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Cuadernos de antropología social

On-line version ISSN 1850-275X

Cuad. antropol. soc.  no.37 Buenos Aires July 2013

 

ARTÍCULO

Antropologia, Direito e Segurança Pública: uma combinação heterodoxa

Roberto Kant de Lima*

 

* Pesquisador de produtividade do CNPq; Cientista do Nosso Estado da FAPERJ. Professor da Universidade Federal Fluminense e da Universidade Gama Filho. Coordenador do Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos/PROPPi/UFF (www.proppi.uff.br/ineac). Correo electrónico: rkantbr@gmail.com.

Artículo elaborado especialmente para Cuadernos de Antropología Social a partir de la exposición del autor en la Mesa Redonda "Experiencias regionales de intervención y activismo en la investigación en políticas de seguridad pública, violencia de estado y derechos humanos", X Congreso Argentino de Antropología Social, 29 noviembre - 2 diciembre de 2011, Buenos Aires.

 


Resumo

Propõe-se discutir as relações acadêmicas entre as disciplinas do Direito e da Antropologia utilizando como suporte empírico a trajetória de constituição do curso de graduação (bacharelado) em segurança pública da Universidade Federal Fluminense, em Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. Ao longo do texto são discutidas questões teóricas referentes aos modelos jurídicos de administração de conflitos propostos para as sociedades ocidentais, cuja construção está ancorada em experiências etnográficas do autor no Brasil e nos EUA. Finalmente, expõem-se algumas características da segurança pública no Brasil, em especial no Rio de Janeiro, palco de importantes transformações nos anos recentes, nessa área.

Palavras chave: Antropologia jurídica; Método comparativo; Segurança pública; Polícia no Brasil

 

Antropología, Derecho y Seguridad Pública: una combinación heterodoxa

Resumen

Este artículo se propone discutir las relaciones académicas entre las disciplinas del derecho y de la antropología utilizando como soporte empírico la trayectoria de constitución de la carrera de grado en seguridad pública de la Universidad Federal Fluminense, en Niteroi, Río de Janeiro, Brasil. A lo largo del texto serán discutidas cuestiones teóricas referidas a los modelos jurídicos de administración de conflictos propuestos para las sociedades occidentales, cuya construcción está basada en las experiencias etnográficas del autor en Brasil y en Estados Unidos. Finalmente, se exponen algunas características de la seguridad pública en Brasil, en especial en Río de Janeiro, escenario de importantes transformaciones en años recientes en esa área.

Palabras clave: Antropología jurídica; Método comparativo; Seguridad pública; Policía en Brasil

 

Anthropology, Law and Criminal Justice: an heterodox combination

Abstract

Academic relationships between Law and Anthropology will be discussed in both theoretical and empirical basis, having as main support the institutionalization process of creating a pioneer criminal justice undergraduate course at the Universidade Federal Fluminense, in Niterói, Rio de Janeiro state, Brazil. Theoretical questions related to Western legal models for social control and administration of conflicts grounded on the author's ethnographic experience in Brazil and USA will be also discussed. Finally, comments will be made on the characteristics of criminal justice in Brazil and on recent changes in public policies on criminal justice and policing strategies in Rio de Janeiro city.

Key words: Legal Anthropology; Comparative method; Criminal justice; Brazilian police


 

Desde 2008, coordeno um projeto que propôs criar, no âmbito da Universidade Federal Fluminense, inicialmente no Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, posteriormente na Faculdade de Direito, um curso de graduação (bacharelado) em segurança pública. Depois de muitos conflitos e obstáculos, o projeto tornou-se realidade e o curso encontra-se em pleno funcionamento na Faculdade de Direito da UFF, a partir do primeiro semestre de 2012.

Reconstituir a trajetória desse embate é refletir sobre como as diversas inflexões, conexões e afastamentos que a Antropologia e o Direito, como campos consolidados na tradição de ensino universitário, podem se articular para construir um campo inovador nesse ensino, como é o da Segurança Pública. Este artigo tratará disso, combinando, necessária e inevitavelmente, partes da história pessoal e institucional dos atores deste processo com seus resultados institucionais.

Em primeiro lugar é necessário dizer que há algumas especificidades na minha formação profissional que se refletiram em minha atual vinculação e atuação institucional. Não é de menor importância o fato de que obtive minha formação jurídica no período de 1964-1968 na Faculdade de Direito de Porto Alegre, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Essa formação foi muito dogmática, rígida, voltada para a reprodução de uma lógica retoricamente liberal, como era o estilo daquela Faculdade, expressando o afastamento com que o mundo abstrato do Direito se representava frente à concretude da realidade social e institucional que o cerca, em especial quanto às maneiras tradicionais de operar o direito, muito pouco explícitas e sempre, aparentemente, menosprezadas pelos juristas em prol de um "dever ser" utópico, abstrato, quase mítico.

Essa atitude intelectual acabou por me afastar do Direito e a procurar outros caminhos que permitissem uma compreensão menos esquizofrênica da vida social. Foi a Antropologia, uma década depois, com sua perspectiva comparada e relativizadora, que me forneceu os instrumentos para pensar de forma articulada os vários domínios da vida social, inclusive o direito. Entretanto, essa reflexão, na época, não era bem vinda, tanto nesse mundo jurídico dogmático e monológico, quanto no mundo das ciências sociais brasileiras, muito afastado da problemática jurídica, ora por considerá-la mero apêndice da ideologia dominante, ora por incorporá-la acriticamente, como sistema de valores de indiscutível validade e reativo a comprovações empíricas.

A trajetória de minha tese de doutorado, de certa forma, expressa parcialmente esses encontros e desencontros entre a Antropologia e o Direito. Ela foi elaborada a partir de uma longa etnografia do sistema de justiça criminal e de segurança pública da cidade do Rio de Janeiro, realizada no período de 1981-1984. Essa etnografia, defendida em 1986 em uma Universidade dos EUA -duas décadas, portanto, depois do início de minha formação universitária- levou outra década para ser publicada no Brasil, inicialmente pela Polícia Militar do estado do Rio de Janeiro (1994) e, em seguida, pela Editora Forense (1995) por influência de colegas advogados.

Essa publicação atraiu o interesse da Escola Superior de Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (ESPM/RJ), que propôs que eu coordenasse a realização de módulos do seu Curso Superior de Polícia, inicialmente, como cursos de extensão e, depois, como cursos de especialização lato sensu, que os oficiais eram obrigados a fazer para serem promovidos sem que, no entanto, fizessem jus a nenhum certificado de validade acadêmica. Por isso, organizamos um curso de especialização em cooperação com a ESPM/RJ, mas com independência e autonomia universitários em que, por um lado, bastava para a qualificação para a promoção a aprovação do aluno nas disciplinas do curso e, de outro, proporcionava a oportunidade, para aqueles que desejassem, de prosseguir em seus estudos e elaborar e submeter a uma banca uma monografia para obter o título de especialista em Políticas Públicas de Justiça Criminal e Segurança Pública, concedido pela UFF. As melhores monografias foram selecionadas e publicadas pela EDUFF, com recursos do ISP/RJ e do InEAC (Miranda; Lage, 2008; Eilbaum; Pires, 2009; Miranda; Mota, 2010; Silva, Guedes, 2013)

Estes cursos, inicialmente financiados pela Fundação Ford e, a seguir, pelo Instituto de Segurança Pública da Secretaria de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, de 2000 a 2006, também se estenderam a capitães e delegados de polícia, no primeiro caso como um módulo do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais e, no outro, dando origem ao Curso Superior de Polícia Integrado. Desde seu início contaram com um elenco de professores visitantes, da França (Isaac Joseph, René Lévy), Canadá (Daniel dos Santos) e Argentina (Sofia Tiscornia), principalmente, e com professores dos Departamentos de Antropologia, Comunicação Social e Ciência Política da UFF, assim como de outras instituições de ensino superior do Rio de Janeiro e de outros estados.

A vivência que os professores da UFF, membros do Colegiado do Curso de Pós-Graduação em Antropologia (PPGA/UFF), adquiriram ao ensinarem nesses cursos, aliada ao fato de que alguns dos alunos do curso de especialização ingressaram nos cursos de mestrado e doutorado do PPGA/UFF, acabaram por constituir massa crítica capaz não só de instituir uma linha de pesquisa no referido Programa, como de elaborar e desenvolver, através do Núcleo Fluminense de Estudos e Pesquisas (NUFEP), projetos individuais e coletivos que foram contemplados com recursos de editais de agências de fomento para realização de pesquisas e convênios internacionais de intercâmbio nessa área.

Esta atividade culminou recentemente na criação de um Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), contemplado em um edital induzido em áreas estratégicas do Plano de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (2009-2014), o Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos (InEAC - disponível em www.uff.br/ineac). Este instituto, constituído por pesquisadores vinculados a uma rede virtual de instituições de pesquisa no Brasil e no exterior, tem como objetivo, além da realização de pesquisas, a formação de quadros qualificados para a difusão e divulgação do conhecimento produzido, especialmente através de fornecimento de subsídios para a formulação, acompanhamento e avaliação de políticas públicas e desenvolvimento de tecnologias sociais, entre outras, a institucionalização e consolidação do curso de bacharelado em Segurança Pública da UFF.

É importante frisar que nossa reflexão sobre o Direito e a Segurança Pública tem sido pautada pelo método comparativo como é utilizado na Antropologia contemporânea, crítico das posturas evolucionistas e funcionalistas, que costumam orientar os estudos comparativos da ciência política, do direito e, muitas vezes, da sociologia. Assim, ao invés de comparar por semelhança, como é usual nessas perspectivas, a Antropologia busca a comparação por contraste, pela diferença, visando desnaturalizar as visões que os nativos (categoria que inclui, muitas vezes, os próprios antropólogos, quando observam sua própria cultura) constroem de seus próprios sistemas. A intenção, portanto, é chegar a modelos que dêem conta dessas diferenças, e que se atualizam na prática de muitas maneiras distintas. Então, é a partir de diferenças que se constroem modelos explicativos e não o contrário: idealizar um modelo e verificar em que medida os sistemas empíricos se conformam a ele (Lima, Amorim e Fonseca, 2005).

Nesta perspectiva, minha experiência profissional e minhas pesquisas, realizadas com o sistema de justiça criminal dos EUA (criminal justice system), que lá inclui a segurança pública e a polícia, inicialmente em 1990 e depois, mais recentemente, em 2012, foram relevantes para estabelecer referências empíricas que, por contraste, permitiram construir uma reflexão comparativa sobre os sistemas do Brasil e dos EUA, inicialmente e, depois, modelos mais gerais destinados a dar conta dos processos e práticas de nossas tradições jurídicas ocidentais (Lima, 2009; Garapon e Papadopoulos, 2008).

A principal diferença entre esses modelos jurídico-judiciais parece ser a sua ênfase, do lado dos EUA, no modelo normalizador, próprio das ideologias individualistas igualitárias e, em nosso caso, ênfase no modelo repressor, próprio de sociedades hierárquicas e holistas, ou personalistas. Isso fica muito claro quando comparamos nossos sistemas de culpabilização pelo erro ou omissão ao cumprir tarefas obrigatórias, ao sistema de responsabilização (accountability) pela ação advinda de uma opção (discretion). Num primeiro caso, o acerto do agente não é mais do que o cumprimento de uma obrigação, representada na maioria das vezes por uma norma abstrata, muitas vezes impossível de ser cumprida; no outro, toda ação é fruto de uma escolha entre as opções dadas e pode ser ou não bem sucedida, o que será objeto de análise de seus frutos, não de sua conformidade obrigatória com prévias regras abstratas. No nosso caso, essa obrigatoriedade de obediência a regras abstratas gera, por um lado, sua socialmente legítima burla sistemática, o famoso jeitinho, que acaba por substituir seu efetivo cumprimento e que impede a formulação de qualquer protocolo para sua efetivação uniforme; no caso do modelo da accountability, temos a criação sistemática de protocolos, que exprimem a forma correta de agir não a partir de regras abstratas, mas da experiência empírica e cuja violação tem que ser explicada, pois se constitui em um desvio (Lima, 2008a).

Os dois modelos, é claro, apresentam problemas: nosso caso expõe sistematicamente os agentes a acusações, desde omissão, desleixo ou descaso, ao mau uso de sua discricionariedade e à corrupção, pelo uso das soluções informais, não protocoladas, muitas vezes de legalidade duvidosa, para tornar efetiva a resposta institucional, enquanto para os sujeitos envolvidos torna a ação institucional mero exercício de um poder arbitrário; no caso do modelo normalizador, se por um lado, imbui os agentes da prestação de um serviço, por outro, cria infinita e permanentemente acusações de desvios da norma, que tem como consequência a sensação de inadaptação dos indivíduos ao seu meio social, que podem levar a ações de violência indiscriminada.

Essa linha de pesquisa, inicialmente autoral, apoiada com bolsa de produtividade do CNPq, desdobrou-se em orientações de monografias de conclusão de curso, dissertações de mestrado e teses de doutorado, inicialmente no PPPGA/UFF, a partir de sua criação em 1994, posteriormente no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Gama Filho, a partir de 2000 (neste último graças à frutífera parceria com a Professora Maria Stella Amorim), algumas delas já publicadas (Amorim, Lima; Fonseca, 2005; Baptista, 2008, 2013; Eilbaum, 2008; Eilbaum, Pires, 2009; Ferreira, 2004, 2013; Fonseca, 2012; Figueira, 2008; Pinto, 2005; Leite, 2003; Lima, Pires e Eilbaum, 2010, 2011; Lima, Eilbaum, 2009; Pires, 2011; Silva, 2010; Silva, 2011, por exemplo). Essas atividades permitiram a criação de um ambiente propício para o ensino de pós-graduação e para a pesquisa, nessa área da Antropologia do Direito, paralela àquela que se desenvolvia na área de Segurança Pública. Além disso, estabeleceram-se relações com grupos estrangeiros de pesquisa, inicialmente da França, Canadá e Argentina, depois ampliadas para Portugal e Estados Unidos, que propiciaram forte trânsito de estudantes e pesquisadores, do Brasil e do exterior, que colaboraram intensamente para a criação e consolidação de massa crítica capaz de alavancar a pesquisa e o ensino nessa temática, que acabou por viabilizar a criação do já referido INCT-InEAC (Tiscornia e Pita, 2005; Tiscornia, Lima e Eilbaum, 2009; Cefaï et al., 2011).

Este foi aprovado em fevereiro de 2009, através da iniciativa do MCT/Programa "Institutos de Ciência e Tecnologia" - Edital 15/08. A partir dessa iniciativa, foram criados 126 INCTs, de modo a contribuir com a articulação dos melhores grupos de pesquisa em áreas de fronteira da ciência e em áreas estratégicas para o desenvolvimento sustentável do país. Dentre essas áreas, apenas dois INCTs foram contratados na temática induzida da Segurança Pública, sendo o INCT-InEAC o único nessa área sediado no Estado do Rio de Janeiro e o único INCT com sede na Universidade Federal Fluminense (UFF), através da Pró-reitoria de Pós-graduação, Pesquisa e Inovação da UFF (PROPPi). Como já destacado, a aprovação do projeto do INCT-InEAC pelo CNPq e FAPERJ veio consolidar uma rede, nacional e internacional, de formação e pesquisa integrada por programas de pós-graduação e núcleos de pesquisa de instituições de diferentes países e estados brasileiros. Tal rede vem tecendo estreitos laços institucionais, através da realização de diversas atividades conjuntas na área da Segurança Pública e da Justiça Criminal desde o ano 2000. Atualmente, é constituída por 19 grupos de pesquisa e 02 programas de pós-graduação, nacionais e internacionais, que desenvolvem 31 projetos de pesquisa, agrupados em três linhas de pesquisa, envolvendo 95 doutores e 66 doutorandos, num total de 313 pesquisadores em diversas fases de formação, além de 7 consultores internacionais da França, Portugal, Estados Unidos, Canadá e Angola.

O InEAC dedica-se precipuamente à pesquisa de processos institucionais de administração de conflitos, tendo como objeto privilegiado aqueles voltados para os conflitos designados como "macrocriminalidade", conflitualidade social, relações de proximidade, e as instituições que têm essa finalidade, como as Guardas Municipais, a Polícia, o Ministério Público, os Tribunais; os conflitos ambientais, em especial aqueles que ocorrem no contexto da criação e desenvolvimento de Reservas Extrativistas Marinhas; as identidades profissionais e corporativas presentes nesse ambiente institucional, nos seus vários níveis (federal, estadual e municipal) e as formas de produção de verdade nessas instituições. Nesses contextos, procuramos incorporar as perspectivas de todos os atores envolvidos, sejam eles os sujeitos do conflito, sejam eles os agentes, ou operadores, das instituições.

É importante frisar que nosso sistema tradicional de administração institucional de conflitos, que faz parte da área de justiça criminal e segurança pública, não é construído com a finalidade de administrar conflitos, de acordo com sua natureza diversa, mas em devolvê-los, ou em pacificá-los, extingui-los, e/ou em punir os sujeitos neles envolvidos, na perspectiva das corporações que os deviam administrar. Isso tem causado sérios problemas de legitimidade para essas instituições, que se refletem na reduzida confiança emprestada a suas atuações. Por outro lado, ao proceder desta maneira, as diferentes instituições não se articulam como um sistema, que, aliás, de forma peculiar, se divide em justiça criminal (vinculada ao poder judiciário, com as corporações da magistratura, ministério público, advocacia) e segurança pública (vinculada ao poder executivo, com as corporações das diferentes polícias, guardas municipais, etc.), mas como um conjunto de corporações com finalidades e interesses particulares distintos e, muitas vezes, contraditórios. Assim, não se pode dizer que elas atuem para disseminar, pedagogicamente, formas universais e uniformes de administração institucional de conflitos não violentas e não repressivas na sociedade, cujos membros acabam. Por isso mesmo, seus membros acabam, ou por administrar violentamente os conflitos em que estão envolvidos, ou por reivindicar a atuação repressiva dessas instituições quando se vêem envolvidos em conflitos que não conseguem administrar com seus próprios meios.

Daí, a importância da criação do curso de bacharelado em segurança pública, para formar operadores comprometidos com s criação e difusão de tecnologias sociais vinculadas a formas de controle social e administração institucional de conflitos que levem em conta a perspectiva da sociedade e possam propor protocolos não só para provê-los de legitimidade institucional, mas também para proteger os agentes públicos em suas práticas cotidianas, regulando sua atuação e eximindo-se da perspectiva repressiva hoje dominante, que é a de uma segurança pública feita pelos agentes do estado para controlar, a seu arbítrio, a sociedade.

A ideia de criar um curso de segurança pública na UFF, assim, nasce, de um lado, de uma experiência etnográfica que suscita uma elaboração teórica sobre modelos jurídicos para a sociedade, para a formulação e o exercício os processos institucionais de controle social, para administração institucional de conflitos (Geertz, 1978; Lima, 2008); e, de outro, de uma reflexão sobre nossa experiência em cursos de extensão e especialização em políticas públicas de justiça criminal e segurança pública no Brasil, nesses últimos quatorze anos. O que se constata é que a segurança pública é sempre pensada como uma atribuição do Estado, para regular os comportamentos sociais. Como a nossa sociedade é marcada por forte desigualdade social e jurídica, com o Direito reforçando uma posição tutelar do Estado sobre a sociedade -representada como portadora de inúmeras hipossuficiências- e, assim, assumindo um caráter propriamente estatal para a sua área "Pública", a forma privilegiada para exercício desse controle é a repressão.

Por outro lado, nem o curso de Direito, nem as academias de polícia são voltadas para o ensino de disciplinas que se relacionem com o exercício do controle social. Assim, esse exercício é aprendido pelos agentes da segurança pública de maneira informal, não escolarizada e isso faz com que eles naturalizem a sua prática, dissociando-a das "teorias" que possivelmente aprendam através do ensino escolarizado. Como consequência, não há quadros profissionais, na segurança pública -salvo raras e honrosas exceções- que sejam capazes de pensá-la a partir da sociedade, procurando regular as ações do estado e o exercício do controle social por seus agentes (Silva, 2011). Por isso, o curso de bacharelado em segurança pública visa à formação de quadros na perspectiva da segurança pública do ponto de vista da sociedade, que possam pesquisar, formular, propor, administrar e executar ações de segurança pública a partir das teorias democráticas e nos moldes de um estado democrático de direito.

Por isso, o curso é muito diferente dos "cursos de polícia", por um lado, porque não se trata, como naqueles, de um curso instrucional, mas de um curso que procura estimular a reflexão e a crítica; por outro, porque, como já disse, não importa muito para a polícia o que se ensina nos cursos de polícia, pois a atividade policial, propriamente dita, é legitimamente aprendida informalmente, na "rua", não na escola (Silva, 2011). Distancia-se, assim, de formas pedagógicas reprodutoras de uma lógica da repressão, tanto presente no padrão militar, que predomina nas academias de polícia militar, como no padrão dogmático-jurídico-repressivo, presente em áreas do direito penal e processual penal, que domina o pensamento jurídico na execução das ações de segurança pública e justiça criminal, nenhuma das duas adequadas para pensar uma segurança pública voltada para a compreensão da natureza dos conflitos, sejam sociais, sejam individuais, que possa propor formas específicas para sua eficaz administração institucional.

A Antropologia está inserida de forma consistente no curso porque as instituições de justiça criminal e segurança pública são opacas ao olhar da sociedade e de seus próprios agentes. Há um ordenamento formal, que é sempre um vir a ser abstrato, e uma prática informal, que é o que efetivamente vige e regula as ações e comportamentos nessas corporações: uma espécie de "ética corporativa". Assim a etnografia e a perspectiva comparada, como são praticadas na disciplina antropológica, são métodos adequados à compreensão dos significados e à descrição dessas instituições, tornando explícitas as tradições implícitas que as governam.

Entretanto, como a explicitar a complexidade deste domínio e os inúmeros preconceitos recíprocos entre a academia e a segurança pública, no Brasil, a implantação do curso não foi tarefa fácil. Inicialmente, frustrou-se a proposta de projeto pedagógico interdisciplinar do curso, que pretendia contar com a colaboração dos Departamentos que compõe o ICHF - Instituto de Ciências Humanas e Filosofia da UFF, a saber, Antropologia, Ciência Política, Sociologia, História, Filosofia e Psicologia, visando sua inserção no Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Houve forte reação por parte de alunos e professores do ICHF que, adotando paradoxalmente a perspectiva que o curso pretendia criticar, vinculavam-no às atividades de repressão, associando a categoria Segurança Pública ao Estado e não à perspectiva da sociedade, como era nossa intenção. Apenas os Departamentos de Antropologia e Filosofia concordaram explicitamente em fornecer disciplinas e após inúmeras discussões realizadas em um período de 04 meses, todas regidas pela lógica do contraditório, em uma suposta luta do bem contra o mal, este representado pelo projeto do curso, o mesmo acabou rejeitado pela maioria dos membros do Colegiado do ICHF.

Devido a este encaminhamento, ofereceu-se a oportunidade de propô-lo em outra unidade da UFF, a convite da Direção da Faculdade de Direito e dos colegas do Departamento de Direito Público daquela unidade, em especial de um colega antropólogo a ele já vinculado, o Professor Ronaldo Lobão. Para tanto, prestei concurso para integrar-me ao Departamento referido e, depois de reavaliarmos e reelaborarmos a proposta inicial, com a colaboração dos colegas do Departamento, a mesma foi aprovada nas várias instâncias da Universidade, finalizando sua trajetória institucional com a criação de um Departamento de Segurança Pública na Faculdade de Direito. A única no Brasil, aliás, a possuir dois cursos de graduação abertos ao público em geral: um em Direito, outro em Segurança Pública.

Esta iniciativa tem sido apoiada pela Secretaria de Segurança Pública do estado do Rio de janeiro, que nos propôs recentemente, inclusive, a criação de um curso de tecnólogo em Segurança Pública a distância, a ser realizado através da Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro.

Provavelmente esse apoio e outras oportunidades que poderão envolver o Departamento, o curso e seus professores e alunos podem estar relacionadas às modificações por que passam a cidade do Rio de Janeiro e suas periferias, vinculadas a sua recente transformação em commodity, razão pela qual se prepara para abrigar grandes eventos internacionais. Entre essas modificações, já se encontra uma necessária transformação nas políticas públicas de segurança pública, representada, em parte, pela implantação das UPPs, Unidades de Polícia Pacificadora.

Estas se constituíram, inicialmente, em uma operação militar, de conquista e ocupação de um território definido. Neste sentido, foram bem sucedidas. No entanto, a política pública que gerou as UPPs padeceu do mal das políticas públicas dessa área, especialmente daquelas que envolvem as chamadas populações menos favorecidas, pois não leva em conta o ponto de vista desses atores. Diferentemente da formulação e execução de políticas públicas voltadas para o meio ambiente e que afetam as camadas médias da população, por exemplo. Ora, à semelhança da construção das etnografias na perspectiva antropológica, a definição da ordem pública democrática só pode ser legítima se for consensualizada entre todos os envolvidos e não, imposta. Assim, mesmo que os grupos locais apoiem a operação militar de desocupação, isso não implica que estejam de acordo com o ponto de vista das instituições estatais encarregadas da manutenção posterior de uma determinada ordem pública.

O sucesso militar das UPPs, por isso, nada tem a ver com as formas de administração institucional de conflitos que fazem parte da prática policial cotidiana. Há, portanto, que observar as diferentes estratégias que serão colocadas em prática para poder avaliar corretamente o seu resultado. Outra questão diz respeito às consequências que essa ocupação localizada nas Zonas privilegiadas da cidade produziu, vinculadas aos eventos que transformaram o Rio de Janeiro em uma commodity: a expulsão de um número indeterminado de habitantes e de agentes públicos envolvidos nas táticas de extorsão (conhecidas como arrêgo, Pires, 2011), anteriormente empregadas para administrar com violência explícita e fortemente armada os conflitos locais e regular a circulação de mercadorias ilícitas, que certamente deverão ser substituídas por outras formas de regulação nesses locais. Entretanto, é bem provável que os grupos expulsos se desloquem para se reproduzirem em outras localidades, que então se tornem mercados mais promissores para o uso dessas estratégias de guerra e repressão, com o seu indispensável acompanhamento da corrupção e da violência, ambas socialmente institucionalizadas, como forma de propiciar a compra e venda daquilo que meu colega Michel Misse (2008) chamou de "mercadorias políticas" e reproduzir ampliadamente as formas de regulação oficiosa das chamadas milícias.

Desta forma, pode-se dizer que a Região Metropolitana do Rio de Janeiro comporta atualmente três modelos de policiamento, correspondentes a três formas de conceber a relação entre a população e a ordem pública e social: o policiamento urbano da Zona Sul, respeitoso dos direitos dos cidadãos; o policiamento dito comunitário, que pretende envolver as populações das regiões desocupadas na aceitação de uma ordem pública pré-concebida sem a sua participação, além de enfrentar os preconceitos históricos existentes entre essas populações e as instituições policiais; e o policiamento oficioso que se realiza através de instituições para-policiais, e que se utiliza de técnicas tradicionais de extorsão e de repressão explícita na manutenção de sua ordem, voltada para o sucesso de seus negócios e interesses particulares.

Diante desse quadro, é certo que não faltarão oportunidades nem para a pesquisa, nem para o ensino e a extensão, nas quais pretendemos nos inserir, cumprindo, ao mesmo tempo, o papel da Universidade pública, de bem formar profissionais que atuem de forma competente, ética e responsável na construção de instâncias institucionais de administração de conflitos, que possam contribuir para a universalização de direitos e de acesso à justiça, objetivos sempre paradoxais em uma sociedade de classes.

 

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