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Mundo agrario

versión On-line ISSN 1515-5994

Mundo agrar. vol.13 no.26 La Plata jun. 2013

 

COMUNICACIÓN

Variáveis evidenciadoras dos processos de transformação do campo: o caso do Espírito Santo - Brasil

Patrícia Ferraz do Nascimento(*); Ana Louise de Carvalho Fiúza(**); Marco Aurélio Marques Ferreira(***); Neide Maria de Almeida Pinto(****); Thiago de Melo Teixeira da Costa(*****)

(*) Universidade Federal de Viçosa, Brasil.
patifena@hotmail.com

(**) Universidade Federal de Viçosa, Brasil.
louisefiuza@ufv.br

(***) Universidade Federal de Viçosa, Brasil.
marcoaurelio@ufv.br

(****) Universidade Federal de Viçosa, Brasil.
nalmeida@ufv.br

(*****) Universidade Federal de Viçosa, Brasil.
thiagocosta@ufv.br

Variables disclosing the processes of transformation of the countryside: the case of the Espirito Santo - Brazil


Resumo

O presente artigo teve por objetivo analisar a ocorrência de transformações no campo, no Brasil, a partir da observação de variáveis como: tipo de trabalho, renda, perfil familiar, acesso a bens de consumo, serviços e tecnologias de informação e de comunicação. Utilizou-se de análise exploratória e do método de regressão logística, a partir de dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD), referentes ao estado do Espírito Santo. O estudo constatou que cerca de 27,2% dos indivíduos que viviam no campo apresentavam perfil urbano, revelando, que o modo de vida urbano não está totalmente circunscrito apenas a cidade.

Palavras-chave: Urbanização do campo; Modos de vida; Regressão logística.

Abstract

This article aims to analyze the occurrence of changes in the countryside, in Brazil, from the observation of variables such as type of job, income, family profile, access to consumer goods, services, and information and communication technology. There had been used exploratory analysis and logistic regression method, based on data from the Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (Brazilian National Household Sample Survey - PNAD) for the state of Espirito Santo. The study found that about 27.2% of individuals who had lived in the countryside report an urban profile, revealing that the urban lifestyle is encompassed not only in the city.

Keywords: Urbanization of the countryside; Lifestyles; Logistic regression.


1. Introdução

A modificação do modo de vida das pessoas que moram no campo, através da incorporação de novos hábitos de consumo, do acesso às tecnologias da comunicação e da informação, bem como o acesso aos serviços públicos e às políticas governamentais, expressam o potencial expansivo da cultura urbana, segundo autores como Sposito (2010), Endlich (2010), Lefebvre (2008), Santos (1996), Wirth (1979) e Rambaud (1969). Assim, o acesso a estes bens e serviços materiais e culturais se refletiria no estilo de vida, nas condições materiais de vida, tal como no seu padrão de moradia, no tempo gasto para realizarem as suas atividades, bem como nas suas formas e possibilidades de lazer.

Ao chamar a atenção para estas novas atividades econômicas e de lazer desenvolvidas no campo, Endlich (2010) indaga se o modo de vida das pessoas que vivenciam estas mudanças nas suas condições materiais e imateriais de existência poderia se caracterizar, realmente, como um modo de vida rural. A autora argumenta que a resposta para esta pergunta dependeria da concepção do  rural e urbano adotada. Segundo a autora, o rural e o urbano poderiam ser tomados como adjetivos relativos a aquilo que pertence ao campo e à cidade, respectivamente. Todavia, para Endlich (2010), rural e urbano podem ser interpretados, também, como "condições de vida", para Lefebvre (2008), como "perfil" para Harris (1971) apud Castro (2001), que já chamava a atenção para a presença de um "perfil urbano" em uma pequena cidade baiana, na década de 60; ou ainda, como "meios de vida" para Candido (1964), e como "modos de vida" para Wirth (1979), Beaujeu-Garnier (1997), Santos (1996) e Sposito (2010).

Assim, assume-se, neste artigo, a perspectiva teórica, a qual concebe o rural e o urbano como modos de vida, já que acredita-se que esta perspectiva permite perceber o campo e a cidade como espaços em movimento, marcados por dimensões sociais, materiais e imateriais, expressas através dos modos de vida que se configuram nestes espaços. Desta forma, fenômenos como os relativos ao crescimento dos novos rurais no campo, a pluriatividade, a diversificação das atividades econômicas no campo, estão apontando para uma revitalização do campo como lugar de moradia e vida. A proximidade entre o rural e o urbano pode ser percebida como instalando uma tendência de dissolução dos rótulos de citadinos e rurais, apontando, antes para a presença de indivíduos, que habitam o campo ou a cidade.

Nesse sentido, o presente artigo tem por objetivo compreender a interferência de variáveis que possam contribuir para explicar e evidenciar a manifestação do processo de urbanização no campo, tais como: tipo de trabalho e renda, acesso a bens de consumo e serviços, acesso a tecnologias da informação e comunicação. Para tal utilizou-se a análise exploratória dos dados e o método de regressão logística a fim de estimar a razão de chance do indivíduo que vive no campo ter um modo de vida rural ou urbano a partir dessas variáveis. A análise foi feita utilizando-se de dados secundários retirados do banco de dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD), referentes ao estado do Espírito Santo.

Partiu-se da hipótese de que para delimitar o modo de vida dos indivíduos é preciso levar em consideração mais do que apenas o local em que eles vivem. A análise do modo de vida dos indivíduos assim como do fenômeno da urbanização se expressam por meio de indicadores sociais e econômicos na vida das populações rurais pode servir como suporte para o planejamento e execução de políticas públicas voltadas para se perceber o campo como estando integrado às dinâmicas globais, ainda que as absorvendo de forma heterogênea e em ritmo diferenciado de localidade para localidade.

2.  A Concepção Teórica Do Processo De Urbanização Do Campo

Lefebvre (2008) foi enfático na defesa da perspectiva de que o processo de urbanização se constitui de forma totalizante, abarcando campo e cidade, ainda que em ritmos e intensidades diferenciados. No entanto, sua teoria está sujeita a muitas criticas; - sua teoria é vista como a-histórica, ela não entende o rural como algo dinâmico, que pode modificar-se com o passar do tempo, em conseqüência disso, ela aponta para o fim do rural; - além disso, a perspectiva de Lefebvre é uma perspectiva homogeneizante, ou seja, não considera as especificidades locais e os grupos sociais inseridos nesse processo.

Nesse sentido, a hipótese inversa a do fim do rural foi elaborada pelo geógrafo e sociólogo Bernard Kaiser, que se baseou na tendência demográfica oposta ao êxodo rural-urbano que se fazia presente nos países desenvolvidos a partir dos anos 1970 para formular a hipótese do renascimento do rural. Kaiser (1990) também não negava as transformações, porém essas transformações para ele culminariam no renascimento do rural. No entanto, a abordagem de Kaiser também está sujeita a críticas, na medida em que o termo renascimento também não é adequado para classificar um fenômeno inteiramente novo, ou seja, essas características do rural apresentadas por Kaiser (1990) pouco tem em comum com as do rural tradicional.

Rambaud (1969), ao estudar as relações entre citadinos e rurais, na França, no pós Segunda Guerra, a partir de uma reflexão sobre o processo de urbanização do campo, defende a perspectiva da força expansiva da cultura e do modo de vida urbano. Essa força expansiva advêm do fato de a cultura urbana possuir componentes e símbolos universais, que propiciam a abertura de espírito de uma sociedade a partir do acesso e troca de informações. No entanto vale destacar que a urbanização do campo cunhada por Rambaud (1969) é diferente da perspectiva de Lefbreve (1970).

Rambaud (1969) propõe chamar de urbanização não somente a ação da cidade sobre o campo, nem o aumento da população das cidades pela chegada dos moradores do campo, mas a "invenção de um modo de vida em vias de se tornar universal e de realizar a unidade do homem social" (Rambaud,1969), sendo que os agentes dessa transformação são tanto os moradores do campo quanto os da cidade. A urbanização se apresenta assim como um "movimento complexo, econômico, social, intelectual e afetivo" (Rambaud,1969), que, segundo o autor deve ser entendida com um processo de diferenciação de dada sociedade.

Porém, o processo de aculturação do urbano sobre o rural, se estabelece de forma negociada, os próprios habitantes do campo desejam um modo de vida urbano de menos sofrimento e almejam a paridade em relação aos citadinos. No entanto, o autor sublinha que é forte a existência de conflitos e contradições. Alguns grupos ou indivíduos são mais adeptos a cultura urbana (como mulheres, jovens, não-agricultores), enquanto outros (idosos, homens, agricultores) são mais resistentes. Alguns se utilizam do princípio de seleção, podendo coexistir assim num mesmo grupo comportamentos próprios e comportamentos de empréstimo. Assim, não fala-se aqui em uma homogeneização ou do completo desaparecimento do rural e sim de formas de hibridização entre o rural e o urbano. O enfoque então não é sobre o fenômeno da urbanização do campo por si ou em si, mas sim a diversidade do dinamismo rural diante deste fenômeno.

Candido (1964), na obra Os parceiros do Rio Bonito, descreve as transformações dos meios/condições de vida em um agrupamento de caipiras. O autor definiu cultura e sociedade caipira como um tipo social e cultural, indicando o que é no Brasil o universo das culturas tradicionais do homem do campo. Segundo ele a sociedade caipira tradicional caracterizava-se por uma vida social do tipo fechada, com base na economia de subsistência e por certa homogeneidade. Nesse sentido, ao avaliar como se comportou a cultura caipira diante de fatores de perturbação, o autor demonstra que o modo de vida caipira passa por uma redefinição de vínculos de dependência, que incorporaram a órbita das povoações, afastando-se relativamente das estruturas tradicionais típicas.

A situação estudada pelo autor é, segundo ele, resultante da coexistência dos fatores de persistência (que contribuem para a continuidade dos modos tradicionais de vida) e dos fatores de transformação que representam a incorporação de padrões modernos. Além do mais, segundo Candido (1964) a realidade é complexa e não permite ver na influencia exercida pela urbanização um processo evolutivo simples e unívoco. Os fatores tradicionais exercem ação reguladora, envolvendo os outros, combinando-se a eles, integrando-os no seu sistema. Portanto, não existe uma substituição mecânica dos padrões; mas a redefinição dos incentivos tradicionais, por meio do ajustamento dos velhos padrões ao novo contexto social.Dessa forma, a acomodação do caipira aos padrões urbanos se faz conforme possa ou não encontrar condições satisfatórias de substituição dos seus próprios.

Assim, pelo exposto acima percebe-se que a modernização faz parte do processo de urbanização porém está não se resume a aquela, já que a  urbanização permite, inclusive, a re-elaboração de elementos antigos tendo por base uma nova racionalidade e também leva em consideração os esquemas de apropriação elaborados pelos atores sociais envolvidos no processo.

4. Metodologia

4.1. Regressão Logística

No intuito de estabelecer a razão de chance de um indivíduo ser considerado rural ou urbano em função dos indicadores balizados pela teoria, o estudo fez uso do método de regressão logística multivariada. De acordo com Hair (2005), Barbetta (2008) e Corrar e Filho (2009), a regressão logística é uma técnica utilizada quando a variável dependente de um estudo é qualitativa. Para Hair (2005) a técnica possui ampla aplicação em situações nas quais se deseja identificar o grupo ao qual um objeto pertence, sendo esperado que a pertença a um grupo possa ser prevista ou explicada por um conjunto de variáveis independentes selecionadas pelo pesquisador. De acordo com Filho e Corrar (2009) quando se identifica uma relação significativa entre elas obtêm-se um modelo que pode servir para estimar o referido resultado em função de futuras observações das variáveis independentes. Dessa forma, a regressão logística atende a dois objetivos: identificar a probabilidade de ocorrência de determinado evento e classificá-lo em categorias (Corrar e Filho, 2009).

Dentre as particularidades da regressão logística que a distingui dos demais modelos de regressão destaca-se o fato de a variável dependente ser dicotômica (aceitar ou rejeitar). Segundo Hair (2005) uma variável dummy, assumi valores 1 ou 0, em função do tipo de resposta: sim ou não. No entanto, segundo Corrar e Filho (2009), embora a variável dependente só possa assumir duas posições, zero e um, torna-se necessário obter valores que possam ser interpretados em termos de probabilidade de sucesso comparada com a de fracasso. Para tanto, em primeiro lugar converte-se a probabilidade associada a cada observação em razão de chance que representa a probabilidade de sucesso comparada com a de fracasso:

Com essa técnica o pesquisador pode contornar algumas restrições encontradas em outros modelos multivariados, como a homogeneidade de variância e a normalidade na distribuição de erros. Porém, mesmo assim é necessário, ainda: a inclusão de todas as variáveis preditoras no modelo para que ele obtenha maior estabilidade; estabelecer o valor do erro esperado como zero; estabelecer a inexistência de auto-correlação entre os erros; a inexistência de auto-correlação entre os erros e as variáveis independentes; bem como a ausência de multicolinearidade perfeita entre as variáveis independentes (Corrar e Filho, 2009).

Quanto ao método para estimar coeficientes a regressão logística maximiza a "verossimilhança" de que um evento ocorra. O uso dessa técnica também exige que avalie-se o ajuste do modelo de diferentes maneiras (Hair, 2005). Corrar e Filho (2009), colocam que uma das principais medidas é o Log Likelihood Value, que busca aferir a capacidade do modelo de estimar a probabilidade associada à ocorrência de um determinado evento. Além do Log Likelihood, têm-se, também, o Teste Hosmer e Lemeshow que tem por finalidade verificar se existem diferenças significativas entre os valores preditos e os observados. Têm-se ainda a estatística Wald que mede o grau de significância de cada parâmetro da equação logística, inclusive a constante. Quanto aos testes Cox & Snell e Nagelkerke, estes procuram identificar a proporção das variações ocorridas no log da razão de chance que é explicada pelas variações ocorridas nas variáveis independentes.

Figueiredo e Correa (2009) e Xavier et. al. (2008) realizaram estudos sobre realidades rurais, utilizando-se da regressão logística. Figueiredo e Correa (2009) investigaram indicadores de educação e exclusão digital entre os trabalhadores agrícolas no Brasil, com dados da PNAD, segundo o local de residência: rural ou urbano. O modelo logístico foi utilizado com o objetivo de investigar alguns determinantes do acesso à Internet pelos trabalhadores agrícolas, e identificar aqueles que estão mais fortemente associados com as chances de as pessoas ocupadas na agricultura estarem inseridas em sistemas de tecnologia de informação e comunicação como a Internet, avaliando a influência de cada fator sobre a probabilidade de a pessoa ter acesso à Internet, mantidos constantes os demais fatores incluídos no modelo. Já Xavier et. al. (2008) estudaram a utilização do crédito rural na fruticultura irrigada. Foram definidas as principais variáveis associadas à inadimplência e foi estimada a regressão logística explicativa do fenômeno, buscando identificar os principais fatores que influenciam a inadimplência entre os fruticultores. Conforme a metodologia foram definidas variáveis com potencial de influência na capacidade de pagamento dos entrevistados, considerando que a falta de capacidade de paga­mento pode estar diretamente relacionada com a possibilidade de o produtor se tornar inadimplente.

4.2. Delimitação do estudo e fonte de dados

Trabalhou-se com análise e descrição de dados secundários extraídos da base de dados do PNAD do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referentes ao Estado do Espírito Santo no ano de 2009. O Espírito Santo é um estado brasileiro localizado na Região Sudeste do país, que conforme contagem populacional, realizada em 2010, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) totaliza 3.514.952 habitantes. O Estado contribuiu, em 2008, com 2,3% para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. A composição do PIB é a seguinte: - agropecuária: 9,3%, - indústria: 34,5%, - serviços: 56,3%. A agricultura baseia-se nos cultivos de arroz, feijão, café, legumes, cana-de-açúcar e diversas frutas (nas áreas litorâneas há plantações de banana, abacaxi, mamão, maracujá e limão, enquanto que nas montanhas são cultivados, morango e uva). O Espírito Santo é o segundo maior produtor de café em grãos do Sudeste e também desponta com significativa presença de turismo rural nos municípios serranos.

Os dados são representativos da realidade de todo o Estado, referindo-se, portanto às características gerais, apontando assim para tendências. Esses dados são concernentes ao perfil sócio-econômico, as características do trabalho, ao acesso às tecnologias de informação, aos bens de consumo e aos serviços por indivíduos de situação censitária rural e urbana. Os dados foram extraídos com o auxilio do software Stata 11.0. Em seguida, foram transpostos para o software SPSS 20.0, onde se realizou a descrição das variáveis. Por fim, realizou-se a retirada de valores considerados como extremamente discrepantes e de casos que possuíam informações incompletas.

Após estes procedimentos obteve-se uma amostra de 6.861 observações, em que 5411 referiam-se à população que vivia na cidade, enquanto que 1 450 eram referentes à população que vivia no campo. Para a descrição dos dados, partiu-se de uma análise exploratória, posteriormente foram realizados testes de hipóteses e correlações. Por fim, realizou-se uma regressão logística, em que a variável dicotômica utilizada foi a situação censitária do indivíduo, sendo caracterizados como: 1= urbano e 0=rural.  A regressão teve por objetivo verificar a porcentagem de indivíduos que viviam no campo, mas que em função das variáveis independentes apresentavam um modo de vida urbano, e também aqueles que viviam na cidade, mas que apresentavam um modo de vida rural, considerando-se como variáveis constituintes dos modos de vida: o perfil sócio-econômico, as características do trabalho, o acesso às tecnologias de informação, aos bens de consumo e aos serviços. Para a realização da análise utilizou-se o método enter que testa o modelo com todas as variáveis incluídas e o ponto de corte foi de 0,5.

Para trabalhar com o processo de urbanização do campo tornou-se necessário estabelecer parâmetros e variáveis que ajudem a explicar o fenômeno, ressalta-se, porém, que não é pretensão desse artigo estabelecer características fixas e cristalizadas sobre os modos de vida, no entanto foi necessário a utilização dessa abordagem para fins de análise e entendimento do processo. O estabelecimento de tais características baseou-se em autores como Rambaud (1969) e Candido (1964) os quais apresentam elementos e indicadores para elaborar os constructos teóricos de modo de vida rural e urbano, tais como: mudanças nas condições de realização do trabalho, acesso à escolarização, à informação e ao consumo. As variáveis independentes utilizadas a partir da teoria foram:

- Perfil socioeconômico: no que diz respeito um campo ruralizado, haveria uma tendência de predomínio de pessoas mais velhas e do sexo masculino; do homem ser considerado como o chefe de família; de haver o predomínio de atividades agrícolas; das famílias terem mais de três filhos; do rendimento mensal domiciliar per capita estar vinculado às atividades agrícolas ou aos benefícios sociais do governo; dos anos de estudo não se voltarem para a busca de uma formação profissional.

- Trabalho: em um campo em processo de urbanização seria expressivo o desenvolvimento de atividades não agrícolas; o tempo de trabalho seria limitado pelo tempo de descanso, de lazer e de dedicação a outras atividades não produtivas; começa-se a trabalhar mais tarde. Assim, considerou-se as seguintes variáveis como indicadores das transformaçoes relacionadas ao trabalho no campo urbanizado: principal atividade econômica desenvolvida; número de horas trabalhadas na semana;idade em que o respondente começou a trabalhar.

- Acesso a tecnologias de informação e comunicação: em um campo em processo de urbanização espera-se a busca pelo acesso a internet; posse de telefone móvel; e posse de televisão.

- Acesso a bens de consumo e serviços públicos: O processo de urbanização instaura no campo um modelo de consumo urbano, voltado para a compra de bens materiais e o acesso a confortos urbanos, expressos neste estudo pelas seguintes variáveis: posse de veiculo automotor; posse de geladeira; tipo de material predominante na construção das casas; posse de água canalizada; posse de iluminação elétrica no domicílio.

5. Resultados E Discussão

A partir da analise exploratória dos dados das variáveis métricas em função da situação censitária, obteve-se os resultados dispostos na Tabela 1.

Tabela 1: Análise exploratória das variáveis métricas, de acordo com a situação censitária (S.C.)

Variáveis

Análise Exploratória dos Dados

S.C.

 

Média

Desviopadrão

Var.

Mín.

Máx.

Mediana

Rural

Idade

39,6

15,6

242,7

10

86

38

Tam. família

3,6

1,5

2,2

1

9

3

Anos estudo

4,9

3,8

14,5

0

15

4

Rend. Mensal

326,6

197,8

39121,5

22,00

1000,0

273,0

Idade trabalho

10,9

3,1

9,9

4

22

10,0

Urbana

Idade

36,6

12,9

167,6

10

77

35

Tam. família

3,4

1,3

1,6

1

9

3

Anos estudo

8,5

3, 9

15,9

0

15

10

Rend. mensal

616,1

427,7

182940,7

11,0

2000,0

500,0

Idade trabalho

14,3

3,9

15,7

5

30

14,0

Fonte: Resultados da pesquisa, 2011.

Percebe-se nos dados apresentados na Tabela 1, que a média de idade da população rural foi de 39,6 anos, variando de 10 a 86 anos, com desvio-padrão relativamente alto de 15, 6. Por meio do teste de médias independentes, observou-se que a média de idade da população urbana (36,6 anos) é estatisticamente menor que a da população rural, variando de 10 a 87 anos, e com desvio padrão também inferior (12,9), indicando uma menor variação em torno da média. Estes dados revelam que, para a realidade estudada, existe uma predominância de pessoas mais velhas no campo.

No que se refere ao nível de escolaridade, observa-se que a população urbana apresentou uma média de 8,5 anos, com desvio padrão de 3,9. Enquanto que a população rural apresentou uma média numericamente inferior de 4,9 anos, com desvio-padrão de 3,8 anos. Pelo teste de médias, observou-se que a média de anos de estudo das pessoas que viviam no campo é, de fato, estatisticamente menor do que a dos habitantes da cidade. Isso se explica, segundo a teoria, pela presença de uma conduta tradicional anti-escolar rural, que não consegue esperar o tempo necessário a uma formação profissional.

Quanto à variável que descreve o tamanho das famílias, percebe-se uma média de 3,6 componentes para as famílias que vivem no campo. Enquanto que as famílias urbanas apresentam uma média estatisticamente inferior (pelo teste de médias) de 3,4 componentes. Sendo que em ambas o número de componentes variam de 1 a 9 membros, porém o desvio padrão no campo é numericamente superior. Nesse sentido, percebe-se também uma maior predominância de características tradicionais, quando comparado com o perfil urbano.

Quanto ao rendimento mensal domiciliar per capita, observou-se uma média de R$ 326, 60 para a população rural, variando de um rendimento mínimo de R$ 22,00 e máximo de R$1.000,00. Já a população urbana apresentou pelo teste de médias, uma média estatisticamente superior (R$ 616,11), com desvio-padrão também superior, variando de R$ 11,00 a 2000,00. Percebe- se então uma discrepância em relação à renda entre a sociedade rural e urbana. Através da realização da Correlação de Pearson, observou- se que existe uma associação positiva porém, fraca entre renda e escolaridade, indicando que aproximadamente 19,4% da variação em uma variável está associada com a outra.

No que se refere à idade com que o respondente começou a trabalhar, percebe-se que a média de idade da população rural foi de 10,9 anos, variando de 4 a 22 anos. Enquanto que a população urbana apresentou uma média estatisticamente superior de 14,3 anos, com desvio-padrão superior, variando de 5 a 30 anos. Portanto, a idade média de começar a trabalhar para os que vivem na cidade é estatisticamente maior do que para aqueles que vivem no campo.

Quanto ao número de horas trabalhadas por semana, observou-se que a maior parte da população que vivia no campo (28,6%) trabalhavam de 15 a 39 horas por semana; seguindo-se de 25,5% que trabalhavam de 40 a 44 horas; 19,2% trabalhavam de 45 a 48 horas; 17% trabalhavam 49 horas ou mais e apenas 9,8% que trabalhavam menos de 14 horas. Já em relação à população que vivia na cidade percebeu-se uma porcentagem maior de indivíduos (42,6%) que trabalhavam de 40 a 44 horas, seguindo-se de 17,8 % que trabalhavam de 15 a 39 horas; 17,4% de 45 a 48 horas; 17,1% que trabalhavam 49 horas ou mais e apenas 5,1% que trabalham até 14 horas por dia. Nesse sentido, pode-se cogitar que o padrão de trabalho citadino segue uma conformação tradicional, com falta de delimitação entre tempo de trabalho e tempo para outras atividades.

Em relação ao tipo de trabalho que é desenvolvido pelos habitantes do campo e da cidade, percebe-se que uma parcela majoritária (76%) da população que vive no campo desenvolve atividades agrícolas, porém percebe-se, também, que as atividades não agrícolas estavam presentes no campo, sendo desenvolvidas por 24% dos seus habitantes. Já em relação à população urbana percebe-se que, na sua grande maioria, 93,9% exerciam atividades não agrícolas, porém uma pequena parcela de indivíduos que vivia na cidade (6,1%) exerciam atividades agrícolas. Assim, apesar da supremacia da execução de atividades agrícolas pelos moradores do campo, o fato de morar no campo ou na cidade não impede o desenvolvimento de atividades agrícolas na cidade e de atividades não agrícolas no campo.

Quanto ao tipo de família, percebe-se que a categoria casal com todos os filhos de 14 ou mais anos vivendo com os pais é a mais expressiva no campo, perfazendo uma porcentagem de 27,3%, mas, também, na cidade, correspondendo a uma porcentagem de 25, 6 %. O segundo tipo de família mais frequente em ambos é o casal com todos os filhos menores de 14 anos, perfazendo 26,9% para a população rural e 21,8% da população urbana. Já com relação aos casais sem filhos estes compõem 19,2% das famílias rurais e 15, 8% das famílias urbanas, tornando-se um dado interessante, visto que, observa-se que historicamente as famílias rurais tendem a ter um menor número de casais sem filhos, devido a importância dos filhos para a reprodução e sucessão da unidade produtiva. Assim, em termos de composição familiar houve uma proximidade entre o perfil de famílias do campo e da cidade. Outro dado que vale a pena destacar é a porcentagem de famílias chefiadas por mães, observa-se essa tipologia em 16,0% das famílias urbanas e em apenas 6,4% das famílias rurais.

Em relação às variáveis referentes ao acesso às tecnologias de informação e comunicação percebeu-se discrepâncias entre o campo e a cidade, exceto quanto a posse de televisão. No que se refere ao acesso à internet, no campo 88,8% disseram não ter tido acesso a internet no período perguntando, enquanto que na cidade essa porcentagem caiu para 50,0%. Quanto à posse de telefone celular, observou-se que apenas 36,7% dos indivíduos que viviam no campo disseram possuir este aparelho, enquanto que na cidade essa porcentagem subiu para 75,9%. Quanto à posse de televisão, percebeu-se que 95,3% dos indivíduos que viviam no campo e 98,4% daqueles que residiam na cidade tinham acesso.

Quanto à posse de outros bens de consumo e serviços observou-se que no que se referia à eletrodomésticos, a geladeira estava presente em 96,6% dos casos no campo e em 98,9% na cidade. No que se referia ao acesso à iluminação elétrica, teve-se uma porcentagem de acesso de 99,3% no campo e de 99,9% na cidade. Quanto ao tipo de material predominante nas habitações, percebeu-se que em 98,9% das habitações urbanas e 97,4% das habitações rurais o material predominante era o mesmo (a alvenaria). Em relação ao acesso a água canalizada, percebe- se que em 99,4% dos casos rurais e 99,9% dos casos urbanos, tinha-se acesso a água encanada no domicílio. Já no que se referia à posse de meios de transporte, observa-se que a porcentagem da população rural que possuía veículos foi maior (60,4%) em relação a população urbana (48,4%). Estatística essa que explicita a importância da mobilidade e do deslocamento para os habitantes do campo, mas que também pode se explicar pela provável carência de transporte público no campo, fazendo com que os habitantes necessitem de um meio de locomoção próprio.

Diante das análises supracitadas, para a realização do modelo logístico foram selecionadas as seguintes variáveis independentes: idade, anos de estudo, principal atividade desenvolvida, número de componentes da família, acesso à internet, posse de celular, idade com que começou a trabalhar, acesso à iluminação elétrica, tipo de material predominante na construção, acesso à água encanada, posse de televisão, posse de geladeira e posse de veículo. Essas variáveis foram analisadas em função da variável dependente: situação censitária (dicotômica): em que o zero (0) é utilizado para representar o rural e o (1) para o urbano.

Assim, a amostra foi composta por 1450 rurais e 5411 urbanos, sendo todos classificados a priori como urbanos. Isso significa que o modelo classificaria corretamente aqueles que de fato eram urbanos, mas incorretamente os rurais. Nesse caso, a porcentagem geral de acerto seria 78,9%. O resultado, portanto, serviu como referência para avaliar a eficácia do modelo quando ele passava a trabalhar com as variáveis independentes. Em seguida, obtêm-se a estatística Wald, que avalia apenas a significância da constante incluída no modelo. Assim, com a significância de 0,00, rejeitou-se a hipótese de que a constante seria nula e concluiu-se que a constante era diferente de zero e poderia ser utilizada no modelo. Já a Tabela 2 (Teste de Omnibus) mostra os resultados referentes ao teste do modelo como um todo.

Tabela 2: Teste de Omnibus

 

Qui-quadrado

Grau de liberdade

Significância

Step

3454, 9

14

0, 00

Block

3454, 9

14

0, 00

Model

3454, 9

14

0, 00

Fonte: Resultados da pesquisa, 2011.

Como a significância é igual a 0,00, assumiu-se que pelo menos um dos parâmetros estimados não era nulo.

Tabela 3: Testes Cox & Snell Nagelkerke

-2 Log likelihood

Cox & Snell R Quadrado

Nagelkerke R Quadrado

3621,812a

0,396

0,615

Fonte: Resultados da pesquisa, 2011.

O tese de Cox & Snell está indicando que cerca de 39,6% das variações no log da razão de chance são explicadas pelo conjunto das variáveis independentes. O NagelKerke é uma versão adaptada do Cox & Snell e fornece resultados entre 0 e 1. Por essa medida, considera-se que o modelo é capaz de explicar cerca de 61,5% das variações registradas na variável dependente. A Tabela 4 refere-se ao Teste Hosmer and Lemeshow, que trata de um tipo de teste Qui- quadrado, em que deseja-se testar a hipótese de que não há diferenças significativas entre os valores preditos pelo modelo e os observados na realidade.

Tabela 4: Teste  Hosmer and Lemeshow

Qui-quadrado

df

Significância

11,26

8

0,20

Fonte: Resultados da pesquisa, 2011.

Nesse sentido, o cálculo da distribuição do Qui-quadrado leva a uma estatística de 11, 26 e um nível de significância de 0,20, que é maior do que 0,05. Assim, os valores preditos não eram estatisticamente diferentes dos valores observados, o que indicou que o modelo apresentava um bom potencial de previsão. A Tabela 5 revela o percentual de acerto do modelo, ao se considerar as variáveis independentes:

 Tabela 5: Classificação do modelo de regressão logística

Observados

Preditos

Condição de Vida

Porcentagem de acerto

Rural

Urbano

Situação censitária

Rural

1056

394

72,8

Urbana

276

5135

94,9

Porcentagem Total

                   90,2

Fonte: Resultados da pesquisa, 2011.

Inicialmente, antes da inclusão das variáveis independentes no modelo, o programa lançou todos os indivíduos como urbanos apresentando um percentual total de acerto nas classificações de 78,9%.  Ao incluir as variáveis independentes, percebe-se que o modelo prevê 72,8% dos habitantes do campo como rurais e 27,2% como urbanos. Já no que se refere à população urbana, observa-se que o programa previu 94,9 % dos habitantes da cidade como urbanos e apenas 5,1% como rurais. No total, o modelo previu corretamente 90,2% dos indivíduos em função da Condição de Vida. Observa-se também por meio do Potencial de Agregação Intelectual do Modelo (PAIM) que descreve a diferença entre as duas predições o ganho em termos de predição, fruto do uso das variáveis teóricas que foi de 14,32%.

Logo:

Porém, resta ainda avaliar a significância de cada coeficiente em particular, para tal recorre-se a estatística Wald, que testa a hipótese de que cada coeficiente não é significativamente diferente de zero.

Observa-se, portanto, em função do nível de significância que as variáveis: anos de estudo, atividade principal, rendimento mensal domiciliar per capita, acesso a internet, posse de celular, idade com que começou a trabalhar e posse de veículo poderiam ser utilizados no modelo, já que seus coeficientes não foram nulos, ou seja, essas variáveis exerciam influência no fato do indivíduo possuir um modo de vida rural ou urbano. Já as variáveis: número de componentes da família e acesso a bens de consumo (como, material predominante da construção, água encanada e geladeira), tiveram os seus coeficientes nulos, nesse sentido, essas variáveis não foram determinantes para prever a condição do indivíduo ser rural ou urbano, indicando que não existiam diferenças significativas entre ambas as populações.

Tabela 8: Variáveis na equação

Fonte: Resultados da pesquisa, 2011.

Além disso, observa-se também que as variáveis: anos de estudo, atividade principal, rendimento, acesso à internet, posse de celular e idade com que começou a trabalhar, relativas ao modo de vida, apresentavam coeficientes positivos, ou seja, uma variação positiva nessas variáveis concorreria para aumentar a chance de o indivíduo ter uma condição urbana. No entanto, a variável acesso a veículo, teve sinal negativo, ou seja, uma variação positiva nessa variável contribui para diminuir a chance de um indivíduo ser urbano, resultado esse coerente com a análise de freqüência.

Porém, duas variáveis apresentaram resultados de caráter contraditório, provavelmente em detrimento de um problema de multicolinearidade, sendo elas idade e acesso a energia elétrica. Visto que a variável idade apresentou um coeficiente de sinal positivo, no entanto a partir da realização do teste de médias, observou-se que a média de idade população rural (39,6) é estatisticamente superior a da população urbana (36,7). Nesse sentido, seria esperado que este valor recebe-se sinal negativo. Quanto ao acesso á energia elétrica, esta apresentou sinal negativo. No entanto, a frequência revelou que o acesso entre a população urbana era maior que o da população rural. Nesse sentido, seria esperado que a mesma tivesse apresentado valor positivo, ou que não fosse significativo. Por fim, dados os coeficientes das variáveis, de acordo com o modelo geral, a equação que descreveu a razão de chance em relação às variáveis estudadas teve a seguinte forma:

(*)

No modelo logístico, cada coeficiente exerce influência direta no logaritmo natural da razão de chance, mas não na probabilidade de sucesso propriamente dita. Neste formato, notou-se que a influência dos coeficientes sobre a razão de chance foi de natureza multiplicativa. Como exemplo, a variável "idade trabalho", quando recebia um aumento unitário e não se alterava as outras variáveis constantes, multiplicava a razão de chance por um fator de e0,096 = 1,10. Isso significava que cada aumento unitário no valor da variável "idade trabalho" aumentava a chance de um indivíduo se encaixar no grupo de população urbana em 10%. Já a probabilidade não era afetada de forma constante. Observou-se em um caso que a razão de chance estava em um valor de 0,11, sendo que existia 10,0% de probabilidade de o indivíduo ser do grupo urbano (chance = 0,1/(1-0,1)), o aumento unitário na variável "idade trabalho" elevaria o valor de chance para 0,12 e a probabilidade de sucesso ao valor de 11%. Isso se dá pela forma de "S" da curva logística de probabilidade, que tinha pequenas inclinações nas extremidades e grande inclinação na região central, sempre confinada entre 0 e 1.

6. Considerações Finais

O estudo constatou que as variáveis: anos de estudo, atividade principal, rendimento mensal, acesso a internet, posse de celular, idade com que começou a trabalhar e posse de veículo; poderiam ser caracterizadas como marcando a diferença entre indivíduos que possuíam um modo de vida rural ou urbano. Já as variáveis: número de componentes da família e acesso a bens de consumo, como material predominante na construção, água encanada e geladeira; não eram característicos de diferenças entre o modo de vida urbano e rural. Ou seja, retomando Rambaud (1969), reforçamos a perspectiva interpretativa de que embora a urbanização tenha surgido na cidade, ela se expande, atingindo também os habitantes do campo. Se a posse da geladeira e a alvenaria já foram consideradas como características do modo de vida das pessoas da cidade, hoje não são mais denotadores de uma distinção. O acesso à internet, celular e renda não são ainda comuns ao modo de vida dos rurais, não porque eles não o desejam, mas por restrições ligadas a oferta de infra-estrutura e oportunidade de emprego e renda.

Já no que diz respeito às variáveis anos de estudo e idade em que se começa a trabalhar, estas variáveis, segundo Rambaud (1969) apontariam para características entranhadas na cultura dos rurais, nas especificidades identitárias mais profundas, ligadas ao modo como aprenderam a se dedicar mais ao trabalho prático, o que os faz preferir a escolaridade técnica à acadêmica, a entrada no mundo do trabalho mais rápido, ao invés de uma longa formação acadêmica. Percebe-se, assim, que o processo de entrelaçamento e hibridismo entre os dois modos de vida não solapa peculiaridades identitárias, nem torna homogêneas as diferenças culturais. Apenas demonstram que as transformações sociais, culturais, tecnológicas e materiais em curso em um determinado tempo histórico não destroem aspectos identitários arraigados no contexto de vida das pessoas. Quanto à análise logística observou-se que com a inclusão das variáveis independentes, o modelo melhorou seu poder de previsão. Cerca de 27,2% dos indivíduos que viviam no campo foram previstos como urbanos, revelando assim que apesar da permanência de discrepâncias entre as duas sociedades, devido ao poder de apropriação de cada individuo, o modo de vida urbano possui uma força expansiva e não está circunscrito apenas aos habitantes da cidade.

De forma geral, alcançou-se o objetivo proposto neste estudo, visto que, o modelo de regressão logística evidenciou que um modo de vida rural ou urbano não seria explicado apenas em função da área geográfica, devendo-se levar em consideração variáveis referentes ao trabalho, renda, perfil socioeconômico, escolarização, consumo e informação, dado que, observou-se que com a inclusão das variáveis independentes, o modelo melhorou seu poder de previsão. Por fim, sugere-se a realização de futuros trabalhos que objetivem investigar a evolução do processo de urbanização do campo ao longo dos anos e pesquisas em nível micro buscando compreender como se estabelece a apropriação ou a resistência a esse processo por cada indivíduo.

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Fecha de recibido: 27 de febrero de 2012
Fecha de aceptado: 11 de octubre de 2012
Fecha de publicado: 07 de junio de 2013.

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