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Mundo agrario

versão On-line ISSN 1515-5994

Mundo agr. vol.13 no.25 La Plata dez. 2012

 

DOSSIER

Índios, Moradores e Câmaras Municipais: etnicidade e conflitos agrários no Rio de Janerio e no Espírito Santo (séculos XVIII e XIX)

 

Maria Regina Celestino de Almeida*; Vânia Maria Losada Moreira**

*Universidade Federal Fluminense. Brasil
reginacelestino@uol.com.br

**Universidade Federal Rural do Rio de Janerio. Brasil
Vânia.vlosada@gmail.com

Indigenous, Non-Indian Residents and Municipal Councils: thnicity and LandConflicts in Rio de Janeiro and Espírito Santo (XVIII and XIX centuries)

 


Resumo
O artigo analisa os processos de extinção das aldeias e terras coletivas indígenas no Rio de Janeiro e no Espírito Santo, de meados do século XVIII ao XIX, com ênfase na atuação política dos índios no sentido de retardá-los. Com base na correspondência entre autoridades, leis, mapas estatísticos e petições dos próprios índios, são abordados os conflitos agrários entre índios, moradores e câmaras municipais, enfocando-se a problemática das controvérsias e discussões sobre etnicidade que tiveram papel central nessas disputas.

Palavras-chaves: Aldeias indígenas, Terras indígenas; Política indigenista; Desamortização de terras indígenas; Rio de Janeiro; Espírito Santo.

Abstract

This paper analyzes the processes of extinction of indigenous collective lands and villages in Rio de Janeiro and Espírito Santo, from mid-eighteenth century to the nineteenth century, giving emphasis on the role of Indigenous's policy aiming to delay the process. Based on the correspondence among authorities, laws, statistical reports, and petitions from the Indians themselves, we approach the agrarian conflicts among indigenous, non-Indian residents and municipal councils, focusing on the issue of controversies and discussions regarding ethnicity that played a central role in these disputes.

Keywords: Indigenous communities; Indigenous lands; Indigenous policy; Confiscation of indigenous lands; Rio de Janeiro; Espírito Santo.


1. Introdução

As aldeias indígenas estabelecidas pela Coroa portuguesa tiveram um papel essencial no projeto de conquista e colonização da América portuguesa. Longe de terem sido efêmeras, como até muito recentemente sugeria nossa historiografia, muitas delas se mantiveram até a segunda metade do século XIX. Foi o caso de várias aldeias das capitanias e depois províncias do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. Neste artigo vamos refletir sobre os longos e complexos processos de extinção das aldeias e terras coletivas dessas regiões, de meados do século XVIII ao XIX, enfatizando a atuação dos índios no sentido de preserválas.

São regiões muito próximas do ponto de vista geográfico, cujas histórias, várias vezes entrelaçadas, apresentam inúmeras semelhanças em relação ao tema aqui abordado. Não obstante, diferenças significativas marcaram as dinâmicas locais de desenvolvimento sócioeconômico e político das duas áreas. Enquanto o Rio de Janeiro foi progressivamente tornando-se importante centro de produção agrícola e principal pólo comercial e portuário do Brasil, sediando a capital da colônia, desde 1763; o Espírito Santo manteve-se até o século XIX como uma das regiões mais periféricas da América Portuguesa. Com a intenção de evitar o contrabando de ouro extraído nas Minas Gerais, a Coroa proibiu a circulação de súditos e a construção de caminhos dos sertões entre Minas e Espírito Santo, isolando a capitania e dificultando seu desenvolvimento sócio-econômico.

O objetivo deste artigo é analisar o tema a partir de uma abordagem comparativa entre essas regiões, com a intenção de evidenciar as semelhanças oriundas de uma política indigenista comum a todo o Brasil e as diferenças resultantes das especificidades regionais, Essas especificidades incluem também as formas locais de aplicação da política traçada para os índios (política indigenista), quanto as variadas estratégias políticas operadas pelos próprios índios (políticas indígenas).

O Espírito Santo e o Rio de Janeiro são emblemáticos a este respeito: apesar das especificidades regionais, vários aspectos comuns podem ser identificados nesses processos, sobretudo quanto aos conflitos por terra. Tais conflitos envolviam índios, moradores e câmaras municipais, nos quais as controvérsias sobre a etnicidade dos aldeados tiveram importante papel. As principais fontes utilizadas são, entre outras, as correspondências entre autoridades, as leis, as solicitações dos próprios índios e alguns mapas estatísticos.

2. Políticas Indígenas e Indigenistas: conflitos e negociações

As aldeias indígenas coloniais foram criadas com o objetivo de integrar os índios que deviam desempenhar diferentes funções nas novas sociedades do ultramar, que então se formavam. Seu estabelecimento e administração despertavam interesses diversos entre os diferentes atores sociais, incluindo os próprios índios. Diante do violento processo de conquista com guerras, doenças, fomes, escravizações e desestruturações de suas sociedades, os aldeamentos foram vistos por muitos índios como novas possibilidades de sobrevivência na colônia. Ao ingressarem nas aldeias, submetiam-se à ordem colonial, eram discriminados e obrigados ao trabalho compulsório, porém tinham alguns direitos, dentre os quais a terra coletiva das aldeias e o direito de não serem escravizados. Compartilhavam novas experiências com diferentes grupos étnicos e sociais e, nesse processo, reelaboraram suas culturas, histórias e identidades, tendo assumido a identidade genérica de índios aldeados (Almeida, 2003).

Muitos desses índios chegaram ao século XIX como grupos que afirmavam suas identidades indígenas e atuavam politicamente em defesa dos seus direitos com base na cultura política do Antigo Regime. Essa cultura política foi por eles assumida a partir de suas experiências de alianças e conflitos com diferentes agentes: prestavam serviços ao rei, principalmente no âmbito da defesa do território, e reivindicavam direitos que lhes haviam sido assegurados pela condição de súditos cristãos. As terras coletivas das aldeias e vilas foram, de meados do século XVIII e principalmente no decorrer do XIX, o principal motivo de conflitos envolvendo índios, moradores e câmaras municipais no Rio de Janeiro, no Espírito Santo e em várias outras regiões do Brasil.

A partir da segunda metade do século XVIII, as reformas pombalinas introduziram a política de assimilação para os índios. Visavam, a longo prazo, extinguir as aldeias e a distinção entre os índios e os demais vassalos do rei, o que significaria o fim das terras coletivas e da condição jurídica específica de índios. Esse processo variou conforme as regiões e estendeu-se até o século XIX, tendo gerado diferentes reações dos grupos indígenas, muitos dos quais permaneceram em seus territórios, mantendo a identificação de índios aldeados, como se verificou em aldeias e vilas indígenas do Rio de Janeiro e do Espírito Santo.

Com a independência, em 1822, e a formação do Estado nacional ao longo do oitocentos, as diretrizes políticas de feitio liberal tenderam a se fortalecer no novo cenário político brasileiro e, no que tange à questão indígena, a propugnar muito mais ostensivamente a rápida assimilação dos índios à sociedade envolvente. A nova orientação liberal e nacionalista ficou particularmente visível na política de deslegitimação das comunidades étnicas, quando o Estado imperial passou a impor aos seus membros, às vezes de maneira violenta e outras de forma mais negociada, processos de homogeneização étnico-cultural que podemos qualificar como tentativas de "nacionalização" e de "cidanização" da população indígena.

Embora a diretriz acerca da "nacionalização" e "cidanização" dos índios não esteja inscrita na Constituição de 1824, aparece de forma clara em algumas recomendações legais, em diferentes correntes do indigenismo do período e, principalmente, na prática política do Império em relação aos índios (Moreira, 2010). A transformação dos índios em "brasileiros" tornou-se, na verdade, um elemento central da política indigenista oficial do Império, interessada em fortalecer o corpo político da nação, mas também muito atenta às possibilidades de integrar os índios e suas terras nos mercados de terra e trabalho que estavam, então, em pleno processo de formação e desenvolvimento. Note-se, ainda, que estender aos índios (assimilados e independentes) a condição de brasileiros dava ao Estado imperial condições muito mais sólidas para sustentar, nos possíveis embates internacionais sobre limites e fronteiras, a soberania sobre os territórios almejados. Vários desses territórios estavam sob o controle de povos indígenas independentes, muitos dos quais em guerra aberta contra os invasores de suas terras. Uma das prioridades da política indigenista do Segundo Reinado (1840-1889) foi, por isso mesmo, a criação de novas missões religiosas para a ressocialização de índios principalmente em zonas de fronteira internacional (Beozzo, 2008: 300).

Os conceitos de "nacionalização" e "cidanização" evocam um movimento "de cima para baixo", pois foi por meio da imposição da soberania do Império a vários povos e territórios que ainda não estavam, de fato, submetidos e controlados pelo Estado, que muitos índios e grupos étnicos passavam a integrar o corpo político da nova nação. Desse ângulo, a nacionalização e a cidanização não era uma resposta do Estado às reivindicações e lutas dos próprios índios, mas antes uma medida unilateral e arbitrária. Contudo, se quisermos levar a sério a proposta metodológica de incluir os índios na história e de percebê-los como agentes do processo histórico-social, é forçoso reconhecer que muitos índios e grupos indígenas, especialmente os integrados à ordem social, apropriaram-se do vocabulário político da época. De acordo com seus interesses e necessidades, cunhavam sentidos e significados próprios para os novos conceitos políticos, nem sempre bem aceitos pelas elites. Em 1830, por exemplo, um abaixo-assinado de índios residentes na província do Espírito Santo denunciou ao presidente da província o estado "deplorável" de suas famílias, casas e lavouras. Fizeram isso, ademais, na qualidade de um "pequeno número de indivíduos, que tem a honra de se denominarem – cidadãos brasileiros". (Apud Marinato, 2007: 15).

Em relação ao abaixo-assinado, não é demais salientar que os índios mobilizam os conceitos de "indivíduo" e "cidadão brasileiro" e que esses termos não se opunham a outro conceito importante, o de "índio", que eles também ostentaram para definir-se a si mesmos ao peticionarem ao presidente provincial. Analisando o contexto social de produção do abaixo-assinado, fica em evidência que os índios incorporaram o novo vocabulário nacionalista e liberal usando, contudo, a velha gramática social e política do Antigo Regime, quando eles se dirigiam às autoridades constituídas na condição de índios e vassalos da Coroa portuguesa. Afinal, era essa condição que lhes garantia a terra coletiva (Almeida, 2003). Tal como vem sendo evidenciado por vários estudos em diferentes regiões da América (Mallon, 1995; Escobar Ohmstede, 2007), os índios há séculos inseridos no mundo colonial chegaram ao oitocentos reivindicando os direitos que lhes haviam sido dados pela condição indígena, porém podiam também assumir as novas propostas dos liberais, lidas, no entanto, à sua própria maneira. Ser índio cidadão era, para eles, uma possibilidade.

O processo de assimilação e nacionalização dos índios alcançou níveis decisivos a partir da segunda metade do século XIX, período em que se acentuou a desamortização e a privatização das terras dos índios, deslanchada em ritmo firme com a promulgação da Lei de Terras de 1850, dos seus regulamentos, em 1854, e de uma série de avisos e leis complementares. Em relação aos índios, o objetivo precípuo da legislação territorial era o de acabar com o domínio e uso comum sobre várias terras que eles possuíam na forma de sesmarias, missões, aldeamentos, compras e doações, desarticulando, desse modo, a territorialidade indígena que era, então, um dos principais sustentáculos da reprodução dos índios como grupo étnico, social e identitário específico dentro da ordem social, política e jurídica do Império.

As terras coletivas dos índios foram, na verdade, o único alvo efetivo da política de desamortização desencadeada pelo Segundo Reinado, pois as terras das corporações civis e religiosas foram mantidas praticamente intocadas (Glezer, 2007: 203). Por essa razão, apesar do caráter liberal da Lei de Terras de 1850, certas formas corporativas de posse territorial, características do Antigo Regime, foram mantidas. Ainda como salientou Glezer, o "processo de desamortização no país parece só ter ocorrido nas áreas de aldeamentos indígenas [...]" (2007: 210). Deve-se acrescentar que a política imperial de desamortização das terras dos índios foi bastante sistemática e agressiva e teve início imediato a partir da promulgação da Lei de Terras, sendo regulamentada pela Lei nº 1.114 , de 27 de setembro de 1860, que autorizou o governo a aforar ou vender, de acordo com as regras estabelecidas pela Lei nº 601, "[...] os terrenos pertencentes às antigas Missões e Aldeias dos índios, que estiverem abandonadas, cedendo, todavia, a parte que julgar suficiente para a cultura dos que neles ainda permanecerem, e os requererem." (Carneiro da Cunha, 1992: 257)

Convém lembrar que a política indigenista do período também previa a criação de novas aldeias para incorporar os chamados índios "bravos" dos sertões, orientando que fossem mantidas enquanto eles não atingissem o estado de "civilização". Isso respondia à diversidade regional do vasto território do Império brasileiro, que comportava imensa variedade de grupos indígenas, em diferentes níveis de interação com as sociedades envolventes. Ao mesmo tempo, dava margem aos antigos aldeados de reivindicarem a permanência de suas aldeias e terras coletivas seculares, como demonstram as trajetórias dos índios do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, como se verá a seguir.

3. Política Indígena e Política Indigenista: etnicidade e conflitos agrários nas aldeias do Rio de Janeiro

O processo de extinção das antigas aldeias indígenas do Rio de Janeiro foi lento e gradual, tendo se estendido das reformas pombalinas até a segunda metade do século XIX, com avanços e recuos. Há indícios na documentação de que os recuos foram causados, em grande parte, pela ação dos próprios índios aldeados. Embora misturados, poucos e vivendo em aldeias pobres e decadentes, conforme diziam os discursos, os aldeados continuaram esforçando-se por manter suas aldeias e vidas comunitárias, por quase um século depois da proposta assimilacionista lançada por Pombal. A terra coletiva das aldeias garantida pela legislação portuguesa era para eles um bem de considerável valor que iriam se esforçar por garantir até o século XIX.

Nos três séculos de colonização, diferentes grupos indígenas transformaram-se e misturaram-se, construindo novas formas de identificação que tinham forte referencial nas aldeias em que viviam. Nelas compartilharam novas experiências com vários outros grupos étnicos e sociais, reelaborando sociabilidades, culturas e identidades. Tornaram-se índios aldeados e súditos cristãos do Rei. Essa identidade lhes dava uma condição jurídica específica que, apesar dos imensos prejuízos, preconceitos e obrigações, lhes garantia vários direitos, dentre os quais a terra coletiva.

Os aldeados identificavam-se, grosso modo, a partir da aldeia em que habitavam como evidenciam os documentos. Encaminhavam suas petições ao rei valorizando o passado de lutas em defesa do império português, enfatizando, muitas vezes, o papel das próprias aldeias. Afinal, o caráter defensivo marcou o estabelecimento da maioria delas e iria ser sempre lembrado nas reivindicações apresentadas pelos índios. Os líderes de São Lourenço, primeira aldeia criada na capitania do Rio de Janeiro, traçavam sua origem a partir de sua fundação, remontando sua história à guerra de conquista do território ao lado dos portugueses. Enalteciam os feitos de seus antepassados e reivindicavam mercês pelos serviços prestados, agindo bem de acordo com a cultura política do antigo regime (Almeida, 2003).

Afirmar a reconstrução das identidades dos índios nas aldeias coloniais não significa, no entanto, desconsiderar o intenso processo de mestiçagem que caracterizou sua trajetória nas antigas aldeias, processo esse que se acelerou consideravelmente após as reformas pombalinas. Se os índios aldeados chegaram ao século XIX, ainda se afirmando como índios nas contendas pela afirmação de seus direitos, deve-se convir que devia ser provavelmente impossível distingui-los dos demais grupos étnicos e sociais com os quais interagiam por quaisquer sinais diacríticos, laços consangüíneos e/ou caracteres físicos específicos. Com base nas novas tendências teóricas e conceituais da História e da Antropologia é possível afirmar que eles deviam ter se tornado mestiços, sem necessariamente terem deixado de ser índios (Almeida, 2008; Cadena, 2005; De Jong y Rodriguez, 2005). Classificados como índios ou como mestiços, mantinham as reivindicações que lhes tinham sido asseguradas pela condição de aldeados, como se verá mais adiante.

No Rio de Janeiro, as terras das aldeias indígenas foram concedidas pela Coroa, pelos padres ou por particulares de diversas formas, incluindo doações de sesmarias. Eram dadas, em geral, em nome do solicitante ou solicitantes que podiam ser índios, padres ou autoridades leigas, mas eram consideradas patrimônio coletivo dos índios da aldeia para a qual foram requeridas, como evidenciam inúmeros documentos sobre conflitos de terra. Do século XVI ao XIX, assiste-se à preocupação das autoridades coloniais em garantir as terras das aldeias para os índios através da legislação, apesar das inúmeras e contínuas usurpações. O espaço físico das aldeias foi assumido pelos índios como patrimônio próprio que lhes fora concedido pela Coroa para garantir seu sustento no mundo colonial através da agricultura e de outras formas de rendimentos que foram aprendendo a explorar e defender. Em torno dela, envolveram-se em inúmeros conflitos e negociações movidos por seus próprios interesses, que continuamente se alteravam em suas experiências de contato.

Ao ingressarem nas aldeias, viviam o processo de territorialização, no sentido que lhe foi atribuído por Pacheco de Oliveira (1999): passavam a viver em um novo território que dado, imposto ou conquistado através de acordos, derrotas ou capitulações passava a constituir referencial básico de sua sobrevivência no mundo colonial. Várias razões levavam os índios a recorrer à justiça, porém a luta pela garantia das terras das aldeias parece ter sido, na capitania e depois província do Rio de Janeiro, especialmente importante para dar coesão aos aldeados e mantê-los unidos nessa condição até bastante avançado o século XIX. Esta ação política e coletiva dava-lhes o sentido de união em torno de um objetivo comum, contribuindo para desenvolver neles o sentimento de identificação de grupo e de pertencimento a uma aldeia. Nas reivindicações dos índios pode-se perceber dois elementos destacados por M. Weber (1994) como essenciais para a formação do sentimento de comunhão étnica: a ação política comum e o sentimento subjetivo de comunidade. Este último também apontado por Barth (2000) como um dos fatores fundamentais para a identificação do grupo étnico: a auto-atribuição.

Na segunda metade do século XVIII, as reformas pombalinas introduziram a proposta assimilacionista para os índios e deram início ao processo de extinção das aldeias coloniais. O Diretório dos Indios (1), legislação criada inicialmente para a Amazônia e depois estendida às demais regiões da América portuguesa, lançou as bases da política assimilacionista com a intenção de transformar as aldeias em vilas e lugares portugueses e os índios em vassalos dos reis sem distinção alguma em relação aos demais. A proposta era acabar com os costumes indígenas nas aldeias e incentivar a miscigenação e a presença de não índios em seu interior.

A aplicação do Diretório, no entanto, variava conforme as regiões e as diversas situações das populações indígenas com seus variados níveis de integração à sociedade colonial. Se o objetivo da lei era a assimilação, alcançá-la exigia diferentes procedimentos de acordo com as regiões e as populações com as quais se lidava. Na própria capitania do Rio de Janeiro, enquanto nas margens norte e sul do Rio Paraíba, (então chamado sertão dos índios bravos), novas aldeias eram estabelecidas; nas áreas de colonização antiga, aldeias seculares eram transformadas em freguesias como primeiro passo para sua extinção. Não obstante, apesar das mudanças na legislação, o Diretório manteve o patrimônio coletivo das aldeias para os índios e malgrado a presença cada vez mais intensa de brancos em seu interior, incentivada pela própria lei, e das usurpações que tendiam a aumentar, as terras das aldeias do Rio de Janeiro não reverteram para patrimônio comum das novas povoações, embora tenha havido propostas neste sentido. A grande mudança, a meu ver, foi o incentivo à miscigenação e à presença de não índios no interior das aldeias, como medidas necessárias para promover a assimilação.

Em meados do século XVIII, os problemas de terra nas aldeias agravavam-se no Rio de Janeiro, na medida em que as terras devolutas iam escasseando e as demandas por ela se ampliavam. A expulsão dos jesuítas complicou a situação, pois além das terras confiscadas aos padres terem voltado ao domínio da Coroa, passsando a ser disputadas e pedidas em sesmarias, os índios perdiam poderosos aliados em seus enfrentamentos com os moradores. Os conflitos de terra entre índios e moradores, que já ocorriam desde o século XVII, aumentaram com o avanço dos moradores motivados por uma legislação que incentivava sua presença no interior das aldeias. Some-se a isso, o desenvolvimento sócioeconômico da capitania que implicava na conquista e incorporação dos sertões mais distantes com a criação de novas aldeias e na ameaça cada vez mais intensa às terras das aldeias já seculares.

As informações esparsas sobre as reformas nas aldeias no Rio de Janeiro indicam que as medidas visavam confiscar os bens dos jesuítas, preservando, porém, as terras das aldeias para os índios. O Bispo era intruído para não permitir que os padres tentassem despojar as Paróquias que administravam porque no Tribunal da Mesa da Consciência e Ordens se havia declarado que "[...] nas Igrejas das Missões é tudo pertencente aos Índios , e que no seu nome e a título de tutela é que se achavam na mera administração deles Religiosos da Companhia de Jesus." (2) Depois de erigidas as aldeias em novas vilas e lugares e estabelecida a casa de residência do Vigário, as terras restantes deviam ser repartidas pelos "[...] índios habitantes das referidas vilas e lugares"(3), o que evidencia a preocupação em garantir a terra para os índios. Convém notar, no entanto, que a idéia de repartir já aponta para a intenção de distribuir parcelas de terra individualmente, prática fundamental na proposta de extinção das aldeias que iria se acentuar no decorrer do oitocentos.

Não obstante, nesse momento, apesar da presença cada vez mais intensa dos não índios no interior das aldeias e das usurpações ilegais que se faziam, no Rio de Janeiro, as aldeias mantiveram-se em seus locais de origem e não se misturaram. Todas tornaram-se logo freguesias, porém apenas São Barnabé foi erigida à categoria de vila ainda no século XVIII. É instigante constatar que continuaram a aparecer na documentação como aldeias e seus habitantes permaneceram distintos dos demais moradores identificando-se e sendo identificados como índios tanto na documentação oficial quanto no cotidiano de suas relações. Permaneceram nas aldeias, cultivando pequenas porções de terras ou arrendando-as, porém ainda defendendo através de petições, as terras que lhes haviam sido dadas séculos antes pela Coroa Portuguesa e cujos rendimentos deviam destinar-se a atender às suas necessidades coletivas.

A própria documentação oficial evidencia as distinções pois, além de chamar algumas freguesias de aldeias, listava os moradores e os índios separadamente. Em 1766, a Memória de todas as freguesias do Bispado do Rio de Janeiro incluía as Aldeias de São Lourenço, São Barnabé, São Francisco Xavier de Itaguaí, Nossa Senhora da Guia de Mangaratiba e São Pedro (4). No mapa da Freguesia de Itaguaí de 1797, os 141 chefes de família aparecem divididos a partir do n� 87 pelo sub ítem "Aldeia dos Índios de Taguaí". O mapa informa que dentre esses 86 moradores não índios, oito viviam nas terras da aldeia, onde pagavam foro. O mapa das vilas da Comarca do Rio de Janeiro de 1816 ainda faz referências às aldeias distinguindo-as das vilas e freguesias do mesmo nome, embora não apresente, em muitos casos, o número de habitantes separadamente (5). Os exemplos indicam a manutenção das distinções, reconhecida por autoridades, moradores e, sem dúvida, pelos próprios índios que continuavam reivindicando direitos que lhes haviam sido dados pela condição de aldeados.

No entanto, os conflitos por terra se acentuavam e, nesse período, já se observa controvérsias e disputas quanto às classificações étnicas dos aldeados. Moradores e autoridades interessados em extinguir as aldeias já apresentavam os índios como poucos e misturados, contrastando com as reivindicações desses últimos que continuavam solicitando seus direitos pela condição de aldeados (6). Essas contradições em torno da classificação dos aldeados na condição de índios ou de mestiços já bastante visíveis na documentação de meados do século XVIII vão se acentuar no decorrer do XIX, evidenciando as relações entre a etnicidade, política indigenista e conflitos agrários.

No final do setecentos e início do XIX, nas áreas de colonização antiga, os índios das aldeias aparecem como os agentes sociais mais interessados, senão os únicos, em mantêlas. Isso parece se explicar, em grande parte, pelo fato de que, apesar de todas as mudanças, a principal função das aldeias para os índios se mantinha: espaço de sobrevivência no mundo caótico e ameaçador da colônia. As lutas nessa época se faziam principalmente pela manutenção do patrimônio, ao qual tinham direito como grupo: as terras e os rendimentos das aldeias. Foi principalmente em torno da ação política comum pela manutenção desses direitos que essas identidades se mantiveram e até se fortaleceram neste período, contra as pressões que se faziam no sentido de reconhecê-los como mestiços, como indica a documentação. O Diretório, como visto, ainda garantia as terras das aldeias para os índios e, portanto, ser ou não ser índio implicava em assegurar ou perder terras coletivas das aldeias. Assim, essas controvérsias, ou mesmo disputas por classificações étnicas, podem ser vistas como disputas políticas e sociais, como destacou Boccara (2000). Se, de acordo com Cohen (1978), os grupos têm interesse em manter-se distintos, enquanto condições políticas e econômicas estão ligadas a essa distinção, essa parece ter sido uma forte razão para os índios aldeados terem resistido à política assimilacionista, mantendo, para usar a expressão de R. Cardoso de Oliveira (1976), sua "identidade contrastiva" em relação aos moradores com os quais interagiam e até dividiam o mesmo espaço.

Caracterizados como diminutos, misturados e transformados, vivendo em aldeias pobres e decadentes como afirmam muitos relatos, os índios aldeados mantiveram-se como tais por pelo menos mais um século após as reformas de Pombal, esforçando-se juridicamente (por vezes com apoio de algumas autoridades) para manter suas aldeias contra a forte pressão que se fazia no sentido de extingui-las. São Francisco Xavier de Itaguaí, por exemplo, chegou a ser declarada extinta, mas foi restabelecida por pressão dos próprios índios, cujo capitão-mor foi ao Reino onde solicitou e obteve da rainha o restabelecimento de sua aldeia (Almeida, 2007). Casos concretos como esse evidenciam o sentimento de comunhão étnica que unia os índios em torno de reivindicações coletivas e os incentivava a manter a distinção, afirmando a identidade indígena reconstruída nas aldeias coloniais.

As disputas iriam se intensificar consideravelmente no século XIX, quando as câmaras municipais e os moradores intensificaram suas investidas para apoderar-se das terras e dos rendimentos coletivos das aldeias que, descritas como decadentes e miseráveis, continuavam despertando conflitos, pois os índios insistiam em preservá-las. A documentação analisada, basicamente petições dos índios, relatórios de presidentes de província, correspondência entre autoridades, relatos dos viajantes e memorialistas revelam as já citadas contradições na classificação das populações indígenas nas categorias de índios e mestiços e apontam o papel central das discussões e controvérsias sobre etnicidade nos embates sobre política indigenista e extinção das aldeias (Almeida,2007).

A política indigenista do estado imperial brasileiro acentuou a proposta assimilacionista lançada por Pombal, incentivando o processo de individualização das terras indígenas com um discurso humanitário que visava integrar os índios em igualdade de condições, transformando-os em cidadãos. Afinal, os ideais de civilização e progresso característicos do novo Estado não comportavam a ideia de índios, nem de vida comunitária. O objetivo era, sem dúvida, extinguir as aldeias, mas de acordo com a lei e respeitando-se os direitos dos índios, enquanto eles fossem considerados como tais.

As propostas assimilacionistas construíam-se de forma a ressaltar as vantagens que a nova condição de cidadão daria aos índios. Tais propostas eram reforçadas pelas construções dos intelectuais que idealizavam os índios do passado, enquanto viam seus contemporâneos como degradados. A solução ideal para eles era, de acordo com esses discursos, integrarem-se à sociedade nacional, tornarem-se cidadãos e terem acesso a propriedades individuais. Valores caros aos índios, como vida comunitária e reciprocidade eram vistos como negativos e obstáculos ao progresso.

Não obstante, apesar do objetivo explícito de extinguir as aldeias e promover a assimilação dos índios, as leis do oitocentos ainda davam aos índios possibilidades deles se manterem nas aldeias, na medida em que asseguravam as terras coletivas e os direitos dos aldeados, enquanto não atingissem a civilização. Os índios souberam valer-se dessa proteção e, com o apoio de algumas autoridades civis e eclesiásticas, conseguiram, ao que parece, retardar o processo de extinção de suas aldeias. As autoridades estatais e locais visavam, sem dúvida, extingui-las e incorporar suas terras, integrando os índios, sem distinção, à massa populacional, mas procuravam fazer isso dentro das regras estabelecidas na legislação e em seus discursos manifestavam a preocupação em garantir o bem estar dos índios. Para extinguir as aldeias conforme a legislação era necessário considerar o estado de mistura e civilização dos índios.

O projeto de José Bonifácio, na Constituinte de 1823, afirmava a humanidade dos índios e a necessidade de integrá-los com brandura a "um povo que se deseja criar", defendendo a política assimilacionista que visava a incorporá-los como cidadãos, com a conseqüente perda do direito à terra coletiva das aldeias (Boehrer, 1966). Apesar de aprovado, este projeto não chegou à prática e a Constituição de 1824 sequer mencionou a questão indígena que se tornou competência das Assembléias Legislativas Provinciais, tendo prevalecido o interesse das oligarquias locais (Carneiro da Cunha, 1992). Ao longo do oitocentos, no entanto, apesar das teorias discriminatórias e racistas que influenciavam o pensamento de intelectuais e políticos da América (Schwarcz,2001), a proposta humanista de José Bonifácio predominou na política indigenista.

Quanto à legislação sobre terras, o Regulamento das Missões de 1845 manteve os direitos dos índios nas aldeias, decretando ser obrigação do Diretor Geral designar terras para plantações comuns, para plantações particulares dos índios e para os arrendamentos (Beozzo, 1983: 174). No entanto, de acordo com as orientações assimilacionistas predominantes, ao referir-se às aldeias, decretava, em seu artigo 1� § 2, que se informasse ao "...Governo Imperial sobre a conveniência de sua conservação, ou remoção, ou reunião de duas, ou mais, em uma só" (7). A Lei de Terras de 1850 também estabelecia uma reserva de terras para a colonização de indígenas, porém foi o regulamento de 1854 que iria explicitar com mais nitidez a política assimilacionista do Império: reservava as terras para os índios em usufruto, afirmando que "não poderão ser alienadas, enquanto o governo Imperial, por ato especial, não lhes conceder o pleno gozo delas, por assim o permitir o seu estado de civilização" (Carneiro da Cunha,1992: 223). A partir de 1861, o encargo da catequese e civilização dos índios passou ao Ministério dos Negócios, Agricultura, Comércio e Obras Públicas, o que aponta para a associação entre a política indigenista e questões agrárias. Em várias regiões do Império, sobretudo a partir da segunda metade do século XIX, a questão indígena tornava-se, basicamente uma questão de terras, como destacou Manuela Carneiro da Cunha. O Regulamento das Missões de 1845 e a Lei de Terras de 1850, complementada com o regulamento de 1854, reafirmaram as diretrizes do Diretório em dois importantes aspectos: incentivavam a proposta assimilacionista e continuavam garantindo o direito dos índios às terras coletivas enquanto eles não atingissem o chamado estado de civilização. Isso dava aos índios das aldeias possibilidades de continuarem reivindicando, através da lei, os direitos que lhes haviam sido garantidos. Essas reivindicações, deve-se lembrar, baseavam-se na afirmação da identidade indígena.

Na segunda metade do século XIX, a intensa correspondência oficial entre autoridades do governo central, das províncias e dos municípios é reveladora da preocupacão do Estado em obter o máximo de informações possíveis sobre os aldeamentos e os índios com o objetivo de dar cumprimento à política assimilacionista, a ser implementada conforme as situações específicas de cada região. Não é de estranhar, portanto, que a tônica dos documentos insistisse tanto na decadência, miserabilidade e diminuição dos índios e suas aldeias. Em 1850, carta circular aos Presidentes de Província ordenava-lhes o envio de informações "sobre os aldeamentos dos índios, declarando as alterações que tenham tido tanto a respeito da população como dos ramos da agricultura, indústria e comércio a que se dedicam com designação das causas que concorrem para a decadência dos mesmos aldeamentos, os meios para as remover, bem como os que parecerem próprios para chamar os selvagens a vida social e para melhoramento material e moral dos ditos aldeamentos [...]" (8). No mesmo ano, outra circular aos Presidentes de Província tratava do:

[...] destino que se deve dar às terras dos índios, visto não os haverem aldeados, e não ter a elas aplicação o Regulamento n. 426 de 24 de junho de 1845, que em conformidade da Resolução Imperial de 12 de setembro PP [...] deve continuar as providências adotadas para incorporação aos próprios nacionais de todas aquelas terras que não estiverem ocupadas, as quais se devem considerar devolutas [...] (9)

O conteúdo desses documentos evidencia o interesse do Estado em obter informações para justificar a extinção das aldeias, de acordo com a lei. No Rio de Janeiro, dando cumprimento às ordens do governo central, o presidente da província estabeleceu significativa correspondência com as autoridades municipais, sobretudo juízes de órfãos para saber se "...existem povoações de índios, qual o estado de seu aldeamento, nação e patrimônio..." (10). Pedia-se também informações sobre as terras das aldeias e suas medições, bem como sobre os possíveis serviços que os índios por ventura prestassem aos moradores e/ou autoridades. O teor dos documentos aponta para o interesse das autoridades em extinguir as aldeias. Para isso era preciso constatar seu desaparecimento ou estado de decadência, o que se revela em muitos relatos com referência a antigas aldeias abandonadas há muitos anos, por índios que viviam dispersos, vagando pelos sertões. Documento de 1859 da Diretoria Geral dos Índios em Quissamã informa sobre os diversos aldeamentos existentes na província do Rio de Janeiro: o de São Fidélis, o da Pedra, no município de São Fidélis, o de São Pedro no de Cabo-Frio, o de São Lourenço no de Niterói, e o de São Barnabé, e terras pertencentes aos índios em Mangaratiba, Resende, e Valença (11). Sobre a aldeia de São Pedro, informa que:

[...] os descendentes destes índios acham-se confundidos na massa geral da população, não sendo possível calcular o seu número: entretanto, pelo Sr. Joaquim Rodrigues Peixoto membro de uma comissão da Câmara Municipal de Cabo Frio encarregada em 1856 de dar informações sobre o aldeamento, já computada a população derivada dos indígenas em cerca de novecentos indivíduos de um e outro sexo (12).

A afirmação merece alguns questionamentos, pois é no mínimo surpreendente que num grupo dito diluído entre a "massa geral da população" tenham sido identificados, três anos antes, cerca de 900 indivíduos "derivados dos indígenas", conforme parece indicar o trecho citado. Além disso, a situação apresentada é contrastante com a atuação desses índios alguns anos depois. Em 1865, ainda pediam "[...] providências para que cesse o vexame que estão sofrendo pela falta de registro de terras" (13). Em atendimento a esta solicitação, foi dada ao Presidente da Província concessão para relevar as multas envolvendo os índios por falta de registros de terras. Em 1872, outro documento sobre a aldeia informa ter sido ela desmembrada, criando-se como parte da Conservatoria dos Índios a Freguezia de São Vicente de Paulo do município de Araruama, no qual não deve haver mais que oitenta índios de ambos os sexos."Os seus descendentes que são os atuais moradores desta Conservatoria, acham-se civilizados e confundidos na massa geral da população" (14). Documentos posteriores, da década de 80 informam sobre a ausência de terrenos devolutos no município, sem qualquer referência à aldeia. Embora escassas, essas informações apontam para a atuação dos índios em busca de seus direitos, desafiando o discurso da dispersão e do abandono da aldeia, que permitiria ao Estado considerá-los civilizados e, em conformidade com a lei, extinguir sua aldeia, o que acabou de fato ocorrendo algumas décadas depois.

A aldeia de São Lourenço foi extinta em 1866, porém desde 1861, a Câmara Municipal de Niterói solicitava à Presidência da Província a incorporação dos terrenos da sesmaria da aldeia, alegando serem estes os melhores terrenos do município que pouco rendem, sob a administração de pessoas desinteressadas. Alegavam a importância desses rendimentos para cobrir despesas da cidade, cujos recursos eram escassos e que os "... indígenas com o andar dos tempos, tem desaparecido, e mesmo os muito poucos que existem, não são puros" (15). Em outubro de 1865, foi dada autorização para que o Presidente da Província extinguisse a aldeia, sob a alegação de " (...) que os poucos índios ali existentes com esta denominação se acham nas circunstâncias de entrarem no gozo dos direitos comuns a todos os brasileiros..." (16) No mesmo documento, autorizava-se a distribuição de lotes de terras "(...) a cada família, no ponto onde já possui casa e lavoura, bem como aos solteiros maiores de 21 anos, que tenham economia separada, um lote de terras com cerca de 22,500 a 62, 500 braças quadradas que ficará sendo propriedade de tais indivíduos depois de cinco anos de efetiva residência e cultura."(17). No ano seguinte, documento, provavelmente da Câmara Municipal, negava a pretensão de "...intitulados índios, que solicitam a continuação de mensalidades outrora arbitradas (...)", afirmando que "(...) não há que deferir-lhes, desde que o Aviso de 31 de outubro do ano próximo findo, extinguindo o mencionado aldeamento, fez desaparecer a "(...) entidade Índios e proveu ao bem estar dos que com essa denominação ainda ali existiam" (18).

O Aviso declarou, portanto, o desaparecimento não só da aldeia, mas também dos índios, que apesar terem sua presença ali reconhecida, ao reivindicarem direitos um ano depois, eram declarados inexistentes pelas autoridades locais. Os exemplos citados confirmam que o discurso das autoridades construía-se conforme seus interesses em ter acesso às terras das aldeias, porém respeitando as exigências da legislação. Assim, aos índios nas aldeias ou em terrenos das aldeias, as autoridades informantes acrescentavam advérbios e adjetivos como "poucos", "diminutos", "misturados", "civilizados" e os tornavam inexistentes, justificando a extinção das aldeias.

3. Política Indígena e Política Indigenista: municipalização e conflitos agrários nas terras indígenas do Espírito Santo

Ao longo da permanência da Companhia de Jesus na capitania do Espírito Santo, duas missões se tornaram particularmente populosas e importantes na região: Nossa Senhora da Assunção de Reritiba e Santo Inácio dos Reis Magos. Ambas foram fundadas no século XVI e tornaram-se bem conhecidas dentro da ordem por receberem estudantes interessados em aprender a língua geral brasílica (Leite, 2006: 231). Com a expulsão dos jesuítas da colônia pelo marques de Pombal, em 1759, os dois aldeamentos foram transformados em vilas, iniciando-se um longo e conflituoso processo de municipalização, e seus moradores índios foram submetidos às novas normas estabelecidas pelo Diretório. Trinta anos depois, em 1790, o capitão-mor do Espírito Santo, Inácio João Mongeardino, informava que a capitania possuía cinco vilas, dentre as quais duas eram "vilas de índios", e ambas só eram menos populosas que a vila de Vitória, que funcionava como cabeça de comarca e capital (Moreira, 2011: 4). Eram elas Nova Benavente e Nova Almeida, respectivamente os antigos aldeamentos de Reritiba e dos Reis Magos.

Apesar das mudanças instituídas pela política indigenista pombalina, continuou-se reconhecendo o direito dos índios sobre suas terras, na qualidade de primeiros e naturais habitantes do Brasil. Essa orientação estava bem assente na Lei das Liberdades, de 6 de junho de 1755, e nas orientações que acompanharam os mandatos para que certas missões fossem dissolvidas e erguidas, em seus lugares, vilas e povoados, pois se ordenou que fossem demarcadas as terras que pertenceriam aos índios, passando-lhes novas cartas de sesmarias (19). Apesar disso, as terras dos índios não ficaram a salvo. Por um lado, porque ocorreram várias invasões e esbulhos ilegais. Por outro, porque as práticas legais e costumeiras do Antigo Regime português permitiam a sobreposição de direitos sobre uma mesma terra (Motta, 2009: 69), o que tornava o direito de domínio dos índios ainda mais precário.

No caso dos índios, duas novidades propostas pelas reformas pombalinas estimularam, na verdade, o processo de sobreposição de direitos sobre as terras de suas sesmarias, afetando, no decorrer do tempo, a organização social deles e também o direito de posse e de domínio sobre as terras recebidas. A primeira foi a possibilidade de aforar as terras dos índios para os portugueses, nos termos estabelecidos pelo parágrafo 80 do Diretório. Justificava-se a medida como meio de favorecer o desenvolvimento da agricultura, o comércio entre índios e portugueses, os casamentos mistos e o uso da língua portuguesa entre os índios, tudo com o fito de transformá-los em vassalos sem distinção em relação aos demais.

Apesar das recomendações para o bem-viver entre índios e portugueses nas vilas recémcriadas, os aforamentos geraram, posteriormente, a multiplicação dos conflitos em torno da posse e do domínio territorial. Na vila de Nova Benavente, por exemplo, tais conflitos já eram agudos na década de 1790, motivando os índios a buscarem a justiça régia para dirimir as contendas. De acordo com a representação que eles enviaram à rainha, estavam ocorrendo ocupações de terras ilegais na vila e muitos foreiros, além disso, em vez de buscarem terras desocupadas, estavam "[...] tomando toda a terra dos ditos Índios [...] com medições e rumos falsos [...]" (20).

A segunda mudança importante promovida pela legislação pombalina foi a criação de conselhos (câmaras) nos aldeamentos indígenas elevados à condição de vilas. Por um lado, a medida referendava a ideia de que os índios deveriam ser governados, no temporal, de forma semelhante aos portugueses, podendo e devendo ocupar os cargos de juízes ordinários e vereadores de suas respectivas vilas. Por outro, a criação de vilas e conselhos afetou profundamente a territorialidade indígena, pois nem sempre as terras dos termos das vilas foram demarcadas e separadas das terras dos índios.

No Livro Tombo de criação da vila de Nova Almeida, por exemplo, está exarada a ordem de D. José I para que o termo da nova vila fosse estabelecido "[...] até os confins das terras de que presentemente se acham de posse dos Indios, as quais medireis e demarcareis com os práticos que elegeres, para que as fiquem por ora possuindo em Commum os mesmos Indios [...]" (21). A sobreposição das terras dos índios e das terras da vila foi causa, nas décadas seguintes, de muitos conflitos, pois as câmaras das vilas de Benavente e Nova Almeida tenderam a administrar as terras dos índios e aforá-las para brancos e pardos como se fossem terras da vila, prejudicando os índios e sobrepondo a jurisdição dos conselhos sobre as terras que pertenciam coletivamente aos índios e que, teoricamente, deveriam ser administradas por seus conservadores.

Os conflitos sociais e fundiários entre índios e outros moradores, tanto em Benavente quanto em Nova Almeida, agravaram-se e multiplicaram-se à medida em que os índios perdiam o poder político em suas vilas para pessoas pouco identificadas com eles, com seus costumes e com a cultura política local. Por volta da década de 1790, Benavente já apresentava uma clara tendência de tornar-se uma vila multiétnica. Por um lado, porque parte dos vereadores e juízes de sua câmara eram portugueses. Por outro, porque na petição que os índios fizeram à rainha, em 1795, eles reclamaram que a câmara estava desrespeitando o costume de "[...] não consentir Portugueses aforados com sítios, casas, engenhos nas terras dos Índios daquela Vila, exceto se algum se quiser casar com Nacional da terra [...]" (22). Esse preceito segundo os índios, ainda era respeitado em Nova Almeida. Para os índios, além disso:

[...] costume antigo também faz Lei: os Jesuítas que criaram as ditas aldeias [i.e., as aldeias de Reritiba e dos Reis Magos] que agora são vilas, nunca consentiram Portugueses algum aforados e nem dadas as ditas terras por sesmaria, como ainda se pratica em Nova Almeida. (23)

Em outras palavras, os índios mitigavam a nova orientação da política pombalina, que permitia o aforamento de suas terras aos portugueses, a partir dos seus próprios interesses e cultura política. Lembravam à rainha sobre a importância dos costumes locais e demonstravam aceitar a presença dos portugueses, desde que eles se casassem com as índias naturais da vila. Alguns anos mais tarde, o mesmo processo ocorreu em Nova Almeida.

Em 1819, o bispo D. Coutinho calculou que a vila de Nova Almeida possuía mais de 3.000 índios, frisando, contudo que "[...] esta vila já não é de índios puros, como em 1812, porque os dois juízes e alguns vereadores são portugueses" (Coutinho, 2002 [1819]: 92). A progressiva transformação de Nova Almeida em uma vila multiétnica, com novos moradores sem laços de parentesco ou de cumplicidade com os índios, foi motivo do agravamento dos conflitos na região. Em 1831, por exemplo, as autoridades estavam preocupadas com uma possível "rebelião" dos índios, pois eles estavam espalhando "[...] boatos ameaçadores e aterradores de lançarem fora [da vila] os brancos [...]" (24). Desde então, a documentação disponível atesta um crescente estado de disputa pelas terras indígenas em Nova Almeida, que caminhou pari passu com a decadência política da vila.

O poder político local, representado pelas câmaras municipais, desempenhou papel importante nas disputas de terras envolvendo índios e outros moradores na província do Espírito Santo. Isso fica particularmente em evidência no caso dos conflitos de terra em Nova Almeida. Em novembro de 1846 e em fevereiro de 1847, por exemplo, a câmara municipal de Nova Almeida expediu ofícios ao presidente da província, dando explicações sobre os aforamentos que eram realizados na sesmaria dos índios. O processo começou devido as representações que os índios Manoel Francisco de Almeida e Inácio Pereira Samora fizeram ao presidente da província, reclamando não apenas a perda de suas terras, mas também que os foros da sesmaria não eram por eles usufruídos (Moreira, 2002a).

Os vereadores explicaram que a câmara praticava o aforamento de terras na sesmaria de Nova Almeida há pelo menos 79 anos e que os rendimentos eram revertidos para cobrir a despesas da câmara porque, segundo o entendimento deles, os índios eram " ... somente usufructuários [da terra] com a regalia de não poderem ser mudados dos lugares onde se acharem residindo, e nem serem obrigados a pagamento algum [...]"(25). A afirmação de que os índios eram "usufrutuários" da terra e que sobre elas não tinham o direito de domínio não se baseava na realidade jurídica da época, pois aquelas terras foram doadas aos índios pelo rei D. José I, em carta de sesmaria, e estavam perfeitamente demarcadas no Livro de Tombo da vila. Vale lembrar, além disso, que o novo regime político, instaurado depois da Independência, manteve os direitos de domínio territorial que vinham do período colonial, deixando para rever a questão da posse e propriedade territorial em legislação específica, que apenas veio a lume em 1850, com a chamada Lei de Terras. Apesar disso, os índios estavam perdendo terras e isso acontecia com a aquiescência da governança da vila.

Os foreiros estabelecidos nas terras indígenas de Nova Almeida provinham, em sua grande maioria, da vila da Serra (26). Não é de se admirar, portanto, que, em 1852, uma parte do território de Nova Almeida tenha sido cedido à vila da Serra e que, em 1853, Nova Almeida perdesse a autonomia política e administrativa, passando a subordinar-se à Serra (Marques, 1878: 8-9). Esses episódios mostram que as vendas, aforamentos e perdas de território intensificavam-se em Nova Almeida quando os novos moradores passaram a controlar o poder político local. A partir de então, eles também passaram a arbitrar sobre o destino das terras indígenas, à revelia do direito de domínio que os índios possuíam sobre elas.

A câmara de Nova Almeida esclareceu, ainda, que muitos índios estavam perdendo suas terras por duas razões fundamentais. Primeiramente, porque estavam vendendo as terras. Mas, do ponto de vista dos oficiais da câmara, o que os índios vendiam não era, efetivamente, a terra, mas o direito de seu uso. Segundo tal entendimento, a câmara passava a cobrar foros dos novos moradores. Em segundo lugar, porque estavam ausentando-se das terras e, com isso, perdiam o direito de "usufrutuários" (27). De fato, os índios se ausentavam de suas terras por vários motivos, dentre eles porque eram requisitados pelo Estado para prestarem diversos serviços, sem chances, aliás, de recusarem. Além disso, muitos trabalhavam de forma temporária para os moradores locais, em suas fazendas, ou no corte da madeira de lei, que exigia longas temporadas nos sertões. Era natural que os índios retornassem para suas terras quando corria a notícia de alguma invasão ou aforamento, não para "incomodar", como queria fazer crer a câmara de Nova Almeida, mas para garantirem a posse do nicho em que viviam e do qual dependiam. Na opinião do governo municipal, os índios que perderam o "usufruto" da terra, pela venda ou pela ausência, não tinham o direito de formar novos ranchos em outras partes da sesmaria, embora isso fosse tolerado em regiões menos disputadas. Nesse período, Aldeia Velha, um antigo aldeamento indígena, voltou novamente a crescer, porque passou a acolher muitos índios que perdiam ou vendiam suas terras próximas à vila de Nova Almeida e iam para lá formar novos sítios. Em 1843, Aldeia Velha já possuía 2.200 habitantes, dentre os quais 1.489 foram classificados pelo pároco como índios (28). Em 1848, a região de Aldeia Velha foi desmembrada de Nova Almeida, dando origem a vila de Santa Cruz (Marques, 1878: 8).

Com as novas leis agrárias promulgadas no Brasil, a partir da segunda metade do século XIX, a territorialidade indígena sofreu modificações importantes. Tais leis visavam fomentar o mercado de trabalho e de terras no país (Martins, 1996; Silva 1996), sendo a Lei de Terras de 1850 (Lei 601, de 18/09/1850) e suas regulamentações (Decreto 1.368, de 30/01/1854) a legislação agrária mais importante do regime imperial brasileiro. No caso dos índios, contudo, deve-se acrescentar a existência de um conjunto de leis, regulamentos e avisos complementares à Lei nº 601, que liquidaram com várias aldeias e sesmarias, onde os índios possuíam o domínio coletivo das terras. Vale frisar, aliás, a Lei 1.114 , de 27 de setembro de 1860, cujo objetivo precípuo era o de desamortizar as terras indígenas para, em seguida, individualizá-las ou privatizá-las, por meio de vendas, parcelamentos ou aforamentos.

Tomando isoladamente a Lei de Terras e seus regulamentos de 1854, os direitos de domínio dos indígenas foram bastante simplificados. A nova lei não tratou, por exemplo, das terras que os índios possuíam coletivamente, graças às doações e compras realizadas no período colonial, nem tampouco do indigenato – i.e., o direito de posse e domínio, reconhecido pelo corpo normativo colonial, baseado no princípio de que eles eram os primeiros e naturais habitantes do Novo Mundo (Mendes Júnior, 1912). Limitou-se a recomendar, em seu artigo 12, que se reservassem terras devolutas para a "colonização indígena". No Decreto 1.368, de 30 de janeiro de 1854, definiu-se com maior clareza o significado e o alcance da "colonização indígena", afirmando-se, no artigo 72, que seriam "reservadas terras devolutas para a colonização e aldeamento de indígenas nos distritos onde existirem hordas selvagens" (Vasconcellos, 1885).

Ao prever a reserva de terras para o "colonização" de índios considerados "selvagens", a Lei de Terras e seus regulamentos dava suporte a uma outra legislação que lhe antecedeu e que se voltava particularmente para a questão da "catequese e civilização" dos índios ("selvagens"): o Regulamento das Missões, de 1845, cujo propósito era criar aldeias e missões para promover a ressocialização dos índios e tribos que viviam independentes nos sertões e florestas. A Lei de Terras era omissa, contudo, em relação à figura do índio que fazia parte da sociedade imperial e era, então, considerado "civilizado" ou "domesticado". O direito que eles tinham sobre as terras de suas vilas, povoados e aldeamentos foi tratado separadamente, por meio de um conjunto de leis, recomendações e avisos expedidos logo após a promulgação da Lei de Terras (Moreira, 2002a).

Os índios tidos como ressocializados passam a figurar, nos discursos oficiais da época, como "índios só de nome", "índios misturados" à população geral ou como '"mestiços", "remanescentes" ou "descendentes" de índios (Carneiro da Cunha 1992: 21), em uma clara alusão de que para ser considerado um "verdadeiro índio", a partir de então, os indivíduos e as comunidades deveriam viver isolados em regiões ainda não colonizadas ou apresentar sinais diacríticos contundentes. A Decisão 92, de 21/10/1850, publicada apenas um mês depois da Lei de Terras é exemplar. Nesse documento, afirma-se que na província do Ceará inexistia "hordas selvagens" e, por isso mesmo, a "colonização indígena", prevista na Lei de Terras, ou a "catequese e civilização" de índios, previsto no Regulamento de 1845, não eram políticas aplicáveis à realidade regional. Diante desse diagnóstico, mandou-se "sequestrar" as terras dos "descendentes de índios" que estivessem "confundidos na massa da população civilizada" e incorporá-las aos próprios nacionais (Ministério do Império– Decisão 92, 21/10/1859. Carneiro da Cunha, 1992: 214). Alguns meses depois, contudo, outro aviso, de 16 de janeiro de 1851, esclarecia as ordens anteriormente dadas. Afirmava que os índios da povoação de S. Benedito, na província do Ceará, não deveriam ter as suas terras sequestradas, pois só deveriam ser incorporadas aos próprios nacionais os terrenos que fossem dos índios, mas que estivessem "desocupadas" (Ministério do Império– Aviso 21, 16/01/1851. Carneiro da Cunha, 1992: 215).

A mesma orientação no sentido de sequestrar terras de índios que estivessem "desocupadas" será dada, posteriormente, a outras províncias do Império. No Espírito Santo, por exemplo, o caso dos aforamentos realizados pela câmara de Nova Almeida na sesmaria dos índios foi discutida nos escalões superiores da administração do Império e, por deliberação do Imperador, concluiu-se que tais aforamentos eram ilegais, pois as câmaras nunca foram autorizadas a administrar o patrimônio dos índios. Recomendava-se, contudo, que todas as posses e aforamentos realizados pela câmara fossem respeitados e os foros recolhidos até que por medida legal se resolvesse sobre esse assunto. Além disso, ordenou-se que os terrenos da sesmaria dos índios de Nova Almeida que não estivessem ocupados e cultivados fossem considerados "devolutos" (Repartição Geral de Terras Pública–Aviso 131, 01/12/1858, em Carneiro da Cunha, 1992: 255). O termo devoluto servia, nesse momento, para qualificar as terras desocupadas e que eram, por isso mesmo, também consideradas "públicas" (Silva, 1996). As terras de índios consideradas devolutas deveriam retornar, em razão disso, ao patrimônio do Estado.

A decisão legal sobre o que fazer com os foros e posses em sesmarias e terras indígenas veio em 1860. De acordo com a lei 1.114 , de 27 de setembro de 1860, em seu Art. 11, § 8, o governo ficou autorizado a "... aforar ou vender, na conformidade da lei 601, de 18 de setembro de 1850, os terrenos pertencentes as antigas Missões e Aldeias dos índios, que estiverem abandonadas, cedendo todavia a parte que julgar suficiente para a cultura dos que nelles ainda permanecerem, e os requererem." (Carneiro da Cunha, 1992: 257) A Lei 1.114 é importante, pois, com ela, foi enfim regulamentado a desamortização e privatização das terras indígenas que, na prática, já estava ocorrendo há muito tempo no Império, por recomendação, aliás, do próprio governo.

Com a nova lei, o governo ficou autorizado a aforar e vender as terras dos índios ou, ainda, repartir parte delas aos índios que as requeressem. Esta orientação oficial foi seguida até os últimos dias do regime imperial e visava acabar com a posse corporativa (coletiva) que os índios mantinham sobre as terras de aldeamentos e sesmarias. Não significava, portanto, expropriá-los de toda a terra, pois ficou reservado aos índios o direito a terem parcelas de terra, como propriedade familiar ou individual, desde que os índios fossem classificados como "índios" pelas autoridades e requeressem as terras para si e seus familiares. A Resolução 29, de 19 de maio de 1862, reafirma esse desideratum, pois autorizou o presidente da província de São Paulo a extinguir os aldeamentos, orientando, contudo, que fosse distribuído a cada família de índios:

[...] no ponto, onde já possua casa e lavoura, bem como aos solteiros maiores de vinte e um annos, que tenham economia separada, terreno sufficiente que não abranja mais de sessenta e duas mil e quinhentas braças quadradas e seja em geral de vinte e duas mil e quinhentas, que ficarão sendo propriedade desses indivíduos depois de cinco annos de effetiva residência e cultura [...] (Carneiro da Cunha, 1992: 258)

Ainda de acordo com a Resolução 29, de 19 de maio de 1862, a medida se justificava porque à:

[...] vista das informações offerecidas pelo Director Geral de Índios dessa Província [de São Paulo], convenceu-se o Governo Imperial de que ahi existem muitos aldeamentos formados de indivíduos, que, pela mór parte, somente deÍndios tem o nome [...] (Carneiro da Cunha, 1992: 258).

A liquidação de aldeamentos aconteceu em vária outras partes do Império, como o Ceará (Silva 2011; Valle 2011), Pernambuco (Valle Maranhão 2011), Rio de Janeiro (Almeida, 2007) e Espírito Santo (Moreira 2002b). Esses estudos revelam que a permanência dos índios em terras de aldeamentos ou coletivas ficou cada vez mais a reboque da avaliação das autoridades e dos poderes locais, responsáveis pela aferição do nível de integração e de ressocialização dos índios na sociedade envolvente. Em relação ao Ceará, por exemplo, Isabelle Braz Peixoto da Silva argumentou que o critério de "indianidade" utilizado pelas autoridades para definir os residentes em aldeamentos jogou papel fundamental no processo de extinção ou manutenção das terras coletivas que os índios possuíam na província. Para a autora, além disso, cada vez mais as autoridades locais restringiram a categoria de "índio" e o direito às terras coletivas aos tipos humanos "bravios" ou "aldeados" (2011: 335).

A efetiva capacidade de os índios manterem suas terras coletivas variou muito de região para região no Império. Ficava na dependência das avaliações das autoridades locais, que arbitravam se os índios estavam ou não suficientemente ressocializados ("civilizados"). Dependia também das circunstâncias e das relações de poder locais, onde os índios podiam ter mais ou menos poder de influência, ou contar ou não com aliados. Mesmo em uma província pequena, como a do Espírito Santo, a capacidade de os índios manterem suas terras e comunidades variou bastante. Durante o oitocentos, a maior parte dos índios da província foi perdendo suas terras, com exceção dos índios de Santa Cruz. Como foi dito anteriormente, Santa Cruz era o antigo povoado de Aldeia Velha, subordinado à vila de Nova Almeida. Neste povoado, logo depois da Lei de Terras de 1850, os índios conseguiram registrar suas terras de vivenda e cultivo junto ao vigário, inclusive na forma de terras coletivas (Moreira, 2002a).

O chamado "registro do vigário" foi uma exigência do Regulamento da Lei de Terras, de 1854, prevista no artigo 94. Tinha um caráter mais informativo do que jurídico, pois não criava em relação às terras registradas nenhum direito formal de propriedade (Silva, 1996: 173). De acordo com o regulamento, cabia aos vigários receber o registro das terras possuídas a qualquer título (sesmaria, aforamento ou posse) em suas respectivas freguesias. Em 3 de janeiro de 1855, o vigário de Santa Cruz informava que "[...] já recebi e registrei algumas declarações apresentadas por índios, únicos que nessa Freguesia possuem e lavram em comum terreno que em diversos lugares em que se acham reunidos em pequenas povoações [...]" (29). Em 2 de maio de 1855, o vigário relatou que havia recebido e registrado "... cinquenta e quatro declarações, sendo a maior parte de índios". Em outubro do mesmo ano o numero dos registros já havia subido para 144 e em agosto de 1858, data em que o vigário considerou completa a sua missão, o número dos registros totalizava 256 (30).

Os registros de terras de índios de Santa Cruz demonstram que, pelo menos naquele momento histórico, ainda existia uma clara tendência em aceitar e reconhecer a presença indígena na região. Isso não impediu, contudo, que eles perdessem o domínio sobre as terras não cultivadas da sesmaria que haviam recebido de D. José, na época da fundação da vila de Nova Almeida. Logo depois da desamortização das terras da sesmaria indígena de Nova Almeida, quando as partes não cultivadas foram consideradas devolutas e retornaram ao patrimônio nacional, o madeireiro Pedro Tabachi contratou com o governo imperial uma concessão territorial para fundar a colônia de Nova Trento, e introduzir 700 imigrantes alemães na região. A contrapartida recebida por Tabachi por esse esforço de colonização era a possibilidade de explorar 3.500 árvores de jacarandá (Bogo, Rosa e Pacheco, 1996: 73).

A colônia acabou fracassando, mas as tentativas de colonizar a região prosseguiram. Em 1881 foi fundado o núcleo colonial Demétrio Ribeiro, dividido em sete seções, assentando-se 2.000 italianos (Bogo, Rosa e Pacheco,1996: 73). Desde 1943, a antiga vila de Santa Cruz ganhou o nome de Aracruz. É justamente em Aracruz que estão localizadas, hoje, as terras indígenas tupiniquins, uma etnia e uma territorialidade atualmente reconhecida pela Fundação Nacional dos Índios (FUNAI).

4. Considerações Finais

Os estudos sobre o Rio de Janeiro e o Espírito Santo aqui apresentados confirmam o interesse dos índios aldeados em preservarem suas antigas aldeias coloniais e terras coletivas, desenvolvendo diferentes estratégias para fazer frente às investidas de moradores, câmaras municipais e outras autoridades contra seus interesses. Nesse sentido, os índios contribuíram para retardar o processo de extinção de suas aldeias, frustrando as expectativas de diferentes setores sociais. Legisladores e políticos imaginavam ser possível desamortizar e privatizar as terras indígenas e dar aos "remanescentes" das aldeias, no máximo, pequenas parcelas de terra tão logo eles estivessem "misturados à massa da população". No entanto, o processo de assimilação foi longo e complexo. Apesar dos moradores e câmaras municipais afirmarem, desde meados do século XVIII, o desaparecimento e a mistura dos índios, com o objetivo de se apropriarem de suas terras, esses últimos continuavam reivindicando direitos enquanto grupo. As controvérsias sobre classificações étnicas dos índios aparecem, pois, nesses conflitos, como um dos elementos centrais nas disputas por terra.

Se, no caso do Rio de Janeiro, as aldeias e povoados indígenas declarados inexistentes no século XIX acabaram realmente extintos, o mesmo não ocorreu em outras regiões. No Espírito Santo, por exemplo, por força de um processo de desenvolvimento sócio-econômico menos intenso que no Rio de Janeiro, situações diferenciadas podem ser observadas no interior da própria província. Enquanto em alguns povoados os índios também desapareceram, em outras, eles permanecem até os dias de hoje. Apesar da transformação dos aldeamentos jesuíticos em vilas e povoados, ainda no período pombalino, eles se mantiveram como lugares indígenas, onde algumas das terras coletivas foram parcialmente preservadas até os nossos dias. É instigante constatar que os índios tupiniquins do Espírito Santo estão localizados no mesmo local, onde, no final do século XVI, foi fundada a aldeia de Santo Inácio dos Reis Magos. Isso evidencia que esses, tal como muitos outros índios de diferentes regiões do Brasil, ao invés de terem desaparecido, misturados à massa da população, como afirmavam políticos e intelectuais do século XIX, permaneceram em suas terras como grupos, e reaparecem, hoje, reafirmando identidades indígenas, muitas vezes construídas nas aldeias coloniais.

Notas

(1) "Diretório que se deve observar nas Povoações dos Índios do Pará e Maranhão, enquanto Sua Majestade não mandar o contrário". Em: Moreira Netto, 1988: 165-203.

(2) Carta Régia ao Bispo do Rio de Janeiro, ordenando que as Aldeias sejam retiradas dos religiosos da Cia. e que sejam erigidas em vilas e lugares. Manuscrito (Ms) Arquivo Histórico Ultramarino (AHU) Rio de Janeiro-Avulsos (RJA), Caixa (cx)63, doc. 63.

(3) Provisão Régia para Joseph Mascarenhas Pacheco de Mello. 8 de maio de 1758. Ms.AHU RJA, caixa 63, doc.72.

(4) Memória de todas as Freguesias desse Bispado do Rio de Janeiro, 22 de janeiro de 1766. Ms. AHU.RJA cx. 84, doc. 7.

(5) "Mapa em que se compreende a relação individual das vilas desta Comarca assim das que tem Juizes de Fora como das em que há Juízes Ordinários com declaração de extensão dos termos de cada uma de suas Freguesias, do número e denominação dos engenhos lugares ou Aldeias, Fogos e Habitantes, lugares de comunicação, por onde passam as principais estradas para outras capitanias e distancias deles. Rio de Janeiro, 16 de julho de 1816. Assinado por Manuel Pedro Gomes, ouvidor da Comarca." Ms. Biblioteca Nacional (BN) I-31, 19,14.

(6) Convém ressaltar a complexidade da questão, considerando que muitos índios, com certeza, optaram pelo abandono da aldeia e da identidade indígena, assim como outros podem ser assumido a dupla identidade de "ìndios mestiços". Sem contar que podiam aparecer ora como índios, ora como mestiços, conforme circunstâncias e interesses. Estudos sobre essas questões são muito mais freqüentes para a América espanhola (Cadena, 2005; Wade, 2005), mas já têm sido observados também na América portuguesa (Pacheco de Oliveira, 1997; Almeida,2008).

(7) Decreto 426, 24 de Julho de 1845-Regulamento acerca das Missões de catechese e civilização dos Índios. Em: Beozzo,1983:169.

(8) Circular aos Presidentes de Província.1850.Ms. Arquivo Nacional (NA) Série Agricultura, IA7.4,fl 38.

(9) Circular aos Presidentes de Província. Ms. AN. Série Agricultura, JA7-4,fl.38.

(10) Ms. Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ) Presidência da Província (PP) col.115, dossiê 312, Pasta 1, n.3.

(11) Ms. APERJ.P:P col. 115 dossiê 312. Pasta 1 no75 -79.

(12) Idem.

(13) MS AN Série Agricultura, IA7-1 fl.62v.

(14) Ms.APERJ PP Col.17, Dossiê 103, pasta 1.

(15) Ms.APERJ P.P. Col.32,dossiê 118. Pasta 1

(16) Ms.AN série Agricultura, IA7-1, fl.70 v.

(17) Ms.AN série Agricultura, IA7-1, fl.70 v.

(18) Ms.AN série Agricultura, IA7-1, fl.78v

(19) BRASIL. Projeto Resgate Barão do Rio Branco, Doc. 3.634.

(20) Arquivo Histórico Ultramarino (AHU). ACL. CU. 005-01, Cx. 3, Doc. 18.226.

(21) ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, 1945:12.

(22) AHU. ACL. CU. 005-01, Cx. 3, Doc.18.226.

(23) AHU ACL. CU. 005-01, Cx. 3, Doc. 18.226.

(24) Arquivo Público do Estado do Espírito Santo (APEES). Série 751, Livro 171, 11/11/1831, p. 52

(25) FUNAI. Diretoria Geral de Pesquisa, Centro de Documentação. Ofício expedido pela câmara municipal de Nova Almeida ao presidente da província em 22/02/1847.

(26) FUNAI. Diretoria Geral de Pesquisa, Centro de Documentação. Ofício expedido pela câmara municipal de Nova Almeida ao presidente da província em 14/11/1851.

(27) FUNAI. Diretoria Geral de Pesquisa, Centro de Documentação. Ofício expedido pela câmara municipal de Nova Almeida ao presidente da província em 22/02/1847.

(28) "Mappa da populasam da freguesia de Nossa Senhora da Penha de Aldêa Velha, pertencete ao anno de 1843". http://www.ape.es.gov.br/censoscapixabas/ald

(29) APEES. Série Accioly, livro n.311, documento datado de 3 de janeiro de 1855.

(30) APEES. Série Accioly, livro n.311. Documento datado 3 de janeiro de 1855.

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Fecha de recibido: 4 de septiembre de 2012
Fecha de aceptado: 7 de noviembre de 2012
Fecha de publicado: 12 de diciembre de 2012

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