INTRODUÇÃO
Os Vertissolos são solos minerais não hidromórficos, que apresentam como características principais a presença de argilominerais do tipo 2:1 como esmectita e montmorilonita e elevada fertilidade natural (Santos et al., 2006). No semiárido brasileiro, esses solos ocupam uma área de 10.187 km2 distribuídos nos estados da Bahia e Paraíba, representando cerca de 1,3% da região (Santos et al., 2018).
O comportamento físico-hídrico dos Vertissolos representam um desafio para à agricultura, em função, principalmente, de problemas relacionados à baixa infiltração de água, drenagem reduzida, concentração de argila expansiva maior que 30%, elevada pegajosidade quando úmido e forte dureza quando seco, demandando grande esforço e elevado gasto de energia do maquinário quanto ao preparo do solo (Santos et al., 2006; Hidalgo et al., 2019). Nesses solos, o caráter coeso geralmente ocasiona a diminuição da porosidade e o aumento de densidade do solo, que, ocorrendo próximo a superfície, gera problemas de difusão de gases e circulação de água, além de afetar o crescimento das raízes das plantas (Santos et al., 2020). Essas características tornam essas áreas problemáticas tanto para a agricultura tecnificada, quanto para a agricultura familiar (Corrêa et al., 2003).
Além disso, as práticas de manejo do solo, se realizadas incorretamente podem acentuar as limitações físico-hídricas do solo (Erkossa, 2011) e, como consequência ocorre perda de matéria orgânica do solo, ruptura de agregados e poros do solo e altera as relações de massa/volume do solo (Gajri et al. 2002). Nesse sentido, a adoção de sistemas de manejo que aportem carbono e contribuam para a melhoria física do solo é primordial. Diversos estudos têm comprovado o efeito benéfico da matéria orgânica sobre a estrutura do solo (Reeves et al., 2019). Hati et al. (2017), estudando as melhorias físicas da camada superficial de um Vertissolo na Índia, observaram que a adoção de sistemas de manejo que consigam sequestrar e aportar carbono na camada superficial do solo, tendem a melhorar o ambiente físico e sustentar maior produtividade das culturas em relação aos sistemas de manejo convencionais. O sistema de manejo é amplamente reconhecido por afetar a qualidade física do solo (Stefanoski et al. 2013) e, entender o impacto que esses sistemas ocasionam ao solo é de suma importância, já que a qualidade física do solo é um parâmetro importante para o crescimento das culturas (Ramos et al. 2020).
Portanto, o objetivo deste trabalho foi verificar o efeito de diferentes sistemas de manejo sobre a qualidade físico-hídrica de um Vertissolo localizado no domínio climático do Semiárido brasileiro.
MATERIAL E MÉTODOS
Caracterização do local de estudo
O estudo foi realizado em área experimental da Fazenda Águas da Tamanduá, no município de Sousa, estado da Paraíba. O município está localizado na mesorregião do Sertão paraibano e microrregião de Sousa sob coordenadas (6°45’33’’S 38°09’01 W). Segundo a classificação de Köppeng, o clima que predomina no local é do tipo Aw, tropical-quente e seco, com precipitação média anual de 839,8 mm, temperatura média de 26,7°C, com 7 a 8 meses de seca ao longo do ano e a vegetação que predomina no município é do tipo Caatinga hiperxerófila (Costa et al., 2018).
O solo da área experimental foi caracterizado como Vertissolo cromado de textura argilosa, apresentando 291; 390 e 319 g kg-1 de areia, silte a argila, respectivamente, na camada de 0-20 cm (Teixeira et al. 2017). A caracterização de química e fertilidade do solo também foi realizada na camada de 0-20 cm e apresentou os seguintes resultados: pH-(H2O/1:2,5)= 5,8; pH-KCl= 5,95; ∆pH= -0,9; P= 28,16 mg dm-3; K= 10,6 mg dm-3; Ca+2= 209,8 mmolc dm-3; Mg+2= 80,0 mmolc dm-3;Al+3= 0,0 mmolc dm-3;H+Al= 3,5 mmolc dm-3;Na+= 10,8 mmolc dm-3;SB= 327,9 mmolc dm-3 e CTC= 325,6 mmolc dm-3; V= 98,6%; MOS= 17,8 g kg-1 (Teixeira et al., 2017).
Tratamentos e delineamento experimental
Os sistemas de manejo do solo selecionados para avaliação desse estudo foram: (S1) Pastagem (Cynodon spp.) com 4 anos; (S2) Romã (Punicata granatum L.) com 6 anos; (S3) Sorgo forrageiro (Sorghum bicolor L.) com 4 anos de implantação e, uma área de vegetação nativa (S4), em bom estado de conservação, utilizada como referência. Durante os quatro anos, as áreas com cultura S1, S2 e S3 foram manejadas de forma alternativa, empregando-se a capina manual ao invés da mecanização. Durante os meses de seca, emprega-se o sistema de irrigação por gotejamento nas áreas S1, S2 e S3 a área de vegetação nativa é mantida sob sistema de sequeiro. O delineamento experimental empregado foi inteiramente casualizado (DIC), constando de quatro áreas (consideradas como tratamentos), cada qual com cinco pseudo-repetições (Hurlbert, 2004). Para cada sistema de uso foram coletadas 10 amostras indeformadas, sendo cinco na profundidade de 0-10 cm e cinco na profundidade de 10-20 cm de profundidade, totalizando 40 amostras.
Variáveis determinadas
Amostras de solo com estrutura indeformada foram coletadas com auxílio de amostrador tipo Uhland e cilindros metálicos com volume de 100 cm3. As mesmas foram previamente saturadas (48h) com água e submetidas aos potenciais matriciais -6 kPa em mesa de tensão e -10, -33, -100, -300, -500 , -1000 e -1500 kPa em câmara de Richards com placas porosas (Klute, 1986), para determinação da Curva de Retenção de Água no solo (CRA). Os parâmetros de ajuste da CRA foram obtidos por meio do modelo matemático proposto por Van Genuchten (1980) (Equação1), com a dependência de Mualem (1986), m= 1-(1/n), utilizando o software SWRC (Dourado Neto et al. 2000).
em que: θ é o conteúdo volumétrico de água no solo (m3 m-3) correspondente ao potencial matricial aplicado (Ψ; kPa), θs e θr correspondem a umidade de saturação e residual, respectivamente (m3 m-3), Ψ é o valor absoluto do potencial matricial (kPa); n e α, são parâmetros empíricos do modelo, (α; kPa-1); n adimensional.
A densidade do solo (Ds; g cm-3) foi determinada através da relação massa do solo seco/volume (Blake & Hartge, 1986). A microporosidade do solo foi determinada em mesa de tensão, através do teor de água retido no potencial -6 Kpa (Teixeira et al. 2017). A porosidade total do solo (PT; m3 m-3) e a umidade do solo na qual a porosidade é 10% (θar; m3 m-3) foram calculadas conforme Teixeira et al. (2017).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As curvas de retenção de água no solo sob os diferentes sistemas de manejo encontram-se apresentada na Figuras (1A) 0-10 cm e (1B) 10-20 cm. Na Tabela 1, estão apresentados os valores médios dos parâmetros de ajustes. Verifica-se que o Vertissolo apresenta elevada capacidade de retenção de água, fato esse comprovado pela suave inclinação das CRA correspondentes aos sistemas romã e pastagem na camada de 0-10 cm, além do sorgo e pastagem na camada de 10-20 cm (Figura 1 AB). Na área de vegetação nativa, verificou-se menor retenção de água em relação aos demais sistemas de manejo avaliados. No solo sob vegetação nativa, a menor taxa de retenção de água pode estar relacionada à elevada capacidade de aeração do solo. Esse resultado corrobora com Araújo et al. (2004), em estudo sobre a qualidade física do solo em áreas de cultivo e mata. Para os autores, valores adequados de capacidade de aeração dependem das condições climáticas e podem ser ampliadas sob condição de maior umidade.
Analisando os valores médios de θs e θr (Tabela 1), observa-se que o θr foi maior que 0,400 m3 m-3 nos sistemas romã e tifton, na camada de 0-10 cm e maior que 0,400 m3 m-3 para sorgo e tifton na camada de 10-20 cm. A baixa inclinação apresentada pelas CRA com o aumento de tensão, demonstra que o solo sob os diferentes manejos apresenta boa retenção de água, contudo é deficiente no que diz respeito à disponibilidade de água para as plantas (Figuras 1AB). Esse comportamento resulta da presença marcante microporos nesses solos (Juhász et al., 2006; Costa et al., 2008).
Em todos os sistemas de manejo, verifica-se que as CRA apresentaram tendência de estabilidade a partir do potencial matricial de -100 kPa, provavelmente influenciada pela quantidade de meso e microporos presentes nesse solo. Segundo Silva et al. (2017), os microporos retém água em maior energia em relação as demais classes de poros, tornando-a potencialmente disponível as plantas. Além do mais, a presença marcante de argilominerais do tipo 2:1 no Vertissolo tende a elevar a capacidade de retenção de água, principalmente pela presença de cargas relacionadas a adsorção (Reichert et al., 2009).
Na Tabela 2, encontram-se apresentados os valores médios para densidade do solo (Ds), macroporosidade (Ma), microporosidade (Mi) e porosidade total (PT), capacidade de aeração do solo (CAS) e umidade do solo na qual a porosidade de aeração é igual a 10% (θar). Verifica-se que a densidade do solo variou de 1,00 a 1,15 g cm-3 na camada de 0-10 cm e 1,21 a 1,30 g cm-3 na camada de 10-20 cm. Na camada de 0-10 cm, observa-se que os valores de Ds ficaram abaixo do limite crítico em todos os sistemas avaliados, que segundo Reinert et al. (2008) é de 1,20 g cm-3. Na camada de 10-20 cm, verifica-se que houve incremento na Ds e, observou-se uma aumento de 0,19 g cm-3 na vegetação nativa, resultado esse, provavelmente influenciado por mudanças estruturais do solo. A porosidade total ficou acima de 0,50 m3 m-3 em todos os sistemas de manejo, com destaque para as áreas com vegetação nativa, romã e pastagem na camada de 0-10 cm, com 0,60; 0,62 e 0,61 m3 m-3 , respectivamente (Tabela 2).
A macroporosidade mostrou-se restritiva apenas nos sistemas sorgo e pastagem na camada de 0-10 cm, e romã e pastagem na camada de 10-20 cm, demonstrando que nesses solos, pode haver limitações na dinâmica de água e difusão de gases. Em ambiente de pastagem, a diminuição da porosidade é ocasionada pelo pisoteio animal excessivo (Stefanoski et al. 2013). Em relação a capacidade de aeração do solo, verifica-se menor valor no sistema romã com 0,09 m3 m-3 na camada de 0-10 cm. Esse é um valor restritivo e reflete na má qualidade estrutural do solo. Para que um solo tenha uma boa difusão de gases entre a saturação e a capacidade de campo, segundo Reynolds et al. (2007), recomenda o valor mínimo de 0,10 m3 m-3.
Na Figura 2, encontram-se o diagrama com a análise de componentes principais (ACP), e verifica-se que 50,9% da variância total foi explicada pelo componente principal CP1 e o CP2 explicou 22,5% da variância dos dados. Observa-se a
formação de seis grupos semelhantes: vegetação nativa 0-10 cm; pastagem e sorgo 10-20 cm; sorgo 0-10 cm; vegetação nativa 0-10 cm; romã 10-20 cm e romã 0-10 cm. Os sistemas pastagem e sorgo na camada de 10-20 cm, distinguiram dos demais sistemas de manejo pela microporosidade, capacidade de campo relativa, capacidade de campo, umidade residual, ponto de murcha permanente e água disponível (Figura 2), ou seja, esses atributos apresentaram maior expressividade nos sistemas sorgo e pastagem, provavelmente por influência do desenvolvimento sistema radicular desses vegetais (Stefanoski et al. 2013).
A distinção do sistema romã 0-10 cm ocorreu pelos atributos umidade ótima de preparo do solo, θar, porosidade total e θs e, no sistema Romã 10-20 cm pelo índice S e capacidade de aeração do solo. Com relação a área de vegetação nativa, verificou-se que esse sistema diferiu dos demais pela capacidade de aeração do solo e macroporosidade na camada de 0-10 cm e, pela água prontamente disponível na camada de 10-20 cm (Figura 2).
Esse comportamento geralmente ocorre, por que existe um equilíbrio no sistema preservado em função da considerável deposição de biomassa e maior atividade dos microrganismos. Para Souza et al. (2010), a elevação na produção de fitomassa contribui para o aumento da atividade microbiana do solo. A partir desses resultados, foi possível identificar as
variáveis com maior potencial discriminatório para cada sistema de manejo do solo (Tabela 3). Como observado por Gomes et al. (2019), os autovetores da ACP podem ser considerados como uma medida de importância relativa de cada variável em relação aos componentes principais, com sinais positivos ou negativos indicando relações diretas ou inversamente proporcionais, respectivamente. Por exemplo, dentre os sistemas avaliados, verificou-se correlação para θINFL, θcc, θr, θPMP, CCr e tamanho de poros >0,2 μm com o CP1 e CP2. Nesse caso, deduz-se que são as variáveis com melhor poder discriminatório dentre os sistemas de manejo avaliados.
CONCLUSÕES
Os diferentes sistemas de manejo pouco modificaram a qualidade físico-hídrica do solo e a melhor qualidade estrutural do solo foi observada no ambiente de mata nativa.
Problemas relacionados à restrição hídrica foram observados no solo sob os diferentes sistemas de manejo, bem como redução na macroporosidade, baixa capacidade de aeração do solo e, baixa disponibilidade de água às plantas.
Espera-se que no longo prazo, os diferentes sistemas de manejo atenuem os problemas físico-hídricos apresentados pelo Vertissolo.