Introdução
Na segunda metade do século XX, em especial nas décadas de 1970 e 1980, o feminismo acadêmico e militante contribuiu para dar visibilidade às contradições entre relações de gênero, trabalho remunerado e padrões de organização familiar, incorporou novas problematizações nas relações entre o “público” e o “privado” e demandou diversos desses aspectos como objeto de políticas públicas.
A questão adquiriu nova relevância na década de 2000 quando evidências mais consistentes mostraram a permanência dos desequilíbrios na distribuição de atividades entre o trabalho remunerado e o não remunerado e nas atribuições de gênero. Estas últimas associadas com a reprodução social da vida, “invisibilizadas” e desvalorizadas.
O ritmo de ingresso e de envolvimento das mulheres no mercado de trabalho aumentou de forma considerável, mas a alteração nos padrões de gênero na vida familiar, sobretudo, na divisão das atividades domésticas, de trabalho e do cuidado, no uso e na disponibilidade do tempo e atribuições familiares em geral, continuou bastante lenta. Essas novas configurações na organização da vida cotidiana mantinham e ampliavam a sobrecarga de atividades, as limitações na vida e nas escolhas das mulheres (Aguirre, 2007; Arraigada, 2007; Crompton & Le Feuvre, 2000).
A produção e a divulgação de conhecimento sobre essa realidade contribuem para a modificação de valores e atitudes, assim como subsidiam as formulações de políticas públicas e as demandas dos movimentos sociais de mulheres que tratam dos temas da tensão entre vida familiar, divisão do trabalho doméstico e trabalho remunerado.
Em linhas gerais, o objetivo da pesquisa “Percepções acerca das licenças maternidade e paternidade no Brasil, segundo uma perspectiva de gênero, classe e raça”, desenvolvida na Faculdade de Serviço Social, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro é analisar um bloco de questões relativas às percepções de homens e mulheres em relação aos direitos trabalhistas (licenças remuneradas) no Brasil, a partir de um survey nacional, considerando esses direitos uma fundamental ação pública de enfrentamento dos conflitos entre trabalho e responsabilidades familiares.
Como parte integrante dessa pesquisa apresentamos neste trabalho os principais resultados de uma pesquisa bibliográfica da literatura nacional e internacional que teve como objetivo caracterizar e analisar as produções acadêmicas sobre as licenças maternidade, paternidade e parental, em perspectiva comparada. A realização da pesquisa bibliográfica se deu no período de novembro/2020 a abril/2021 e ocorreu no Banco de Dissertações e Teses da Capes, na base bibliográfica Scielo e em revistas internacionais sobre as produções relacionadas aos temas indicados.
O trabalho em questão visa discutir sobre as desigualdades de gênero no trabalho remunerado e não remunerado, mediante uma análise comparativa sobre as licenças maternidade, paternidade e parental no Brasil e no mundo, suas características, o tratamento dessas garantias pelos diferentes sistemas de proteção social (cobertura dos benefícios, tempo de duração da licença e salário, fonte de pagamento) e o que eles contribuem e/ou impactam na diminuição das desigualdades de gênero no mercado de trabalho e na divisão mais equitativa do trabalho doméstico na família. A temática sobre as licenças tem passado por importantes mudanças no Brasil e no mundo no que diz respeito a sua concepção, extensão e, mais especificamente, fruto da luta das mulheres pela igualdade no trabalho. Buscaremos evidenciar os resultados das pesquisas acadêmicas no âmbito social, legislativo e político, analisando e sistematizando as principais mudanças nesses direitos trabalhistas.
A relevância do debate sobre o processo discriminatório sofrido pelas mulheres por terem o potencial de serem mães, é distinta do homem que pouco sofre discriminação no trabalho pelo seu potencial de paternidade. O acesso feminino ao mercado de trabalho se caracteriza pela precarização, pela jornada extensiva de trabalho, baixos salários, sobre determinação no desemprego e segmentação das atividades profissionais fruto das opressões relativas às demandas familiares que conformam e são também fruto das desigualdades de gênero no mercado de trabalho.
1. Os sentidos das licenças remuneradas do trabalho como enfrentamento das desigualdades de gênero no mercado de trabalho
Após o advento do capitalismo industrial a mulher trabalhadora passou a ser percebida como um problema social que necessitava de intervenção pública. Nesse contexto, os movimentos de mulheres lutaram por um tipo de Estado-providência e um tipo de cidadania que reconhecesse os direitos e as necessidades relacionadas com os riscos não só dos assalariados masculinos, mas também das mães, assalariadas ou não. Eles inspiraram e modelaram uma importante legislação sobre proteção social em diversos países, como licenças e subsídios de maternidade, abono ou salário-família, entre outros. Além disso, contribuía para a proliferação dessa legislação o crescente declínio das taxas de fecundidade. A pobreza das famílias e a questão populacional eram as causas mais importantes para a multiplicação das medidas públicas de proteção social à maternidade. A concepção das especificidades femininas no mercado de trabalho modelou as primeiras leis de proteção ao trabalho feminino, notadamente a proteção à maternidade. Em linhas gerais, a proteção à maternidade prevê medidas especiais e leis que possibilitam que as mulheres possam exercer a maternidade sem que sejam marginalizadas no mercado de trabalho, bem como exercer suas atividades produtivas sem ter que abrir mão da sua atividade reprodutiva. Desta forma, se busca garantir a igualdade de oportunidades e de tratamento para trabalhadoras e trabalhadores.
Nessa direção, há uma série de leis, normativas e convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que não cabe detalhar, mas que vão ao longo do tempo avançando na ampliação do direito à licença e ao salário maternidade. No entanto, as lutas das trabalhadoras e dos movimentos feministas apontam crescentemente para a insuficiência da licença maternidade para o compartilhamento dos cuidados entre os pais, impactando na inserção feminina no mercado de trabalho e na manutenção da desigual repartição do trabalho não remunerado na família. Apesar da crescente inserção das mulheres ao mercado de trabalho, elas não conseguem se desvincular do trabalho doméstico e de cuidados, assentado na ideia das esferas separadas de gênero, que não corresponde mais à realidade. As lutas no plano jurídico-legal se ampliaram para o reconhecimento de que trabalhadores e trabalhadoras possuem responsabilidades familiares e tais demandas ampliaram o escopo dessas licenças para incorporar os homens, através das licenças paternidade e parental. Veremos adiante o quanto esses instrumentos protetivos são eficazes para o fomento à igualdade de gênero.
No Brasil, a crescente inserção feminina no mercado de trabalho é caracterizada pela informalidade e pela precarização, pela menor jornada de trabalho, baixos salários, dificuldades na permanência do trabalho, maior presença no desemprego e em ocupação segmentadas por gênero (Bruschini, 2007).
A licença-maternidade no Brasil foi regulamentada através da criação da Consolidação das Leis do trabalho (CLT), na era Vargas e estabelecia o direito à licença maternidade de seis semanas antes do parto e seis semanas após o parto (alterada em 1967 para quatro semanas antes e oito semanas após o parto). Neste período de licença a trabalhadora tinha direito ao valor integral do salário, pagos pelo empregador. Esse direito também constituiu a garantia da dispensa da trabalhadora no horário de trabalho para a realização de consultas médicas e exames, instituiu um dia de folga remunerada para os pais trabalhadores, garantiu a mulher o direito de duas pausas diárias de 30 minutos para amamentar nos seis primeiros meses após o parto, e previa que as empresas com mais de 30 funcionárias mulheres acima dos 16 anos de idade deveriam dispor de creches. Além disso, ficou proibida a demissão de mulheres grávidas sem justa causa, garantindo o direito do retorno ao trabalho no final da licençamaternidade. Contudo, com o valor integral do salário das trabalhadoras sendo custeado exclusivamente pelo empregador, se disseminou nesse contexto uma maior discriminação de gênero no mercado de trabalho, em razão dos altos custos dos salários das trabalhadoras para as empresas. Para tentar romper com essa discriminação, em 1973, por meio de uma recomendação da OIT, a remuneração passou a ser responsabilidade da Previdência Social, que tem seu custeio feito de forma tripartite, pelos trabalhadores ou segurados, empregadores e Estado. Em 1988, com a nova Constituição brasileira, a licençamaternidade passou a ser considerado um direito social e foi ampliado o período de duração de 84 dias para 120 dias e as gestantes passaram a ter uma maior garantia de estabilidade de emprego. Foi, também, estabelecido o direito à licença paternidade de 5 dias para os trabalhadores. Em 2008, foi instituído pela Lei nº 11.700 o Programa Empresa Cidadã destinado a prorrogar a duração da licença-maternidade no Brasil em 60 dias, além dos 120 dias já estabelecidos pela Constituição. Em 2016, o benefício foi estendido aos homens, concedendo-lhes 20 dias de licença paternidade. Porém, esse benefício não é universal, sendo apenas para as empresas que dele participam e que declaram Imposto de Renda da Pessoa Jurídica com base no Lucro Real. O pagamento das trabalhadoras gestantes dos dois meses adicionais passa a ficar integralmente a cargo das empresas, e não mais do INSS, como são os 120 previstos na Constituição de 1988.
Apesar da licença maternidade atrair mais mulheres ao mercado de trabalho em virtude da proteção que oferece ao emprego, ter a possibilidade de reduzir a disparidade salarial entre homens e mulheres, fazer com que as mães tenham mais tempo de dedicação à criança, ser positiva para a saúde da mãe, diminuindo a incidência de ocorrências no pós-parto, e da criança que consegue um melhor desenvolvimento oriundo da amamentação, pode também impactar negativamente sobre o emprego feminino com a diferença de tempo entre a licença maternidade e a licença paternidade. Isso levanta diferentes questões a serem debatidas, uma delas é o fato de que as mulheres continuam enfrentando discriminação nas relações de trabalho, em razão, principalmente, de sua condição de mãe, que coloca como destino natural das mulheres a possibilidade de engravidar, e com isso reproduz o imaginário de que a maior parte das responsabilidades com os filhos é das mulheres. Outra questão é que a licençamaternidade pode se tornar prejudicial para as mulheres, pois o tempo dedicado aos filhos pode reduzir sua disponibilidade para o trabalho remunerado, tendo um impacto direto no emprego, nos salários e na carreira, em decorrência da quantidade de tempo afastadas. Com isso, surge a contradição de que mesmo que o Brasil seja um dos países que garanta um dos mais vastos períodos de licença maternidade, apesar de restrito às trabalhadoras formalizadas, é também o que assegura um mínimo período de licença paternidade e, através disso, o Estado permanece reforçando a maternidade como destino e habilidade feminina.
Os resultados quantitativos da pesquisa revelam o circuito do debate contemporâneo sobre as licenças remuneradas relacionadas à maternidade e paternidade. Categorizamos a perspectiva teóricometodológica adotada pelas pesquisas e identificamos quatro categorias: estudos das vivências e percepções sobre o conflito trabalho X maternidade/paternidade; estudos sobre a legislação trabalhista (histórico, escopo e alterações recentes); estudos comparados; e a relação entre trabalho e maternidade entre categorias profissionais específicas. A categoria dos estudos das vivências e percepções do conflito trabalho X maternidade/paternidade aparece em maior quantidade nas dissertações, teses e artigos nacionais e internacionais, seguido dos estudos sobre a legislação trabalhista que, apesar de em artigos internacionais estar em terceiro lugar, em dissertações, teses e artigos nacionais aparece em segundo. Por fim, em menor número temos os estudos comparados e trabalho X maternidade para categorias profissionais específicas. As áreas e programas de pós-graduação que mais produzem sobre o tema são o Direito e a Psicologia, responsáveis pela maior parte das produções relativas às vivências e percepções do conflito trabalho X maternidade/paternidade e os estudos sobre a legislação trabalhista. Em relação à distribuição geográfica dessa produção, no país, temos a região Sudeste com 58% das pesquisas e em seguida a região Sul, com 18%. Em relação aos artigos internacionais, a Europa produziu vinte e dois artigos, a América do Norte quatorze e Ásia e Oceania totalizaram 5 artigos. As pesquisas foram majoritariamente desenvolvidas e os artigos publicados por mulheres pesquisadoras.
No tocante ao período de tempo das produções, encontramos um amplo período relativo aos artigos nacionais e internacionais. Sobre os artigos nacionais, encontramos o período situado entre as décadas de 1990 a 2020. Nos artigos internacionais encontramos um período ainda mais amplo, compreendido entre as décadas de 1980 a 2020. Observamos que em relação às dissertações e teses as produções científicas se mostraram mais recentes e situadas na década de 2010. A diferença relativa ao período das produções evidencia que ao nível internacional, notadamente na Europa e na América do Norte, a preocupação política e acadêmica é mais antiga corroborando a importância desses direitos do trabalho na agenda de lutas das mulheres trabalhadoras. Este é um fato importante a ser destacado ao entrar no debate da história das políticas de licenças e como ela se apresenta na atualidade.
2. Vivências e percepções sobre o conflito trabalho e maternidade/paternidade
Os resultados que obtivemos no decorrer da pesquisa evidenciam e afirmam as mudanças sociais que as famílias passaram. As percepções sobre maternidade e paternidade não permaneceram análogas a décadas passadas, porém, isso não quer dizer que não existam desigualdades e discriminações no cotidiano e nas legislações.
Durante a pesquisa foi constatado que as políticas de licenças remuneradas na Europa são muito mais desenvolvidas devido aos movimentos sociais e políticos liderados pelas mulheres e sindicatos, que as levou a ter um escopo de direitos mais robusto do ponto de vista da igualdade de gênero no mercado de trabalho. Esses dados poderão ser vistos mais detalhadamente no item 3 deste artigo.
Os artigos nacionais destacam que a licença maternidade brasileira é abrangente, maleável, condicionada às condições de saúde da mulher, garantidora da integralidade e estabilidade do salário e do emprego, se comparada a outros países que, muitas vezes, condicionam a integralidade do salário ao tempo de utilização da licença ou, quando a fornece na sua totalidade, o número de semanas é menor. O maior problema da legislação brasileira é a sua restrição às trabalhadoras formais, excluindo grande parcela dessas trabalhadoras desses direitos. O problema da proteção trabalhista brasileira é sua cobertura não universal e segmentadora da clientela. (Machado, 2018; Lima, 2016; Marques, 2015; Gama, 2014). Outro aspecto destacado pela literatura nacional se refere à diferença de extensão temporal entre as licenças maternidade e paternidade, o que evidencia seu caráter desigual e sexista, pois reforça o estigma do homem provedor e da mulher responsável pela reprodução da família. (Pinheiro, 2019; Andrade, 2018).
Em 2014, foi realizada uma pesquisa bibliométrica (Vieira et al., 2014) com o tema da paternidade e se constatou que não há artigos específicos sobre os benefícios e conflitos da paternidade nas relações de trabalho/carreira. Um ponto importante foi a ampliação da licença paternidade em 2008 para trabalhadores de empresas que estão cadastrados no Programa Empresa Cidadã 1 (Pedrosa, 2018; Stolar, 2018; Colussi, 2017). As duas maiores críticas a esse programa ocorrem no contexto em que as mulheres cadastradas no PEC passam a receber salários superiores às outras mulheres que não são elegíveis para ou àquelas que permanecem no emprego informal, contribuindo ainda mais para a desigualdade da distribuição de renda entre mulheres. A segunda crítica se dá pelo fato de que ao ampliar muito mais a licença maternidade do que a licença paternidade, acaba contribuindo para a desigualdade de gênero, pois se intensifica a diferença de gênero no emprego e nas tarefas domésticas. (Stolar, 2019; Pinheiro, 2019).
Nogueira (2017) realizou pesquisa com 141 gestores de recursos humanos, no país, dos quais 74% deles trabalhavam em empresas com mais de 500 funcionários e revelou que 18% das empresas tem concedido a licença paternidade de 20 dias. Destaca que 61% dos entrevistados tem receio de que a licença de 20 dias resulte em sobrecarga de trabalho e que possa haver perda de produtividade em decorrência da ausência do trabalhador. A autora pontua que as transformações são inegáveis sobre o tema da paternidade, revelando a sua complexidade. Porém, salienta que as mulheres ainda vivenciam a dupla jornada de trabalho, seja mediante a licença paternidade contabilizada em cinco ou vinte dias seguidos e revela a sua insuficiência para o equacionamento das tensões entre trabalho e responsabilidades familiares.
Marques (2015) pondera que a legislação brasileira necessita ser aprimorada e atualizada para a realidade atual das famílias brasileiras, com vistas à diminuição da desigualdade social e de gênero, bem como desenvolver novas políticas públicas que substitua os traços arcaicos que o Brasil ainda mantém. Destaca o quão fundamental é a política de licenças remuneradas ampliar o quantitativo mulheres-mães trabalhadoras cobertas pela proteção trabalhista, incorporar os pais trabalhadores ou mesmo a família extensa, como os avós. Dessa forma, afirma a autora, surge a importância da ampliação da licença paternidade, da constituição da licença parental e das políticas familiares, que traz em pauta as políticas de cuidado às crianças e outros familiares em contexto de enfermidades (Pinheiro, 2019; Andrade, 2018; Marques, 2015). Tais alterações legais e nas políticas sociais contribuem para a redistribuição das tarefas domésticas e de cuidados no interior das famílias com repercussões relevantes para a promoção de maior igualdade no mercado de trabalho.
Em pesquisas comparativas internacionais, Andrade (2018), Silva (2015) e Cruz Silva (2016), defendem uma transformação das licenças maternidade e paternidade com o intuito de promover maior igualdade de gênero. Cruz (2016), explicita que a licença maternidade representou ganhos inegáveis para as mulheres, entretanto sua previsão original precisa de revisão. Ela exemplifica a partir da experiência de dois países, Suécia e Noruega, sobre a licença parental. A licença parental não é um debate novo na Europa. Lidbeck e Boström (2020) desenvolveram estudos a partir da perspectiva de casais onde ambos usufruíram da licença parental. As mães têm a tendência de assumir os principais cuidados aos bebês, porém esse panorama tem se modificado e é perceptível o incentivo do governo sueco em torná-la mais igualitária trazendo uma licença parental compartilhada mais justa.
No tocante às percepções e vivências, as autoras sinalizam que as responsabilidades do compartilhamento das tarefas trazem à tona uma licença ineficaz decorrente do tempo e do preconceito em torno da temática. O trabalho do cuidado é um trabalho invisível e interminável, além de não oferecer folgas, as mulheres são sobrecarregadas com tarefas da maternidade e com as tarefas domésticas. (Nogueira 2017, Lima 2016), Os resultados da pesquisa bibliográfica mostram que há 2 grandes temas que vêm sendo pesquisados e debatidos. O primeiro deles, se refere, dentro da categoria vivências e percepções sobre as licenças, às preocupações de ambos os pais com o retorno ao trabalho e as tensões entre trabalho e demandas familiares no interior das famílias - controvérsias na divisão do trabalho de cuidado entre os casais - e também no ambiente de trabalho - pressões existentes quanto à carreira, ausências necessárias para cuidar após o retorno ao trabalho, entre outros.
Outro tema de grande produção acadêmica sobre as licenças remuneradas, principalmente, nas produções internacionais, é sobre a licença paternidade e parental. No Brasil, Marques (2016) traz uma pesquisa realizada por Wagner et al., (2005) em Porto Alegre no início dos anos 2000 com 100 famílias de nível socioeconômico médio. Observa-se movimentos, práticas e comportamentos mais equitativos relacionados à divisão de tarefas na criação dos filhos. Cerca de 69% das mulheres trabalhavam fora e tinham participação no mercado de trabalho similar à dos maridos. Evidenciam uma heterogeneidade de práticas parentais e a sobreposição de modelos de paternidade também tensos e contraditórios.
As autoras Sarfati et al., (1992), realizaram um estudo no ambulatório de um hospital escola, a fim de analisar o usufruto da licença paternidade pelo pai das crianças. Visava responder qual é a importância do pai e sua participação no período perinatal e de que forma a prorrogação da licença paternidade refletiu nas atividades dos pais durante esse período. As autoras concluíram que os pais exerceram uma ou mais atividades voltadas para suas famílias, no entanto, uma parcela importante ainda desconhece seus direitos relativos à licença paternidade. Existe uma necessidade de orientação e divulgação à população com relação aos seus direitos instituídos legalmente. Foi possível observar que a paternidade vem passando por mudanças, ainda que tímidas.
Nogueira (2017) concluiu que os pais que residem nos grandes centros urbanos têm a tendência de valorizar mais o envolvimento paterno nas atividades cotidianas com os filhos pequenos e os mesmos perceberam mais impacto da paternidade na carreira, em comparação aos residentes em cidades médias ou pequenas. Inquiridos sobre a ampliação da licença paternidade, a maioria dos estudos mostra o desejo dessa ampliação e o principal motivo está relacionado ao cuidado dos recém nascidos. A maioria dos homens considera que estão aptos a cuidar das crianças pequenas e não compreendem esta atividade como algo exclusivo das mulheres. As autoras (Nogueira, 2017; Silva, 2015; Marques, 2015; Pinheiro, Galiza & Fontoura, 2009) concluem que o direito à licença paternidade precisa ter avanços e ser mais aberto a discussões, buscando uma licença mais equitativa entre homens e mulheres. Apesar desses resultados, são ainda pouco numerosos os estudos no país que abordam o tema da paternidade e os conflitos nas relações de trabalho/carreira, incluindo o papel que jogam as licenças remuneradas nesses processos.
No âmbito internacional os temas da paternidade, da licença paternidade e da licença parental são bem desenvolvidos, bem mais do que no Brasil. Após vários países da Europa terem experimentado o gozo das licenças maternidade e paternidade, bem com as diferenças na utilização desses benefícios à luz da igualdade de gênero, associada às lutas feministas nesses países, as políticas de proteção à maternidade e paternidade se ampliaram e passaram a se dar na estruturação da licença parental na maioria dos países. Muitos estudos, então, se debruçaram para analisar as experiências da licença parental. Para a maioria deles, essa licença visa a ser uma política direcionada, tanto para o bem-estar da criança, quanto para a promoção da equidade de gênero, pois potencializa o compartilhamento das tarefas domésticas e de cuidados. Ao considerar que a mãe é culturalmente associada como a principal responsável pelo cuidado com as crianças e enfrenta maior carga de trabalho, esse tipo de política tenta desconstruir essa visão, dando oportunidade para que o pai também esteja presente neste espaço e assim contribuir para a promoção da autonomia da mulher, a partir de uma divisão mais igualitária das atividades domésticas e de cuidados familiares. (Lidbeck & Boström, 2020, Abrahamsen, 2018).
Essas pesquisas evidenciam que os homens estão assumindo cada vez mais a responsabilidade pelo cuidado de seus filhos. Os resultados demonstraram uma tendência à que os casais dividam a licença parental de forma igual, transferindo a responsabilidade pelo cuidado dos filhos para o pai quando a mãe regressava ao trabalho. Os pais demonstraram ansiedade pelo período em que se tornaram os principais cuidadores dos seus bebês, já as mães demonstram uma insegurança frente ao cuidado solo do pai, porém ressaltaram que os pais são igualmente importantes como cuidadores dos filhos. As mães relataram também um sentimento confuso sobre a licença parental, onde o medo e a insegurança são sentimentos presentes. Relataram que confiavam na capacidade do pai em assumir o papel de cuidador principal e que era importante que não dependesse de sua orientação direta para facilitar a confiança e a liberdade dos pais de criarem suas próprias formas de cuidar dos filhos. Foi observado que o processo de responsabilidades de cuidar dos filhos entre os pais se modificava em cada família, cada família apresentava desafios diferentes. Embora as descrições das mães revelassem alguma luta na entrega da responsabilidade e controle, elas buscavam demonstrar confiança em seus parceiros para atender as demandas das crianças. (Lidbeck & Bostöm, 2020)
Nos últimos anos, um número crescente de países introduziu políticas destinadas a encorajar o uso da licença parental pelos pais, como uma "cota paterna" que reserva o tempo de licença parental para uso exclusivo dos pais. Como um país pioneiro, a Noruega introduziu uma cota para o pai em 1993 que reservava quatro semanas de licença parental para os pais. Muitos países seguiram este exemplo e programaram políticas semelhantes. Na verdade, a União Europeia incentiva seus estados membros a aprovar políticas que promovam uma divisão mais igualitária entre os sexos na licença parental, determinando que pelo menos um mês de licença parental para cada pai seja fornecido em uma base intransferível. (Machado, 2018, Marques, 2015).
3. Análise comparativa das licenças no mundo
Buscaremos apresentar uma sistematização das pesquisas que abordaram as licenças remuneradas relacionadas à maternidade e paternidade de forma comparada evidenciando as diferenças desses direitos ao redor do mundo, suas alterações e avanços recentes. (Melo 2019; Machado 2018; Silva, 2015; Bennhold, 2010; Valdimarsdóttir, 2006). As tabelas construídas apresentam e discutem, brevemente, as características comparadas das licenças maternidade, paternidade e parental em grande parte dos países no mundo ocidental e fornecem um cenário atualizado do seu escopo, alterações legais, cobertura e tipo de provisão estatal.
Caracteristica das Licenças no Mundo | |||||
Países | Licença Maternidade | Licença Paternidade | Licença Parental | Valor / salário | Fonte do beneficio |
Continente Europeu | |||||
França | 16 semanas | 7 dias obrigatório | 28 dias no total sendo 7 são obrigatórios e o restante se torna facultativo. | Maternidade = 100% Paternidade = 100% | Seguridade social |
Itália | 21,7 semanas | 10 dias | 10 meses (até doze anos da criança sendo dividido entre o casal) | Maternidade = 80%, Paternidade = 100%, Parental: 30% até os 6 anos e não remunerado dos 6 aos 12 anos. | Istututo Nazional Previdencia Sociale (INPS) |
Islandia | - | - | 39 semanas. Neste tempo, 13 semanas reservadas separadamente para mães e pais. As 13 semanas restantes podem ser divididas entre casal. | 80% para ambos os pais | Seguridade social |
Alemanha | 14 semanas | - | 3 anos de duração ( decisão feita pelo casal) | Maternidade e Paternidade = 100% (50% empregador e 50% seguro saúde) no primeiro ano e nos anos subsequentes sem remuneração | Empregador/ seguro de saude |
Portugal | - | - | 120 dias a 150 dias (decisão feita pelo casal) | 120 dias = 100%, 150 dias = 80% | Seguridade social |
Noruega | 13 semanas antes do parto e 10 semanas após o parto | 2 semanas | 46 ou 56 semanas, 14 semanas para reservado para ambos os pais. | 46 semanas = 100%, 56 semanas = 80% | Seguridade social |
Suécia | 90 dias (os primeiros 30 dias, os pais podem tirar juntos) | 90 dias (os primeiros 30 dias, os pais podem tirar juntos) | o restante (300 dias) fica a criterio do casal a divisão | 390 dias = 80% | Seguridade social |
Espanha | 16 semanas | 16 semanas | - | 100% | Seguridade social |
Fonte: Elaboração própria, a partir da pesquisa bibliográfica
França - Em 2016, a licença maternidade para o primeiro ou segundo filho era de 16 semanas: 6 semanas antes do parto e 10 semanas depois do parto. Esse número de semanas varia a partir do terceiro filho. Todavia, os direitos relacionados aos pais eram de apenas 3 dias de licença pelo nascimento e mais 11 dias de licença parental que podem ser usufruídos consecutivamente dos 3 dias até o 4o mês de vida do recém-nascido (Melo, 2019). Em 2020, segundo o Jornal O Globo (2020), se ampliou a licença parental para 28 dias (7 são obrigatórios) em prol de promover igualdade de gênero e incentivar o vínculo entre pais e filhos. Para as mães a licença permanece em 16 semanas.
Itália - A licença maternidade é de 21,7 semanas (equivalente a 5 meses), sendo pago um valor de cerca de 80% do salário mensal. A licença paternidade é de 10 dias. A licença parental é válida aos pais naturais e adotivos que podem usufruir por 10 meses até os 12 anos de vida da criança, sendo dividido e decidido pelos pais, recebem 30% se o filho for menor de 6 anos e não é remunerada se a criança tiver entre 6 e 12 anos. Na Itália a trabalhadora gestante pode solicitar o afastamento antecipado por complicações ou risco na gravidez e também tem direito a 80% do salário. As mães têm o direito de serem dispensadas 1 hora mais cedo até o primeiro ano de vida da criança e de optarem por acumular e usufruir essas horas da maneira que preferirem. (Addabbo et al., 2021)
Islândia - Possui um sistema de licença parental fortemente igualitário com 39 semanas de licença. Nesse tempo, mulheres e homens obtêm a mesma quantidade de licença, três meses cada, de maneira intransferível. O casal recebe também três meses adicionais que podem ser compartilhados, como os pais preferirem. As duas políticas públicas que merecem destaque nesse contexto é a assistência à infância e a licença parental, o que possibilita a participação mais ativa das mulheres no trabalho remunerado e contribui no enfrentamento à discriminação que sofrem no mercado de trabalho (Belle, 2016; Valdimarsdóttir, 2006). Os países nórdicos (Dinamarca, Suécia, Noruega, Islândia e Finlândia) ocupam os quatros dos cincos lugares de menor índice de diferenciais de gênero no mercado de trabalho.
Alemanha - Fez um enorme progresso na temática das licenças no sentido de atenuar as desigualdades de gênero. Historicamente os parâmetros culturais da Alemanha eram bastante conservadores, porém isso mudou em meados dos anos 2000, quando o país implementou políticas mais igualitárias e em prol de ajudar as mães a voltarem ao mercado de trabalho. Atualmente, as mães na Alemanha têm direito a 14 semanas de licença de maternidade (cerca de três meses) com salário integral. Algo a ressaltar em comparação aos demais países é que a licença maternidade alemã é hoje uma das mais baixas da Europa. Ademais, mães e pais alemães podem gozar a licença parental por 3 anos e a decisão do tempo a ser usufruído fica a critério do casal. No entanto, recebem cerca de 100% do salário no primeiro ano e nos anos seguintes sem pagamentos. Em 2007, a Alemanha criou uma política de apoio à família com o objetivo de aumentar a taxa de natalidade. (Machado, 2018)
Portugal - Em 2019 ocorreram mudanças no código do trabalhador que substituíram as licenças maternidade e paternidade pela licença parental. As novas medidas têm o intuito de tornar mais igualitários os benefícios no tempo e no pagamento. A licença parental tem a duração de 120 ou 150 dias consecutivos, podendo ser compartilhados entre o casal. Se o casal optar pelo compartilhamento de licença, ganha o acréscimo de 30 dias extras, totalizando 180 dias. A licença parental quando atribuída somente às mães, elas podem gozar de 30 dias de folga antes do parto e 6 semanas posteriores ao parto. A licença parental atribuída exclusivamente aos homens tem a duração total de 25 dias úteis, 15 são obrigatórios e precisam ser utilizados nos 30 dias seguintes ao nascimento e os 10 dias facultativos podem ser utilizados consecutivamente ou não. (Melo, 2019; Machado, 2018)
Noruega - a licença parental tem a duração de 46 ou 56 dependendo do nível de pagamento e podendo chegar a 49/59 semanas com as 3 semanas antes do nascimento. Vale ressaltar que cerca de 14 semanas é reservado para ambos os pais. Nas primeiras 46 semanas o valor do benefício é integral. Se o casal usufruir as 56 semanas o valor é reduzido para 80% do salário. A Noruega permite que os pais dividam as semanas restantes, mas não há nenhum sistema de bônus que encoraje um uso similar desse tempo pelos pais. No entanto, os pais noruegueses utilizam 40% de todos os benefícios de licença parental. (Brandth & Kvande, 2018)
Suécia - Em 1974 se tornou o primeiro país do mundo a oferecer a licença paternidade e estender aos pais esse direito. O objetivo era que o casal recebesse seis meses de licença, dividido igualmente entre ambos. Nos anos 1990, cerca de 90% dos dias de licença foram usufruídos pelas mulheres e os homens transferiram para as mulheres os seus dias. Dessa forma, o governo criou mecanismos, nomeando cotas para os pais, onde trinta dias eram obrigatórios ou seriam perdidos se não fossem usados. Após sete anos esse modelo foi modificado para 60 dias. Atualmente a licença é de 480 dias para o casal e nos primeiros 390 dias quem optar por usufruir da licença recebe cerca de 80% do salário, pago pelo Estado. O restante da licença não é remunerado. (Bennhold, 2010; Valdimarsdóttir, 2006).
Espanha - As licenças na Espanha sofreram modificações no ano de 2021. A licença paternidade passou a ser totalmente equiparada à licença maternidade. Sendo assim, ambos recebem 16 semanas e suas licenças são 100% remuneradas e intransferíveis.
Característica das Licenças no Mundo | |||||
Países | Licença Maternidade | Licença Paternidade | Licença parental | Valor/ Salário | Fonte de benefício |
Continente Americano | |||||
Canadá | 17 semanas | - | 35 semanas é permitido o compartilhamento entre o casal. Essa licença pode ser solicitada após a licença maternidade acabar. | - | Seguridade social |
EUA | 6 a 12 semanas | - | - | a porcentagem varia nos Estados. | - |
Brasil | 120 dias (17 semanas) + 60 dias no programa empresa cidadã. | 5 dias consecutivos, se as empresas estiverem cadastradas no programa empresa cidadã, o prazo será estendido para 20 dias | - | 100% | INSS/Segurida de Social |
Uruguai | 14 semanas para funcionários do setor privado e 13 semanas para o setor público. | 10 dias | subsídio parental para servidores do setor privado, licença de meio período ou ter a jornada de trabalho de 4 horas díarias | 100% | Seguridade social/ Empregador |
Argentina | O período é de 90 dias de afastamento - A lei prevê que a mulher afaste-se do trabalho 30 dias antes do parto previsto e retorne após 60 dias , ou divida o afastamento entre 45 dias antes do parto e 45 após ele, o que é considerado um tempo reduzido | 20 dias | - | 100% | Seguridade Social |
Chile | 18 semanas | 5 dias | 12 a 18 semanas de duração, podendo compartilhar a apartir das 7 semanas com os pais | 100% | Seguridade Social |
Fonte: Elaboração própria, a partir da pesquisa bibliográfica
Em relação ao continente americano, os Estados Unidos e Canadá não são referência nessa temática. Os direitos são restritos e reafirmam o machismo enraizado nas políticas e nos direitos do trabalho. O movimento legislativo em prol do estabelecimento de uma licença mais igualitária é discreto e lento. No entanto, as altas taxas de participação feminina no mercado de trabalho se contrapõem à realidade dos demais países do continente.
A América Latina possui fortes indicadores de desigualdade de gênero no trabalho, em relação à renda, jornada e reconhecimento legal. Porém, alguns desses países já se propõem a dar um passo em direção a equidade de gênero no trabalho produtivo e reprodutivo, através da introdução da licença parental. (Andrade, 2018; Lupica, 2016; Addati, Cassier & Gilchrist, 2014; Pautassi e Rico, 2011).
Canadá - As licenças são divididas em duas modalidades: pregnancy leave, que é exclusiva para as mães e parental leave que é compartilhada entre ambos os pais. A pregnancy leave tem a duração de 18 semanas e a parental leave pode durar até 35 semanas e é permitido que seja compartilhada entre o casal. Vale ressaltar que essa licença pode ser usufruída após a licença maternidade. (Machado, 2018; Addati, Cassier & Gilchrist, 2014)
Estados Unidos - A legislação não prevê a obrigação das empresas de conceder licença maternidade às mulheres e pode variar de acordo com as leis de cada estado. O período da licença pode variar entre 6 a 12 semanas e a porcentagem do salário pode mudar ou até mesmo não ter, de acordo com cada estado e categoria profissional. (Pinheiro, 2019; Addati, Cassier & Gilchrist, 2014)
Argentina - O período da licença maternidade é de 90 dias, período inferior às recomendações de organizações globais de quatro meses. A lei prevê que a mulher se afaste do trabalho 30 dias antes do parto e retorne após 60 dias ou divida o afastamento entre 45 dias antes do parto e 45 após o mesmo, o que é considerado um tempo reduzido. A mulher pode negociar com a empresa três ou seis meses adicionais de licença não remunerada com o empregador, que deve ser avisado ainda durante a licença maternidade padrão. Neste período, é mantida a estabilidade, mas não há remuneração até o retorno ao trabalho. A licença paternidade recentemente teve uma ampliação de 5 dias para 20 dias. (Pautassi e Rico, 2011)
Chile - Atualmente a licença maternidade tem um período de duração de 18 semanas, sendo 6 semanas antes do parto e 12 semanas após o parto e é um direito que não pode ser renunciado. Sua remuneração é integral e tem o Estado como fonte de pagamento. A licença paternidade no Chile tem a duração de cinco dias corridos. Recentemente, foi instituída a Licença pós-natal/parental que entende a licença maternidade em 12 semanas (período integral) ou 18 semanas (meio período), podendo esse período ser compartilhado com o pai a partir da 7ª semana. A licença também é estendida em caso de nascimento prematuro ou criança com baixo peso. (Andrade, 2018; Lupica, 2016)
Uruguai - Atualmente a licença maternidade tem a duração de 14 semanas, sendo 6 semanas antes do parto e 8 semanas após o parto e 6 semanas de licença para quando é adotante. A licença paternidade tem a duração de 10 dias e a remuneração integral é paga pelo Estado. Os pais que adotam têm 13 dias corridos também com remuneração integral. Em 2013, o país implementou a licença parental que é chamada de Subsídio Parental para Cuidados. Ela permite que todos os trabalhadores que são contemplados pela licença maternidade e paternidade, do setor privado, usufruam do direito de uma licença de meio período ou ter uma jornada de trabalho de 4 horas diárias, sendo sua remuneração financiada metade pelo Estado e metade pelo empregador. Esse direito dá aos pais a escolha de quem entre eles pode utilizar, só não podendo utilizá-lo ao mesmo tempo. As mulheres podem utilizar após o fim da licença maternidade e os homens sempre que quiserem. Sua duração é de 3 a 4 meses. (Idem)
4 - Considerações Finais
A questão de fundo que move essa investigação é refletir, no caso brasileiro, sobre os mecanismos mais adequados de conformação de políticas sociais e de trabalho visando promover maior igualdade de gênero no mercado de trabalho e no interior das famílias. Ao contrapor as características da inserção no trabalho e as demandas familiares, por gênero, com a estrutura das políticas de suporte para responder essas demandas conseguimos identificar as potencialidades e lacunas da legislação trabalhista brasileira para atingir essas tensões.
Não obstante as percepções e atitudes assentadas no gênero não serem modificadas por força de Lei, diversas investigações evidenciam o impacto quantitativo e qualitativo da intervenção estatal e esse estudo também os corrobora. Países que possuem um arcabouço protetivo robusto são mais exitosos no incremento da igualdade de gênero no trabalho e na família. Esses avanços são frutos da ressignificação que os movimentos feministas implementaram ao longo de décadas mudando e ampliando a concepção da licença maternidade para incorporar o valor ético e político da igualdade de gênero no mercado de trabalho e na divisão do trabalho doméstico e de cuidados nas famílias, aspecto ainda muito resistente a mudanças e berço das desigualdades de gênero em diversos âmbitos da vida social. Nesse sentido, as mudanças legais observadas nas últimas décadas para a criação e adequação da licença paternidade e, em alguns países, a reformulação da licença parental representam um avanço importante.
As diferenças entre os países no tocante a esses direitos evidenciam uma trajetória de luta feminista, estrutura de inserção feminina no mercado de trabalho e sistemas de proteção social e trabalhista diversos. Na América Latina e no Brasil, essas características se mostram mais agudas em termos das desigualdades de gênero no mercado de trabalho, da errância da luta política em torno dos direitos do trabalho e de sistemas de proteção social segmentados e familistas. O Brasil permanece com legislações sociais e trabalhistas antiquadas e machistas. Um forte exemplo é o período diferenciado entre a licença maternidade e paternidade e quando há algum tipo de expansão ele ocorre para aquelas (es) trabalhadoras (es) que já possuem um importante arcabouço protetivo, agudizando as desigualdades entre mulheres do setor formal e informal de trabalho. Ademais, não há avanços no legislativo brasileiro para a implantação da licença parental que permanece adormecida nos meandros da câmara dos deputados.
Ao trazer o tema da proteção das mulheres no mercado de trabalho tencionada pelas demandas familiares, no Brasil, é muito importante ressaltar que a informalidade é uma característica central, de modo que a atuação do Estado - via políticas sociais assentadas no trabalho formal - para amenizar essas tensões são ineficazes e excludentes. Com efeito, ganha ares dramáticos com as recentes reformas trabalhista e previdenciária.