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Revista iberoamericana de ciencia tecnología y sociedad

versión On-line ISSN 1850-0013

Rev. iberoam. cienc. tecnol. soc. vol.8 no.24 Ciudad Autónoma de Buenos Aires set. 2013

 

[article pii="nd" doctopic="oa" language="es" ccode="conicyt" status="1" version="3.1" type="ilus" order="10" seccode="cts060" sponsor="nd" stitle="Rev. iberoam. cienc. tecnol. soc." volid="8" issueno="24" dateiso="20130900" fpage="197" lpage="219" issn="1850-0013"]DOSSIER-ARTÍCULOS

[front][titlegrp][title language="pt"]Comportamento dos estabelecimentos de pequeno porte na indústria de transformação no Brasil no período 2000 a 2010[/title]- [subtitle]uma avaliação em dois setores contrastantes [/subtitle]

[title language="en"]Behavior of small businesses in the transformation industry of Brazil (2000-2010)[/title]: [subtitle]an evaluation of two contrasting sectors[/subtitle]

[/titlegrp][authgrp][author role="nd"][fname]Maria Carolina [/fname] de [surname]Azevedo Ferreira de Souza[/surname][/author], [author role="nd"][fname]Leonel[/fname][surname] Mazzali[/surname][/author], [author role="nd"][fname]Miguel Juan [/fname][surname]Bacic[/surname][/author] e [author role="nd"][fname]Rodrigo[/fname] [surname]Lanna da Silveira [/surname][/author][/authgrp]*

* Maria Carolina de Azevedo Ferreira de Souza: professora associada do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, Brasil. E-mail: carols@eco.unicamp.br. Leonel Mazzali: professor doutor do Mestrado Profissional da Faculdade de Campo Limpo Paulista, Brasil. E-mail: leonel_mazzali@uol.com.br. Miguel Juan Bacic: professor titular do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, Brasil. E-mail: bacic@eco.unicamp.br. Rodrigo Lanna da Silveira: professor doutor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, Brasil. E-mail: rodrigolanna@yahoo.com.  


[bibcom][abstract language="pt"]O trabalho analisa a evolução da participação das pequenas empresas no número de estabelecimentos e no emprego, em dois setores da indústria brasileira: alimentos e cosméticos. A partir das principais bases de dados disponíveis no Brasil, o estudo abrange o período 2000 a 2010, marcado por dois momentos distintos: 2000-2003 (baixo crescimento) e 2004-2010 (recuperação). A comparação entre os dois setores visa avaliar se as características estruturais distintas de alguma forma aparecem nas taxas de crescimento do número estabelecimentos e do número de empregados. Os dados evidenciam que a estrutura industrial do setor de cosméticos é caracteristicamente de pequenas empresas, que mantêm participação relativamente estável no total de estabelecimentos e do emprego (aproximadamente 94% e 41%, respectivamente). A importância das pequenas empresas ganha realce considerando-se que, na década com um todo, sua contribuição para a geração líquida de empregos foi superior à das grandes empresas. Situação diversa se verifica no setor de alimentos. Os dados sinalizam uma estrutura industrial atomizada, com empresas dispersas geograficamente, porém com forte presença de grandes empresas, que conduzem o dinamismo do setor. Relativamente à média da Indústria e ao setor de cosméticos, os pequenos estabelecimentos, embora relevantes, têm baixa participação na geração de emprego.[/abstract]

Palavras-chave: [keygrp scheme="nd"][keyword type="m" language="pt"]Pequena empresa[/keyword]; [keyword type="m" language="pt"]Emprego na pequena empresa[/keyword]; [keyword type="m" language="pt"]Estrutura industrial[/keyword]; [keyword type="m" language="pt"]Crescimento econômico[/keyword][/keygrp].

[abstract language="en"]This paper analyzes the evolution of the participation of small firms, in terms of number of establishments and total employment, in two sectors of Brazilian industry: foods and cosmetics. The study comprises the period between 2000 and 2010, reflecting on two different moments of the Brazilian economy: 2000-2003 (low economic growth) and 2004-2010 (economic recovery). By comparing these two sectors, we seek to find out if their distinct structural characteristics are somehow mirrored in the growth rates vis-à-vis the number of establishments and employees. The data shows that the industrial structure of the cosmetics sector is predominantly composed of small firms. Furthermore, we find that the shares of total establishments and employment (around 94% and 41%, respectively) remain relatively stable throughout this period. A different situation occurs in the food sector. In this case, the data indicates that there is a fragmented industrial structure, and that firms are more geographically dispersed. Nevertheless, the largest companies have the greatest market share and dictate the dynamism of the sector. Compared to the cosmetics sector and to the industry as a whole, small firms in the food sector, albeit relevant to the industrial structure, contribute very little to generating employment.[/abstract]

Key words[keygrp scheme="nd"]: [keyword type="m" language="en"]Small business[/keyword]; [keyword type="m" language="en"]Employment in small business[/keyword]; [keyword type="m" language="en"]Structural characteristics[/keyword]; [keyword type="m" language="en"]Economic growth[/keyword][/keygrp].[/bibcom]

[/front]


[body]Introdução

As questões que estimularam o estudo e orientaram a análise podem ser assim sintetizadas: Qual o desempenho das pequenas empresas industriais (PES) em termos do número de estabelecimentos, e, principalmente, da contribuição para o emprego na indústria de transformação no Brasil no período entre 2000 e 2010? Há diferenças nesse desempenho de acordo com as características estruturais dos setores em que atuam? Sabe-se que esse período foi marcado por anos de contração e anos de recuperação (expansão) da economia, quando a taxa de crescimento (média) da economia foi bem superior à verificada ao longo dos anos 90 (aumento de crescimento médio anual de 1,8% para praticamente 4% ao ano).

Este trabalho apresenta os resultados de análise sobre a evolução dos estabelecimentos industriais de pequeno porte, em termos de sua contribuição para o emprego, na indústria de transformação como um todo e em dois setores de bens de consumo: Alimentos e bebidas, e Perfumaria e cosméticos. São setores contrastantes no que se refere à essencialidade (bens de necessidade, e bens, em princípio, mais supérfluos, caso dos cosméticos). São distintos também quanto à estrutura industrial e quanto ao espaço ocupado por pequenas e grandes empresas.

O setor de alimentos é atomizado, com empresas dispersas geograficamente. Cinco estados concentram 59,7% do total de estabelecimentos: São Paulo (17,3%); Minas Gerais (15,5%); Rio Grande do Sul (10,3%); Paraná (8,9%), e Santa Catarina (7,9%). As características do setor permitem ganhos de escala. Esses ganhos podem ser conjugados a fortes vantagens de diferenciação, que requerem elevados investimentos em desenvolvimento de produtos e em campanhas de promoção e divulgação. Portanto, embora o setor seja atomizado, há forte presença de grandes empresas líderes de mercado. Combinadas, essas particularidades restringem os espaços para pequenas empresas.

O setor de cosméticos e perfumaria é mais concentrado geograficamente. Do total de estabelecimentos do setor, 40,2% estão localizados no estado de São Paulo. Seguem-se Minas Gerais, com 12,7%, Rio de Janeiro, com 8,6% e Paraná, com 7,5%. Isto é, 69% dos estabelecimentos estão localizados nesses quatro estados. Apesar da concentração geográfica, em termos estruturais o setor é menos concentrado que o de alimentos e bebidas. A presença predominante é de pequenas empresas, tanto com linha própria de produtos, quanto, especialmente, com produção para terceiros. Essa característica abre espaços para a inserção, e facilita a permanência e a expansão das empresas menores. Em alguns casos, por meio de estratégias de nicho, em outros, com maior grau de dependência e subordinação ao dinamismo das grandes empresas, pela via da terceirização, em geral para grandes empresas, algumas multinacionais.

Comparam-se os resultados nesses dois setores, visando avaliar se o fato de apresentarem características estruturais distintas de alguma forma aparece na evolução das taxas de crescimento em estabelecimentos e em número de empregados, e na posição relativa das pequenas empresas ao longo do período.1  Período esse marcado no seu início por baixas taxas de crescimento econômico e na sua segunda metade, por expansão, com exceção de 2009, no qual os efeitos da crise global foram sentidos também no Brasil, resultando em queda do PIB.

Quanto aos dois setores selecionados, dadas as características contrastantes quanto à essencialidade do consumo, e o peso das PES em termos de número, e de importância para a geração de emprego, interessa observar se a essencialidade significou menos "elasticidade" (ou maior resistência), no conjunto, em termos do total de unidades e do número de empregados, tendo em conta a hipótese nuclear do trabalho. A hipótese nuclear é que nesses anos não se verificou a mesma tendência à expansão da importância do emprego nas empresas de pequeno porte apontada pelos dados do período anterior; ao contrário, esse segmento de empresas perdeu importância relativa.

1. Marco teórico

A passagem de pequena para grande empresa exige que importantes barreiras sejam superadas, dado que as vantagens inerentes às grandes empresas - as vinculadas às economias de escala e as referentes às condições de acesso às fontes de financiamento - não são elimináveis e não são acessíveis (ao menos em iguais condições) a pequenas empresas. Essa é a base da argumentação de Steindl (1945 e 1952) em crítica à concepção de Marshall (1982) sobre o processo de concorrência e a composição da estrutura industrial em termos do porte das empresas (tamanho do capital).

Segundo Marshall (1982), o processo de crescimento das empresas seria comparável às etapas biológicas: as empresas nasceriam e cresceriam até um tamanho "limite", a partir do qual, quase que inevitavelmente, decresceriam, dando lugar a outras pequenas empresas, sujeitas ao mesmo processo, tal qual em uma floresta.

Steindl (1945 e 1952) contesta essa suposição enfatizando as descontinuidades, as assimetrias e o diferencial de vantagens como as principais características no que se refere à estrutura por tamanho de empresas. As grandes empresas podem já nascer grandes e as pequenas podem morrer antes de crescer, contrapõe Steindl a Marshall. Para Steindl, no rol dos fatores que influenciam a posição das grandes e pequenas empresas, as economias de escala ocupam o lugar central.

A argumentação de Steindl sobre a convivência de empresas de diferentes tamanhos no mercado não deixa dúvidas sobre as condições adversas às pequenas empresas, ressaltando que as assimetrias favorecem as grandes empresas (o grande capital). Isso, todavia, não significa que as pequenas empresas vão, necessariamente, desaparecer. O que ocorre é um movimento de intensa rotatividade de pequenas empresas de tal forma a configurar uma organização industrial caracterizada pelo corte estrutural - pequenas, médias e grandes empresas -, com marcado diferencial de vantagens e, por decorrência, de margens e taxas de lucro, segundo o porte de empresas, com evidentes implicações sobre as possibilidades de permanência no mercado e de expansão das empresas.

No que se refere à existência continuada das pequenas empresas, Steindl destaca que, em certos casos, ela pode ser explicada pelas próprias condições oligopolistas da indústria. "A razão é que as grandes empresas tendo conseguido se firmar como líderes de preço teriam pouco a ganhar com a eliminação de pequenas empresas que respondem apenas por uma pequena parcela da oferta total da indústria." (Steindl, 1945: 60). Embora não haja uma inexorável tendência à sua completa eliminação, a dinâmica, as funções, o desempenho, a sobrevivência e a acumulação de capital das pequenas empresas se vinculam, em grande medida, ao potencial de acumulação e às estratégias das grandes empresas nas diversas estruturas de mercado.

Posteriormente, ao escrever, em 1972, a introdução para uma edição em espanhol de "Small and Big Business", o autor, de certa forma, reafirma seu ceticismo ao reconhecer que:

"(...) tal como me equivoquei ao descuidar das deseconomias, expressei-me em termos por demais adversos sobre as possibilidades das pequenas empresas, embora meus comentários sobre o grau decrescente de sua independência tenham sido confirmados pelos desenvolvimentos posteriores" (Steindl, 1972: 17).

Essa reconsideração sobre o espaço das pequenas empresas levou em conta que, ao longo dos 25 anos entre a publicação original e a segunda edição do livro, desenvolveram-se algumas atividades propícias a uma significativa participação de empresas pequenas (especialmente alguns tipos de serviços e fabricação de produtos especializados e personalizados). Nesse período, também foi ampliada a tendência à subcontratação por parte das grandes empresas, movimento que vem se  mantendo e se fortalecendo, de tal forma que a subcontratação é atualmente um componente importante das estratégias das empresas. O movimento de desintegração vertical abre espaços para que alguns tipos de pequenas empresas possam atuar em cooperação com grandes empresas contratantes, preservando relativa autonomia. Ou seja, as evidências não deixam dúvida quanto à persistente presença das pequenas empresas, não como um segmento destinado a desaparecer, mas antes como um conjunto heterogêneo, mas que se mantém, com novas funcionalidades, em novos espaços. Não como um resultado de uma imperfeição, mas como parte integrante da estrutura produtiva, que, portanto, com ela evolui e adquire novas formas de inserção. Cabe aqui recorrer à afirmação de Audretsch (2002) sobre a maior contribuição das pequenas empresas, (em uma perspectiva dinâmica): elas servem como agentes de mudança.

Em síntese, os fatores e argumentos mencionados podem ser utilizados não só para explicar a tendência à concentração dos mercados, mas também para entender a tenaz sobrevivência das pequenas empresas e para por em relevo sua fragilidade no que tange à independência econômica e política, em face do avanço do processo de concentração de capital. Essa é uma das bases para defender políticas diferenciadas voltadas para esse segmento. Por outro lado, é de se esperar que, a despeito das evidentes fragilidades, as pequenas empresas apresentem certas características, ou, mais especificamente, certas vantagens, possibilitando que ocupem determinada posição competitiva. Entre outras, a simplicidade da estrutura organizacional e a maior flexibilidade (relativamente à maior complexidade das grandes empresas) são usualmente citadas.

A flexibilidade, entendida como a capacidade de responder rapidamente a mudanças - internas e externas - está associada à "inércia organizacional", que é conseqüência inevitável dos investimentos em ativos físicos especializados, da rigidez das rotinas e processos e da burocratização das estruturas administrativas. A grande empresa, ao longo de sua história, efetivou elevados investimentos em capital físico e humano. Tais investimentos são específicos, muito deles irreversíveis, dificultando, ou mesmo impedindo, a adoção de novos métodos. As pequenas empresas, por possuírem uma estrutura de capital - físico e humano - menos especializada e específica, são capazes de minimizar a influência da inércia, tendo capacidade de reestruturar rotinas e processos produtivos. Ademais, a proximidade das relações patrão-empregado, além de reduzir os custos de coordenação, facilita a comunicação e, por essa via, a aprendizagem e o compartilhamento do conhecimento e de valores.

Yu (2001) afirma que dois ativos intangíveis distintivos das pequenas empresas são a simplicidade da sua estrutura organizacional e as relações entre o proprietário- empreendedor e seus funcionários. O fato de as pequenas empresas serem menos "taylorizadas" - maior proximidade patrão/empregado (seja em termos técnicos, seja em termos físicos) e maior conhecimento do processo de produção como um todo por parte dos operários - estimularia uma maior criatividade em situações nas quais a maior rigidez da estrutura organizacional e a especialização da mão-de-obra, características das empresas maiores, não o permitiriam.

Comentando o comportamento da categoria das pequenas empresas nos período de crise econômica, Delatre (1982) observa que o ajuste de emprego é, muitas vezes, feito, não pela redução do número de empregados, mas antes pelo desaparecimento de empresas. Ademais, segundo o referido autor, com a crise, algumas empresas médias reduzem o número de empregados, com o que "caem" para a categoria de empresas pequenas. Algumas dessas, por sua vez, passam a fazer parte do grupo das microempresas. Estas, aliás, tendem a proliferar em momentos de depressão econômica, nesse caso, não como sinal de vigor de uma tendência ao empreendedorismo, mas antes como uma nada elogiável conseqüência de retração das atividades econômicas.

A tendência ao aumento da formação de novas empresas, costumeira em períodos de baixo crescimento econômico reflete, em boa medida, os movimentos de pessoas desempregadas que não vêem outra forma de voltar a integrar-se na estrutura produtiva, aproximando-se mais de "trabalhadores por conta própria" do que de capitalistas no sentido usual do termo (Souza e Mazzali, 2008).

Assim, o aumento do número de empregos nas pequenas empresas, em paralelo à redução de empregos nas grandes empresas, não pode ser propriamente atribuído a um possível "maior dinamismo e resistência à crise" das primeiras, sendo freqüentemente sinal de recrudescimento dessa mesma crise (Souza e Mazzali, 2008). Isso pode explicar a conclusão de Bacic, Souza e Gorayeb (2001), a partir de análise sobre o comportamento do emprego na década relativa aos anos 1990 a 1999, evidenciando que no Brasil o emprego aumentou significativamente nas empresas de pequeno porte durante essa desfavorável década.

2. Metodologia

A RAIS (Relatório Anual de Informações Sociais) do Ministério do Trabalho do Brasil foi utilizada como fonte dos dados, dado que, apesar das limitações, constitui base bastante confiável quanto ao número de estabelecimentos formais e número de empregados com vínculo formal, inclui estabelecimentos com um número reduzido de empregados, ou sem empregados, e permite avaliar a evolução do número de estabelecimentos e de empregados por setor (de acordo com Código de Atividade Econômica, CNAE) e por porte de empresa. O comportamento do emprego é analisado para os períodos 2000 a 2003 (anos de menor crescimento), para o período subseqüente, (época de maior crescimento, com exceção do ano crítico de 2009) e para o período 2000 a 2010 como um todo.

A escolha do período levou em conta o fato de que nos anos 2000 a 2010 a economia brasileira passou por dois momentos distintos, conforme pode ser constatado pela análise da tabela 1. O início da década (2000 a 2003) foi caracterizado por baixo crescimento do PIB, que já havia sido baixo durante a década 1990 a 1999, mais uma "década perdida" para a economia brasileira (com havia sido a anterior).

A partir de 2004 observou-se significativa recuperação, para o que contribuiu, em grande medida, o cenário externo favorável. Entretanto, como esperado, o país não ficou imune à crise mundial, e os efeitos apareceram principalmente no PIB de 2009, com queda de 0,6%, em termos reais, como pode ser observado na Tabela 1. A recuperação, com crescimento de 7,49% em 2010, ocorreu, portanto, a partir de base muito baixa. Apesar dos resultados de 2009, o período 2004 - 2009 pode ser considerado de recuperação e de expansão, quando comparado às décadas anteriores e aos anos 2000 - 2003.

Tabela 1. Taxas de crescimento real do PIB no Brasil, no período 2000-2010

3. Apresentação e Análise dos Resultados

3.1. Evolução da participação das pequenas empresas na indústria de transformação no período 2000 a 2010

Considerando o total da indústria de transformação, os dados mostram, conforme Tabela 2, que houve aumento no número de estabelecimentos entre 2000 e 2003, e no período 2000 - 2010 como um todo. No entanto, a taxa de crescimento entre os anos 2000 e 2003 foi de 7,9%, bem inferior à do período seguinte (26,4%), de maior crescimento econômico (com exceção de 2009). Foi inferior também à média dos anos 2000 - 2010 como um todo: 36,4%.

Tabela 2. Evolução do número de estabelecimentos, por porte, no período 2000 - 2010 na indústria de transformação no Brasil

Quanto aos pequenos estabelecimentos (aqui tratados como uma aproximação depequenas empresas), que representam aproximadamente 97% do total de estabelecimentos da indústria de transformação (98% considerando-se a RAIS negativa), nota-se que entre 2000 e 2003 houve crescimento de 8% no total de unidades, taxa bem próxima à da média da indústria de transformação.

A taxa de crescimento dos estabelecimentos com RAIS negativa (RN), isto é, os estabelecimentos que não tiveram nenhum empregado formalmente registrado ao longo do ano, foi significativamente superior (16%) às das demais faixas de pequenas empresas (no geral só foi inferior à taxa de crescimento do outro extremo, os estabelecimentos com mais de 1000 empregados). Na mesma tendência, o número de estabelecimentos sem empregados no final do ano cresceu 12%. Considerando os estabelecimentos com RAIS negativa, o crescimento em número de unidades foi de 11,8% entre 2000 e 2003; 17,5% entre 2003 e 2010, e 31,3% para o período 2000 - 2010 como um todo.

A evolução do número de estabelecimentos com RAIS negativa e daqueles que ao final do ano não empregavam nenhuma pessoa com carteira assinada indica um dos efeitos da contração econômica (baixa taxa de crescimento do PIB): a multiplicação de empresas de porte muito pequeno (microempresas) nas quais apenas o proprietário trabalha. Esse crescimento, mais que um sinal de dinamismo do empreendedorismo, como muitas vezes alardeado, indica uma das consequências do aumento de desemprego. Nessa situação, para muitas pessoas o trabalho por conta própria aparece como a única opção para preservar as condições de vida. Não podem ser vistas, portanto, como empreendedores no sentido "schumpeteriano" do termo.

No caso do período em análise, a suposição se fortalece, pois, como mostram os dados da Tabela 2, no período de expansão, ao contrário do verificado no período de contração, a taxa de crescimento do número total desses estabelecimentos foi inferior ao conjunto das demais PES, o mesmo ocorrendo para a década considerada como um todo. Reforçando o argumento, vale apontar que entre 2009 e 2010 (ano de recuperação do crescimento do PIB) houve redução em números absolutos no total desses estabelecimentos, comparando-se os dados para o final de ambos os anos.

No período 2000 a 2010, o número de estabelecimentos com mais de 1000 empregados, mais que dobrou, em grande parte devido ao aumento entre 2003 e 2009. A variação no número desses estabelecimentos foi bem superior à da média em cada um dos intervalos considerados. Entretanto, como a participação das grandes empresas no total de estabelecimentos é baixa, praticamente não houve efeitos sobre a participação relativa das PEs em número de estabelecimentos (96,6% em 2000, 96,7% em 2003, 96,4% em 2010, não considerando a RAIS negativa). O mesmo não ocorre no que se refere à participação no emprego, levando em conta os dados da RAIS conforme pode ser observado na Tabela 3.

Tabela 3. Evolução do número de empregados por porte de estabelecimento no período 2000 - 2010 na indústria de transformação no Brasil

Quanto ao emprego, a participação relativa dos estabelecimentos com mais de 500 empregados (grandes empresas) cresceu ao longo do período (de 24,3% sobre o total de empregados com vínculo formal em 2000, para 31,4% em 2009), em grande medida em função do aumento de 91,6% no total de estabelecimentos com mais de 1000 empregados e de 98,6% no total de empregados entre 2003 e 2010 (136,6% e 144,6%, respectivamente, entre 2000 e 2010).

No que diz respeito às PEs, que representam aproximadamente 96% do total de estabelecimentos, têm participação bem mais modesta no total de empregados. A participação relativa do emprego nos estabelecimentos com até 99 empregados caiu ao longo do período, de 46% em 2000, para 42,2% em 2010, embora tenha havido variação positiva no número de estabelecimentos e no total de empregados. Ocorre que no período de expansão da economia tais variações foram bem inferiores às das grandes empresas.

No período de retração econômica (2000 a 2003), enquanto as PEs tiveram aumento de 9% no total do emprego, na faixa acima de 1000 empregados o crescimento foi de 23,2%. As taxas para o período seguinte foram superiores, tanto na faixa de maior porte (98,6%), quanto no segmento das PEs (34%). As taxas correspondentes às PEs não deixam de ser significativas, considerando-se que, caracteristicamente, as PEs não têm acesso a várias das vantagens disponíveis às grandes empresas e as restrições que enfrentam se acentuam em períodos de contração econômica.

A capacidade de gerar empregos é, evidentemente, maior nas grandes empresas, mas a participação das PEs, embora bastante modesta por estabelecimento, é relevante quando se considera o conjunto. A variação percentual no total de empregos desse segmento de empresas entre 2000 e 2003 foi muito menor que a dos estabelecimentos com mais de 1000 empregados, mas superior às das demais faixas por número de empregados, e representou a maior variação em números absolutos.

Com o crescimento percentual do número de empregados pouco superior ao do número de estabelecimentos (sem RAIS negativa) entre 2000 e 2003, o tamanho médio praticamente não se alterou, em média 20 empregados por estabelecimento. No período seguinte, a média aumentou para 23 empregados por estabelecimento (23,6), dado o maior crescimento relativo dos grandes estabelecimentos. Vale observar que em 1989, a média na Indústria era de 34 pessoas por estabelecimento, indicando peso maior das grandes empresas nessa década, que foi caracterizada por baixas taxas de crescimento econômico. Nos anos 90, a participação relativa das Pes no emprego aumentou, com decorrente redução da média de empregados por estabelecimento. Na década seguinte, o tamanho médio, em número de empregados, das PEs aumentou, de uma média de 9,6 empregados por unidade em 2000, para 9,7 em 2003, e 10 empregados em 2010.

O segmento dos estabelecimentos entre 250 e 499 empregados foi, pelo que os dados indicam, o mais afetado. No período de retração de crescimento econômico, apresentou o menor crescimento relativo em número de estabelecimentos, e em número de empregados. Com a recuperação da economia, a taxa de crescimento teve aumento considerável, mas não o suficiente para recuperar a participação no total de estabelecimentos e do emprego. Ou seja, esse segmento, assim como o das PEs, "encolheu" e perdeu posições relativas, enquanto o conjunto dos grandes estabelecimentos se expandiu.  O crescimento médio foi proporcionalmente maior nas empresas com mais de 500 empregados (de uma média de 1095 empregados por unidade em 2000, para 1135 em 2003, e 1259 em 2010). Isso significa que, enquanto em 2000 seriam necessários 113 pequenos estabelecimentos para obter a mesma quantidade de empregados ocupados, em média, em uma grande empresa, em 2003 a proporção seria de 117, e em 2010, de 122. Isto é, a estrutura industrial se tornou mais concentrada.

Os dados para a indústria de transformação indicam que, apesar de todas as restrições, as PEs permanecem com participação importante na estrutura industrial, principalmente no que tange à geração líquida de emprego (fluxo). Entre 2000 e 2010, da geração líquida de emprego, os estabelecimentos com até 99 empregados contribuíram com 36%. Entretanto, no período de crise econômica, a contribuição desse estrato de estabelecimentos foi de 46%. Ou seja, esse segmento de empresas (no conjunto) tem capacidade de resistência, e tem papel relevante na geração líquida de empregos, principalmente em períodos de baixo crescimento econômico (sem entrar no mérito da qualidade do emprego gerado) como se depreende dos dados constantes na Tabela 4.

Tabela 4. Contribuição dos diferentes estratos de estabelecimentos para a geração líquida do emprego na indústria de transformação no período 2000 - 2010 no Brasil

O peso em número de estabelecimentos e empregados, os efeitos da retração econômica, a participação relativa de grandes e pequenas empresas, não são os mesmos em todos os setores, e podem variar ao longo de um período alterando a posição do setor na indústria, como ilustram os dados para os dois setores selecionados para este trabalho.

3.2. Evolução da participação das pequenas empresas no setor de perfumaria e cosméticos no período 2000 - 2010

O setor de cosméticos (bens que não são de primeira necessidade, alguns deles até supérfluos) é frequentemente apontado como resistente a crises econômicas, característica sintetizada no chamado "efeito batom" - preservação, ou mais que isso expansão das vendas em momentos de retração econômica. Tal efeito refletiria tanto a necessidade de "investir" na aparência visando aumentar as chances de obter novo emprego, seja pelo fator "indulgência" pessoal.

Os dados daTabela 5 mostram que de fato o setor apresentou taxas de crescimento no número de estabelecimentos superiores às da indústria de transformação em praticamente todas as faixas de tamanho. O número de estabelecimentos com até 99 empregados cresceu 16,3% entre 2000 e 2003, taxa duas vezes superior à da indústria de transformação como um todo.

Tabela 5. Evolução do número de estabelecimentos, por porte, no setor de perfumaria e cosméticos no período 2000 - 2010 no Brasil

Com crescimento proporcionalmente superior ao das demais faixas de tamanho, a participação das PEs no total de estabelecimentos do setor aumentou de 93,9% em 2000 para 94,5% em 2003 e em 2010 representava 94,1%. Vale observar, que no período de baixo crescimento da economia, os estabelecimentos com RAIS negativa tiveram aumento significativo (22,9%), superior ao da indústria de transformação como um todo (16%). O mesmo vale para os estabelecimentos sem empregados com vínculo formal ao final do ano cujo total aumentou 45,3% entre 2000 e 2003, enquanto na indústria de transformação como um todo o aumento no total de estabelecimentos dessa faixa foi de 12,3% (ver Tabela 2).

Ressaltando a característica de setor composto predominantemente por pequenas empresas, em 2010 havia apenas 11 estabelecimentos com mais de 500 empregados (0,8% do total de estabelecimentos sem RAIS negativa).

Os dados sinalizam que o "efeito batom" não se estendeu para o emprego no setor, conforme pode ser observado na Tabela 6. Ao menos no que se refere a essa variável (emprego), o setor não ficou imune às consequências do período de baixo crescimento econômico, com severos efeitos, de forma tal que a taxa de crescimento no emprego entre 2000 e 2003 foi de 1,5%, bem abaixo do crescimento da indústria de transformação como um todo. Nas faixas entre 250 e 499 empregados e acima de 1000 empregados houve redução do número absoluto de empregados, com taxas negativas de -8,2%, e -47,4%, respectivamente.

Tabela 6. Evolução do número de empregados por porte de estabelecimento setor de perfumaria e cosméticos no período 2000 - 2010 no Brasil

A expressiva redução do total de empregados nessas faixas pode ser explicada, em grande medida, pela redução do número absoluto de estabelecimentos, que, pelo porte, têm considerável impacto no total de emprego do setor. Da mesma forma que são necessárias muitas pequenas empresas para obter o emprego gerado por uma grande empresa, o desaparecimento de uma única dessas grandes empresas tem efeitos negativos ainda mais graves para o emprego, posto que concentrados, muito mais visíveis e sentidos.

Nos pequenos estabelecimentos, a taxa de crescimento no emprego foi pouco inferior à da indústria de transformação como um todo (7,5 e 9%, respectivamente), no período 2000-2003, mas com aumento em números absolutos e taxa acima da média  do setor, isto é, na crise as empresa de menor porte tiveram papel relevante para evitar perdas mais acentuadas no total do emprego no setor. Levando em conta a faixa entre 100 e 249 empregados, pode-se afirmar que o emprego no setor foi preservado graças às pequenas e médias empresas (PMEs).

Na faixa de estabelecimentos entre 100 e 249 empregados, houve expressivo crescimento (25,7%) no número total de empregados. Como essa taxa foi superior à relativa ao número de estabelecimentos, parte do aumento no emprego ocorreu em função de efetivas admissões e não em função do deslocamento, para baixo, de empresas da faixa superior. Por outro lado, pode-se aventar que ao menos parte do crescimento nessa faixa pode ter sido resultado do aumento da terceirização por parte de grandes empresas, na busca de redução de custos (mão-de-obra, especialmente) e preservação da competitividade nesse momento de retração da economia. Esse "deslocamento" do emprego de grandes para médias empresas subcontratadas poderia explicar, parcialmente, o crescimento de apenas 1,5% do setor como um todo.

No período 2003 a 2010, com a recuperação econômica, o brilho do setor foi mais intenso que o da média da indústria de transformação. O emprego formal cresceu 58,6% no setor de perfumaria e cosméticos (45,7% na indústria de transformação). O crescimento do emprego nas pequenas empresas contribuiu com 50,7% (a contribuição das PEs para o emprego na indústria de transformação foi de 34,%), taxa inferior apenas à das empresas com mais de 1000 empregados, nas quais o emprego aumentou 405%, "puxado" pelo aumento de 300% no total de estabelecimentos.

Com o aumento no número de estabelecimentos de grande porte, apesar da pequena participação em número de unidades, a média de empregados por estabelecimento que em 2000 era de 30 pessoas por empresa, em 2003, com a maior participação das PEs caiu para 27 pessoas/empresa. Porém, em 2010 a média foi de 32 empregados por empresa, evidenciando a capacidade (unidade individual) de emprego das grandes empresas. Nas PEs, a contribuição para o emprego aparece apenas quando se considera o conjunto. Enquanto 0,81% do total de estabelecimentos, percentual correspondente às faixas acima de 499 empregados, representava 28,4% do emprego, os pequenos estabelecimentos, 94,1% do total, contribuíam com 41,5% do emprego. Isso não diminui sua importância, principalmente quando se leva em conta que no período de crise a participação das PEs cresceu relativamente a 2000, alcançando 41%.

O setor de cosméticos cresceu em número de estabelecimentos e teve bom desempenho mesmo no período de contração, entre 2000 e 2003. Entretanto, em termos de emprego, a contribuição do setor nesse período foi mais modesta, e abaixo da média da indústria de transformação. O "efeito batom" verificado em termos de número de estabelecimentos nesse período de retração da economia (crescimento em taxas superiores à da indústria de transformação) não se estendeu plenamente para o âmbito do emprego. Basicamente porque, embora o número de pequenos estabelecimentos tenha crescido em taxa superior à da indústria de transformação, houve redução no número de estabelecimentos acima de 1000 empregados. Em 2000 eram 2 estabelecimentos nessa faixa e em 2003, apenas 1 estabelecimento 1000 pessoas ou mais nesse setor, de acordo com os dados da RAIS.

A participação do setor no total da indústria de transformação também é um indicativo de que o crescimento no total de estabelecimentos do setor não tem o mesmo vigor (mesmo no período de baixo crescimento do PIB) quando se trata do emprego. Em 2000, o total de estabelecimentos do setor de perfumaria e cosméticos representava 0,35% do total da indústria de transformação; em 2003 o percentual aumentou para 0,37%, e em 2010 era de 0,39% (mesmo percentual de 2009). Quanto ao emprego, em 2000, o total de empregados com vínculo formal nesse setor representava 0,55% do total da indústria de transformação; em 2003 o percentual era 0,51%, e em 2010 era de 0,56% (0,54% em 2009).

Na década 2000 a 2010 como um todo, o emprego no setor de perfumaria e cosméticos cresceu pouco acima do verificado na indústria de transformação: 61% e 58,9%, respectivamente. As pequenas empresas tiveram papel importante no desempenho do setor. As taxas de crescimento nesse segmento foram superiores às da indústria de transformação em todas as faixas. Esse desempenho incluiu os estabelecimentos com RAIS negativa, apesar da redução, em termos relativos e absolutos, superior à da indústria de transformação, entre 2009 e 2010. Esse último, ano de recuperação do crescimento do PIB, situação em que os estabelecimentos de porte muito pequeno tendem a perder participação. Como resultado, a participação dos estabelecimentos entre 0 e 99 empregados no total do emprego que em 2000 era de 38,9% aumentou para 41% em 2003, e em 2010 foi de 39% (em 2009 chegou a 41,4%). Além disso, como pode ser observado na Tabela 7, os estabelecimentos com até 99 empregados contribuíram significativamente para a geração líquida do emprego nesse setor, com 39% entre 2000 e 2010, percentual maior que o da indústria de transformação, que foi de 36%.

Tabela 7. Contribuição dos diferentes estratos de estabelecimentos para a geração líquida do emprego no setor de perfumaria e cosméticos no período 2000 - 2010 no Brasil

 

3.3. Evolução da participação das pequenas empresas no setor de alimentos e bebidas no período 2000 - 2010

No setor de alimentos e bebidas, constituído em parte considerável por bens de consumo de primeira necessidade, o crescimento do número de estabelecimentos foi muito baixo no período de retração da economia, com taxas próximas de zero, 0,3% no geral, e 0,1% no total de estabelecimentos com até 99 empregados (não considerando os estabelecimentos com RAIS negativa).

No segmento das PES, o número de estabelecimentos com até 9 empregados teve redução nesse período, como revelam os dados da Tabela 8. Ao contrário do setor de cosméticos e da indústria de transformação como um todo, mesmo os estabelecimentos com RAIS negativa tiveram taxa de crescimento abaixo da média da indústria de transformação.

No período seguinte (2003 a 2010) a taxa de crescimento do número de estabelecimentos foi, no geral, inferior às da média da indústria de transformação. Esse desempenho se deveu à forte redução no número de estabelecimentos de pequeno porte entre 2009 (ano de baixo crescimento do PIB) e 2010, sinalizando uma relação mais direta (ou dependência), comparativamente ao setor de perfumaria e cosméticos, entre o dinamismo da Indústria e o dinamismo do setor.

Tabela 8. Evolução do número de estabelecimentos, por porte, no setor de alimentos e bebidas no período 2000 - 2010 no Brasil

Entre 2003 e 2010, o crescimento no número de estabelecimentos foi superior ao da média da indústria de transformação como um todo apenas no segmento das grandes empresas. A taxa de crescimento no total de estabelecimentos foi de 11,6%, "pressionada" pelo baixo crescimento no total das PEs, dada sua participação em termos de número de número de estabelecimentos. Em 2000 tal participação era de 96,3%; em 2003 de 96,1%, e 95,3% em 2010. A redução relativamente a 2009, quando foi de 96,2%, é mais um indicativo dos efeitos da baixa taxa de crescimento do PIB em 2009.

O crescimento foi muito mais acentuado no caso das grandes empresas, e pelo seu peso como empregadoras, aumentou o tamanho médio dos estabelecimentos: de 22 empregados por estabelecimento em 2000, para 25 empregados em 2003, e 37  empregados em 2010 (29 em 2009), média de empregados por estabelecimento superior à da indústria de transformação, e mais um indicativo do peso das grandesempresas, embora o setor seja atomizado, com empresas dispersas geograficamente.

Principalmente pela redução entre 2009 e 2010, o crescimento percentual do número de estabelecimentos do setor na década 2000-2010 como um todo foi de 11,9, bem abaixo do crescimento na indústria de transformação (36,4%). O crescimento no total de estabelecimentos com até 99 empregados foi ainda menor e esse segmento de empresas perdeu participação no setor e na indústria. Em 2000, os pequenos estabelecimentos do setor representavam 17% do total de PEs da indústria de transformação. Em 2003, o percentual era de 15,8%, e em 2010 de 13,8% (em 2009 era de 16,8%).

O setor como um todo também perdeu participação em número de estabelecimentos no total da indústria. Em 2000, a participação do setor era de 17,1%; em 2003, de 15,9%, e em 2010, de 14% (em 2009, era de 16,9%). Os dados da Tabela 9, comparados aos da indústria de transformação (Tabela 3), mostram que dada a presença significativa de grandes estabelecimentos, as taxas de crescimento do emprego no setor foram, no geral, superiores às da indústria. O emprego nos estabelecimentos com mais de 1000 empregados, que tiveram aumento expressivo no número de unidades, ao contrário do verificado nas demais faixas de tamanho, cresceu 66% no período de retração econômica.

Tabela 9. Evolução do número de empregados por porte de estabelecimento no setor de alimentos e bebidas no período 2000 - 2010 no Brasil

No período seguinte, de recuperação do crescimento do PIB, a taxa de crescimento no emprego nesses estabelecimentos foi de 101%, superior à taxa da indústria de transformação. No período 2000 a 2010, o crescimento do emprego nos grandes estabelecimentos acima de 1000 empregados do setor (233,9%) também foi superior ao crescimento do emprego nesse segmento na indústria de transformação (144,7%).

Os dados indicam que ao longo da década, as PEs perderam participação relativa na geração de empregos. O setor ficou "menor" quanto ao número de estabelecimentos, mas com maior concentração.

Os dados da Tabela 10 mostram o desempenho do setor quanto ao emprego com vínculo formal e também da contribuição dos pequenos estabelecimentos para a geração líquida do emprego no setor. O conjunto dos estabelecimentos com até 99 empregados teve queda significativa no total do emprego do setor: de 35,3% em 2000, para 27% em 2010. A contribuição para o emprego foi proporcionalmente inferior ao da indústria de transformação, e bem menor que a das grandes empresas. Nas faixas de estabelecimentos com até 4 empregados, e entre 5 e 9 empregados houve redução no total de empregados no período de baixo crescimento do PIB, ao contrário da indústria de transformação como um todo e no setor de cosméticos.

No período de crescimento, o emprego nessas faixas de estabelecimentos aumentou, mas a taxas inferiores às demais no setor, e às da indústria de transformação. O desempenho relativamente fraco dos pequenos estabelecimentos do setor na década se deve principalmente à evolução entre 2009 e 2010, francamente desfavorável ao segmento das PEs, em todas as faixas de tamanho, como fica claro pelos dados da Tabela 9.

Tabela 10. Contribuição dos diferentes estratos de estabelecimentos para a geração líquida do emprego no setor de bebidas e alimentos no período 2000 - 2010 no Brasil

Em contraste ao comportamento dos estabelecimentos de pequeno porte, a contribuição para o emprego dos estabelecimentos com mais de 1000 empregados cresceu substancialmente. Ao longo da década, esse estrato de tamanho de estabelecimento, de baixa, mas crescente, participação no total de estabelecimentos (de 0,2% em 2000 para 0,6% em 2010) ganhou importância mais que proporcional no emprego. Enquanto em 2000 representava 19.3% do total do emprego do setor, em 2003 participava com 27,3%, em 2009, com 36,7%, e em 2010 do total de emprego formal, 37,2% estavam concentrados nesse segmento. Ou seja, é dele que crescentemente depende o emprego no setor. Associado a esse aumento, o tamanho médio dos estabelecimentos cresceu ao longo da década: 22 empregados por estabelecimento em 2000; 25 em 2003; 29 em 2009, e 34 em 2010. A participação do emprego no setor de alimentos e bebidas no total do emprego da indústria de transformação é um indicativo da forte presença das grandes empresas no setor, principalmente quando comparada à participação em número de estabelecimentos. Em 2000, a participação do setor em número de empregados era de 18,3%; em 2003 era de 19,6%, e em 2010 era de 19,9%. Esse percentual é menor que o de 2009, em função da forte redução do emprego nos estabelecimentos de pequeno porte, em montante tal que não pôde ser compensado pelo aumento nas demais faixas de tamanho.

Considerações Finais

As grandes empresas têm maior capacidade de geração de empregos. Em 2010, 96,4% do total de estabelecimentos responderam por aproximadamente 42,2 % do total de empregados, enquanto 0,30% contribuíram com 31,4%. Portanto, para o período aqui considerado, as pequenas e médias empresas não mostraram, em anos de retração (e principalmente no de expansão) da economia, maior dinamismo que as grandes empresas no que tange ao emprego, ao contrário do que argumentado em vários trabalhos sobre esses segmentos de empresas. No entanto (e isso é digno de nota), as PEs contribuem para atenuar a pressão sobre a taxa de desemprego em períodos de retração do crescimento econômico. Essa contribuição ocorre, ressalte- se, em parte considerável pelo crescimento de empresas que se aproximam do trabalhador autônomo (empreendedor individual, categoria recentemente incorporada nas linhas de apoio à formalização dos pequenos negócios) uma forma de alternativa ao desemprego, que ganha importância em momentos de baixas taxas (ou negativas) de crescimento econômico.

Os dados evidenciam que a estrutura industrial do setor de perfumaria e cosméticos é caracteristicamente de pequenas empresas, que mantêm participação relativamente estável no total de estabelecimentos e do emprego (em torno de 94% e 41%, respectivamente). A importância das pequenas empresas ganha realce quando se considera sua contribuição para a geração líquida de emprego (fluxo), bem superior à das grandes empresas no período de crise (no conjunto das empresas com mais de 500 empregados a geração líquida de empregos foi negativa). Contribuição superior também levando-se em conta a década 2000 a 2010 como um todo, na qual a contribuição das PEs para a geração líquida de empregos no setor foi de 39%, superior à das grandes empresas acima de 500 empregados (31,9%).

Boa parte das PEs atua como subcontratadas, em suas diversas modalidades, das grandes empresas do setor, inclusive multinacionais, com marcas reconhecidas, com grande penetração nos canais de distribuição ou com imensas redes de distribuição próprias. Entretanto, é um setor no qual, pelas características, uma delas as amplas possibilidades de subcontratação e conhecimento nela acumulado tanto por contratantes, quanto por subcontratados, oferece espaços para pequenas empresas. Espaços que se ampliam pelas oportunidades propiciadas pela disponibilidade de produtos da chamada química verde. Várias pequenas empresas exploram esse segmento, algumas com linhas específicas de produtos, já com marca reconhecida. Portanto, há presença de grandes empresas com participação importante, mas no caso desse setor não há como entender sua dinâmica (pelo lado da oferta) sem entender o papel das PEs, com particular atenção à subcontratação, um dos núcleos de seu funcionamento. Do lado da demanda, se o "efeito batom" pode ser utilizado como uma das possíveis explicações para a taxa de crescimento nos anos de baixo crescimento econômico, seus efeitos, pelos dados disponíveis, não se estendem com o mesmo vigor para o emprego.

Situação diversa se verifica no setor de alimentos e bebidas, levando-se em conta os dados apresentados ao longo do trabalho. Esses dados sinalizam uma estrutura industrial atomizada, mais dispersa em termos geográficos, porém com forte presença de grandes empresas, que dão o tom do dinamismo do setor. Relativamente à média da indústria e ao setor de perfumaria e cosméticos, também foco desta análise, os pequenos estabelecimentos têm baixa participação na geração de emprego desse setor de bens de consumo, em boa parte essenciais. A concentração no setor e a forte presença de grandes empresas multinacionais tendem a se acentuar com o movimento de compras e fusões de empresas.

A "essencialidade" aparentemente não "blinda" o setor em momentos de baixo crescimento econômico, principalmente no caso das pequenas empresas, com participação significativa, em número de estabelecimentos, nessa estrutura industrial, porém bem mais suscetíveis, comparativamente às empresas de maior porte, aos efeitos negativos em momentos de redução do crescimento econômico.

No geral, constatou-se reversão da tendência ao aumento da importância dos pequenos estabelecimentos que se depreendia da análise dos dados relativos à década anterior. O crescimento da economia favorece as PEs, mas favorece muito mais as grandes empresas. Em períodos de crescimento há espaços para crescimento de todos, inclusive de pequenas empresas, que aumentam em número absoluto e até em números relativos. Porém, as desvantagens, como apontado na apresentação do marco teórico, as fragilizam em momentos de crise econômica. Os dados analisados sinalizam que nesses momentos as PEs perdem peso relativo, e em algumas faixas de tamanho, em alguns setores, há redução do número absoluto de pequenos estabelecimentos.

 Considerando as diferenças entre os dois setores analisados, pode-se aventar a hipótese de que no caso do setor de cosméticos e perfumaria a menor flutuação no número de pequenos estabelecimentos em momentos de expansão e de crise pode ser explicada de um lado pela existência de nichos, propiciados pela diferenciação que o setor permite. De outro lado, pela intensa e particular forma de subcontratação que caracteriza o setor. Em momentos de expansão o aumento da demanda leva ao aumento da subcontratação de pequenas empresas, que podem dessa forma, aumentar o emprego. Além disso, a possibilidade de subcontratação pode atrair novas pequenas empresas.

Em momentos de contração da demanda, o ajuste das grandes empresas pode se dar pela redução das encomendas às pequenas empresas subcontratadas, mas não pode ser eliminada de vez, dado que tal subcontratação não é esporádica, mas uma característica da indústria. Ou seja, a relação entre pequenas e grandes empresas nesse setor vai além de uma funcionalidade apenas no que tange à capacidade. As pequenas empresas podem complementar a capacidade produtiva das grandes, produzindo produtos que não integram as linhas prioritárias em termos de inovação e de tecnologia, mas que são estratégicos para complementar seu leque de oferta. Nesse caso, as pequenas empresas podem funcionar quase como parte do processo produtivo das empresas contratantes (produção em si, enquanto a empresa contratante detém as fórmulas dos produtos), isto é, como "montadoras", ou mais especificamente como "misturadoras", de componentes, dos quais não detêm o conhecimento da composição. A relação é assimétrica, mas há interdependência, pois há custos de mudança de subcontratado para as grandes empresas, o que favorece relações mais estáveis com as pequenas subcontratadas, até pelos menores custos de transação que propiciam.

No caso do setor de alimentos e bebidas, não há as particularidades do setor de cosméticos, quanto à relação entre pequenas e médias empresas. Não há tantos espaços para complementaridade e subcontratação. As grandes empresas têm vantagens tanto no que se refere às economias de escala, quanto ao poder de investir em pesquisa e desenvolvimento e em inovação. Mesmo em espaços regionais, que se julgava seriam "refúgios" mais seguros para as pequenas empresas, as grandes empresas podem atuar com produtos com marcas regionais, mas que são produzidos em suas grandes plantas (economias de escala e de escopo combinadas). Nesse setor parece se aplicar o argumento de Steindl de que a as vantagens das pequenas empresas são acessíveis às grandes, mas a recíproca não é verdadeira. Em consequência, há mais flutuação tanto em número de estabelecimentos quanto no emprego gerado pelas pequenas empresas nesse setor relativamente ao setor de cosméticos. O setor é mais concentrado, com menos espaços (e mais estreitos e contestáveis) para as pequenas empresas.

As diferenças identificadas a partir da análise dos dados mostram que políticas para as PEs não podem ser pensadas sem considerar as características estruturais dos setores em que se inserem e sua contribuição para a dinâmica do setor, e, fundamental, para a geração líquida de emprego.

Notas

1. De acordo com classificação do Serviço Brasileiro de Apoio à Pequena Empresa (Sebrae) será considerada como aproximação de pequena empresa industrial o estabelecimento com até 99 empregados. [/body]

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