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Trabajo y sociedad

versão On-line ISSN 1514-6871

Trab. soc.  no.30 Santiago del Estero jun. 2018

 

ESCENARIOS RURALES: ESTRATEGIAS LABORALES Y AGRONEGOCIOS

Condições de trabalho e saúde de plantadores de verduras de um município brasileiro 

Condiciones de trabajo y salud de plantadores de verduras de un municipio brasileño 

 Work and health conditions of vegetable planters from a Brazilian municipality

 

Stênio Trevisan Manzoli*  Aparecida Mari Iguti**  Inês Monteiro***

* Doutor em Ciências da Saúde. Enfermeiro. Prefeitura Municipal de saúde, Paulínia – Brasil.
** Professora associada, Departamento de Saúde Coletiva – Faculdade de Ciências Médicas. Universidade Estadual de Campinas – Brasil.
*** Professora associada, Faculdade de Enfermagem. Universidade Estadual de Campinas – Brasil. inesmon@unicamp.br

 


RESUMO

Este estudo exploratório objetivou identificar o perfil, estilo de vida e condições de saúde e trabalho de trabalhadores de um pequeno estabelecimento/ propriedade produtora de verduras em município de Minas Gerais – Brasil e 53 trabalhadores responderam ao Questionário de dados sociodemográficos, estilo de vida e aspectos de saúde e trabalho – QSETS para coleta de dados. A maioria era jovem (média de 28,8 anos, variando entre 17 a 60 anos); do sexo masculino, casada, com filhos; 75,5% tinham até sete anos de estudo (fundamental incompleto) e 86,6% possuíam vínculo empregatício formal. A maioria relatou atividades nas principais etapas das culturas, plantio, tratos culturais e colheita. Foram relatadas questões relacionadas às condições de trabalho e uso do corpo: permanência em posturas cansativas prolongadas, de pé, agachada, carregamento de peso e movimentos repetitivos. Parte dos trabalhadores (39,6%) relatou exposição aos agrotóxicos. Em relação à saúde, 43% dos trabalhadores relataram algum tipo de doença e 60% dos que tiveram dor nos últimos seis meses ou se expuseram aos agrotóxicos, consideraram a saúde pior ou um pouco pior que pessoas com a mesma idade. A pesquisa permitiu descrever o trabalho na cultura de hortaliças identificando-se a necessidade de adoção de medidas de prevenção, em particular nas questões do sistema musculoesquelético e exposição aos agrotóxicos a fim de evitar o adoecimento.

Palavras-chave: Saúde do trabalhador; Condições de trabalho; Trabalhadores rurais; Estilo de vida

RESUMEN

Este estudio exploratorio con el fin de identificar el perfil, estilo de vida y condiciones de trabajo y salud de los trabajadores de un pequeño establecimiento /propiedad productora que producen verduras en municipio de Minas Gerais - Brasil, con 53 trabajadores y ao Questionário de dados sociodemográficos, estilo de vida e aspectos de saúde e trabalho – QSETS para recoger datos. La mayoría eran jóvenes (promedio de 28,8 años, variación 17 a 60 años); varón, casado, con hijos; 75,5% tienen hasta siete años de educación y 86,6% tienen contracto formal. La mayoría reportó actividades en las principales etapas de los cultivos, la siembra, el cultivo y la cosecha. Se han reportado problemas relacionados con las condiciones de trabajo y uso del cuerpo: permanecer en posturas extenuantes prolongados, de pie, en cuclillas, la carga de peso y movimientos repetitivos. Están expuestos a los pesticidas 39,6%. En relación con la salud, 43% de los trabajadores reportó algún tipo de enfermedad y 60% de los que tenían dolor en los últimos seis meses / fueron expuestos a los pesticidas consideraban la salud empeora o algo peor que las personas de misma edad. La investigación permitió describir el trabajo en el cultivo de hortalizas que identifican necesidad de adoptar medidas preventivas, sobre todo en los problemas del sistema músculo-esqueléticos y la exposición a los pesticidas con el fin de prevenir la enfermedad.

Palabras clave: Salud laboral; Condiciones de trabajo; Trabajadores rurales; Estilo de vida

ABSTRACT

This exploratory study aimed to identify the profile, lifestyle and health and working conditions of workers from a small establishment/ producer property in a municipality of Minas Gerais - Brazil, with 53 workers, and the questionnaire - Questionário de dados sociodemográficos, estilo de vida e aspectos de saúde e trabalho – QSETS were used for data collection. Most were young (mean 28, 8 years, ranging from 17 to 60 years); male, married, with children; 75.5% had up to seven years of schooling (fundamental incomplete education) and 86.6% had a formal employment relationship. The majority reported activities in the main stages of crops, planting, cultivation and harvesting. Issues related to working conditions and the use of the body was reported: permanence in long tiring postures, standing, crouching, weight bearing and repetitive movements; and 39.6% were exposed to agrochemicals. Regarding health, 43% of workers reported some type of illness and 60% of those who had pain in the last six months or exposed to pesticides, considered their health worse or a little worse than people of the same age. The research allowed us to describe the work in the vegetable culture, identifying the need for the adoption of preventive measures, in particular in the questions of the musculoskeletal system and exposure to pesticides in order to prevent illness.

Key words: Occupational health; Working conditions; Rural workers; Life style

Licencia Creative Common: https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode


 

SUMARIO

1. Introdução. 2. Método. 3. Perfil dos trabalhadores. 4. Atividades e condições de trabalho. 5. Perfil dos plantadores de verduras. 6. Considerações finais. 7. Bibliografia

*****

1. Introdução

Este estudo tem por objetivo descrever as condições de vida, saúde e trabalho de trabalhadores de um pequeno estabelecimento/ propriedade produtora de verduras de um pequeno município do sul do Estado de Minas Gerais, que integra a região Sudeste, no Brasil.
É importante compreender a realidade social que perpassa o país, no final do século XX e início do século XXI, pois, como afirma Octavio Ianni (2002, p. 29):

Dada à intensa e generalizada transnacionalização das atividades econômicas, políticas e culturais (...), modificam-se (...) os territórios e as fronteiras adquirem outros significados (...). Ocorrem modificações importantes no tecido da sociedade, compreendendo as condições de vida e trabalho, produção e reprodução: no campo e na cidade, agricultura e indústria, escola e família (...). A dinâmica das atividades econômicas, políticas e culturais ou sociais, em sentido amplo, adquire ritmos e versatilidade excepcionais, dada a intensa e generalizada incorporação de tecnologias eletrônicas. Aos poucos, ou de repente, as coisas, as gentes e as ideias revelam-se migrantes, volantes, desterritorializadas, ubíquas.

Nesta perspectiva cabe destacar que no final do século XX ocorreram importantes transformações na economia brasileira, em parte, condicionadas pelo capital internacional, com relevante contribuição do setor agrícola.
Embora o agrobusiness domine o discurso governamental e a mídia brasileira e mostre seu poder econômico com a concentração de propriedades, do consumo da água, dos bens e da produção, como parte da lógica capitalista para exportação de ‘commodities', atendendo a lógica internacional que faz do país um produtor de bens primários, este setor apresenta baixos percentuais de produção de produtos alimentícios. Já os pequenos agricultores são responsáveis por mais de 70% dos produtos alimentícios para o consumo interno do país (Serenini e Malysz, 2014).
Destaca-se sua contribuição para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), em média 3,1% ao ano, considerando-se o final dos anos 1990 até o ano de 2012. A região Sudeste, que engloba os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo, apresentou o maior crescimento quando comparada às outras quatro regiões brasileiras, tanto no período de 1995-1997 (34%), quanto no de 2008-2010 (31%). As principais culturas da região Sudeste são a de cana-de-açúcar, café, laranja, milho e soja (Banco Central, 2012).
Segundo dados do último censo agropecuário (2006), os pequenos agricultores representavam 84,4% dos 5.175.489 estabelecimentos rurais, ocupando 24,3% do território nacional enquanto o agronegócio ocupava 249,7 milhões de hectares (75,7%). Além disso, os pequenos ocuparam 12,3 milhões de pessoas (74%), enquanto os grandes, 4,2 milhões (26%). Em termos populacionais, segundo o Censo Demográfico de 2010, 30 milhões de pessoas viviam em áreas rurais, 15% dos brasileiros (IBGE, 2011) (Dulci, 2016). Observando dados dos bancos públicos, os principais operadores das linhas de crédito agrícola, os grandes empreendimentos receberam R$ 65 bilhões na safra 2008/09, R$ 92,5 bilhões na safra 2009/10 e R$ 100 bilhões na safra 1010/11. Os pequenos agricultores receberam R$ 13 bilhões na safra 2008/09, R$ 15 bilhões na safra 2009/10 e R$ 16 bilhões na safra 2010/11, valor aproximado mantido no plano /safra 2011/12 (Serenini e Malysz, 2014).
Dos 5.563 municípios brasileiros, 45,2% possuem até 10 mil habitantes, 25,2% entre 10 mil e 20 mil, 18,7% entre 20 mil e 50 mil habitantes e aproximadamente 5 mil possuem menos de 50 mil habitantes e somente 10,9% com mais de 50 mil habitantes (IBGE 2010). As zonas urbanas dos pequenos municípios não podem ser alinhadas às das grandes cidades como São Paulo e de outras capitais e os estudos sobre a ‘nova ruralidade brasileira', mostram que as populações da maior parte das cidades do país possuem fortes traços, laços e hábitos rurais. Municípios de 3 mil, 5 mil, 7 mil habitantes são, na realidade, municípios rurais, alterando a percepção do que seria a população rural e de sua magnitude, com uma projeção ao menos do dobro do que o último censo indicou (Dulci, 2016).
No Brasil, a produção de alimentos conta com modalidades variadas referentes ao modo de produção, posse da terra, tamanho das propriedades e as regiões. Um importante aspecto a ser destacado é que as produções destinadas ao mercado externo contam com financiamento público de grande vulto. Além disso, a introdução de tecnologias - mecânicas, químicas, biológicas e eletrônicas, tem modificado o cenário agrícola, alterando a organização do trabalho, reduzindo a necessidade de mão de obra intensiva, - em determinadas etapas do ciclo agrícola o uso intensivo ainda se mantém em atividades pouco qualificadas e de alta intensificação do trabalho, pesado e repetitivo, para
trabalhadores sazonais precarizados. Por exemplo, estudos no setor frutícola tem registrado o impacto do desenvolvimento em algumas regiões na geração de emprego e novas oportunidades de trabalho. Os produtores buscam as inovações tecnológicas - poupadoras de mão de obra - para aumentar a produtividade e os trabalhadores, estimulados pelos índices de crescimento do setor, passam a se mobilizar, visando capitalizar, para a categoria, os avanços da fruticultura; insinuam-se, pois, disputas por melhores salários e profissionalização, como consta da pauta de reivindicações (Cavalcante, 2004).
A produção de alimentos hortifrutigranjeiros, cujo consumo é geral, diário e contínuo,é fundamental para a sociedade. A produção em larga escala de verduras e hortaliças visa abastecer principalmente os mercados como os da Grande São Paulo, Brasil, e estes produtos são diariamente enviados à Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (CEAGESP) e distribuídos aos varejistas. A produção de hortaliças consumidas na capital paulista localiza-se nas cidades do interior paulista e no sul mineiro e mais de 90% da produção desses municípios vão para a capital paulista, estimuladas pelas boas condições de infraestrutura oferecidas pelo Estado de São Paulo, que permitem o rápido escoamento da produção altamente sensível às alterações climáticas (Moraes, 2002). A região do sul de Minas Gerais, localizada na região Sudeste do Brasil, produz e encaminha diariamente para a capital paulista aproximadamente 2700 caixas de hortaliças (Moraes, 2002). A redução de áreas agrícolas e o elevado custo de terras e de mão de obra na região da Grande São Paulo também são razões do distanciamento entre as áreas produtivas e consumidoras.
Em pesquisa que analisou os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD 2008 (Maia & Rodrigues, 2010, p. 758) apontou que

(...) os resultados da análise descritiva reforçam as expressivas diferenças na composição da estrutura ocupacional agrícola e não agrícola. Em termos de características socioeconômicas, os ocupados do setor agrícola apresentam, por exemplo, idade média mais avançada, maior proporção de negros; menores níveis de escolaridade; inserção mais precária no mercado de trabalho no que se refere ano que se refere à renda e jornada de trabalho. Além disso, prevalecem nas regiões menos desenvolvidas e se declaram em bom estado de saúde em menor proporção do que os ocupados não agrícolas.

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios- PNAD rural 2013 mostram que o grupo de atividade econômica horticultura e floricultura ocupava 239.090 trabalhadores no país, 5,9% do total de empregados (DIEESE, 2014). Considerando a grande importância econômica e social das atividades agrícolas, existem poucos estudos focados nos aspectos da saúde e segurança. A maioria dos estudos existentes está relacionada ao desenvolvimento de tecnologias para aumento da produção na agropecuária, com menor ênfase na saúde e segurança dos trabalhadores (Frank et al, 2004). No geral, o setor agrícola apresenta grande diversidade relacionada aos tipos de culturas existentes, as distintas técnicas organizações e relações trabalhistas, as etapas do processo produtivo; além disso, algumas culturas estão diretamente vinculadas à agroindústria. Alguns estudos focados em agentes de risco à saúde, parcela delas na exposição aos agrotóxicos (Faria et al, 2004; Maciel-Silva et al, 2005; Soares et al, 2003; Araújo et al, 2007), outros como o de Gosling e Araújo (2008) mostram que tratoristas se encontram expostos a níveis elevados de ruído e à sobrecarga térmica. Poucos estudos estão direcionados às atividades, envolvendo os aspectos ergonômicos como indicam Matos & Ferreira (2015) em estudo de revisão.
Outras pesquisas são mais gerais, estudando o contexto socioambiental e a percepção dos trabalhadores aos riscos á saúde, nas quais se sobressai o uso intensivo de agrotóxicos na cultura de flores, como no de Gasparini (2012). Além do mais há uma escassez de estudos que retratem as condições gerais de saúde da população rural no Brasil (Moreira, 2015).
Em particular, tendo em vista as poucas informações disponíveis sobre o trabalho em pequenas e médias propriedades, este estudo acrescenta dados à literatura sobre trabalho rural atual.

2. Métodos

Trata-se de um estudo exploratório, descritivo, realizado em uma propriedade produtora de verduras e hortaliças de pequeno município, com aproximadamente 40 mil habitantes, do sul de Minas Gerais. A cafeicultura e o plantio de flores são características predominantes na área rural do município.
Foram aplicados questionários contendo dados sociodemográficos - sexo, idade, estado civil, escolaridade, ocupação, número de filhos; estilo de vida; condições de trabalho e de saúde - Questionário de dados sociodemográficos, estilo de vida e aspectos de saúde e trabalho – QSETS (Monteiro, 1996).
A amostra foi constituída por 53 trabalhadores rurais que aceitaram participar da pesquisa e as entrevistas foram realizadas pelo primeiro autor, no local de trabalho, o que foi considerado relevante na compreensão da realidade de trabalho dos mesmos. Os dados das entrevistas foram inseridos em planilha no Programa Excel® e foi realizada análise descritiva e comparativa. Os resultados gerais da pesquisa foram apresentados aos trabalhadores e empresa.
Os entrevistados foram informados sobre o tema e os compromissos éticos da pesquisa, sendo o seu consentimento verbal e escrito requisito para a aplicação do questionário. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

3. Perfil dos trabalhadores

Dos 53 trabalhadores entrevistados, a maioria era do sexo masculino (36), 26 dos quais com idade igual ou menor de 30 anos e das 17 mulheres, 12 tinham idade igual ou menor de 30 anos. Todas as mulheres viviam maritalmente e entre os homens, 16 eram solteiros, 19 viviam maritalmente e um era separado. Tinham filhos 16 homens e 11 mulheres e o número máximo de filhos entre as mulheres era três e entre os homens, sete. Do total, 14 trabalhadores residiam sozinhos ou com uma pessoa, 13 com duas, três com três pessoas, 12 com quatro pessoas, um com cinco e cinco com seis pessoas; quatro trabalhadores não forneceram este dado.
Entre os que não estudaram, dois tinham mais de 40 anos de idade e dois menos de 30 anos; 30 estudaram até quatro anos, 19 dos quais com menos de 30 anos de idade, entre estes, estavam agrupados os com maior idade. Estudaram entre quatro e sete anos 10 trabalhadores, nove dos quais possuíam menos de 30 anos, exceto um, com 50 anos de idade. Os quatro que concluíram o segundo grau, tinham até 25 anos de idade e um que concluiu o ensino superior, 26 anos. Mais da metade dos que estudaram menos de quatro anos eram mulheres e nenhuma mulher estudou mais de sete anos.
No atual ocupação eram empregados com carteira de trabalho assinada (46), trabalhadores por conta própria (‘autônomos') (5), um trabalhava sem carteira assinada e um trabalhava como meeiro (alugava a terra do proprietário, pagando em produtos (meia parte)). Em relação ao tempo na empresa, 11 trabalhavam há menos de um ano, 6 até dois anos, 15 entre dois e cinco anos; entretanto a empresa manteve um quadro mais estável de 21 trabalhadores, 12 dos quais estavam entre cinco e dez anos e nove há mais de 10 anos. A maioria trabalhava há menos de cinco anos na empresa estudada; 15 trabalhavam há dez anos ou mais na agricultura.
Dos entrevistados oito começaram a trabalhar com menos de dez anos de idade, 26 entre dez e quinze anos, 13 entre 16 e 18 anos, quatro com mais de 18 anos e dois não forneceram informações. Mais de um quarto das mulheres começou a trabalhar com menos de 14 anos e metade dos homens começou a trabalhar com menos de 14 anos. Embora a maioria dos trabalhadores tenha iniciado suas atividades ocupacionais na área rural; alguns trabalharam em atividades urbanas como cerâmica, padaria e ambulante.
Durante a semana 31trabalhadores acordavam em torno das 5h30 para ir trabalhar; dez às 5h da manhã, dez às 6h e dois, às 4h30. Quanto ao estilo de vida a maioria (58,5%) não realizava atividade
física, 98,1% realizavam atividades de lazer, a grande maioria não fumava (90,6%) e pelo menos metade (50,9%) ingeria bebida alcoólica de forma habitual ou esporadicamente. Quanto ao sono dos entrevistados, 94,1% das mulheres e 91,7% dos homens relataram dormir bem após o dia de trabalho.
Dentre as atividades de lazer as mais citadas foram assistir TV, ouvir música, sair com os amigos, passear, ir à igreja, dançar, visitar familiares e fazer tricô/crochê. As atividades físicas mais praticadas eram futebol e bicicleta. Quanto ao aspecto religioso a maioria era católica (81,1%).

4. Atividades e condições de trabalho

Preparação do solo
Antes do plantio deve-se verificar a fertilidade do solo e é indispensável sua análise para planejar o uso de fertilizantes (adubos inorgânicos ou minerais com seus elementos nutrientes), os corretivos (para neutralizar o excesso de acidez do solo) e condicionadores, adicionados para aumentar a produção e a produtividade das plantações. A adubação é uma das atividades realizadas pelos trabalhadores.
Manejo do solo e preparação de mudas
Muitas hortaliças necessitam de semeadura em viveiros (Figura 1), sendo posteriormente transferidas para canteiros definitivos. As mudas são frágeis e devem manter suas raízes, o que exige delicadeza para sua retirada. O trabalhador fica agachado com a coluna curvada, deslocando-se dessa forma e movimentando os braços. As mudas são transportadas em bandejas para o canteiro definitivo, previamente molhado e replantadas, mantendo os trabalhadores com as costas curvadas, cabeça baixa e pernas abertas, e a permanência nestas posturas é prolongada ao longo da jornada de trabalho.


Figura 1: Mudas de hortaliças plantadas em viveiros.

O plantio exige a posição curvada por tempo prolongado, além de movimentos repetitivos ao longo do dia; além disso, carregam peso e também ficam expostos ao calor, insolação, vento e chuvas.
A rega da terra finalizando sua preparação para receber as sementes pode ser realizada manualmente, com mangueiras ou sistema de irrigação por aspersão. As mangueiras são pesadas e exigem força física para sustentá-la em altura para atingir o canteiro todo.
No plantio de sementes, pequenas covas são cavadas nas leiras nas quais são jogadas as sementes, fechando com as mãos, pés ou ferramentas, trabalho que se deve fazer com rapidez.
No caso de plantio em canteiros, levantar as laterais dos canteiros com a enxada exige força física e postura com coluna curvada, cabeça baixa, e os braços que se movimentam rapidamente.
Para afofar a terra, o trabalhador fica curvado, com a cabeça abaixada e braços com movimentos de vai e vem. A enxada é levantada cheia de terra, colocada por cima. Todo processo de trabalho, do plantio à colheita, exige o uso intensivo do corpo.
Os tratos culturais visam acompanhar o crescimento das verduras, como a rega, ‘capinagem' ou ‘arrancação' de mato, o controle de pragas (em geral com pulverização de agrotóxicos) que são realizadas até que as plantas estejam prontas para a colheita.
Na pulverização há exposição aos agrotóxicos (Figura 2) e, se for feita manualmente, há o peso das bombas costais (ou com mangueiras), em um trabalho feito de pé, repetindo-se os movimentos. O calor e a exposição ao sol podem facilitar a absorção dos produtos aplicados. O bico do pulverizador do aplicador entope com facilidade e para saber se está fluindo bem, o trabalhador testa com as mãos (para não se atrasar no trabalho), aumentando a exposição direta.


Figura 2: Local da plantação com trabalhador aplicando agrotóxico ao fundo.

Considerando-se as etapas da cultura de hortaliças as principais atividades citadas pelos trabalhadores foram: manejo e preparo do solo – cinco trabalhadores; semeadura e plantio – 38; preparo de mudas – três; tratos culturais – 31; adubação – 17; irrigação – três; controle de pragas: aplicação de agrotóxicos – 19 e planejamento e supervisão - três; colheita – 38; manuseio após a colheita – 14 e transporte – três.
Como os trabalhadores estiveram livres para citar as principais atividades realizadas, não sendo estimulados a dizer sim ou não para cada etapa, podem ter ocorrido omissões entre eles, mas as citadas foram de toda forma as que ocupam espaço em suas representações operativas (tabela 1).

Tabela 1: Distribuição dos trabalhadores de plantação de verduras segundo variáveis relativas ao trabalho.

Consideraram as exigências físicas do trabalho as mais impactantes (41), mentais (2) e nove trabalhadores consideraram a combinação de exigências físicas e mentais; um entrevistado não respondeu a esta questão; 25 consideraram o trabalho estressante.
A movimentação e levantamento de peso eram frequentes, sendo relatada por 54,7% dos entrevistados; 75,5% faziam movimentos repetitivos, 77,4% trabalhavam curvados em algum momento das atividades e a maioria afirmou trabalhar em posições cansativas. Entre as atividades mais cansativas sobressaiu-se o trabalho em posturas incômodas mantidas de forma prolongada e a posição agachada, esta a mais citada, mas também houve referência à exposição solar e a temperaturas elevadas, as longas jornadas, o "passar veneno" e o risco de acidentes de trabalho.
As características percebidas no trabalho estiveram relacionadas majoritariamente ao sistema musculoesquelético, como se observa na tabela 2.

Tabela 2: Distribuição das características do trabalho segundo a percepção dos trabalhadores.

* Mais do que uma resposta por entrevistado.

Entre os entrevistados, a quase totalidade das mulheres (94,1%) e 3/4 dos homens (77,8%), afirmaram que o trabalho era cansativo. Entre os trabalhadores que responderam afirmativamente à questão se o trabalho cansa ou desgasta (83%) a maioria relatou as seguintes atividades: "plantar","catar mato", carregar caixas", "dia de adubação cansa mais", "trabalhar no sol quente","trabalhar agachado o dia todo", "passar veneno", "dia de adubação cansa mais", "quando trabalha o dia todo tirando verdura", e que "cansa mais porque tem que fazer o serviço de casa".
Observou-se que 70,6% das mulheres e 36,1% dos homens consideravam o trabalho na empresa estressante, tendo sido verificada relação positiva entre trabalho estressante e sexo no teste de quiquadrado (valor p=0.0189).
A utilização de equipamentos de proteção individual foi relatada por 30 trabalhadores.
Entre os trabalhadores que referiram estar com a saúde pior ou um pouco pior quando comparados com outras pessoas na mesma idade, 60% tiveram alguma dor nos seis meses anteriores a aplicação do questionário; 36% entre os que consideravam estar semelhante e 43,5% dos que acreditavam estar melhor ou muito melhor.
Outro aspecto investigado foi a relação entre as variáveis "saúde" e "contato com agrotóxicos" e 60% dos trabalhadores expostos aos agrotóxicos julgaram estar com a saúde pior ou um pouco pior quando comparada com os não expostos; 40% dos que relataram saúde igual, melhor ou muito melhor. Houve correlação entre contato com agrotóxico e sexo (teste qui-quadrado p-valor=0.002).
Quando comparadas as variáveis saúde e sexo foi identificado que 5,9% das mulheres julgavam estar com a saúde pior ou um pouco pior quando comparada com a de outras pessoas com idade semelhante. Responderam estar iguais 52,9% das mulheres. Acreditavam estar com a saúde comparada melhor ou muito melhor 41,2%. Em relação aos homens, 11,1% julgavam estar com a saúde pior ou um pouco pior quando comparada com a de outras pessoas. Manifestaram saúde semelhante 44,4% dos homens e este mesmo percentual acreditavam estar melhores ou muito melhores.
O relato de queixa de dor esteve presente no relato dos trabalhadores e entre os que faziam uma pausa no decorrer da jornada de trabalho 34,6% referiram dor na última semana e, entre os que faziam duas, 24%. Entre os trabalhadores que afirmaram trabalhar em posições cansativas, 38,2% relataram presença de dor na semana anterior; assim como nos seis meses anteriores (44,1%). Entre os
trabalhadores que afirmaram trabalhar em posições curvadas, 34,1% apresentaram dores no decorrer da semana e, dos 44,1% entrevistados que afirmaram trabalhar em posições curvadas 43,9% manifestaram dores nos últimos seis meses.
Havia no QSETS uma questão aberta, que indagava se o trabalhador tinha planos para o futuro e a maioria das mulheres (70,6%) e dos homens (72,2%) responderam afirmativamente. "Ter casa própria", ter dinheiro para comprar uma, "construir a própria casa" foi o plano mais citado. Alguns gostariam de ‘ir embora para terra natal', e outros, "construir uma família", "casar e ter filhos", ainda, "quando tiver um filho, dar as melhores coisas para ele".
Muitos citaram a questão do trabalho, em busca de autonomia, como "ter uma lanchonete" "parar de trabalhar para os outros", ou melhores condições como "arrumar um emprego melhor", "ser caminhoneiro", ainda "trabalhar e ser uma pessoa". Também houve falas mais gerais como "melhorar de vida", "trabalhar bastante para tentar realizar seus sonhos"; enquanto outras fazem referência à preocupação com o futuro "guardar dinheiro para a velhice", "aposentar e ir para a cidade". Somente um trabalhador relatou diretamente um sonho de consumo, "comprar uma moto" (que poderia também estar ligado com um meio de transporte).

5. Perfil dos plantadores de verduras

Observa-se que a maioria dos entrevistados foi composta de homens, jovens, casados e com filhos, com poucos anos de estudo e que começou a trabalhar muito cedo. Outra importante característica a ser destacada é que parte delas provinha de outros Estados ou de outra região no Estado de Minas Gerais.
Alguns jovens, em virtude da fadiga de conciliar trabalho e escola, acabam abandonando os estudos antes mesmo de completar o ensino fundamental e médio. Esse fato interfere na manutenção da pobreza, fazendo com que crianças e adolescentes tornem-se adultos que pouco poderão compartilhar com seus filhos, além da herança da miséria e da marginalização (Fischer et al, 2003).
Os censos populacionais e os estudos empíricos sobre as condições de trabalho no campo e sobre acidentados do trabalho corroboram este perfil de uma força de trabalho masculina, com baixo nível de qualificação e com baixa remuneração, com trabalhadores analfabetos (80% dos analfabetos brasileiros residem na área rural) ou com baixo nível de escolaridade, tendo a inserção precoce no mercado de trabalho como um dos determinantes deste perfil. Dados da PNAD de 2009 indicaram que 28,4% dos meninos começaram a trabalhar com idade de até nove anos e, 54,1%, entre 10 e 14 anos, sendo que 74% dos meninos entre cinco e 14 anos que trabalhavam em atividades agrícolas não frequentavam a escola (Dieese, 2014).
No estudo de Ambrosi e Maggi (2013), 42,0% dos entrevistados apresentavam grau de escolaridade de poucos anos de estudo, no de Gasparini (2012) 14/20 produtores de flores tiveram até cinco anos de estudo. O estudo em Itabira (Minas Gerais) também apresentou perfil socioeconômico semelhante ao nosso (Cockel et al, 2005). Outro estudo com proprietários de minifúndios (Rio Grande do Sul) mostrou perfil um pouco diferente, com trabalhadores apresentando faixa etária e escolaridade um pouco mais elevada (Menegat e Fontana, 2010). Quando se analisa o perfil dos acidentados rurais, observa-se que a maioria apresenta escolaridade do ensino fundamental incompleto (Fehlberg et al, 2001; Teixeira e Freitas, 2003), embora pela Constituição Brasileira de 1988 seja obrigatório o oferecimento de pelo menos o ensino fundamental (atualmente com duração de nove anos) a todos os cidadãos do país, de modo gratuito. Dados da PNAD de 2008 relacionados aos trabalhadores (com idade de 18 anos ou mais) exercendo atividades agrícolas mostram também baixa escolaridade (Moreira, 2015). No conjunto dos trabalhadores rurais, a grande maioria tem baixa escolaridade, 72,3% com até sete anos de estudo nos dados da PNAD 2013, 39,3% dos trabalhadores com até no máximo três anos de estudo, (45,8%, dos quais informais e 29,7% entre os trabalhadores com carteira) (PNAD 2013, IPEA, 2015).
Também esse ‘meio rural' esteve mais próximo e conectado com o meio urbano, inclusive vários trabalhadores eram originários do meio urbano e essa proximidade ficou evidenciada pelo histórico
ocupacional inicial urbano; em um estudo sobre trabalho rural encontrou-se que 25,0% eram moradores do meio urbano (Drebes et al, 2014). Dados da PNAD rural de 2013 indicaram que 43,2% dos trabalhadores rurais residiam em área urbana (cidade, vila urbanizada ou não ou isolada).
Quanto à situação das relações de trabalho no presente estudo, 86,8% dos trabalhadores possuíam carteira assinada e, o restante, trabalhava como autônomo. O município do estudo tem se destacado nas últimas décadas pela crescente produção de flores, verduras e hortaliças, responsável pelo fortalecimento da economia local, e um dos efeitos foi o de aumento da formalização do mercado de trabalho local. Esse aspecto é corroborado pela alta porcentagem de trabalhadores com carteira assinada na empresa, fato bastante raro no setor agrícola. No trabalho de Nunes e Santos na cultura cafeeira, somente quatro em 20 entrevistados tinham carteira assinada; em outro estudo 78,4% eram‘autônomos' e 21,6% empregados (Drebes et al, 2014). Dados do IBGE de 2010 mostram que somente 16,4% dos ocupados em atividades agrícolas contribuíam para Previdência Social. Dados brasileiros de 2013 mostram que 40,6% possuíam carteira de trabalho assinada (IPEA, 2015).
Os trabalhadores participavam de quase todas as etapas do processo de cultivo, com ênfase em três delas, o da semeadura/plantio, dos tratos culturais e da colheita; também podemos indicar a importância da exposição aos agrotóxicos. Isso ocorre em parte por se tratar de hortaliças convencionais cultivadas para fins comerciais, cujas características são de ciclos curtos, com exigências culturais extensivas e uso de mão de obra intensiva.
Boa parte dos estudos sobre trabalho rural, exceto os focados na exposição aos agrotóxicos, enfatiza os esforços físicos e posturais presentes nas diferentes atividades. O estudo realizado por Guimarães (2010) verificou exigências físicas, cognitivas e afetivas presentes na atividade de arranquio e ajuntamento de feijão realizado por trabalhadores rurais na Região Noroeste de Minas Gerais. Além de identificar a prevalência de vivências denominadas de "mal-estar no trabalho", a autora identificou também a ausência ou a improvisação de Equipamento de Proteção Individual -EPI, a adoção de posturas forçadas e incômodas e a exigência de movimentos repetitivos na realização das tarefas, caracterizando as atividades como sendo de elevada exigência física relacionando-a ao surgimento de doenças osteomusculares, incluindo as dores lombares crônicas, cervicalgias e problemas da coluna dorsal (Alves e Guimarães, 2012).
As atividades de campo exigem dos trabalhadores deslocamentos constantes em extensas áreas, realizando agachamentos, rotações e flexões de tronco. As que envolvem o uso de ferramentas agrícolas (enxadas, foices, facões, picaretas etc) exigem também esforço físico para elevar ferramentas pesadas, com os membros superiores posicionados acima dos ombros, além de emprego de força para perfurar e revolver a terra. Além disso, permanecem de pé e em movimento, com levantamento e transporte de pesos. Esses movimentos são repetitivos, realizados de forma rápida e constante, com poucas pausas, durante toda a jornada de trabalho (Martins e Ferreira, 2015).
Os achados sobre trabalhadores envolvidos no corte de cana reforçam a semelhança – em termos de exigências, de fatores de riscos e de lesões – com outras atividades rurais apontadas em outros estudos, observando a dimensão do problema postural e os esforços intensos despendidos pelos trabalhadores, agravados pelo sistema de pagamento/recebimento por produção (Alessi e Navarro, 1997).
A literatura aponta a agricultura como um dos ramos produtivos no qual o trabalhador enfrenta problemas ergonômicos que geram alto risco para o desenvolvimento de distúrbios musculoesqueléticos e incapacidade (Martins e Ferreira, 2015). Outros exemplos de riscos ergonômicos comuns nas atividades dos trabalhadores agrícolas são os problemas posturais no plantio, ordenha, colheita e capina e na poda (Martins e Ferreira, 2015). No atual estudo observamos que grande parte daqueles que relatavam trabalhar em posição cansativa ou curvada apresentaram dores nos últimos seis meses.
No estudo de Cockell et al (2005) as observações realizadas indicaram que 20% dos trabalhadores levantavam e transportavam algum tipo de carga pelo menos uma vez por dia, 23.4% de duas a cinco vezes/dia, 9.4% de 6 a 10 vezes/dia, 18.8% durante toda a jornada de trabalho e 10.9% levantava esporadicamente. Somente 17.2% dos trabalhadores não levantavam nenhum tipo de peso durante a jornada de trabalho (Cockell et al, 2005). Num estudo do Rio Grande do Sul, os principais problemas
de saúde referidos foram os relacionados à coluna vertebral, principalmente a hérnia de disco com 40,9% das citações e a hipertensão arterial que acomete 27,3% dos pesquisados (Menegat e Fontana, 2010). Entre os trabalhadores que exerciam atividades agrícolas na amostra da PNAD 2008, 21,1% relataram doença de coluna ou costas e 7,7% de artrite ou reumatismo, além da hipertensão arterial, problemas de saúde que foram relacionadas com suas atividades ocupacionais (Moreira, 2015).
Os operadores de tratores agrícolas estão expostos à determinada carga física e, neste caso, também mental, pois a operação de um trator exige o controle simultâneo de diversas variáveis referentes ao trabalho (Márquez, 1990).
No presente estudo um importante aspecto apresentado foi que a maioria dos trabalhadores afirmou realizar pausas durante a jornada de trabalho, o que apresenta um aspecto positivo, considerando-se o tipo de trabalho realizado pelos mesmos. Uma informação oriunda das entrevistas é que as esposas faziam intervalo de duas horas no período de almoço da empresa, para realizar tarefas domésticas e preparo dos alimentos, (enquanto os homens tinham uma hora). Além disso, a queixa de trabalho cansativo de uma das mulheres foi da dupla jornada de trabalho, tornando longas as horas de atividade diária.
Também a descrição de outros autores sobre as características dos riscos ocupacionais se assemelham como do caráter sazonal e cíclico do trabalho, as longas horas de trabalho, a realização da tarefa ao ar livre expondo-os a diferentes condições climáticas, contatos com animais e plantas, uso intensivo de agrotóxicos, todas estas condições colocam em risco a saúde dos trabalhadores rurais (Gasparini, 2012).
Os agricultores têm sido estimulados, inclusive com parte dos financiamentos para plantio, a utilizar grande variedade de produtos químicos nas culturas, levando ao uso indiscriminado de agrotóxicos, expondo produtores, consumidores e residentes dos locais de cultura, impactando também o meio ambiente. Parcela substancial dos agricultores que manipulam agrotóxicos desconhece os riscos à saúde e a maioria não faz uso de equipamento de proteção individual durante sua manipulação ou o fazem de forma irregular/inadequada.
Segundo Domingues et al. (2004) a falta de informação por parte dos trabalhadores rurais quanto aos riscos a que estão expostos quando manipulam agrotóxicos e outros produtos químicos em suas atividades, deve-se na maior parte das vezes à baixa escolaridade, que dificulta, ou mesmo impossibilita, o acesso às informações de extrema importância para a sua segurança e dos envolvidos direta e indiretamente com a atividade agrícola.
Neste estudo foi observado que grande parcela dos trabalhadores estava exposta aos agrotóxicos, mas ainda resistente ao uso de EPIs, que estavam disponíveis para quem manipulava diretamente os agrotóxicos. Além do mais, dois trabalhadores assalariados da empresa eram técnicos agrícolas que deviam planejar e acompanhar as atividades dos trabalhadores. A legislação brasileira indica que trabalhadores rurais devem ter disponíveis EPI em seu ambiente de trabalho, adequados às atividades realizadas, e cabe ao trabalhador fazer uso dos mesmos, visando preservar e proteger a sua integridade física (Brasil, 2008); entretanto observando-se as atividades realizadas, pode-se perceber as razões das dificuldades de realizar o trabalho utilizando os equipamentos, agravadas pelas condições climáticas.
Em estudo realizado em Itabira – Minas Gerais a grande maioria dos trabalhadores apresentou exposição a agrotóxicos e somente 29.9% não tinham exposição direta. Embora 80.6% tenham relatado uso de algum tipo de Equipamento de Proteção Individual durante o manuseio, os EPI's nem sempre eram adequados, nem se encontravam em bom estado de conservação ou suficientes para a proteção (Cockell et al, 2005).
Além dos riscos à saúde citados trabalhadores rurais estão expostos aos riscos de acidentes de trabalho. Os estudos utilizando as estatísticas existentes como os da Previdência Social indicam alta prevalência de acidentes, ainda mais se considerarmos o trabalho informal/por conta e a subnotificação; no estudo do Estado de São Paulo entre os anos 1997-1999, houve a predominância de acidentes típicos, seguidos de acidentes de trajeto e doenças do trabalho (Teixeira e Freitas, 2003).
No estudo de revisão as publicações foram de investigação concentradas nas regiões Sul e Sudeste do país, com destaque para São Paulo e Rio Grande do Sul. Como nos dados gerais, os acidentes de trabalho típicos envolvem predominantemente homens e as doenças ocupacionais as mulheres e em
faixas etárias mais jovens (Jesus & Brito, 2009). No estudo com amostra da população rural de Pelotas (Rio Grande do Sul) a maioria dos acidentados feriu-se com o uso de ferramentas manuais (23 dos 56 acidentados), sendo a localização mais frequente as mãos (52,2%) e pés (34,8%). As ferramentas manuais e os animais domésticos estiveram envolvidos em 56,1% dos acidentes e 15,8% na exposição aos agrotóxicos (Fehlberg et al, 2001).

6. Considerações finais

Este estudo possibilitou conhecer o perfil – predominantemente jovem e do sexo masculino, entre trabalhadores que plantam verduras. Os resultados obtidos sobre as situações e atividades de riscoà saúde dos trabalhadores rurais são concordantes com os estudos existentes no Brasil – com movimentos repetitivos, posição inadequada durante o trabalho, exposição a agrotóxicos e trabalho em temperatura elevada. No estudo foi possível identificar algumas questões relacionadas às condições de vida e trabalho.
Estudos mais amplos envolvendo trabalhadores rurais em distintas atividades e culturas devem ser realizados, incluindo os impactos gerados pela aplicação da Norma Regulamentadora 31 (Brasil, 2005), visando melhorar as condições de trabalho e vida, tendo em vista que o setor agropecuário no Brasil ocupa importante papel na economia.
As reflexões sobre o mundo rural levam-nos a pensar quais deveriam ser as políticas públicas relacionadas a proteção social e a qualidade de vida dos trabalhadores rurais, associados ao debate do modelo de desenvolvimento do país que atinge diretamente a população, considerando também o meio ambiente, considerando as reivindicações das populações locais relativas a sua situação de vida, e a emergência de políticas relacionadas com as novas funções do espaço rural, através da necessidade de se conceber os sistemas de produção agrícolas "respeitadores do meio ambiente". Deveria se considerar a diversidade de situações no quadro de uma análise das transformações da sociedade nos processos de reestruturação sociopolítica que afetam a população rural.

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Recibido: 11.08.17
Recibido con modificaciones: 29.10.17
Aprobado: 12.11.17

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