieira para esses sítios do interior, sobretudo aqueles da faixa Leste-Oeste na região central do Rio Grande do Sul.

É possível perceber que sítios arqueológicos localizados no interior do Rio Grande do Sul – alguns sem evidências cerâmicas e outros com presença de poucos fragmentos – passaram a figurar como sítios vinculados à tradição Vieira, aparentemente, apenas pelo fato de apresentarem montículos ou por serem implementados sobre colinas. Entretanto, no estudo de caso do sítio arqueológico do Pororó em Pinhal Grande, mesmo sem presença de cerâmica, foi possível perceber que aquele Cerrito implementado fora do contexto das terras baixas foi um espaço construído (Garcia, 2016).

No Pororó foram encontrados apenas materiais líticos em uma construção de um grupo caçador-coletor, sem relações diretas com aqueles grupos que construíram Cerritos no litoral, não sendo encontrados nesse sítio os materiais cerâmicos outrora usados como diagnóstico da tradição Vieira. Tais evidências vêm permitindo considerar a existência de Cerritos construídos no interior de forma independente por caçadores-coletores no atual Rio Grande do Sul.

Nesse sentido, para o entendimento dos Cerritos nesse Estado, destaca-se novamente que os termos Cerrito, tradição Vieira e tradição Umbu não podem ser tratados como sinônimos. Como um paralelo para a fixação do posicionamento discutido, a realidade uruguaia auxilia a discussão trazida nesse artigo.

Cerritos sem evidências de cerâmicas estão presentes no Uruguai, contudo nos contextos do país vizinho foram observadas continuidades diretas ligadas ao surgimento de montículos da região pampiana, havendo sobreposições com datas quase contínuas entre as ocupações pré-Cerrito, início das primeiras construções, surgimento de cerâmica, evidências de cultivos e início das atividades funerárias. Esses indicativos são tratados nas obras de Mazz (1999, 2001), Iriarte (2006) e Mazz et al. (2011).

Frente aos indicadores apresentados, considera-se então a existência de diferentes fenômenos de Cerritos no Rio Grande do Sul, sendo possível nesse momento apontar pelo menos duas realidades distintas. A primeira ligada a grupos sedentários pescadores-caçadores-coletores que praticavam horticultura, possuíam cerâmica e ocuparam as terras baixas litorâneas em um período entre aproximadamente 5000 AP e a conquista iberoeuropeia. E a segunda relacionada a grupos nômades caçadores-coletores do interior, de cronologia ainda pouco conhecida devido a poucas pesquisas na área, mas que emerge como um tema promissor de pesquisa para o Rio Grande do Sul.

Notas

1. Data calibrada em dois sigmas com software Oxcal 4.2, base SHCAL 13, em uma das datas mais antigas de Cerritos, 4600 ± 60 AP no sítio Cráneo Marcado (Capdepont et al., 2004).

2. Data calibrada em dois sigmas com software Oxcal 4.2, base SHCAL 13, a partir da data mais antiga disponível até o momento para Cerritos na Argentina, 1640 ± 70 AP no sítio Túmulo Campaña 2 (Castiñeira et al., 2014).

3. Dois sigmas aplicados na data 2600 ± 195 AP, obtida por termoluminescência para o Corredor do Bolso, sítio com a data mais recuada no Brasil para estas estruturas (Soares, 2004). Desvio padrão adquirido por Correspondência do físico nuclear Shigueo Watanabe, do Laboratório de Cristais Iônicos, Filmes Finos e Datação (LACIFED), São Paulo (SP), enviada por e-mail ao arqueólogo Anderson Marques Garcia.

4. O mesmo capítulo de Bety Meggers e Clifford Evans foi publicado 1977, no livro Ancient Native Americans, do mesmo editor citado aqui.

5. Também denominadas como boleadeiras mamilares.
6. Haveria outro conjunto de “aterros” a Norte, distante em aproximadamente 160 km do primeiro, junto ao afluente Fiuza do rio Ijuí.

7. A fase Itaqui não foi formalmente associada com a tradição Umbu, mas possui pontas de projéteis semelhantes.

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