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Revista electrónica de investigación en educación en ciencias

versión On-line ISSN 1850-6666

Rev. electrón. investig. educ. cienc. vol.3 no.2 Tandil ago./dic. 2008

 

ARTÍCULOS ORIGINALES

Panorama geral das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de eletromagnetismo

Difficulty and viability scenerio of including students with visual impairment in electromagnetism classes

 

Eder Pires de Camargo1 , Roberto Nardi2

1Departamento de Física e Química da Faculdade de Engenharia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Avenida Brasil 56, CEP: 15385 000 Ilha Solteira, São Paulo, Brasil, e Programa de Pós-graduação em Educação para a Ciência (Área de Concentração: Ensino de Ciências) da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Campus de Bauru, São Paulo, Brasil.
2Departamento de Educação e Programa de Pós-graduação em Educação para a Ciência (Área de Concentração: Ensino de Ciências) da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Avenida Engenheiro Luiz Edmundo Carrijo Coube, s/n, Campus Universitário - Vargem Limpa - caixa postal 473, CEP 17033-360- Bauru- São Paulo, Brasil.


Resumen

O presente artigo encontra-se inserido dentro de um estudo que busca compreender quais são as principais barreiras e alternativas para a inclusão de alunos com deficiência visual no contexto do ensino de física. Apresenta e discute as dificuldades e viabilidades para a participação efetiva do aluno cego de nascimento em aulas de eletromagnetismo. Por meio de análise de conteúdo, identifica 4 classes funcionais implicadoras de dificuldades e 5 de viabilidades. Como conclusão, enfatiza a importância da criação de ambientes comunicacionais adequados, a função inclusiva do elemento interatividade, bem como, a necessidade da destituição de ambientes segregativos no interior da sala de aula.

Palavras-chave: Ensino de física; Inclusão; Deficiência visual; Eletromagnetismo; Participação efetiva.

Abstract

This article is aimed at understanding which the most important difficulties and alternatives to include students with visual impairments in physics classes are. It presents and discusses the difficulties and viabilities of having a born blind student effectively attend electromagnetism classes. Using content analysis, this experiment identifies 4 functional classes which might correspond to difficulties and 5 which refer to the viabilities. Therefore, the importance of appropriate communicative environments, the including role of the interactivity element, as well as the need for destitution of segregation environments inside classroom, are emphasized.

Keywords: Physics teaching; Inclusion; Visual impairment; Electromagnetism; Effective participation.


 

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo relata o panorama geral das viabilidades e dificuldades para a inclusão de aluno com deficiência visual em aulas de eletromagnetismo. De acordo com Carvalho e Monte (1995) para incluir os alunos com deficiências no ambiente social da sala de aula, as práticas educacionais devem ser alteradas no sentido da valorização da heterogeneidade humana, o que implica a aceitação individual de todos os alunos levando-se em conta suas condições pessoais.

A inclusão posiciona-se de forma contrária aos movimentos de homogeneização e normalização (SASSAKI, 1999). Defende o direito à diferença, a heterogeneidade e a diversidade (RODRIGUES, 2003). Efetiva-se por meio de três princípios gerais, a presença do aluno com deficiência na escola regular, a adequação da mencionada escola às necessidades de todos os seus participantes, e a adequação, mediante o fornecimento de condições, do aluno com deficiência ao contexto da sala de aula (SASSAKI, op. cit.). Implica numa relação bilateral de adequação entre ambiente educacional e aluno com deficiência, em que o primeiro gera, mobiliza e direciona as condições para a participação efetiva do segundo (MITTLER, 2003). Na lógica da inclusão, as diferenças individuais são reconhecidas e aceitas e constituem a base para a construção de uma inovadora abordagem pedagógica. Nessa nova abordagem, não há mais lugar para exclusões ou segregações, e todos os alunos, com e sem deficiências, participam efetivamente (RODRIGUES, op. cit.). A participação efetiva é entendida em razão da constituição de uma dada atividade escolar que da ao aluno com deficiência, plenas condições de atuação. A participação efetiva, pode, portanto, servir como parâmetro sobre a ocorrência ou não de inclusão, além de explicitar as reais necessidades educacionais do aluno com deficiência. Concluir que incluir alunos com deficiências em aulas de física, química, biologia, matemática, história, língua portuguesa, etc, deve ir além dos princípios gerais indicados, é reconhecer a necessidade do investimento em pesquisas que revelem propriedades ativas das variáveis específicas.

A partir do exposto, o presente texto identifica, classifica e analisa algumas das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de física que enfocaram temas eletromagnéticos. Para tanto, tomouse como parâmetro a participação efetiva desse discente nas atividades. A participação efetiva é avaliada em função da relação: discente com deficiência visual/conteúdos conceituais e procedimentais de eletromagnetismo (COLL apud ZABALA, 1998). Segundo esse autor, os conteúdos de ensino são compreendidos em termos conceituais, procedimentais e atitudinais.

Como explica Zabala (op. cit.), os conteúdos conceituais estão relacionados ao conhecimento de fatos, conceitos e princípios, os procedimentais ligados às regras, técnicas, habilidades, e os atitudinais a valores, atitudes, princípios éticos. Em outras palavras, conteúdos conceituais relacionam-se ao saber, os procedimentais ao saber fazer, e os atitudinais ao ser (ZABALA, op. Cit.).

Em relação aos conteúdos atitudinais, várias pesquisas indicam que a presença do aluno com deficiência em uma classe regular contribui positivamente ao desenvolvimento de valores de caráter colaborativo, de respeito às diferenças, ligados à construção de uma sociedade menos excludente e para a identificação de uma natureza humana heterogenia (Carvalho E Monte, 1995). Esse é o motivo pelo qual, no presente texto, as atenções sobre o processo de inclusão estão voltadas à participação efetiva do aluno com deficiência visual naquelas atividades próprias ao ensino de conteúdos conceituais e procedimentais de eletromagnetismo. Em outras palavras, serão discutidos os problemas reais oriundos da relação docente/discente com deficiência visual, discentes com e sem deficiência visual, discente com deficiência visual/conhecimento de eletromagnetismo, discente com deficiência visual/atividades experimentais, discente com deficiência visual/operações matemáticas, etc.

2. O CONTEXTO DAS ATIVIDADES.

Sob a coordenação de um grupo de licenciandos (grupo de eletromagnetismo), foram aplicadas quatro atividades (16 horas no total) em ambiente educacional que contou com a presença de alunos com e sem deficiência visual. O grupo de eletromagnetismo era constituído por quatro licenciandos que se alternaram entre as funções de coordenação e apoio das atividades. As atividades ocorreram no Colégio Técnico Industrial Prof. Isaac Portal Roldán (Bauru, Estado de São Paulo, Brasil). Essas atividades fizeram parte de um curso de extensão denominado "O Outro Lado da Física" oferecido pelo curso de Licenciatura em Física da Universidade estadual Paulista (câmpus de Bauru) durante o segundo semestre de 2005. Além de eletromagnetismo, esse curso também contemplou aulas de óptica, mecânica, termologia e física moderna. Acerca da preparação para a aplicação dos módulos de ensino, cabem os seguintes comentários.

Os licenciandos definiram que as atividades constituiriam um curso de extensão a ser oferecido pela UNESP para uma determinada escola da rede regular de ensino de Bauru. A escolha do CTI deu-se por quatro fatores: (a) o CTI é um colégio vinculado à UNESP; (b) existência de boas relações entre a mencionada instituição e a UNESP de Bauru; (c) cursos semelhantes já haviam sido aplicados com sucesso no CTI; (d) proximidade entre o CTI e a UNESP. Tal proximidade facilitou o deslocamento dos licenciandos.

No início do segundo semestre de 2005, os licenciandos iniciaram um período de divulgação junto aos alunos da mencionada instituição. O CTI oferece cursos técnicos de mecânica, eletrônica e processamento de dados, bem como, o ensino médio propedêutico. Estudam no CTI alunos da cidade e da região de Bauru com idade média de 15 anos. O número de vagas para a participação dos alunos do CTI no curso "O Outro Lado da Física" foi de trinta e cinco, sendo que o número de inscritos foi de aproximadamente setenta alunos. A escolha dos trinta e cinco participantes deu-se por sorteio. Dessa forma, os alunos oriundos do CTI e participantes do curso eram provenientes dos três anos do ensino médio (profissionalizante e propedêutico).

Paralelamente ao processo de divulgação descrito, entrou-se em contato com a Escola Estadual Mercedes P. Bueno, localizada na cidade de Bauru - SP, a fim de convidar alunos com deficiência visual para participarem do curso anteriormente mencionado. A escola foi procurada, pois, no CTI, não havia alunos com deficiência visual matriculados. A Escola Estadual Mercedes P. Bueno possui uma sala de recursos pedagógicos que procura atender às necessidades educacionais de alunos com deficiência visual (Ex. ensino do Braile, transcrição de textos ou provas em Braile). Dois alunos com deficiência visual interessaram-se em participar do curso "O Outro Lado da Física". Esses alunos na ocasião possuíam as seguintes características em relaçãoà deficiência visual e à escolaridade: ambos eram cegos; um possuía 15 anos de idade e cursava a 8ª série do ensino fundamental, e o outro possuía 34 anos e cursava a oitava série do ensino de jovens e adultos. Na ocasião, os discentes com deficiência visual tinham contato com temas da física nas aulas de ciências (ministradas na educação básica). O aluno de 15 anos de idade era cego de nascimento e o de 34 perdera a visão aos vinte e quatro anos. O aluno cego de nascimento participou de todas as aulas, e o que perdeu a visão ao longo da vida, da terceira e quarta aulas. Destaca-se que os resultados apresentados enfatizam as viabilidades e dificuldades vivenciadas pelo aluno que nasceu cego. A ênfase às viabilidades e dificuldades dos dois discentes inviabilizaria a exposição desse texto.

3. METODOLOGIA DE ANÁLISE E TÉCNICAPARA A COLETA DOS DADOS

O registro áudio-visual e posterior transcrição na íntegra das atividades constituíram o corpus de análise. Adotando os procedimentos: exploração do material; tratamento dos resultados e interpretação, para a realização de uma análise temática - técnica de análise de conteúdo - (BARDIN, 1977) foram identificadas dificuldades e viabilidades para a participação efetiva do aluno cego de nascimento nas atividades de eletromagnetismo.

No processo de exploração do material, realizou-se a fragmentação do corpus de análise (BARDIN, op. cit.). Para a fragmentação, foram selecionados trechos que continham a mesma viabilidade ou dificuldade. Após a fragmentação, as dificuldades e viabilidades foram agrupadas de acordo com a classe que as caracterizam. Em outras palavras, o agrupamento foi orientado pela identificação do perfil das dificuldades e viabilidades para a inclusão do aluno com deficiência visual. Essas dificuldades e viabilidades serão enfocadas na seqüência.

Como decorrência dos processos de fragmentação e agrupamento, foram identificadas quatro classes de dificuldades de inclusão e cinco de viabilidades. Essas classes são as seguintes: (a) dificuldades: comunicação, segregação, operação matemática e experimento. (b) Viabilidades: comunicação, experimento, utilização de materiais, apresentação de hipótese e apresentação de modelos. As dificuldades e viabilidades explicitadas representam classes funcionais ou componentes ativos das atividades que expressam, respectivamente, barreiras ou alternativas à participação efetiva do aluno cego nas aulas de eletromagnetismo. O quadro 1 apresenta as classes de dificuldade e viabilidade, e a quantidade e porcentagem dos momentos em que as mesmas foram verificadas.

Quadro 1: Panorama geral de dificuldades e viabilidades de inclusão para o aluno cego de nascimento.

Observa-se no quadro 1 que as classes: Comunicação e experimento foram comuns às dificuldades e viabilidades de inclusão. Por outro lado, verificaram-se classes que representaram dificuldade ou viabilidade de inclusão. As classes: segregação e operação matemática representaram somente dificuldade à participação efetiva do discente, enquanto que as classes: apresentação de modelos, utilização de materiais e apresentação de hipóteses representaram apenas alternativas a tal participação. Isto se deveu ao fato de que essas classes possuem características intrínsecas que as tornaram fator gerador de barreiras e/ou alternativas à participação efetiva do aluno com deficiência visual.

As características intrínsecas serão definidas a partir de duas categorias, ou seja, linguagem e contexto. Em outras palavras, o entendimento dos fatores determinantes para a condição de dificuldade e/ou viabilidade de uma determinada classe funcional será feito em função da explicitação do perfil lingüístico utilizado pelos licenciandos no processo de veiculação de significados eletromagnéticos, bem como, do contexto em que a veiculação de significados ocorreu. Na seqüência, as categorias mencionadas são apresentadas.

Categorias para a análise dos dados

Categoria 1: Linguagem.

A presente categoria objetiva compreender se as informações veiculadas pelos licenciandos foram acessíveis ao aluno com deficiência visual. A acessibilidade será avaliada em razão das estruturas empírica e semântico-sensorial das linguagens utilizadas para a veiculação de informações.

1.1. Estrutura Empírica da Linguagem: Refere-se ao suporte material da linguagem (MARTINO, 2005), isto é, a forma por meio da qual uma determinada informaçãoé materializada, armazenada, veiculada e percebida. Pode se organizar em termos fundamentais e mistos. As estruturas fundamentais são constituídas pelos códigos visual, auditivo e tátil articulados de forma autônoma e/ou independente uns dos outros. As estruturas mistas surgem quando os códigos fundamentais se combinam de forma interdependente, ou seja, estruturas áudio-visual, tátilvisual, tátil-auditiva e tátil-visual-auditiva. Observa-se que os sentidos de natureza olfativa e gustativa não serão, para efeitos de análise desta categoria, considerados como códigos sensoriais utilizados para a veiculação de informações. Embora a existência de tais códigos seja possível, entende-se, por hipótese, que para contextos de sala de aula de eletromagnetismo ela seja desprezível.

1.2. Estrutura Semântico-sensorial da Linguagem: refere-se aos efeitos produzidos pelas percepções sensoriais no significado de fenômenos, conceitos, objetos, situações e contextos (DIMBLERY & BURTON, 1990). Esses efeitos são entendidos por meio de quatro referenciais associativos entre significado e percepção sensorial, a indissociabilidade, a vinculação, a não relacionabilidade e a relacionabilidade secundária.

Significados indissociáveis são aqueles cuja representação mental é dependente de determinada percepção sensorial. Esses significados nunca poderão ser representados internamente por meio de percepções sensoriais distintas da que os constituem.

Significados vinculados são aqueles cuja representação mental não é exclusivamente dependente da percepção sensorial utilizada para seu registro ou esquematização. Sempre poderão ser representados por meio de percepções sensoriais distintas da inicial.

Há, para o caso da indissociabilidade, uma relação indissolúvel entre significado e percepção sensorial, enquanto que para o caso da vinculação, não.

Significados sensorialmente não relacionáveis (ou sem relação sensorial) não possuem vínculo ou associação com qualquer percepção sensorial. Embora o aprendiz possa construir representações mentais sensoriais acerca de idéias com a presente característica, as mesmas nunca corresponderão de fato aos fenômenos/conceitos que se visam comunicar. As representações mentais com a característica semântico-sensorial aqui discutida encontrarse- ão sempre no nível analógico, metafórico e artificial. Tratam-se, portanto, de significados abstratos referentesà construtos hipotéticos elaborados para a explicação de fenômenos, efeitos, propriedades, etc.

Significados de relacionabilidade sensorial secundária (ou de relação sensorial secundária) são aqueles cuja compreensão estabelece com o elemento sensorial uma relação não prioritária. Em outras palavras, embora ocorram construções de representações mentais sensoriais por parte do aprendiz, as mesmas não representam prérequisito à compreensão do fenômeno/conceito abordado. A idéia de representação utilizada nesta categoria de análise é aquela contida em EISENCK & KEANE (1991). Segundo os autores (op. cit. p. 202) representaçãoé "qualquer notação, signo ou conjunto de símbolos capaz de representar, mesmo na ausência do representado, algum aspecto do mundo externo ou de nossa imaginação". De forma mais específica, a presente categoria fundamenta-se no conceito de "representações internas" ou "representações mentais", que ocorrem no nível subjetivo da cognição, do pensamento. Em outras palavras, tais representações referem-se "às formas em que codificamos características, propriedades, imagens, sensações, etc, de um objeto percebido ou imaginado, bem como, de um conceito abstrato" (EISENCK & KEANE, 1991, p. 202).

Dessa forma, a caracterização das linguagens obedeceuà relação: Linguagem = (estrutura empírica) + (estrutura semântico-sensorial). A avaliação de uma viabilidade ou dificuldade comunicacional levou em conta o fato de uma dada linguagem ter ou não tornado acessível ao aluno cego de nascimento os significados por ela veiculados. Em outras palavras, a acessibilidade foi avaliada em razão da potencialidade comunicativa das estruturas empírica e semântico-sensorial da linguagem em comparação com a característica visual do aluno (cego de nascimento).

Categoria 2: contexto.

Refere-se a duas características inerentes à presença do aluno com deficiência visual nas atividades: (a) espaço instrucional que contemplou a presença do aluno cego; e (b) nível de interatividade desse espaço.

a) Es paço instrucional: episódio e episódiosparticulares.

2.1. Episódios: Referem-se a espaços instrucionais comuns aos alunos com e sem deficiência visual, isto é, momentos em que todos os discentes envolveram-se nas mesmas tarefas coordenadas pelos licenciandos. Uma característica fundamental dos episódios é a não diferenciação de conteúdos, estratégia metodológica e recurso instrucional para aluno com e sem deficiência visual.

2.2. Episódios particulares: Dizem respeito aos espaços instrucionais que contaram apenas com a participação do aluno cego, ou seja, ocorreram de forma separada e simultânea à aula dos alunos videntes. Uma característica central desses episódios é a diferenciação, em comparação à participação dos alunos videntes, dos recursos instrucionais utilizados, das estratégias metodológicas empregadas e do conteúdo ou de sua abordagem.

b) Nível de interatividade: discurso interativo e discurso não-interativo: Segundo Mortimer e Scott (2002) a diferenciação entre os discursos interativo e nãointerativo da-se pela identificação do número de "vozes" que participam de uma determinada relação discursiva. Exemplificando, se numa aula apenas o professor fala, o discurso é dito não interativo, enquanto que se durante a aula, existe a participação dos alunos (apresentação de dúvidas, questões, posições, etc), o discurso é dito interativo.

2.3. Discurso interativo: ocorre com a participação de mais de uma pessoa.

2.4. Discurso não-interativo: ocorre com a participação de uma única pessoa.

Portanto, o contexto é definido pela relação: (espaço instrucional) + (nível de interatividade). Na seqüência, com o apoio das categorias de análise, as classes de dificuldades e viabilidades identificadas serão analisadas. Em tal análise, serão enfocadas, primeiramente, aquelas presentes nas dificuldades e viabilidades, e posteriormente, as identificadas nas dificuldades ou viabilidades.

4. Análise dos dados

Classes que representam dificuldade e viabilidadeà inclusão do aluno com deficiência visual.

Dificuldade de comunicação: Foram identificados 92 momentos em que ocorreram dificuldades de comunicação entre os licenciandos e o aluno cego, dificuldades agrupadas em função de 4 linguagens. Essas linguagens constituíram-se em razão das seguintes estruturas empíricas: (a) estrutura fundamental: auditiva e visual independentes; (b) estruturas mistas: áudio-visual interdependente e tátil-auditiva interdependente. Em relação ao aspecto semântico-sensorial, os significados abordados estiveram relacionados a duas estruturas: (a) significado vinculado às representações visuais, exemplos: carga elétrica (registro, sinais e intensidade), força elétrica (módulo, direção e sentido), lei de Coulomb (relação entre as grandezas: força elétrica, cargas elétricas e distância entre as cargas), processo de eletrização (contato e indução), atração e repulsão elétricas, linhas de força do campo elétrico, corrente elétrica, resistência elétrica, resistores elétricos, segunda lei de Ohm (significados e relações entre as grandezas), diferença de potencial elétrica, gerador e receptor elétricos, medidores elétricos - galvanômetro, voltímetro e amperímetro - (significado e registro), magnetismo (princípios gerais e implicações práticas), dipolo magnético, auroras boreal e austral (como e porque ocorrem, aspectos relacionados ao comportamento geométrico), linha de campo magnético (de ímãs, da terra, etc), fita cassete (funcionamento e armazenamento de informações), constantes do eletromagnetismo - permissividade elétrica e permeabilidade magnética - (unidades, valores e significados), relação: campo magnético e corrente elétrica; e (b) significado indissociável de representações visuais, exemplos: característica visual das cores associadas ao fenômeno das auroras boreal e austral e idéia visual de energia luminosa.

Portanto, as 4 linguagens geradoras de dificuldade comunicacional foram as seguintes: (a) áudio-visual interdependente/significado vinculado às representações visuais ( 96,74%), (b) áudio-visual interdependente/significado indissociável de representações visuais ( 1,09%), ( c ) auditiva e visual independentes/significado vinculado às representações visuais ( 1,09%) e (d) tátil-auditiva interdependente/significado indissociável de representações visuais (1,09%).

A veiculação dos significados vinculados às representações visuais constituiu-se na base das dificuldades de comunicação entre os licenciandos e o aluno cego de nascimento. Essas dificuldades objetivaram-se por meio de linguagens constituídas de estrutura empírica de acesso visualmente dependente (áudio-visual interdependente) e de acesso visualmente independente (tátil-auditiva interdependente e auditiva e visual independentes). Dessa forma, dificuldades geradas por linguagem de acesso visualmente dependente fundamentam-se na estrutura empírica, bem como, na estrutura semântico-sensorial dos significados abordados (prioritariamente significados vinculados às representações visuais). Já as dificuldades geradas por linguagens de acesso visualmente independente fundamentam-se na estrutura semânticosensorial dos significados abordados. Linguagens constituídas de estrutura empírica áudio-visual interdependente representaram a principal barreira comunicacional entre os licenciandos e o aluno cego de nascimento, tanto pela predominância de utilização, quanto pela forma como organizam a veiculação de significados (observação simultânea dos códigos auditivo e visual que dão suporte material à veiculação de informações).

Na seqüência, serão apresentadas características marcantes das linguagens geradoras de dificuldade comunicacional: (a) presença majoritária de dificuldades relacionadasà estrutura empírica áudio-visual interdependente; (b) presença majoritária de dificuldades relacionadas aos significados vinculados às representações visuais; (c) as dificuldades oriundas de estrutura empírica áudio-visual interdependente relacionaram-se quase que totalmente aos significados vinculados às representações visuais; (d) significados indissociáveis de representações visuais participaram discretamente do conjunto de dificuldades comunicacionais; (e) episódios comuns a todos os alunos caracterizaram-se majoritariamente pelo emprego de linguagem de estrutura empírica áudio-visual interdependente; (f) a interatividade mostrou-se fator discreto de dificuldades e (g) não foram verificadas dificuldades provenientes da relação: interatividade/linguagens de estruturas empíricas visualmente independentes (tátil-auditiva interdependente e auditiva e visual independentes);

Viabilidade de comunicação: Foram identificados 122 momentos em que ocorreram viabilidades de comunicação entre os licenciandos e o aluno cego, viabilidades agrupadas em razão de 10 linguagens. Essas linguagens constituíam em função das seguintes estruturas empíricas: (a) estruturas fundamentais: fundamental auditiva e auditiva e visual independentes; e (b) estrutura mista tátilauditiva interdependente. Em relação ao aspecto semântico-sensorial, os significados veiculados estiveram relacionados a quatro estruturas: (a) significado vinculado às representações não-visuais (exemplos: linhas de força do campo elétrico, simbologia dos elementos constituintes de um determinado circuito elétrico, estrutura cristalina de um condutor, linhas de campo magnético, etc). A veiculação de significados como os mencionados apoiou-se em maquetes ou equipamentos possíveis de serem tocados, manipulados e observados auditivamente; (b) significados de relacionabilidade sensorial secundária (exemplos: perigo dos relâmpagos, objetivo e funcionamento do pararaio, efeitos dos raios nos eletrodomésticos, data do descobrimento do âmbar, data da construção de equipamento de eletrização, Benjamin Franklin foi o descobridor do para-raio, data da elaboração da lei de Coulomb, período e criador da pilha, período de desenvolvimento mais acentuado da eletricidade, etc.); (c) significado indissociável de representações não-visuais (exemplos: corrente elétrica aquece o chuveiro, corrente elétrica produz choque, 90% da energia elétrica em uma lâmpada é transformada em energia térmica, corrente elétrica aquece a lâmpada, etc.); e (d) significados sensorialmente não relacionáveis (exemplos: próton/carga positiva, elétron/carga negativa, nêutron/carga neutra, o que é campo magnético, o que é campo elétrico, diferenciação entre eletricidade positiva e negativa, corrente elétrica produz campo magnético, etc.).

Portanto, as 10 linguagens geradoras de viabilidade comunicacional foram as seguintes: (a) fundamental auditiva/significado de relação sensorial secundária (22,13%); (b) tátil-auditiva interdependente/significado vinculado às representações não-visuais (21,31%); (c) auditiva e visual independentes/significado de relação sensorial secundária (19,67%); (d) fundamental auditiva/significado vinculado às representações nãovisuais (13,93%); (e) auditiva e visual independentes/significado vinculado às representações não-visuais (8,20%); (f) Tátil-auditiva interdependente/significado indissociável de representações não-visuais: (4,10%); (g) auditiva e visual independentes/significado sem relação sensorial (4,10%); (h) fundamental auditiva/significado indissociável de representações não-visuais: (3,28%); (i) fundamental auditiva/significado sem relação sensorial:(2,46%); e (j) tátil-auditiva interdependente/significado de relação sensorial secundária (0,82%).

Dessa forma, ocorreu entre os licenciandos e o aluno cego, veiculação de significados vinculados e indissociáveis de representações não-visuais, bem como, de relacionabilidade sensorial secundária e sem relacionabilidade sensorial. Tal veiculação objetivou-se por meio de linguagens constituídas de estruturas empíricas de acesso visualmente independente (fundamental auditiva (41,80%), auditiva e visual independentes (31,97%) e tátilauditiva interdependente (26,23%).

Na seqüência, serão apresentadas características marcantes das linguagens geradoras de viabilidade comunicacional: (a) predominância de viabilidades nos contextos comunicacionais comuns à todos os discentes; (b) predominância, nos contextos comuns à todos os discentes, do emprego das estruturas empíricas: fundamental auditiva e auditiva e visual independentes; (c) predominância de viabilidades relacionadas aos significados de relacionabilidade sensorial secundária (conteúdos factuais); (d) o elemento "não-interatividade" mostrou-se adequado à veiculação de significados de relacionabilidade sensorial secundária; (e) ocorrência freqüente de viabilidades relacionadas aos significados indissociáveis de representações não-visuais em episódios caracterizados pelo elemento "interatividade"; (f) os episódios particulares facilitaram a utilização de linguagens de estrutura empírica tátil-auditiva interdependente, bem como, a veiculação de significados vinculados às representações não-visuais; (g) ocorrência de viabilidades relacionadas à veiculação dos significados eletromagnéticos sem relação sensorial; (h) maior número de viabilidades em contextos comunicacionais interativos; e (i) não ocorrência da relação: viabilidade/estrutura empírica áudio-visual interdependente.

Dificuldade experimento: Foi identificada em quatro ocasiões. Refere-se à não participação efetiva do aluno com deficiência visual em atividades experimentais. Esse tipo de dificuldade esteve ligada à realização de experimento demonstrativo, em episódios não-interativos e com o emprego de linguagem áudio-visual interdependente/significado vinculado às representações visuais. Os experimentos realizados foram os seguintes: (1) experimento demonstrativo do processo de eletrização por atrito (licenciando esfregava bexigas no cabelo e aproximava uma da outra produzindo repulsão entre elas); (2) experimento demonstrativo (licenciandos atritam bexiga no cabelo, aproximam da extremidade do eletroscópio e as lâminas internas se afastam (foto 1); (3) licenciando liga o painel, abre e fecha chaves fazendo determinadas regiões do painel não funcionarem, executa medidas de corrente e tensão demonstrando como utilizar os medidores elétricos (foto 2); (4) licenciando demonstra configuração de campo magnético sobre limalha de ferro colocada sobre superfície de papel.


Foto 1: eletroscópio utilizado em experimento


Foto 2: Circuito elétrico utilizado em experimento

Viabilidade experimento: Foi identificada em 5 ocasiões. Refere-se à participação efetiva do aluno com deficiência visual em atividades experimentais. Esse tipo de viabilidade esteve ligado à realização de experimentos participativo e demonstrativo, em episódios interativos e com o emprego de linguagens de estruturas empíricas tátilauditiva interdependente e fundamental auditiva. Os experimentos realizados foram os seguintes: (5) eletrização por atrito: aluno com deficiência visual atrita caneta no cabelo, aproxima a caneta atritada dos papeis que estão sobre sua mão e eles são atraídos; (6) aluno com deficiência visual pega nas mãos pequenos pedaços de papel, licenciando esfrega em sua cabeça a bexiga, aproxima dos papeis sobre a mão do discente cego e eles são atraídos; (7) gaiola de Faraday: (a) licenciando envolve num pedaço de papel um rádio ligado e o rádio continua a funcionar, (b) licenciando envolve o rádio numa folha de papel alumínio e o rádio deixa de funcionar; (8) afeitos da corrente elétrica: licenciando liga o circuito multissensorial (foto 3), discente cego observa por meio do tato e da audição os equipamentos funcionando (ventilador e buzina), ocorre discussão entre os alunos com e sem deficiência visual sobre os efeitos da corrente elétrica nos aparelhos; (9) licenciando conduz as mãos do aluno com deficiência visual ao longo dos equipamentos experimentais desligados (foto 3), da oportunidade para que o discente cego apresente suas dúvidas e compreensões acerca do funcionamento e do não funcionamento dos equipamentos


Foto 3: circuito multissensorial (tátil-visual-auditivo)

Classes que representam dificuldade ouviabilidade à inclusão do aluno com deficiênciavisual.

Dificuldade segregação: Foi identificada em 6 ocasiões: diz respeito à criação, no interior da sala de aula, de ambientes segregativos de ensino. Esses ambientes contaram com a participação apenas do aluno com deficiência visual e de um licenciando colaborador. Os referidos ambientes foram constituídos devido às dificuldades oriundas da aula principal, isto é, aquela ministrada para todos os alunos pelo licenciando responsável. Ocorreram prioritariamente durante episódios de ensino que não favoreceram a interação docente/discente, o que representa, para efeitos de participação efetiva, uma diferenciação excludente em relação ao tratamento educacional dos alunos videntes. Nos ambientes segregativos, temas discutidos durante a aula principal eram por vezes suprimidos ou simplificados, ou seja, diferenciaram-se daqueles trabalhados por todos os alunos. Observou-se ainda, que em tais ambientes, os diálogos ocorreram em voz baixa, o que explicita sua característica de "incomodo" à aula principal. O quadro 2 apresenta um panorama sintético da dificuldade de segregação

Quadro 2: síntese das atividades segregativas e principal realizadas simultaniamente

Atendimentos particularizados, observados em episódios que previam tal prática junto a todos os alunos, não foram considerados ambientes segregativos de ensino. Isto implica dizer que a posição adotada não é contrária a realização de atendimentos particularizados para quaisquer alunos, e sim, a aqueles que representam exclusa em relação ao tratamento educacional da aula ministrada.

Dificuldade operação matemática: Foi identificada em cinco ocasiões. Refere-se à não participação efetiva do aluno com deficiência visual em atividades que envolveram a efetuação de cálculos. Essas atividades foram realizadas em episódios não-interativos e com o emprego de linguagem de estrutura empírica fundamental auditiva. Fundamenta-se na relação triádica caracterizadora das operações matemáticas, ou seja, Simultaneidade entre raciocínio, registro do cálculo e sua observação.

Os cálculos não realizados pelo aluno cego estiveram relacionados aos seguintes temas: problemas envolvendo a aplicação da lei de Coulomb (em dois momentos), problemas sobre receptores elétricos (um momento) e problemas envolvendo medidores elétricos (dois momentos).

Um aluno vidente quando equaciona e resolve matematicamente um problema físico, pensa sobre o que vai calcular, escreve o cálculo ao longo de uma folha de papel, observa as equações e suas anotações, se preciso, volta a observar, raciocina enquanto escreve, e este processo repete-se durante todo o cálculo. O aluno cego, por não conseguir registrar e observar simultaneamente, não executa a relação triádica raciocínio/registro/observação, o que o deixa com enormes dificuldades nas atividades de cálculos. Nota-se que o Braile, código de escrita e leitura tátil, não proporciona ao aluno com deficiência visual as condições de simultaneidade, já que, a escrita Braile é realizada na parte oposta do papel.

Viabilidade utilização de materiais: Verificada em cinco ocasiões, refere-se à utilização, junto aos alunos videntes, das maquetes desenvolvidas para o ensino do aluno com deficiência visual. Tal utilização ocorreu com o emprego de linguagem de estrutura empírica áudio-visual interdependente e em episódios não interativos. A viabilidade de utilização, portanto, não é aplicada diretamente à participação efetiva do aluno com deficiência visual, e sim, à possibilidade de materiais desenvolvidos para alunos com a mencionada deficiência serem empregados junto aos alunos videntes.

Cinco foram as maquetes utilizadas: (a) registro tridimensional de cargas elétricas positiva e negativa e suas respectivas linhas de força (foto 5); (b) maquete tátil-visual de cargas elétricas positiva e negativa e a interação entre suas linhas de força (foto 6); ( c ) maquete tátil-visual de rede cristalina cúbica. (foto 7); (d) maquete analógica tátilvisual de condutor elétrico (comprimento do condutor, área do condutor e resistividade do condutor) - segunda Lei de Ohm- (foto 8); (e) maquete tátil-áudio-visual analógica (corrente elétrica, diferença de potencial, resistência elétrica e resistividade elétrica - foto 4 ).


Foto 4: maquete tátil-visual-auditiva analógica: corrente elétrica, ddp, resistividade elétrica


Foto 5: Registro tridimensional de representação de cargas elétricas positiva e negativa e suas respectivas linhas de força.


Foto 6: Maquete tátil-visual de representação de cargas elétricas positiva e negativa e a interação entre suas linhas de força.


Foto 7: Maquete Tátil-visual de rede cristalina cúbica


Foto 8: Maquete Tátil-visual analógica de condutor elétrico (comprimento do condutor, área do condutor e resistividade do condutor - segunda Lei de Ohm).

É importante destacar que as maquetes tátil-visual e tátilvisual- auditiva exibem um grande potencial inclusivo, na medida em que atendem necessidades educacionais de todos os alunos.

Viabilidade apresentação de modelos: Foi identificada em duas ocasiões. Refere-se à apresentação, por parte do aluno cego, de modelos explicativos de fenômenos eletromagnéticos. Ocorreu em episódios interativos e com o emprego de linguagens de estrutura empírica fundamental auditiva. Nesses ambientes, os alunos com e sem deficiência visual alternaram-se como interlocutores. Assim, o discente cego teve a oportunidade de expressarse. Os modelos por ele apresentados foram os seguintes: (a) modelo sobre eletricidade: eletricidade é como bolinhas que devem chegar a algum lugar, mas por vários caminhos; (b) modelo para corrente elétrica: corrente elétricaé semelhante a um cano passando água.

A título de exemplificação, apresenta-se um dos modelos do aluno cego (modelo b). Para a apresentação do mencionado modelo, será transcrito um trecho de uma das atividades. Nesse trecho, as siglas: L, A-v e B, correspondem, respectivamente, às declarações de um dos licenciandos, de um dos alunos videntes e do aluno cego de nascimento.

Trecho 1

L: Agora eu vou fazer uma pergunta aqui, parece simples,mas não é tão simples.
Liga o equipamento (foto 3)
L: O que acontece quando eu desligo aqui? (chave )
Porque que acaba? ( o funcionamento dos equipamentos)
A-v: Corta a corrente elétrica
B: É tipo ligar na torneira não é? A torneira você abre,sobe o parafuso para cima e a água sai. Ai você cocha atorneira ela fecha e ai a água não passa mais, é tipo uma chave.

O modelo apresentado evidencia que o discente com deficiência visual possui representação mental acerca do fenômeno da corrente elétrica e que tal representação foi por ele construída devido ao estabelecimento de analogia entre corrente elétrica e água passando por uma torneira. Ou seja, a partir de influências sociais e do conhecimento do funcionamento do objeto "torneira", o aluno com deficiência visual relacionou o fluxo de água em um cano com o fenômeno da corrente elétrica em um fio condutor.

Viabilidade apresentação de hipótese: Foi verificada em duas ocasiões. Sua ocorrência esteve relacionada a episódios interativos e ao emprego de linguagens de estruturas empíricas tátil-auditiva interdependente e auditiva e visual independentes. Como nesses ambientes os alunos com e sem deficiência visual alternaram a função de interlocutor, o discente cego teve condições de expressar-se. Essa viabilidade refere-se a situações em que o discente apresentou relações de causa e efeito para um determinado fenômeno eletromagnético. Essas hipóteses foram as seguintes: (a) hipótese para as causas do funcionamento dos equipamentos elétricos do circuito (foto 3); (b) hipótese inerente aos efeitos do campo magnético que passa através de diferentes meios materiais. Na seqüência, a hipótese (a) será apresentada. Observa-se que as siglas empregadas anteriormente são mantidas.

Trecho 2

L: A gente está tentando organizar um pouco as idéias,alguém quer dizer o que acontece dentro dos fios, o que faz com que a lâmpada acenda a buzina toque e o ventiladorgire?
A-v: Passa uma corrente elétrica
B: A eletricidade positiva e negativa se encontra, em todosos fios tem o positivo e negativo.
L: Você poderia repetir?
B: Eu acho que a eletricidade positiva e negativa seencontra e acontece o fenômeno.

Como indica o trecho 2, o discente cego apresentou hipótese para o funcionamento dos equipamentos elétricos constituintes do circuito (foto 3). Essa hipótese fundamenta-se no argumento de que ocorre, no interior do fio, o encontro de eletricidade positiva com eletricidade negativa. Esse encontro, segundo o discente, faz os equipamentos funcionarem. O que está em análise não é se a hipótese do discente está correta ou incorreta. O que buscamos evidenciar é que o discente, à medida que as atividades tornaram-se interativas, elaborou hipóteses explicativas para fenômenos eletromagnéticos. Essa elaboração de hipóteses e também de modelosé fundamental ao processo de aprendizagem do aluno. Portanto, proporcionar condições para que hipóteses e modelos sejam elaborados por discentes com deficiência visual é fundamental à participação efetiva dos mesmos nas atividades de eletromagnetismo.

Buscando uma síntese, são apresentados os quadros 3 e 4. Esses quadros explicitam as classes de dificuldades e viabilidades, bem como, suas características intrínsecas marcantes.

Quadro 3: Classes e características intrínsecas das dificuldades de inclusão.

Quadro 4: Classes e características intrínsecas das viabilidades de inclusão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS.

Como mostraram as análises efetuadas, foram identificadas quatro classes de dificuldades de inclusão. A predominante foi a comunicacional (85,98% de ocorrência), seguida pela segregativa (5,61% de ocorrência), da relacionada às operações matemáticas (4,67% de ocorrência) e aos experimentos (3,74% de ocorrência).

Essas classes estiveram relacionadas, majoritariamente, a episódios não-interativos comuns a todos os alunos e ao emprego de linguagens visualmente acessíveis. O foco de dificuldades comunicacionais centrou-se na veiculação, por meio de linguagem de estrutura empírica áudio-visual interdependente, dos significados vinculados às representações visuais, isto é, tornados visualmente acessíveis. Tais significados não exibem relação indissociável com a representação visual, e por isto, podem ser registrados e veiculados por códigos não-visuais. Dito de outro modo, a forma de registro e veiculação visual foi executada de forma intencional e deliberada, ou ainda, desatenta às necessidades educacionais do aluno com deficiência visual. A dificuldade "segregação" esteve diretamente relacionada à criação, no interior da sala de aula, de episódios particulares que contaram apenas com a participação do discente com deficiência visual. Como discutido, nesses episódios os temas trabalhados eram distintos dos abordados na aula principal, que não previa, em sua estrutura metodológica, atendimentos particularizados. Atividades que previam tais atendimentos não foram interpretadas como ambientes segregativos de ensino. Já os experimentos que representaram dificuldade à participação efetiva do discente com deficiência visual foram os visualmente demonstrativos e observáveis. Durante a realização de tais experimentos, não foram verificadas as interações discentes com e sem deficiência visual e discente com deficiência visual/licenciando.

Outra classe geradora de dificuldade a ser destacada,é aquela relacionada à operação matemática. Esse temaé pouco discutido na perspectiva da deficiência visual,é muito importante ao ensino de física, e representa para discentes cegos ou com baixa visão, uma grande barreira a ser superada. Docentes de física e matemática dificilmente sabem como lidar com esse tipo de situação. O problema envolve a relação triádica raciocínio/registro/observação dos cálculos. Como o deficiente visual não observa simultaneamente o que escreve, a relação é destituída.É preciso o investimento no desenvolvimento de materiais que proporcionem condições para que este discente, de forma simultânea, registre, observe aquilo que registra e raciocine.

Já as viabilidades de inclusão estiveram relacionadas a cinco classes funcionais. A predominante também foi a comunicacional (89,70% de ocorrência), seguida pelas de experimento e de utilização de materiais (ambas com 3,68% de ocorrência) e pelas de apresentação de modelos e de hipóteses (ambas com 1,47% de ocorrência). Essas classes, exceto a "utilização de materiais", caracterizaramse pelo emprego de linguagens de estruturas empíricas fundamental auditiva, auditiva e visual independentes e tátil-auditiva interdependentes.

Em geral, as viabilidades comunicacionais estiveram relacionadas a duas características: (a) veiculação de significados de relacionabilidade sensorial secundária, e (b) veiculação de significados vinculados às representações não-visuais. Os significados de relacionabilidade sensorial secundária dizem respeito, majoritariamente, a fatos, datas, acontecimentos cotidianos. Por outro lado, significados vinculados às representações não-visuais são oriundos da tentativa de superação das dificuldades provenientes da veiculação de significados vinculados às representações visuais. A veiculação de tais significados apoiou-se em maquetes ou equipamentos possíveis de serem tocados, manipulados e observados auditivamente. Dessa forma, esses materiais representaram canais comunicacionais entre discente com deficiência visual, licenciando e conteúdo eletromagnético.

A classe "utilização de materiais", não representa viabilidade diretamente relacionada aos alunos com deficiência visual, e sim, uma possibilidade de inclusão que não deve ser descartada. Em outras palavras, tal classe funcional reconhece que materiais elaborados para alunos cegos ou com baixa visão podem ser utilizados junto aos alunos videntes. Nas atividades de eletromagnetismo, esses materiais foram empregados de forma a não viabilizar a participação simultânea dos alunos com e sem deficiência visual. Falta, portanto, um ajuste de natureza metodológica para que todos os alunos possam utilizar os mesmos materiais.

A partir dos padrões de viabilidades e dificuldades expostos, apresentam-se 6 recomendações para a inclusão do aluno com deficiência visual em aulas de eletromagnetismo e para a melhora do ensino e da aprendizagem dos estudantes em geral:
1) Destituição da estrutura empírica áudio-visual interdependente caracterizadora de boa parte das linguagens empregadas em sala de aula.
2) Criação de material instrucional de interface visual e não-visual (registros visuais e não-visuais sobrepostos).
3) Utilização, junto aos alunos cegos ou com baixa visão, de linguagens de estrutura empírica tátil-auditiva interdependente.
4) Promover interação entre discentes com e sem deficiência visual, utilizando em tal interação, os materiais de interfaces visuais e não-visuais.
5) Reconhecimento de que existem fenômenos eletromagnéticos que não podem ser observados empiricamente, e que nesse caso, a visão não contribuià compreensão dos mesmos.
6) Reconhecer e explorar as potencialidades comunicacionais das linguagens fundamental auditiva e auditiva e visual independentes. A utilização de tais linguagens é viável para a veiculação de significados de relacionabilidade sensorial secundária, bem como, ao detalhamento oral de significados vinculados às representações visuais.

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