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Mundo agrario

versão On-line ISSN 1515-5994

Mundo agrar. vol.23 no.52 La Plata jun. 2022

http://dx.doi.org/https://doi.org/10.24215/15155994e187 

Artículo

Extensão rural no Brasil: por uma análise da instrumentação da ação pública

Rural extension in Brazil: an analysis of the instrumentation of public action

Daniela Aparecida Pacífico1  2 

1Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

2Laboratório de Estudos Rurais (LERU)

Resumo

O presente artigo tem como objetivo analisar instrumentos, técnicas e ferramentas da ação pública no Brasil com foco na atuação da assistência técnica e extensão rural governamental e não-governamental, de 2010 a 2020. O trabalho analisou os mecanismos de funcionamento da ação pública, evidenciando-os a partir das relações que foram capazes de organizar, e das implicações durante a implementação do Plano Brasil Sem Miséria Rural (BSM-Rural). A hipótese é que a extensão rural governamental e a não-governamental ao operar instrumentos, técnicas e ferramentas elaborados para implementar o BSM-Rural contribuíram para que fossem constituídas as técnicas e as ferramentas de operacionalização da Lei de ATER, em uma orquestrada sobreposição de instrumentos e de produção de efeitos. Do ponto de vista metodológico utilizou-se de pesquisa documental, da revisão bibliográfica de literatura especializada, e da pesquisa de campo realizada em 2013/2015 e 2020/2021. O estudo tomou por base a literatura de instrumentação da ação pública de Halpern; Lascoumes; Le Galès (2014). O trabalho possibilitou compreender o movimento dos instrumentos da ação pública, as relações e os efeitos gerados na convergência de políticas públicas de enfrentamento da pobreza rural no Brasil e, sobretudo, a origem das técnicas e das ferramentas que operaram a Lei de ATER.

Palavras-chave Extensão rural; Políticas públicas; Abordagem dos Instrumentos; Lei de ATER; Brasil

Abstract

This article aims to analyze instruments, techniques and tools of public action in Brazil with a focus on the performance of technical assistance and governmental and non-governmental rural extension, from 2010 to 2020. The work analyzed the mechanisms of operation of public action, evidencing them from the relationships they were able to organize, and the implications during the implementation of the Brasil Sem Miséria Rural Plan (BSM-Rural). The hypothesis is that the governmental and non-governmental rural extension, when operating instruments, techniques and tools designed to implement the BSM-Rural, contributed to the creation of the techniques and tools for the operationalization of the ATER Law, in an orchestrated overlapping of instruments. and producing effects. From a methodological point of view, documental research, a bibliographic review of specialized literature, and field research carried out in 2013/2015 and 2020/2021 were used. The study was based on HALPERN's public action instrumentation literature; LASCOUMES; LE GALÈS (2014). The work made it possible to understand the movement of the instruments of public action, the relationships and the effects generated in the convergence of public policies to face rural poverty in Brazil and, above all, the origin of the techniques and tools that operated the ATER

Keywords Rural extension; Public policies; Approach to instruments; ATER Law; Brazil

Introdução

A extensão rural enquanto uma ação estruturada no âmbito do poder público não é algo recente no Brasil e sua origem reporta-se ao processo de modernização da agricultura dos anos 1950.1 O tema contou com atenção considerável de diversos estudiosos que acumularam importante literatura entre os anos 1980 e 2010 (Freire, 1983; Gonçalves Neto, 1997; Hespanhol, 1997). Parte dos estudos consideram a vocação da extensão rural governamental como central na conformação do seu modus operandi, tendo ela se aproveitado substancialmente do fato de ter estado nos anos 1970/80, por um lado, salvaguardada pela orientação da política da EMBRATER2 – o braço da pesquisa agropecuária para transferência de tecnologia (Carvalho, 1992; Caporal, 1998; Prado, 2001) e, por outro, pelo compromisso com o crédito rural, vinculado a política agrícola (Peixoto, 2008; Diniz, 2018).

Na comunidade acadêmica especializada no assunto é consensuada a vocação da extensão rural governamental como agente fundamental na implementação de programas, de projetos e de ações múltiplas provenientes da esfera federal, estadual e municipal (Rodrigues, 1997; Souza, 2006). O modo de operar, isto é, o saber-fazer institucional, em grande medida cristalizado pela vocação da extensão rural governamental de implementar programas, projetos e ações – se observado em período longo –, também absorveu as lógicas e as teorias embutidas nas técnicas e nas ferramentas das políticas públicas implementadas por ela. O fenômeno da assimilação do modo de fazer, no caso da extensão rural governamental pode ser analisado sob a ótica de uma retroalimentação, isto é, a extensão rural governamental atuando na manutenção de políticas públicas ao passo que também impõe a elas sua lógica de funcionamento e as assimila, constituindo-se delas (Pacifico, 2016).

De história longa marcada por continuidades e descontinuidades, há um fato tardio na história institucional da política de extensão rural no Brasil que diz respeito ao marco regulatório de 2010.3 O marco institucionalizou a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER) criada em 2003. A PNATER foi fruto de ação dialogada entre Estado e sociedade e trouxe inúmeros avanços ao campo da extensão rural, dentre eles podemos citar: (i) problematizou o método difusionista e a transferência de conhecimento utilizados na extensão rural governamental, (ii) pautou novos paradigmas para o desenvolvimento rural, com base na agroecologia, e (iii) reconheceu o protagonismo das organizações da sociedade civil ligadas aos movimentos sociais na formulação e na implementação de programas, projetos e ações – até então espaço exclusivo da extensão rural governamental.4

Inicialmente o marco regulatório, concebido pela Lei nº 12.188/2010, guardava a expectativa de tornar permanente o esforço da construção participativa da PNATER (Diniz & Hespanhol, 2018). Tal esforço pode ser resumido em dois pontos fundamentais: (i) a oportunidade de ampliar os espaços de atuação da sociedade civil organizada ligada à movimentos sociais na formulação e na implementação de programas, de projetos e de ações financiadas pelo Estado, com sua incorporação no sistema brasileiro de assistência técnica e extensão rural, e (ii) a proposta de transformar os rumos da extensão rural tendo por base a sustentabilidade dos agroecossistemas e os novos paradigmas de desenvolvimento assentados na agroecologia (Caporal & Costabeber, 2004; Caporal & Ramos, 2009). Porém, é consenso na comunidade acadêmica especializada no assunto que a Lei de ATER, ao invés de tornar permanente o esforço da construção participativa da PNATER, ela modifica profundamente os princípios da PNATER. Tal argumento pode ser encontrado, por exemplo, em Diesel, Dias e Neumann (2015), no qual destacam os descompassos temporais que aconteceram entre o lançamento da PNATER, em 2004, e o regramento da forma de operação por meio da Lei de ATER, de 2010.

Estudos importantes foram feitos desde então (Zarnott et al., 2017; Zarnott et al., 2015; Rambo et al., 2015; Diesel, Dias, Neumann, 2015; Bergamasco et al., 2017; Diniz, 2018; Bergamasco et al., 2020) que, em grande medida, buscaram compreender impactos, desafios, potencialidades, limites, e como tal marco regulatório, por um lado, incidiu sobre os dois pontos fundamentais supracitados,5 e, por outro, como tem garantido (ou não) os princípios contidos no documento fundador da PNATER. Os resultados desses e de outros estudos têm mantido consenso acerca do baixo desempenho tanto ao que se referiu a ampliação dos espaços de atuação da sociedade civil organizada, quanto da efetiva transformação dos rumos da extensão rural em direção à agroecologia. Por consequência, têm enfatizado demasiada depreciação dos princípios contidos no documento fundador, uma vez que a Lei de ATER rumou para caminhos distantes dos preconizados no documento da Política (Caporal, 2014; Peixoto, 2014; Diesel et al., 2015; Bergamasco et al., 2017).

De modo geral, a literatura vem sugerindo que o peso institucional da velha vocação da extensão rural governamental de ser agente fundamental na implementação de programas, projetos e ações financiados pelo Estado incide diretamente na conformação de seu modus operandi e na constituição de seus próprios instrumentos (Pörsch, Grisa & Kubo, 2018; Pacifico, 2016). Neste sentido, cabe problematizar acerca dos efeitos do marco regulatório de 2010 e analisar os instrumentos, as técnicas e as ferramentas daí decorrentes. Quais foram efetivamente as técnicas e as ferramentas que colocaram em prática a Lei de ATER? Que efeitos produziram na década a Lei de ATER (2010/2020)? Esses questionamentos ainda são oportunos para evidenciar as relações sociais e políticas, e, sobretudo, de questionar a neutralidade das técnicas e ferramentas que operaram, e ainda operam, políticas públicas.

O presente estudo tem como objetivo analisar instrumentos, técnicas e ferramentas da ação pública no Brasil com foco na atuação da assistência técnica e extensão rural governamental e não-governamental, de 2010 a 2020. O trabalho analisa os mecanismos de funcionamento da ação pública para compreender suas implicações durante a implementação do Plano Brasil Sem Miséria Rural (BSM-Rural), e para evidenciar as relações que foram capazes de organizar. A hipótese é que a extensão rural governamental e a não-governamental, ao operar instrumentos, técnicas e ferramentas elaborados para o BSM-Rural, contribuíram para que fossem constituídas as técnicas e as ferramentas de operacionalização da Lei de ATER, em uma orquestrada sobreposição de instrumentos e de produção de efeitos.

A linha condutora da reflexão é o caso emblemático do Plano Brasil Sem Miséria Rural (BSM), que foi implementado de 2011 a 2016 por meio do trabalho da extensão rural governamental e da extensão rural não-governamental, em territórios das 5 (cinco) regiões brasileiras para o enfrentamento da pobreza rural.6 Trata-se de um caso exemplar de sobreposição de instrumentos da ação pública. A sobreposição de instrumentos torna difícil a análise dos efeitos do fenômeno da instrumentação da ação pública se buscarmos capturá-lo em isolado. A opção teórico-metodológica adotada foi a de capturar o fenômeno por meio da assistência técnica e extensão rural em ação, isto é, por meio da sua atuação.

1. Percurso teórico e metodológico

Na literatura que documenta o período histórico e político da extensão rural no Brasil há uma lacuna teórica quanto à análise sistemática de técnicas e ferramentas derivadas do (ou para o) marco regulatório em questão (a Lei de ATER). Parte considerável dos estudos concentraram-se até agora na análise da Lei de ATER, cujo foco esteve em uma análise do discurso do texto da lei, suas nomenclaturas, inclusões e exclusões, sempre em relação aos princípios do texto da antecessora, PNATER. Deste modo, entende-se que há lacuna analítica que considere os efeitos das técnicas e ferramentas do ponto de vista das relações específicas que estas organizaram no Estado, e entre este e a sociedade ao longo de dez anos, 2010/2020. Dito de outra forma, é notória a necessidade de uma abordagem do fenômeno da instrumentação de modo a problematizar a ligação entre o instrumento, suas técnicas e ferramentas, as dinâmicas estabelecidas, e as disparadas nos processos de implementação.

Tal problematização parece ser mais profícua se enquadrada no que a literatura denomina de período de territorialização da ação pública, especificamente compreendido de 2003 a 2016, justamente por permitir capturar o movimento dos instrumentos. Mas sua proficuidade parece ser vantajosa também para entender o período atual, de desterritorialização, decorrente do desmonte das políticas públicas diferenciadas para o desenvolvimento rural justamente por evidenciar a ausência de movimento, de interação entre Estado e sociedade através das políticas públicas.7

Embora estes períodos – territorialização e desterritorialização – contribuam para análise no tempo/espaço e digam muito sobre o momento atual brasileiro, estamos cientes de sua desproporcionalidade neste trabalho. Neste estudo damos ênfase em compreender “quais foram”, “como se constituiu”, e os “efeitos dos instrumentos” no período de territorialização para aí sim lançar pistas estratégicas acerca do período subsequente, isto é, a atualidade.

A ênfase está no instrumento da ação pública, que pode ser compreendido “como um dispositivo ao mesmo tempo técnico e social que organiza relações sociais específicas entre Estado e sociedade, sustentado por uma concepção de regulação em função das representações e significados que carregam” (Halpern, Lascoumes & Le Galès, 2014, p. 17). É possível diferenciá-lo em níveis de observação distinguindo-o em instrumento, técnica e ferramenta. O instrumento seria um tipo de instituição (p. ex., o censo agropecuário), a técnica um dispositivo concreto de operacionalização do instrumento (p. ex., estabelecimento familiar e estabelecimento não-familiar), e ferramenta um microdispositivo no âmbito da técnica (p. ex., até 4 módulos fiscais, como uma das características para definir estabelecimentos familiares) (Lascoumes & Le Galès, 2004, p. 14, com exemplos nossos).

O instrumento é o produto de uma operação pensada no domínio do Estado que visa produzir efeitos no comportamento de outros atores, até mesmo controlá-los do ponto de vista da ação. Destinado a produzir efeitos, um instrumento nunca é neutro. Pesquisadores como Lascoumes e Le Galès (2004) apoiam-se substancialmente na fórmula de Gaston Bachelard (1972) e abordam “o instrumento como a concretização de uma teoria”, e colocam em questão sua neutralidade técnica, analisando as estratégias políticas e o fascínio pela inovação instrumental como chaves-analíticas nos estudos sobre a instrumentação.

As noções instrumento e instrumentação permitem a elaboração de uma tipologia das relações políticas organizadas pelos instrumentos, ligadas aos tipos de legitimidade que produzem. Neste sentido, Halpern, Lascoumes e Le Galès (2014, p. 64) explicam a governabilidade moderna como indissociável da proliferação de instrumento e ferramentas que constituem as tecnologias de gestão como mediadores invisíveis, estruturantes e construtoras da capacidade de ação. É evidente que tal abordagem, ao ser aplicada para analisar o caso da extensão rural brasileira, precisa considerar as transformações ocorridas nos últimos dez anos, assim como seu desmantelamento, e das demais políticas públicas diferenciadas para o desenvolvimento rural – que foram implementadas pela extensão rural – como algo rigorosamente central. A aplicação deverá considerar ainda indicativos de continuidade e descontinuidade nos sistemas locais de ação pública (Pacifico, 2015).

De uma perspectiva cronológica, a implementação da Lei de ATER e a do Plano Brasil Sem Miséria Rural tiveram início no mesmo ano agrícola, se assim pode-se dizer. Respectivamente, em agosto de 2010 e maio de 2011, convergindo na estratégia governamental da época de combate à pobreza, se observadas as técnicas e ferramentas utilizadas tanto para operacionalizar a Lei quanto para implementar o Plano. A referida convergência somente foi possível porque o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), pasta a qual operacionalizava as ações de assistência técnica e extensão rural, assumiu a implementação do eixo de inclusão produtiva do Plano Brasil Sem Miséria Rural, no início do primeiro Governo da presidente Dilma Rousseff.8

Do ponto de vista da metodologia, este trabalho sustenta-se em pesquisa documental, revisão bibliográfica de literatura especializada, e pesquisa de campo realizada em dois momentos (2013/2015 e 2020/2021). O Quadro a seguir apresenta os níveis de observação do fenômeno da instrumentação, no qual a coluna Tipologia expressa o tipo de relação firmada entre Estado e sociedade por meio do instrumento. A coluna Marco Regulatório expõe as leis e os decretos que institucionalizaram os instrumentos da coluna seguinte (coluna Instrumento). As duas últimas colunas descrevem os níveis observados em cada instrumento, respectivamente, Técnica/dispositivo enquanto aquilo que operacionaliza o instrumento, e Ferramenta como o microdispositivo no âmbito da técnica.

Quadro 1 níveis de observação do fenômeno da instrumentação neste estudo 

Fonte: Pacífico (2016).

Do Plano Brasil Sem Miséria nos interessa o eixo da inclusão produtiva ao que se refere exclusivamente à relação entre a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural – instituída pela Lei de ATER em 2010 – e o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais (também conhecido como “programa fomento” ou “fomento produtivo”). As discussões e resultados estão organizadas nas duas seções seguintes. A próxima seção apresenta, de um ponto de vista histórico – sem demasiados detalhes – técnicas e ferramentas de assistência técnica e extensão rural utilizadas em dois momentos: momento I - de 2003 a 2010, e momento II - a partir de 2010. Na seção seguinte apresenta-se o Plano Brasil Sem Miséria Rural (BSM-Rural) a partir dos elementos programados na escala de ação governamental, com destaque para as técnicas e ferramentas fundamentais do Plano que foram manejadas pelos atores implementadores da assistência técnica e extensão rural para fazer o Plano acontecer na prática.

2. Ações de ATER: técnicas e ferramentas, antes e depois do marco regulatório

Do ponto de vista histórico, os anos 1990 foram árduos para a extensão rural governamental. A extinção da EMBRATER disparou um processo de desestruturação das empresas estatais nas unidades federativas (Gregolin, 1997). Extinções de empresas, exonerações de servidores, descontinuidade de acompanhamento e assessoria técnica junto aos agricultores marcaram a extensão de modo dramático. A assistência técnica e extensão rural não-governamental foi praticamente uma necessidade devido à ausência das agências governamentais na maior parte do país. As organizações da sociedade civil ligadas aos movimentos sociais que atuavam no acompanhamento de agricultores em situação de vulnerabilidade pautavam e demandavam atuação do Estado, ao mesmo tempo em que lideravam parte importante da crítica ao modelo homogêneo de desenvolvimento. Por sua vez, por não dependerem diretamente das ações do Estado, este mesmo período foi importante para que se consolidassem caminhos para o desenvolvimento com base nos processos ecológicos e sustentáveis.

Algumas organizações nessa época viram-se fortalecidas pelas bases sociais e políticas emergentes no Brasil e contaram, em alguma medida, com parcos apoios de cooperações internacionais à projetos de redução da pobreza no meio rural brasileiro (Dias, 2004). De modo resumido, esses fóruns de produção de ideias, ou seja, o da extensão rural governamental em processo de desestruturação e insatisfeita, e o da sociedade civil organizada e fortalecida pela abertura democrática, juntamente com os movimentos sociais que se vivificaram nas eleições presidenciais de 2002, aproximaram-se no fórum de comunidades de política pública e formularam a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER)9.

É relevante mencionar que em 2003 vivia-se o início de um governo democrático e popular com abertura para participação e controle social sobre as políticas públicas, e neste palco foram retomadas as ações de assistência técnica e extensão rural sob a coordenação da recém-criada Secretaria da Agricultura Familiar (SAF), no Ministério do Desenvolvimento Agrário. A formulação da PNATER se deu a partir de intensos debates em seminários regionais e nacionais, e ampla mobilização social. A coordenação deste processo esteve a cargo do Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural (DATER), da SAF/MDA. O desafio de tal formulação foi o de atender o imperativo socioambiental e as novas exigências da sociedade e ao mesmo tempo reestruturar o Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural (SIBRATER). Os anos de 2003 e 2004 foram extremamente importantes do ponto de vista da aglutinação institucional com a realização dos seminários; a criação do Comitê de ATER no âmbito do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), e a estruturação das técnicas e das ferramentas pelas quais a PNATER começou a existir de fato, financiando ações por meio de dinâmicas de aplicação de recursos financeiros.

Momento I

De 2003 a 2010, a transferência de recursos financeiros da PNATER para reestruturação do SIBRATER foi disciplinada por meio de convênios públicos, de contratos de repasses, da promoção de atividades de formação de extensionistas e do lançamento de editais de apoio às universidades para pesquisa e extensão em tema transversal à PNATER, isto é, o desenvolvimento rural sobre as bases da agroecologia. Os convênios públicos referiram-se a acordos firmados entre órgãos da administração pública federal, no caso o DATER/SAF/MDA, e órgãos da administração pública estadual, no caso, as empresas da extensão rural governamental, ou entidades privadas sem fins lucrativos, para realização de objetivos de interesse comum e cooperação entre os partícipes.

Há uma pluralidade de regimes jurídicos nos convênios já que um conjunto de normas diferentes atuam sobre cada um deles (Medeiros, 2017). No caso específico dos convênios de ATER, a escolha da conveniente partia de critérios de infraestrutura, capilaridade na unidade federativa e a possibilidade de contrapartidas, características presentes principalmente nas empresas de extensão rural governamentais que sobreviveram a extinção nos anos 1990. Como qualquer sistema deficiente na transparência, os critérios começaram a dar margem à questionamentos e insatisfações no âmbito do SIBRATER (Diniz & Hespanhol, 2018).

O convênio de assistência técnica e extensão rural previa, por item, o tipo de custeio e de investimento em ações de extensão rural, de modo a listar o item e seu valor. Para cada item listado uma rubrica era prevista (um valor monetário), fazendo com que cada convênio tivesse determinada quantidade de ações, e determinado valor final. As contrapartidas eram centrais e também deveriam estar listadas, como, por exemplo, os recursos humanos e a estrutura física ofertados no âmbito da cooperação. A ferramenta convênio de ATER esteve ativa de 2003 a 2010, mas aos poucos, mesmo antes da Lei de ATER, se mostrou inadequada pela complexidade e morosidade do trâmite no setor jurídico, pelo nível de detalhamento exigido, pela necessidade de um fiscal para cada convênio, pela distribuição desigual dos recursos entre as conveniadas, pelo tipo de prestação de conta exigido ao final do período, isto é, por metas e, sobretudo, pela pouca diversidade entre as conveniadas, tanto do ponto de vista social e político quanto regional e territorial.

Os contratos de repasse também são presentes há muito tempo na administração pública e são regidos pela Lei nº 8.666/93, também chamada Lei de Licitações, a qual prevê 5 (cinco) modalidades de licitação, que são: concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão, e a partir de 2002, o pregão. Os contratos foram utilizados relativamente pouco para disciplinar a transferência de recursos financeiros da PNATER por motivos técnicos, uma vez que se tratava de ferramentas extremamente difíceis em relação ao objeto – a extensão rural –, mas também por motivos políticos, de inclusão de público outro que não empresas governamentais. O desafio na utilização desta ferramenta esteve relacionado à transferência dos recursos financeiros que deveria ser processada por intermédio de instituição ou agente financeiro público federal. Em suma, por serem instrumentos tradicionais da administração pública, convênios e contratos ao serem utilizados para disciplinar recursos da extensão rural, organizaram relações também tradicionais ao estabelecerem diálogo mais profícuo com membros convencionais do sistema brasileiro de assistência técnica e extensão rural.10

A promoção direta de atividades de formação de extensionistas, geridas pelo DATER/SAF/MDA e parceiros, também foi um canal pelo qual o sentido da PNATER foi implementado. Neste caso, os projetos de desenvolvimento firmados pelo MDA com o Programa das Nações Unidades para o Desenvolvimento (PNUD) continham rubricas específicas para ações de formação e permitiam a disponibilização de recursos humanos e o custeio de atividades. Obviamente que os projetos de desenvolvimento da parceira MDA/PNUD sozinhos não seriam capazes de promover a mobilização necessária para as formações acontecerem. Estas ações contaram com a parceria de organizações da sociedade civil, de empresas governamentais de extensão rural, e de inúmeras universidades, e, após, 2008, com a parceira dos Institutos Federais de Educação Técnica e Tecnológica.

Em 2010, com a institucionalização do marco regulatório das ações de assistência técnica e extensão rural (a Lei de ATER), a formação de extensionistas enquanto uma ação dentro da política de extensão rural vai sendo esvaziada e transferida para as instituições vencedoras de Chamada de ATER. A delegação da função vai permitir que a formação de extensionistas seja ressignificada do ponto de vista da sua utilidade prática. A formação de extensionistas que teria sido abordada como formação continuada na PNATER passou a assumir encargo estritamente operacional a partir de 2010, desconectando-se dos parceiros nos territórios, e assumindo caráter de treinamento para bem operar “diagnósticos”, “atestes” e “laudos”. Isto é, bem operar o preenchimento do sistema de gestão desenvolvido para o monitoramento das Chamadas de ATER e das Chamadas de ATER-BSM (específicas para atender o público do Plano Brasil Sem Miséria).

Por fim, a última ferramenta da PNATER no período 2003/2010 foram os editais de apoio às universidades para pesquisa e extensão no tema transversal da PNATER, o desenvolvimento rural sobre as bases da agroecologia. Muito embora os editais tenham sido utilizados também após o marco regulatório, a Lei nº 12.188/2010, não mais vinculados à PNATER e sim à política nacional de agroecologia e produção orgânica para promoção de núcleos de pesquisa e extensão em agroecologia (Souza et al., 2017), os primeiros editais em parceria com o CNPq surgiram no âmbito da PNATER em 2007. Há de se creditar que os editais surgiram de demandas provenientes do Comitê de ATER do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), como uma ação de política pública.

O primeiro edital foi o de nº 36/2007, resultado de cooperação entre a SAF/MDA, a Secretaria de Segurança Alimentar e Nutricional (SESAN), do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e o CNPq, com o objetivo de selecionar projetos de extensão tecnológica inovadora, apropriada à agricultura familiar, e estimular o intercâmbio de profissionais experientes entre as diferentes regiões do País. Tanto a formação de extensionistas quanto a ação dos editais tiveram cunho formativo e de construção de conhecimento diferenciado para o fortalecimento do tema transversal da PNATER e são bem datados no tempo/espaço da implementação desta política, ao mesmo tempo em que foram fundamentais na organização de relações institucionais, sociais e políticas contextualizadas e comprometidas com os processos endógenos de desenvolvimento dos territórios.

Momento II

A partir de 2010, técnicas e ferramentas utilizadas até então sucumbem à Chamada Pública para contratação de assistência técnica e extensão rural, isto é, as técnicas e ferramentas utilizadas anteriormente deixam de ser acionadas para dar espaço à Chamada. A Chamada nada mais é do que um tipo de edital. Esses editais foram denominados de “Chamada pública”, “Chamada pública de ATER”, “Chamada de ATER”, ou ainda “Chamada de ATER-BSM”, por caracterizarem-se um chamamento às instituições de assistência técnica e extensão rural governamentais e não-governamentais para inscrição de propostas técnicas. Sua utilização no contexto da Lei de ATER, regulamentada pelo Decreto nº 7.215/2010, pode ser entendida como uma convergência de situações, ora de efeitos e de relações institucionais, sociais e políticas.

Os convênios haviam provado sua defasagem do ponto de vista operacional, e os contratos – para fins do objeto extensão rural – eram pouco adequados, pois, o caminho era o da licitação. Avaliava-se que, ao contratar nas regras da licitação a qualidade da assistência técnica e extensão rural ficaria comprometida, praticamente inviabilizada. Já esse novo edital, derivado da Lei de ATER, no caso, esse chamamento público para seleção de instituições governamentais e não-governamentais prestadoras de serviço de assistência técnica e extensão rural, se mostrou razoavelmente adequado para disciplinar a transferência de recursos financeiros da Lei de ATER, por não ser convênio, nem estar sob as regras da Lei nº 8.666/93, lei das licitações.

O chamamento é um documento público que contém as regras do funcionamento da seleção. No caso da Chamada pública elaborada para fins de seleção de instituição prestadora de serviços de assistência técnica e extensão rural, os itens do regramento podem ser resumidos em: (i) objeto da contratação; (ii) possíveis entidades executoras; (iii) público beneficiário; (iv) área geográfica; (v) descrição das atividades; (vi) prazo de execução; (vii) valor da Chamada (recurso destinado à atividade de ATER); (viii) qualificação e composição da equipe técnica; (ix) base metodológica; (x) cronograma de execução; (xi) roteiro de elaboração da proposta técnica; (xii) orientação de inscrição da proposta técnica; (xiii) critérios de seleção das entidades; (xiv) modelo de currículo institucional e de equipe (Brasil, 2011d).

Antes do Plano Brasil Sem Miséria Rural começar a ser implementado por instituições de assistência técnica e extensão rural uma única rodada de Chamadas havia sido publicada. Marcada por expectativas e inúmeras críticas, tal rodada apresentou uma assistência técnica e extensão rural extremamente amarrada ao que dizia respeito, por exemplo, (i) ao número de horas para realização de um diagnóstico, (ii) ao máximo de diagnósticos possíveis em uma semana, e (iii) às atividades individuais e coletivas previstas, sem margens para adaptações. Tais engessamentos primários foram sendo revistos ao passo que mais chamadas foram sendo publicadas, e ao passo em que outros temas – que não apenas os de enfrentamento da pobreza rural – foram sendo pautados, como é o caso das Chamadas de Agroecologia e de Sustentabilidade.

2.1 Elementos constitutivos da Chamada de ATER

As primeiras Chamadas para contratação de serviços de assistência técnica e extensão rural para implementação do Plano Brasil Sem Miséria Rural (Chamada ATER-BSM) foram em 2011 (Brasil, 2011d). O Quadro a seguir apresenta seus principais elementos.

Em 2011, foram publicadas três chamadas para contratação de serviços de assistência técnica e extensão rural para atuação específica com o Plano Brasil Sem Miséria Rural, a primeira e a segunda sob o título de “Chamada pública para seleção de entidade executora de assistência técnica e extensão rural para acompanhamento de famílias em situação de extrema pobreza”, e a terceira, com o nome de “Chamada pública da Diretoria de Políticas de Mulheres Rurais e Quilombolas (DPMRQ)”. No caso das duas primeiras (de maio e junho de 2011), as Chamadas determinaram que as famílias em situação de extrema pobreza deveriam ser de agricultores e agricultoras familiares nos termos da Lei nº 11.326/2006, lei da agricultura familiar (BRASIL, 2011d; 2011e).

A terceira Chamada ATER-BSM (de novembro de 2011) estabeleceu com detalhes o público ao se referir às famílias quilombolas. Muito embora as famílias quilombolas estivessem “resguardadas” pela lei da agricultura familiar como público prioritário segundo o artigo 3º, § 2º, inciso 5º (BRASIL, 2006), sabia-se pelas informações do Cadastro Único que a concentração da pobreza, além de ser no campo, tinha cor e sexo. Afrodescendentes e mulheres rurais eram as populações mais pobres entre os pobres. A Chamada pública para quilombolas, por sua vez, propôs alcançar não somente os agricultores/as familiares em situação de extrema pobreza, mas agricultores/as remanescentes de quilombos (Brasil, 2011f). O reconhecimento da identidade quilombola enquanto mobilizador de direitos agregou dimensão estratégica ao Plano, e reforçou o argumento pela abordagem multidimensional da extrema pobreza rural.

Quadro 2 Chamadas públicas para implementação do Plano, 2011. 

*Nos termos da Lei da Agricultura Familiar nº 11.326/2006.

Fonte: BRASIL (2011d; 2011e; 2011f). Elaborado pelo autor, setembro de 2015.

Os territórios da cidadania e/ou as comunidades nas primeiras Chamadas de ATER-BSM operaram como microdispositivos, isto é, como lotes a serem pleiteados. Os lotes nada mais foram do que unidades territoriais as quais instituições de assistência técnica e extensão rural governamental ou não-governamental poderiam se candidatar. De 2011 a 2016 foram lançadas inúmeras chamadas para contratação de serviços de ATER com foco no enfrentamento da pobreza rural e inúmeras instituições governamentais e não-governamentais concorreram, foram selecionadas, contratadas, e prestaram o serviço. Diferentemente dos convênios que exigiam uma listagem itemizada das ações a serem realizadas e custeadas, na Chamada a quantidade de recurso para o serviço de assistência técnica e extensão rural, por lote, já estava predefinido no chamamento. O valor total do lote era constituído por meio de um cálculo prospectivo, com base em um número aproximado de atividades possíveis de serem realizadas para o cumprimento do tipo de serviço contratado.

O valor destinado para um lote tomava por base uma precificação dos métodos da extensão rural como, por exemplo: 1 reunião, 1 visita técnica e um curso tinham valores fixos na Chamada, estimados por região. Com base na precificação das atividades possíveis, o cálculo se constitua, e, juntamente com a remuneração da equipe técnica, era extrapolado para o valor final a ser investido, no caso, por lotes/territórios. Também de modo diferente dos convênios nos quais não havia remuneração da equipe técnica – os recursos eram destinados para custeio e investimento –, na Chamada há remuneração da equipe técnica independentemente da instituição selecionada ser governamental ou não-governamental. Nos convênios, a equipe técnica entrava como parte da contrapartida, uma vez que o entendimento era o de que essa já pertencia a instituição, que a remunerava. Nas Chamadas as quais instituições não-governamentais foram selecionadas, muito provavelmente a remuneração da equipe técnica constituía-se em algo central para a execução do serviço, diferentemente das governamentais, nas quais a remuneração da equipe provavelmente não dependia da remuneração da Chamada.

Do ponto de vista operacional, editais traduzidos em chamamentos para contratação de serviços de assistência técnica e extensão rural avançaram, até certo ponto, ao possibilitar a incorporação de instituições não-governamentais ligadas aos movimentos sociais na prestação de serviços de ATER. Por outro lado, ao buscar libertar-se das amarras detalhistas dos convênios e dos processos de licitação dos contratos, as chamadas reinventaram a ATER ao engessar as formas de atuação (expressa em 1 reunião, 1 visita técnica, etc.). A reinvenção pautou-se na necessidade de pôr preço nas atividades de extensão rural (precificar) para ficar dentro do orçamento, mantendo a necessidade de haver um fiscal da chamada, e a realização de prestação de contas por atividades, dentre outros. Além disso, promoveu a criação de novos mecanismos, como o ateste do agricultor (uma forma do beneficiário do serviço dizer que o recebeu), ou os laudos da equipe técnica no preenchimento dos sistemas de gestão.

Tal reinvenção questionável, a propósito, foi sustentada na aposta da vocação da extensão rural governamental ser agente fundamental na implementação de programas, de projetos e de ações múltiplas. Tanto é evidente que, a liberação do recurso da Chamada se dava posteriormente a realização do serviço. A implicação disso para o caso de instituições não-governamentais ligadas aos movimentos sociais (sem fins lucrativos) era o autofinanciamento da política pública, um tipo de adiantamento para conseguirem realizar o serviço, prestar contas, e somente então serem pagas (reembolsadas).

As últimas Chamadas de ATER-BSM datam 2014/2015, e com algumas pequenas diferenças entre os contratos tiveram as atividades encerradas em 2016/2017. As Chamadas de ATER em andamento, já sob a estrutura da ANATER e realocada na Secretaria Especial de Agricultura Familiar e Desenvolvimento Agrário (SEAD), sofreram com repasses tardios de recursos às instituições que prestavam o serviço de ATER. Atualmente a ANATER é vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), e em 2018 houve as últimas publicações de Chamadas de ATER temática para atender programas específicos. Em 2019 não houve chamamento. Em 2020 e 2021, um chamamento por ano, sendo respectivamente direcionadas à assentamentos de reforma agrária no Centro Oeste e na Amazônia Legal.

A Chamada de ATER de 2020 foi destinada a 3.170 famílias com um investimento de pouco mais de 12 milhões. A Chamada de 2021, previa atender 2.397 famílias com investimento de 10 milhões de reais (ANATER, 2021). De acordo com o Quadro 2 deste trabalho, apenas as três primeiras Chamadas ATER-BSM foram destinadas para atender 30.560 famílias com investimento de mais de 38 milhões reais (Pacifico, 2016). Sem dúvidas de que para entender a trajetória dos dez anos da Lei de ATER é fundamental compreender o papel do Plano Brasil Sem Miséria na constituição das técnicas e das ferramentas de operacionalização da Lei de ATER. Para tal, é necessário observar o contexto e a forma com que o eixo de inclusão produtiva do Plano estiveram assentados nas Chamadas de ATER-BSM. A seção seguinte trata do BSM-Rural a partir de elementos programados e discricionários.

3. O PBSM: elementos programados na escala de ação governamental

O formato da Chamada, ainda incipiente e em teste em 2010, ganhou força quando os policy makers no MDA, em fevereiro de 2011, assumiram o eixo da inclusão produtiva do Plano Brasil Sem Miséria, o eixo do Rural. Instituído em 02 de junho de 2011 pelo Decreto-presidencial nº 7.492, o Plano surgiu no Governo Dilma Rousseff, no âmbito da estratégia de erradicação da extrema pobreza com a finalidade de “superar a situação de extrema pobreza da população em todo o território nacional, por meio da integração e articulação de políticas, programas e ações” (Brasil, 2011a).

A instância de gestão do Plano foi composta por três comissões: (i) comitê gestor nacional, composto por Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (que o coordenou), Casa Civil da Presidência da República, Ministério da Fazenda, e Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; (ii) grupo executivo, formado pelos secretários-executivos dos órgãos mencionados e por representante do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (que o coordenou); e (iii) grupo interministerial de acompanhamento, composto por representantes do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (que o coordenou); Casa Civil; Secretaria-Geral da Presidência da República; Ministério da Fazenda; Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; Ministério das Cidades; Ministério do Trabalho e Emprego; Ministério do Desenvolvimento Agrário; Ministério da Saúde; Ministério da Educação; e Ministério da Integração Nacional (BRASIL, 2011a). Este último grupo mobilizou a metodologia da sala de situação para acompanhar as metas do Plano. A sala de situação se constituiu em um ambiente de identificação de problemas, e funcionou como uma construção coordenada do MDS com os demais ministérios.

Para identificação do público-alvo e o planejamento das ações do Plano Brasil Sem Miséria foi utilizado o Cadastro Único para Programas Sociais, denominado por vezes de “CadÚnico”, “Cadastro Único” ou somente “Cadastro”, e este orientou o fortalecimento dos 3 (três) eixos de atuação do Plano.

(1) O eixo de garantia de renda abordou, de modo geral, as estratégias de transferências monetárias direcionadas ao alívio imediato da situação de extrema pobreza, e os instrumentos foram os seguintes: Programa Bolsa Família; Brasil Carinhoso; e Benefício de Prestação Continuada de Assistência Social.

(2) O eixo de acesso a serviços versou sobre a ampliação de serviços e ações de cidadania e bem-estar social e resumiu-se nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS); Centros de Referência Especializada de Assistência Social (CREAS); Centros de Referência para População em Situação de Rua (Centros POP); Unidades Básicas de Saúde; e o Programa Mais Educação (Costa, Mafra e Bachtold, 2014; Haddad et al., 2014).

(3) O eixo de inclusão produtiva referiu-se à oferta de oportunidades de qualificação, ocupação e renda. Para a área urbana, reuniu o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec Brasil Sem Miséria) e o Programa Nacional de Promoção do Acesso ao Mundo do Trabalho (Acessuas Trabalho). Para a área rural contou com o Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Pnater), o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais, o Programa Água para Todos, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), e, para a Região Norte, além dos já citados, contou também com o Programa Bolsa Verde (MDA, 2011). Nos anos seguintes também foi incorporado o Programa de Microfinança Rural do Banco do Nordeste – o Agroamigo (Melo, 2015). Todos os instrumentos citados, de todos os eixos do Plano, estiveram ligados a 5 (cinco) ministérios, a saber: Desenvolvimento Agrário, Integração Nacional, Educação, Meio Ambiente, e Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

O Plano Brasil Sem Miséria articulou políticas públicas já existentes, e algumas delas passaram por reformulações para se adequarem às necessidades de enfrentamento da pobreza no campo e na cidade. Para o rural brasileiro, a originalidade do Plano esteve na criação do programa de fomento. Instituído pela Lei nº 12.512, de outubro de 2011, o “programa de fomento” ou o “fomento produtivo” teve como objetivo estimular a geração de trabalho e renda com sustentabilidade e promover a segurança alimentar e nutricional.

O principal meio de operacionalização do programa fomento foi por meio da transferência de recurso financeiro não reembolsável acompanhado de serviços de assistência técnica e extensão rural (Brasil, 2011b). A primeira das condições para a participação no programa era encontrar-se em situação de extrema pobreza, e, a segunda, estar inscrito no Cadastro Único. Atendidas as condições, a família estava apta a receber acompanhamento de ATER e o valor de R$ 2.400 (dois mil e quatrocentos reais) por unidade familiar, pagos preferencialmente à mulher, em três parcelas, no prazo de até dois anos, para o investimento em um projeto produtivo agrícola ou não agrícola (Brasil, 2011b). Em 2013, a Lei 12.844/2013, no art. 13, reduziu para 2 (duas) o número de parcelas. Também houve uma exceção no valor mencionado. A Lei 12.844/2013, no Art. 13a, autorizou transferência para família beneficiária, localizada na região do semiárido, de recursos financeiros no valor de até R$ 3.000 (três mil reais) para utilização em técnicas de convivência com o Semiárido, na forma indicada por assistência técnica, denominado de Fomento Semiárido (Schröder, Camboim, 2015).

Para efeito de caracterização do público em situação de extrema pobreza, em 2011, a renda considerada foi de até R$ 70 (setenta reais) por indivíduo, por mês.11 A convergência da atuação de ministérios amparou-se na definição de uma linha de pobreza para o Plano Brasil Sem Miséria que foi baseada em linhas já adotadas administrativamente no país. O Quadro a seguir apresenta as três principais linhas de pobreza que já vinham sendo utilizadas nas políticas e programas sociais no Brasil.

Quadro 3 principais linhas de pobreza das políticas públicas brasileiras 

*Dados com base em Falcão e Costa (2014, pp. 72-73).

Fonte: elaborado pelo autor, setembro de 2015.

Falcão e Costa (2014, p. 73) explicam que uma linha da pobreza na casa dos R$ 70 por pessoa da família, ao mês, “colocaria o Plano em sintonia com um dos seus principais programas, o Bolsa Família”. Além de que basear-se nessa linha permitiu confiabilidade, visto que “os parâmetros do Bolsa Família foram construídos e discutidos por profissionais e instituições respeitadas no Brasil, ao longo de mais de uma década” (2014, p. 73). Isto é, a linha de pobreza do Programa Bolsa Família12 – cujos valores permitiram estratificação da população brasileira em pobres (renda até R$ 140 per capita ao mês) e extremamente pobres (renda de até R$ 70 per capita ao mês) – era o principal parâmetro global de aferição da extrema pobreza no país, “conferindo comparabilidade internacional aos resultados, sem deixar de proporcionar uma meta desafiadora” (2014, p. 73).

Estabelecida a linha da pobreza, também denominada de linha administrativa orientadora do Plano, ela foi aplicada aos bancos de dados da gestão pública em busca de caracterização da população extremamente pobre em todo o território nacional. Os três principais bancos de dados foram (i) o do Censo Demográfico, (ii) o da PNAD e (iii) o do Cadastro Único (Falcão e Costa, 2014). O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), a partir dos dados preliminares do Censo Demográfico 2010, buscou informações sobre a dimensão do público, a localização e as características socioeconômicas da população em situação de extrema pobreza. Os dados foram trabalhados conforme o IBGE concluía as análises do Censo, na época, recém-efetuado. Assim, o total de pessoas com renda entre R$ 1 e R$ 70 foi de 11,4 milhões, e o total de pessoas que foram classificadas em domicílio sem rendimento, de 6,8 milhões (IPEA, 2012).

Contudo, nem todos se enquadravam no perfil de extrema pobreza. Para chegar a um número mais real, o MDS solicitou averiguação a partir dos domicílios sem rendimento para ver os que detinham maior probabilidade de realmente estar em situação de extrema pobreza a partir dos seguintes critérios: (i) não ter banheiro exclusivo, (ii) não ter ligação com a rede de esgoto e não ter fossa séptica, (iii) estar em área urbana sem ligação com a rede de água, (iv) estar em área rural sem ligação com a rede de água, sem poço artesiano ou nascente, (v) não ter energia elétrica, (vi) ter ao menos um morador de 15 anos ou mais analfabeto, (vii) ter ao menos três moradores com até 14 anos, (viii) ter ao menos um morador com 65 anos ou mais (Falcão e Costa, 2014, p. 80).

Dessa maneira, seguindo critérios outros que não somente o de renda, mas de condições mínimas de higiene, acesso à água, à energia e nível de escolaridade, chegou-se a um total de 4,8 milhões de pessoas vivendo em domicílios com ao menos uma das características acima (Falcão e Costa, 2014). Ao somar os 11,4 milhões de pessoas com renda de até R$ 70 aos 4,8 milhões sem rendimento, chegou-se aos 16,2 milhões de brasileiros em situação de extrema pobreza no Brasil, com uma característica particular, isto é, 46 % dos extremamente pobres estavam no rural.

Ao aplicar a linha de pobreza do Plano Brasil Sem Miséria sobre os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), o IBGE buscou encontrar a evolução anual da taxa de extrema pobreza uma vez que a PNAD permitia o acompanhamento de tal taxa por ter como parâmetro a linha de US$ 1,25 por pessoa ao dia. Já o Cadastro Único – a terceira fonte de informações do poder público no qual a linha de pobreza do Plano Brasil Sem Miséria foi aplicada – permitiu qualificar a informação e localizar a população pobre e extremamente pobre por meio de informações sobre quem são, onde moram, o perfil educacional, o perfil de trabalho e renda, as principais despesas, características do domicílio, se há serviço de saneamento, disponibilidade de energia elétrica, coleta de lixo, se a família se declara pertencente a povos e/ou comunidades tradicionais, se são assentados de reforma agrária, agricultores familiares, etc.

A identificação da população extremamente pobre no rural partiu do Cadastro Único e encontrou apoio no sistema da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP). Decide-se assim, no comitê gestor, pela elaboração de uma lista de beneficiários a partir do cruzamento de dois bancos de dados, o do CadÚnico e o da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), respectivamente, do MDS e do MDA. A lista de beneficiários do Plano constituiu-se, primeiramente, em um esforço entre ministérios e, em seguida, no cruzamento de banco de dados, que, na gênese, não foram feitos para “dialogar”.

Por um lado, a dificuldade de identificação das famílias rurais com base somente no CadÚnico se colocou por haver alto índice de não preenchimento dos endereços nas zonas rurais, e, por outro, a necessidade política de contemplar os agricultores familiares nos termos concebidos pelo MDA, sem deixar de focar nos pobres. Neste momento, do banco de dados da DAP foi possível extrair o perfil dos que acessavam o crédito Pronaf por faixa de renda. A faixa de interesse do Plano foi a correspondente a do Grupo B (da linha de crédito do Pronaf, categoria B), isto é, agricultores com renda per capita ao mês de até R$ 70 (parâmetro de 2010). No Pronaf, esse grupo de agricultores também foi denominado de agricultores pobres, tomadores do microcrédito produtivo e que estavam na mesma linha de pobreza do Plano. Por conseguinte, aproximar os dados da DAP com os do CadÚnico se mostrava um exercício importante para a construção de uma lista de beneficiários por município, com nome e CPF. Tal busca passiva, mecânica – a partir de um script de batimento – possibilitou listar os beneficiários do Plano em ordem de prioridade.

Da perspectiva do Estado, a lista de beneficiários enquanto uma ferramenta produto do cruzamento de dois dispositivos é a materialização de mecanismos de garantias, isto é, de que famílias extremamente pobres do campo fossem acompanhadas, ao mesmo tempo em que tivessem o mínimo de capacidade de resposta mediante a utilização do recurso do fomento. Delgado e Leite (2013) estudaram os critérios operacionais e de prioridade de identificação dos agricultores familiares para o Plano e explicam o sentido de “capacidade de resposta” por meio da produção agrícola.

A lista sintetiza os critérios operacionais e os de prioridade, tornando-se uma nova ferramenta ao condensar os interesses sui generis dos ministérios em questão. Por um lado, incorporar o público do Programa Bolsa Família, e, por outro lado, o público da agricultura familiar, reconhecido pela declaração de aptidão ao Pronaf (e a necessidade de garantir que as famílias do Plano fossem também público-alvo da assistência técnica e extensão rural). No que lhe diz respeito, a lista sintetiza também o ponto de vista do Estado sobre a pobreza e a forma de enfrentá-la.

Para contornar as críticas de que parte dos necessitados haviam ficado fora das ações, a sala de situação desenvolveu a Busca Ativa para o Plano. A Busca Ativa desdobrou-se em duas estratégias: 1) uma ação de cadastramento, isto é, busca das famílias em situação de vulnerabilidade social ainda não identificadas no Cadastro Único; 2) uma ação de garantia de direitos, isto é, garantir que depois de cadastrada as famílias em situação de vulnerabilidade social fossem acompanhadas com políticas sociais. A Busca Ativa tornou-se uma identificação feita no local, e, no caso do Plano Brasil Sem Miséria Rural, tinha como objetivo a priorização de povos indígenas, comunidades quilombolas, extrativistas etc.

Para Lascoumes e Le Galès (2012), entre o que é pensado na formulação de uma política pública e na escolha da ferramenta (os elementos programados) e os ajustes (aqueles espaços abertos que permitem que atores implementadores efetuem mudanças), existem brechas para as distintas formas de fazer, para o exercício do que chamam de poder discricionário. Neste ponto, a Busca Ativa (em oposição à busca passiva) –, isto é, essa porcentagem de agricultores em situação de extrema pobreza que podia ser incorporada às ações do Plano por sugestão da extensão rural – foi uma estratégia para (i) permitir agência à ATER e (ii) amenizar a exclusão e/ou corrigir possíveis distorções que a lista viesse ter, de modo a se caracterizar como um ajuste autorizado, uma espécie de institucionalização das distintas formas de fazer; por fim, (iii) a Busca Ativa foi o que podemos chamar de desconcentração administrativa que, diferentemente dos processos de delegação permitiu alguma autonomia aos atores implementadores no processo de identificação das famílias.

A Busca Ativa foi uma inovação no âmbito da técnica que se estendeu para outras chamadas públicas para contratação de serviços de assistência técnica e extensão rural, assim como a própria disponibilização de listas de beneficiários, que, até a existência do Plano Brasil Sem Miséria Rural, não era uma prática vinculada às Chamadas de ATER.

As Chamadas de ATER Sustentabilidade e ATER Agroecologia, contemporâneas as Chamadas ATER-BSM, não foram destinadas à agricultores em situação de extrema pobreza, e é interessante observar como a disponibilização de uma lista, a de inscritos na DAP, passou a ser utilizada como um referencial. Se em algum momento a disponibilização de uma orientação de público, por meio de uma lista de quem são os agricultores familiares potenciais, pareceu tranquila e não restritiva, é exatamente aí que reside imposição. A imposição é uma característica inata aos instrumentos da ação pública e pode ser analisada por meio das exigências administrativas de enquadramento do público, e, também, pela interpretação e ajustes de tais exigências (Lascoumes e Le Galès, 2012). Em última instância, a Busca Ativa permitiu “legalização” de rotinas, e consagrou as dinâmicas internas de priorização de público. Por outro, a Busca Ativa acentuou o conflito entre os que emitiam e os que não emitiam a DAP, já que a emissão era realizada por instituições credenciadas que seguem resoluções, normativos e portarias, e, de alguma maneira, interpretações e posicionamentos políticos.

Para fins de políticas públicas, a utilidade da DAP é a de identificar e normatizar. De acordo com a Portaria ministerial nº 26, de maio de 2014, “a Declaração de Aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar é o instrumento utilizado para identificar e qualificar as Unidades Familiares de Produção Rural e suas formas associativas organizadas em pessoas jurídicas” (Brasil, 2014, p. 78). É ainda “um documento voluntário e declaratório” (MDA, 2014, p. 15). Instrumento para identificar e qualificar a unidade familiar de produção, a DAP, surgiu como ferramenta para o Pronaf, e suas diretrizes – assim como orientações do Pronaf – estão no manual de crédito rural.

As resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN) e os normativos do Banco Central do Brasil (BACEN) disciplinam o Pronaf e a DAP. Esses pilotos invisíveis da ação pública, como bem denominou Dominique Lorrain (1998), têm como base estrutural o Manual de Crédito Rural (MCR), que tem força de lei. Ora, não é exagerado afirmar que os normativos da DAP se assentaram nas orientações deste manual do mesmo modo que, em 2006, foram dele que saíram os enquadramentos dos agricultores familiares, para os termos da lei da agricultura familiar (BACEN, 2016, p.115). O objetivo inicial da DAP era o de estratificar os agricultores familiares em faixa de renda para assim escalonar seu poder de pagamento perante o agente financeiro, e, também, o tipo de subvenção direcionada a cada faixa de renda. Uma vez elaborada para compor os mecanismos de crédito rural, a DAP reuniu inúmeras travas ao longo de toda a década (2010/2020) e veio dando provas de não se constituir em um dispositivo democrático inclusivo, mas sim de seleção.

De todo modo, ao que se referiu ao cruzamento dos bancos de dados CadÚnico e DAP, houve esforço em fazer “conversar” sistemas de gestão da informação de ministérios diferentes, e, também, o empenho do Estado (até 2014) em identificar a população vulnerável para tentar incluí-la por meio de ações estratégicas. Há de se considerar, contudo, as fragilidades inerentes a esses processos que promoveram, por sua vez, processos de disjunção. De acordo com Aguilera (2014), em política pública o ato de selecionar integra uma parte e marginaliza outra, e este movimento permite que sejam criadas novas clivagens insiders/outsider, o que, para o caso do Plano Brasil Sem Miséria Rural reforçou separações entre os que eram – em alguma medida – vistos pela ação pública, e os que continuaram invisíveis.

Considerações finais

O artigo teve como objetivo analisar instrumentos, técnicas e ferramentas da ação pública no Brasil com foco na atuação da assistência técnica e extensão rural, de 2010 a 2020. O caso emblemático estudado foi a extensão rural implementando o Plano Brasil Sem Miséria Rural, e, por meio deste, confirmamos a hipótese de que a extensão rural governamental e a não-governamental, ao operar instrumentos, técnicas e ferramentas elaborados para implementar o BSM-Rural, contribuíram para que fossem constituídas as técnicas e as ferramentas de operacionalização da Lei de ATER, em uma orquestrada sobreposição de instrumentos e de produção de efeitos. Por outro lado, o estudo mostrou ainda que, o próprio BSM-Rural, ao se utilizar de dispositivos e ferramentas de outras políticas públicas (linha da pobreza, DAP, etc.), absorveu debilidades desses instrumentos, técnicas e ferramentas reproduzindo ocultamentos e exclusões.

Atenção foi dada exclusivamente à constituição das técnicas e ferramentas mobilizadas em articulação com as Chamadas de ATER para implementação do BSM-Rural, e aos efeitos que produziram do ponto de vista das relações institucionais, sociais e políticas que organizaram. O esforço empreendido foi para contribuir analiticamente na construção de conhecimento acerca do papel dos instrumentos, das técnicas e das ferramentas derivadas do (ou para o) marco regulatório das ações de ATER, de 2010, na organização de relações específicas no Estado, e entre este e a sociedade no período de territorialização da ação pública. A abordagem da instrumentação aplicada ao período da territorialização das ações de assistência técnica e extensão rural permitiu compreender o movimento de instrumentos, as conexões, as relações e os efeitos gerados na convergência de políticas públicas de enfrentamento da pobreza rural no Brasil, e, sobretudo, a origem das técnicas e das ferramentas da Lei de ATER. O movimento do instrumento só pode ser entendido de modo sistemático se capturado por meio da assistência técnica e extensão rural em ação.

A originalidade deste trabalho foi a de estudar a implementação do Plano Brasil Sem Miséria Rural por meio da atuação da ATER, considerando o desafio da análise em situações de sobreposição de instrumentos, com o objetivo de compreendê-los, juntamente com as técnicas e ferramentas em marcha no período de territorialização da ação pública. Com esta entrada evidenciou-se as relações institucionais que puderam ser vistas quando da articulação entre ministérios no enfrentamento da pobreza, e também relações sociais e políticas, quando do detalhamento sobre críticas e negociações entre Estado (ministérios) e a sociedade (instituições governamentais e não-governamentais) no ajuste das técnicas e ferramentas.

Deste modo, é possível indicar alguns dos elementos que caracterizaram a descontinuidade dos instrumentos no período de desterritorialização da ação pública, e demonstrar o efeito de produção de desprendimento da presença do Estado nos territórios. Estes efeitos podem ser observados em escalas distintas da ação pública: (i) a extinção de políticas públicas, de ministérios e secretarias que atuavam diretamente ou indiretamente no tema da extensão rural e da pobreza rural; (ii) o esvaziamento orçamentário de políticas e programas; (iii) a não regulação direta nas instâncias da administração pública; a publicação anual de Chamadas de ATER, e (iv) a redução drástica de público-alvo e de investimentos são uns destes elementos. Mas podemos considerar ainda, a extinção de chamadas temáticas, de territórios da cidadania ou de identidades, a nova desestruturação das empresas estatais de extensão rural, e o desestimulo das instituições governamentais e das não-governamentais ligadas aos movimentos sociais em participar das Chamadas de ATER justamente por precisarem autofinanciar a política pública, dentre outros. Sem soma de dúvidas essas e outras evidências apontam para um processo de desterritorialização da ação pública.

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Notas

1Para entender o processo de modernização da agricultura no Brasil e a relação com a extensão rural sugiro a leitura de alguns autores-referência no assunto (Fonseca, 1985; Queda, 1987; Delgado, 2001; Mussoi, 2011; Santana, 2011).

2Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural, criada em novembro de 1975.

3Geralmente denominado Lei de ATER, que se tratou da primeira tentativa de normatizar por meio de uma lei as ações de assistência técnica e extensão rural no Brasil. O marco regulatório Institui a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural para a Agricultura Familiar e Reforma Agrária - PNATER e o Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária – PRONATER, Lei nº 12.188/2010.

4Para uma análise detalhada da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural consultar a seguinte literatura especializada: Tavares e Ramos (2006); Dias (2008); Caporal (2008); Pettan (2010); Mussoi (2011); Pacífico (2016); Diniz (2018).

5Os pontos fundamentais são: (i) a oportunidade de ampliar os espaços de atuação da sociedade civil organizada ligada à movimentos sociais na formulação e na implementação de programas, de projetos e de ações financiadas pelo Estado, com sua incorporação no sistema brasileiro de assistência técnica e extensão rural; e, (ii) a proposta de transformar os rumos da extensão rural tendo por base a sustentabilidade dos agroecossistemas e os novos paradigmas de desenvolvimento assentados na Agroecologia.

6Como extensão rural não-governamental entende-se que existem as privadas, as de organizações (de cooperativas, por exemplo), e as ligadas aos movimentos sociais. No caso das privadas, estas são mais facilmente denominadas de “assistência técnica”. Para aprofundar no tema extensão rural pública ver Haverroth (2012), para extensão privada ver Peixoto (2009), e para o tema das ongs e extensão rural ver Dias (2004) e Alves (2012).

7Sobre o tema do desmonte das políticas públicas sugiro a leitura de autores-referência no assunto (Leite, 2015; Leite, 2019; Grisa, 2018; Mattei, 2018a E 2018b; Sabourin, 2018; Niederle, Grisa et al., 2019; Sabourin, Craviotti, Milhorance, 2020a; Sabourin et al., 2020b; Sauer et al., 2020; Schmitt, 2020; Zimmermann, 2020).

8O Ministério do Desenvolvimento Agrário foi extinto pela Medida Provisória nº 726 de 12 de maio de 2016, do Vice-presidente da República em exercício, Michel Temer, um dia depois da votação no Senado Federal que deu sequência ao impedimento da presidenta eleita Dilma Rousseff. Neste mesmo ano, as ações de assistência técnica e extensão rural foram transferidas para a Agência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (ANATER). Para uma análise qualificada do processo de criação da ANATER consultar Thomson et al., 2017 e Bergamasco et al., 2017.

9A menção a fórum de comunidades de política toma por base os estudos de GRISA (2012).

10O SIBRATER constituía uma rede nacional de assistência técnica e extensão rural com mais de 700 (setecentas) instituições governamentais e não-governamentais cadastradas no Sistema Informatizado de ATER (SIATER), e em torno de 22.000 (vinte e dois mil) técnicos/extensionistas (MDA, 2010; Pacifico, 2016).

11De 2014 a 2016 esse valor foi alterado algumas vezes e passou de R$ 70 para R$ 85.

12A linha da pobreza do Programa Bolsa Família estratifica a população em pobres e em extremamente pobres. Para cada estratificação é considerada a renda familiar dividida pelo número de pessoas da família.

Recibido: 30 de Noviembre de 2021; Aprobado: 06 de Junio de 2022; : 23 de Junio de 2022

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