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Revista del Museo de Antropología

versión impresa ISSN 1852-060Xversión On-line ISSN 1852-4826

Rev. Mus. Antropol. vol.12 no.2 Córdoba ago. 2019

http://dx.doi.org/10.31048/1852.4826.v12.n2.25237 

DOSSIER

http://dx.doi.org/10.31048/1852.4826.v12.n2.25237

MINOM a serviço da vida

MINOM at the service of life

Mario de Souza Chagas* y Marcele Pereira**

*Professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Diretor do Museu da República e Presidente do MINOM. pmarosc@gmail.com

**Professora da Universidade Federal de Rondônia - UNIR. Pró-Reitora de Cultura, Extensão e Assuntos Estudantis da UNIR. Atual Vice Presidente do MINOM junto com o Professor Mario Moutinho. Marcelle.pereira@unir.br

 

Recibido 29-04-2019.

Recibido con correcciones 05-07-2019.

Aceptado 20-08-2019

 

O Movimento Internacional para uma Nova Museologia – MINOM, realizou sua XVIII Conferência Internacional na cidade de Córdoba (Argentina), por meio da Associação de Trabalhadores de Museus – ATM1, projeto coletivo que prioriza socializar e difundir a situação dos museus argentinos, com destaque para as condições de trabalho de seus trabalhadores buscando a melhoria da formação profissional e do Espaço Encontro de Educadores de Museus2, coletivo de trabalhadores de museus que se dedicam a tarefa de interpretar o patrimônio, por meio da promoção de práticas comprometidas social e politicamente, visando refletir sobre o fazer educativo nos museus.

Tanto a ATM quanto o Encontro de Educadores são coletivos que se coadunam essencialmente com a missão e propósito do MINOM, tal parceria rendeu resultados incontestes e um deles foi à produção da Carta de Córdoba3 durante a realização da XVIII Conferência do MINOM, documento significativo para o cenário da museologia social.

As cartas produzidas durante as conferências do MINOM são documentos que, além de gerar ideias, posicionamentos, ações, indignação e denúncias, permitem a construção de registros históricos a partir de uma reflexão social atualizada e contribuem para que o campo dos museus e da museologia social possam se posicionar criticamente indicando condições e compromissos para o enfrentamento de questões sociais urgentes. As cartas, a partir desta perspectiva, podem ser traduzidas como ferramentas que permitem pensar em novas e outras bases para as lutas e as resistências relacionadas aos seguimentos sociais ameaçados.

O MINOM, desde sua criação em 1984, busca a integração entre profissionais, artistas e militantes sociais, com vistas a fortalecer o campo da museologia percorrendo, para isso, diferentes territórios que permitem ampliar, por meio de práticas e reflexões, a diversidade de concepções museológicas e museais atreladas à perspectiva social. Reunindo profissionais e instituições de várias partes do mundo busca zelar pelo compromisso com o debate, intercâmbio e realização de pesquisas e estudos que têm contribuído com o acúmulo de iniciativas acerca da museologia social.

Com metodologia livre, cada local sede é convidado a promover o debate a partir das suas questões inquietantes observadas em cada contexto. A partir de uma dinâmica colaborativa, participativa e com formato variado, o que importa para o MINOM é produzir deslocamentos e indignações, vontade de luta e afetos múltiplos. Por tanto é necessário afetar o outro por meio da potencia museal, importa abrir novos caminhos a partir da capacidade geradora de insubordinação e indisciplina epistemológica pretendida pelo MINOM e seus integrantes. A cada experiência acumulada, cada carta produzida, temos acrescido a Museologia Social de corpo, alma e sentidos aguerridos de pertencimento.

Em Córdoba, vivemos dias intensos de aprendizado mútuo. A partir de uma provocação local e dos eixos de discussões os participantes experimentaram oportunidades diversificadas de afetarem-se com as impressões e experiências uns dos outros e de proporem soluções e encaminhamentos para as questões suscitadas. A sensibilidade e a participação atenta dos integrantes da ATM e do Encontro de Educadores de Museus, profissionais, estudantes e as instituições acolhedoras, fizeram com que as emoções transbordassem durante todo o evento, emoções pautadas pelas trajetórias comprometidas com o entendimento de que os museus necessitam de posturas mais atuantes, com mais ênfase em questões sociais, pautados por participação de grupos e coletivos representativos de causas a partir das lógicas subjugadas. Estas inquietações proporcionaram reflexões importantes acerca da realidade sociocultural da Argentina atrelada ao campo dos museus, da memória e do patrimônio cultural em suas diferentes manifestações e possibilidades de interferência.

Para a coordenação do MINOM, grupo que contribuiu para a realização da XVIII Conferência Internacional, o mais significativo foi possibilitar condições que pudessem ampliar a percepção da necessidade de se manter na batalha pela mudança de posicionamento no campo dos museus e da museologia diante dos cenários de urgências a que muitas pessoas são submetidas diariamente. Além disso, também foi possível discutir e sugerir alternativas que pudessem pautar novos compromissos com base nos pressupostos da museologia social para ampliar a capacidade de resistir frente aos processos colonizadores dos museus e da museologia praticada na Argentina.

A partir dos eixos escolhidos pela equipe de organização local com apoio do MINOM, foram apresentadas questões problema com vistas à reflexão e a construção coletiva de enfrentamento e posicionamentos a partir do campo museal e patrimonial. O Eixo 1. Pautou a questão dos museus, ações patrimoniais e experiências educativas em espaços de privação de liberdade:

Jovens e adultos privados da liberdade são incorporados a instituições de regimes fechados que historicamente tem estado associadas a fins de controle e normalização. Esta perspectiva, que se modifica a partir do aporte dos direitos humanos, dá lugar a outras experiências possíveis -experiências liberadoras- dentro desses espaços. O museu como espaço de comunicação e de construção de sentidos, e o patrimônio como a materialidade que guarda em si a memoria e as identidades individuais e coletivas, se abre como direito e ferramenta ante a necessidade social de desenvolver possibilidades para modificar o dado (texto publicado na chamada para a XVIII Conferência do MINOM).

Ao propor como tema central a discussão sobre a inclusão de jovens e adultos incorporados a instituições carcerárias como questão a ser pensada pelo campo do patrimônio, da memória e da educação articulados a perspectiva museológica é possível observar a Museologia Social em ação. Ao assumir a responsabilidade de provocar o diálogo com vistas a ampliar as iniciativas de reconhecimento e intervenção diante do enfrentamento do tema aos direitos preservados de quem está em situação de privação de liberdade, a museologia social exerce um de seus papeis prioritários: contribuir com os processos de decolonização do pensamento e da prática museal (PEREIRA, 2018).

A segunda questão pensada e proposta para as discussões do MINOM em Córdoba dedicam-se as reflexões sobre gênero, museus e ações patrimoniais:

Vale recorrer qualquer museu do mundo para encontrar expressões artísticas ou referências materiais que contribuíram para perpetuar práticas naturalizando a desigualdade e outras formas de violência. No escapam a este debate a definição de recursos do feminino e do rol social da mulher, para pôr somente um exemplo. Diante da mudança de paradigma, vale a pena revisar como os museus e a interpretação do patrimônio que estes guardam favorecem outras construções e reconhecimentos possíveis à questão de gênero em sua ampla e rica diversidade. (texto publicado na chamada para a XVIII Conferência do MINOM)

Ambos os eixos experimentam interação com as inquietações sentidas pelos movimentos sociais e, a partir das proposições da Conferência, foi possível aprofundar, debater e somar diferentes perspectivas e proposições aos temas enfrentados. Uma das considerações mais relevantes que podem ser identificadas nas Conferências propostas pelo MINOM, está exatamente na capacidade de gerar empatia com as problemáticas sociais, indicando ação, reflexão e prestação de serviços visando transformações e a consequente mudança de realidades injustas, desiguais e também excludentes a partir dos museus e da museologia social. As trocas, a energia de apoio mútuo, as cirandas e as possibilidades de realização conjunta, solidificam um clima de generosidade e de potência fraterna que gera uma onde de paz, de solidariedade e de realização que movimentam as pequenas, ou melhor, as micro revoluções. Portanto, é possível indicar que a museologia social e o MINOM se ocupam disso.

Tal perspectiva se evidencia, quando a partir dos eixos e das discussões postas observamos a construção da Carta, documento final do MINOM Córdoba, que tem como missão difundir as considerações, encaminhamentos e compromissos assumidos durante o evento. As cartas, como já foram apontadas são ferramentas potentes para a divulgação das questões tratadas a partir da ótica da museologia social e como as instituições e profissionais se comprometem em agir em benefício das mudanças pretendidas.

Nesta direção a Carta de Córdoba assertivamente faz uma denuncia a partir de uma questão que mobilizou todo o país:

Exigimos que Santiago Maldonado nos seja devolvido vivo e exigimos também a libertação de Milagro Sala. A vida dos companheirxs apontam para a emergência de um contexto de luta que denuncia a grave situação em que vivem os povos indígenas americanos, o que implica a criminalização e a judicialização de suas reinvindicações e até mesmo de suas condições de vida, incluindo a inviabilização e a negação de que possam viver em sintonia com as suas próprias cosmovisões, onde o território é parte vital. Neste contexto, exigimos a aprovação da extensão da Lei 26.160, referente à Emergência Territorial Indígena e a revogação da Lei 26.331 do Bosque Nativo, ambas na Argentina. (Carta de Córdoba, 2017).

A partir desta construção percebemos que o campo dos museus e do patrimônio, não só se solidariza somando forças nos discursos que exigem mudanças e providências junto às autoridades, mas também se posiciona a partir do enfrentamento do campo museal impulsionando que as instituições culturais e de educação possam propor ações de sensibilização, de chamamento à luta e propostas de debates acerca dos temas que se vinculam com a demanda social. Esta postura afirma o papel dos museus frente às responsabilidades sociais, define estratégias para que os espaços museais possam refletir os anseios e contribuir com a formulação de políticas públicas que busquem diminuir as distâncias sociais e as perseguições daqueles que são submetidos a um processo de invisibilização a partir da reprodução das colonialidades do saber, do poder e do ser (MIGNOLO, 2003).

Não é difícil observar o crescente aumento das práticas antidemocráticas que assolam países no mundo todo nos últimos anos. Frequentemente vemos o retorno de questões que envolvem a privação de direitos e de dignidade das minorias étnicas, das questões de gênero e preconceito racial a que são submetidos os povos, comunidades tradicionais e urbanas negligenciados por um sistema capitalista que os impede de participar do processo de constituição de uma sociedade mais justa e igualitária.

O MINOM enquanto movimento e a partir da identificação de um cenário museológico colonizador, procura enfrentar a lógica museal dominante e homogênea propondo ações que expressem as mudanças necessárias para a consolidação do campo da museologia social como alternativa decolonizadora das práticas museais. Atuando como um aglutinador de ideias e de pensamentos acerca da museologia social que se pretende decolonial e insurgente, o MINOM carrega em sua definição o termo precursor da Nova Museologia, pois parte da construção de que o termo ainda se faz necessário e, por isso mesmo resiste, talvez alicerçado na ideia dos museus e da museologia como este lugar que se pretende novo e que se refaz constantemente em meio às lutas por emancipação em busca de processos de reaprendizado contínuo e constante do fazer museal.

Por último como destaque da construção coletiva do MINOM em Córdoba, é preciso reconhecer nas palavras inocentes e arguciosas de Noam, um grande ensinamento para todos nós. Ao propor sobre a possibilidade de gerar imaginações e compartilhá-las o menino de sete anos nos diz que é possível gerir outro mundo possível, onde as imaginações possam ser construídas a partir do bem comum refletindo a necessidade de nos conectarmos com a vida e com os afetos por ela gerados:

“Você têm que se desprender de sua própria imaginação para comunicá-la e transmiti-la aos outros. Assim, você poderá compartilhar a sua imaginação com os outros e os outros vão deixar algo para você também” (Noam, 7 anos. Participante ativo da XVIII Conferência Internacional do MINOM). (Carta de Córdoba, 2017).

Assim, ao nos relacionarmos com a produção de conhecimentos que gera indignação a partir do campo museal é possível reconhecer, no cenário atual, possibilidades múltiplas de entendimento acerca da capacidade real da vida gerar impacto sobre nossas ações e igualmente nossas ações sobre a vida. Esta não é uma relação de obviedade, ao contrário, quanto mais consciente for, mas compreendemos a afirmação título da Carta de Córdoba: “a museologia que não serve para a vida não serve para nada”. Consideramos também que os museus que não servem para a vida não servem para nada. Tanto os museus como a museologia fazem parte da vida e o posicionamento de que é necessário servir, nos faz pensar que além de ser necessário, diríamos mesmo, é imprescindível considerar que este é um servir relacionado à construção de ideias que nos mobilizem a estar vivos e, por isso mesmo, atuantes a partir da ideia de fazer o bem, de cultivar afetos, ampliar as possibilidades de equilíbrio diante das necessidades mais urgentes como a fome, a morte, os assassinatos, a intolerância e a falta de respeito com as diferenças, sejam elas quais forem.

Portanto, consideramos a prática da museologia social, antes de tudo, como uma postura diante da vida e posteriormente diante dos museus e da museologia. Uma postura que pretende estar em luta e não de luto, por isso a vida é tão importante para a construção de outros futuros possíveis. Estamos com Noam e com os integrantes do MINOM atuantes em diferentes países. Assim como eles, clamamos que não esqueçamos o sentido de estarmos juntos, que não esqueçamos os Santiagos Maldonados4 de Argentina e os Amarildos5 do Brasil, desaparecidos e encontrados mortos por sistemas castradores de liberdade e de vidas. Todas as vidas importam e todos os museus conectados com a vida importam.

Notas

1. Sobre o Coletivo Trabalhadores de Museus consultar: trabajadoresdemuseos.blogspot.com.ar

2. Sobre o Encontro de Educadores consultar: educadoresdemuseos. wordpress.com

3. http://www.minom-icom.net/files/minom_2017_-_declaracion_de_ cordoba_-_esp-port-fr-ing_0.pdf

4. Para compreender o caso de Santiago Maldonado, ativista político argentino ver: https://www.revistaforum.com.br/corpo-do-ativistaargentino-santiago-maldonado-e-encontrado-e-reconhecido-pelafamilia/

5. Para compreender o caso do desaparecimento e assassinato do cidadão brasileiro Amarildo de Souza https://www.bbc.com/ portuguese/brasil-44790123

Referências

1. Chagas, M., Primo, J., Storino, C., & Assunção, P. (2018). A museologia e a construção de sua dimensão social: olhares e caminhos. Cadernos de Sociomuseologia; v. 55 n. 11 (2018): Museologia e Direitos Humanos. Recuperado de https://revistas.ulusofona.pt/index.php/ cadernosociomuseologia/article/view?path=        [ Links ]

2. Declaración de Córdoba XVIII Conferencia Internacional de MINOM La museología que no sirve para la vida, no sirve para nada Córdoba/ Argentina, 2017. http://www. minom-icom.net/files/minom_2017_-_declaracion_de_ cordoba_-_esp-port-fr-ing_0.pdf Último acesso em 05 setembro de 2018.         [ Links ]

3. Mignolo, W. D. (2003). Histórias locais - projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Ed. UFMG.         [ Links ]

4. Pereira, Marcele R. N. (2018) Museologia Decolonal: os pontos de memória e a insurgência do fazer museal. Tese de Doutorado defendida na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – ULHT.         [ Links ]

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