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versión impresa ISSN 1666-485Xversión On-line ISSN 1668-723X

Tópicos  no.41 Santa Fe ene. 2021

 

Reseñas bibliográficas

Reseña: José Nicolao Julião, Reflexões Filosóficas sobre a história: Agostinho, Hegel e Nietzsche, Rio de Janeiro, Via Verita, 2019, 229 pp.

Antonio Lomeu1  antoniolomeu@hotmail.com

1Profesor en Historia por la Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro y Magister en Historia por la Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Dirección electrónica: antoniolomeu@hotmail.com

A tarefa de reunir três reflexões tão variadas sobre a História em um livro parece ser um grande desafio, tendo em vista que Agostinho, Hegel e Nietzsche viveram em distantes períodos da história –sobretudo se pensarmos nos séculos que separam o primeiro pensador do ultimo. No entanto, o livro Reflexões Filosóficas sobre a história, de José Nicolao Julião nos revela que esse empreendimento possui uma coesão em torno de um núcleo: a de oferecer, modestamente e substancialmente, o exame de três modelos axiais em que a reflexão filosófica sobre a história atinge certa peculiaridade, que seriam, (1) A Filosofia da História Teológica (ou Providencial), (2) A Filosofia da História Metafísica (ou Especulativa) ), (3) a Teoria da História, a Filosofia Crítica da História, a Epistemologia da história. Portanto, em função desse trajeto, podemos considerar o livro uma incursão não somente na Filosofia da Historia como também na historia da Filosofia.

Nesse sentido, o livro –que também pode ser lido em partes separadas, pois seus ensaios possuem uma interdependência– busca acentuar as relações subterrâneas entre os três autores, apresentando um panorama geral de um percurso da Filosofia da Historia importante não somente para a Filosofia Moderna, como também para o pensamento contemporâneo. Esse percurso abarca, primeiro, uma analise da visão teológica da historia contida nas reflexões de Santo Agostinho, cuja ambição de resolver os problemas eclesiásticos, mais que teóricos, o faz concentrar-se na historia pensada como salvação. Hegel, por sua vez, é apresentado como sendo o único a elaborar propositadamente uma “Filosofia da Historia” sob a forma de uma “Historia Universal”, na qual se verifica um caráter especulativo e sistemático da historia. Por último, o autor expõe o pensamento de Nietzsche como um ponto de ruptura drástica em relação aos dois primeiros filósofos, tendo em vista que propõe a idéia de uma filosofia da história criativa, desferindo criticas aos princípios norteadores da filosofia moderna da consciência.

Sendo assim, a obra está organizada em três partes e cada uma delas possui uma introdução e conclusão. O primeiro ensaio, intitulado A história teológica em Agostinho: Em busca da salvação, busca expor como se constituiu um modelo teológico da filosofia da história que tem a Providência divina como o seu princípio de determinação, o tempo linear sucessivo como a sua forma de desenvolvimento e a salvação como a sua finalidade, a partir da reflexão agostiniana da filosofia da historia. Para tanto, Julião primeiro trata de introduzir o leitor a historia do conceito de “Filosofia da História”, partindo das considerações de Aristóteles acerca da diferença entre o oficio do poeta e do historiador. Logo, após essa introdução, Julião aborda a obra Confissões com o objetivo de examinar a compreensão linear tensa do tempo agostiniana, que segundo o autor não é cronológica, senão dotada de um sentido interno, na alma, e sucessivo –ou contínuo indissociável da eternidade. Em seguida, através do estudo de “A Cidade de Deus”, ele busca destrinchar a noção de progresso histórico sagrado presente na obra e como ele somente termino no reino divino. A origem e a tensão entre as duas cidades, a de Deus e a dos ímpios, são os temas abordados na ultima parte do ensaio dedicado a Agostinho. Nela, o processo de desenvolvimento e os fins das duas cidades são ligados à história progressiva da salvação, narrada na perspectiva bíblica da ação dos grandes patriarcas em suas relações de obediência e desobediência a Deus. A conclusão seria de que a historia universal somente se completa na lei divina, e caso os seres humanos não forem instruídos a agirem a respeito do bem supremo e do mal mais elevado pelas Escrituras, o esforço humano não teria nenhum propósito. A reflexão teológica de Santo Agostinho, portanto, de acordo com Julião, tem um caráter de inaugurar as filosofias modernas de historia na medida em que as influencia com seus conceitos de providencia divina e de tempo continuo e progressivo. Seria somente no século XVIII, a partir de Kant, que a filosofia da historia viria se opor a teologia rompendo com qualquer possibilidade de se fundamentar seja a teoria, a moral, o direito, a política, e a história, a partir de uma autoridade externa divina.

A parte destinada a Hegel, A Filosofia da História Especulativa no Sistema Hegeliano da Ciência se dedica a mostrar como a filosofia, para ele, é Historia Universal (Weltgeschichte), isto é, história do progresso na consciência da liberdade. Com isso, segundo o autor, a partir das considerações do filosofo de Stuttgart, a historia ganha um estatuto filosófico fundamental, que pode ser encontrada em todas as partes de sua filosofia. A historia, portanto, possui um lugar de destaque no seu sistema filosófico na medida em que ela é a efetivação ou ampliação da liberdade. O objetivo de Julião é o de demonstrar esse lugar de destaque que a Historia Universal possui no Sistema da Ciencia hegeliano. Para tanto, primeiramente, o autor discorre sobre esse Sistema, mostrando como Hegel estava inserido na tradição da filosofia sistemática alemã e como seu sistema trata do “Todo”, no qual o parcial seria um momento falso da verdade. Por isso, como expressa Julião, no sistema hegeliano “a verdade será essencialmente sistemática, onde a verdade de cada parte só terá sentido a partir de sua relação dialética e consubstancial com o Todo” (p. 94). Três partes ou programas dividem esse Sistema de Ciencia para Hegel, a saber, uma Lógica, uma Filosofia da Natureza e uma Filosofia do Espírito que estão sistematicamente interligadas constituindo uma Totalidade. O livro analisa o primeiro programa, o da Ciência da Lógica, concentrando-se no estatuto lógico-ontológico do conceito de liberdade, num esforço de definir o objeto da lógica hegeliana, assim como seus fundamentos. Em seguida, Julião se detém no exame do lugar sistemático da História Universal e a efetivação da liberdade nos Princípios da Filosofia do Direito. De acordo com o autor, “a História Universal, no Sistema da Filosofia de Hegel, pode ser vista como a expressão máxima do Espírito objetivo, ou seja, como a história da efetivação da liberdade no âmbito do Estado, legitimada pelo Direito” e seria em função disso que “o que é mais fundamental no modelo hegeliano de se compreender a história é a teleologia imanente ao Espírito, indiferente aos desejos dos indivíduos” (p. 110). Por isso, é através da unidade dos variados interesses individuais e particulares que se concretiza o universal ou coletivo e o Estado se encarregaria de manter essa unidade, sem anular, ao mesmo tempo, identidades e oposições. O Estado permitiria ao indivíduo “levar uma vida universal”, tendo como fim a unidade verdadeira. Por essa razão, Julião explora em diferentes tópicos a realização progressiva da liberdade desde os impérios do Oriente, onde apenas um era livre, o soberano, passando pela antiguidade clássica (Grécia e Roma), alguns eram livres, até chegar ao mundo cristão moderno, sobretudo, germânico, no qual todos são livres. Conclui-se nessa parte que “a história universal não é senão o desenvolvimento da ideia de liberdade” – sugerindo que o progresso da ideia de liberdade havia alcançado sua efetivação no mundo germânico. Isso se deu na medida em que não havia restrições à liberdade, pois existia uma harmonia perfeita entre as livres escolhas dos indivíduos e as necessidades da sociedade como um todo.

Finalmente, no ultimo ensaio do livro, A filosofia histórica em Nietzsche: a história criativa, Julião aborda as considerações de Nietzsche sobre a história, tendo como base os seus escritos nos quais a crítica mais geral à cultura histórica é narrada a partir dos seus conceitos, de sentido histórico, niilismo e genealogia, tendo em vista que seria sob estas insígnias que ele de maneira mais própria pensou o domínio da história. Essa tríade conceitual é compreendida por Julião como um processo simbiótico da ampliação englobante da compreensão de Nietzsche sobre a história no decorrer de sua obra. Deste modo, é analisado, em primeiro lugar, o surgimento do termo “sentido histórico” na Segunda extemporânea e em fragmentos da época e, em segundo lugar, são abordados os termos niilismo e genealogia como uma forma de ampliação da compreensão de história no pensamento nietzschiano. A primeira parte do ensaio, As considerações de Nietzsche sobre o sentido histórico nos textos juvenis, se concentra, portanto, no mais amplo dos temas, chamando atenção para o questionamento de Nietzsche sobre a falta ou a presença de sentido histórico, seja em uma reflexão, seja em um acontecimento ou em uma situação, com consequências de utilidade ou desvantagem para vida. Julião afirma que o filósofo de Rocken produz uma “filosofia histórica” desprovida totalmente das noções de progresso e teleologia muito comum nas teorias modernas tradicionais como aparece em Kant e em Hegel. Ao contrário desses filósofos, Nietzsche se esforça tanto em diagnosticar um estado de degenerescência vital da humanidade, revelado em seu processo histórico, como em denunciar uma infecundidade objetiva do método histórico com sua pretensão de resgatar as verdades dos fatos passados. Em função disso, suas reflexões se oporão aos termos “Filosofia da Historia” ou “Historia Universal”. Para ele, a historia, porém, tem um caráter positivo, pois oferece um campo imprescindível para o filosofar. A filosofia, inclusive, só é reconhecida como possível sob o domínio histórico, pois, caso contrário, ela perde a sua dinâmica, se torna definível e consequentemente dogmática. Essa atitude filosófica inicial de Nietzsche, a crítica da cultura histórica –sem, contudo, negligenciar o valor da história faz parte do contexto crítico da Segunda extemporânea marcado pelas discussões entre os românticos e os iluministas. Moderadamente, em favor dos primeiros e, parcialmente, em oposição aos últimos, Nietzsche se insurge contra a idéia teleológica otimista do progresso evolutivo da razão, herdeira caudal da metafísica racional socrática. De acordo com a narrativa nietzschiana, ao invés de marchar rumo a um evolutivo progresso para o melhor, tal como preconiza a racionalidade moderna, a história humana acaba por caminhar para um processo de degenerescência e enfermidade (das Gebrechen, die Krankheit) rumo ao nada. Entrando mais especificamente no texto das Segundas Extemporâneas de Nietzsche, Julião realiza um breve levantamento dos autores que se dedicaram a analisar a obra, salientando as principais conclusões dos estudiosos acerca da forte critica ao Historicismo alemã contida nesse texto. O autor define a obra um esforço de propor “uma escrita filosófica da história que valorize, em certa medida, o esquecimento como um impulso criador a-histórico, o que é vital para a recriação artística do passado (p. 163).”

Mais do que apresentar três concepções paradigmáticas distintas sobre Historia de maneira original e clara, Julião revela como algumas delas se constituem não somente em oposição, mas também em continuação a antecessora. As novas filosofias da historia, portanto, por mais que critiquem os pressupostos das anteriores e estabeleçam novas perspectivas, às vezes possuem uma linha de contigüidade em relação às predecessoras. Por exemplo, embora Hegel seja visto como um pensador que, por meio da autonomia e da alteridade da consciência, respectivamente, tentou apresentar soluções racionais para o agir moral, independente de toda autoridade externa, mesmo assim, ainda em sua filosofia prática, encontramos também a persistência da sombra da Providência agostiniana, sobretudo devido à teleologia imanente aos seu sistema. Nietzsche, talvez tenha sido o ponto de ruptura mais definitivo apresentado por Julião na medida em que refletiu sobre o problema da originalidade do conhecimento nas ciências humanas, sobretudo em história, sociologia e psicologia, mantendo uma luta contra o sistema filosófico hegeliano e contra a pretensão de validade universal postulada pela metodologia das ciências naturais. Além disso, o pensamento nietzschiano introduz o tema do niilismo como falta de sentido histórico como a sua visão de mundo mais abrangente e, com isso, apresenta a sua mais dura e extensa crítica à cultura. Nesse sentido, há um claro rompimento com a tradição agostiniana e hegeliana na medida em que Nietzsche amplia a sua narrativa crítica sobre a história da humanidade, compreendendo-a como sendo um processo de desenvolvimento de deficiência, enfermidade e degenerescência. Embora haja uma enorme diferença entre as filosofias da Historia contidas no livro, podemos perceber o esforço do autor em apontar um dialogo constante entre as mesmas e como esse dialogo foi imprescindível para suas fundamentações. A analise desses modelos paradigmáticos logrou apresentar, sobretudo, algumas reflexões indispensáveis para aqueles estudiosos que se interessam sobre qual seria o exame filosófico direto da história, se a história seria necessária ou contingente, se teria uma direção ou tratar-se-ia de uma coincidência, se teria uma direção, qual seria, e como e por que ela se desenvolveria.

Recibido: 01 de Marzo de 2021; Aprobado: 01 de Mayo de 2021

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