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Revista electrónica de investigación en educación en ciencias

On-line version ISSN 1850-6666

Rev. electrón. investig. educ. cienc. vol.13 no.1 Tandil June 2018

 

ARTICULOS ORIGINALES

Evidências de validade de uma escala para medir engajamento e interesse de estudantes em aulas de física1

 

Nayra Luiza Carminatti1, Luiz Clement1

nayralcarminatti@gmail.com , luiz.clement@udesc.br

1Universidade do Estado de Santa Catarina, Joinville, Brasil

 


Resumo

Este trabalho apresenta o processo de elaboração e busca de evidências de validade de um instrumento na forma de escala likert que visa avaliar o interesse e o engajamento de estudantes do Ensino Médio para realizar Atividades Didáticas de Resolução de Problemas na disciplina de Física. A versão final da escala é composta por uma afirmativa principal, “Participei das atividades de resolução de exercícios e problemas porquê...”, seguida de dezoito itens que a completam. A escala foi aplicada a um conjunto de 377 estudantes do Ensino Médio. Foram realizadas as seguintes análises estatísticas: análise fatorial, com extração dos componentes principais, análises de consistência interna e correlação de Pearson. Foram encontrados quatro fatores representativos, assim caracterizados: Engajamento Cognitivo e Comportamental (α=0,8), Interesse Individual (α=0,7), Interesse Situacional (α=0,7) e Engajamento Emocional (α=0,9), os quais explicam 50,3% da variabilidade dos dados. Os resultados atribuem confiança e credibilidade à escala e a tornam apta para ser utilizada em investigações que tenham como foco o interesse e o engajamento de estudantes em aulas de Física.

Palavras clave: Escala likert; Interesse; Engajamento; Ensino de Física.

Evidence of validity of a scale to measure engagement and interest of students in physics classes

Abstract

This paper presents the process of elaboration and look for evidence validity of an instrument in the form of a likert scale that evaluate the interest and engagement of High School students in Didactic Activities of Problem Solving in the discipline of Physics. The final version of the scale consists in a main affirmative, "I participated in exercise and problems solving activities because ...", followed by eighteen items that completed it. The scale was implemented to 377 high school students. The following statistical analyzes were performed: factorial analysis, extraction of the main components, analysis of internal consistency and Pearson correlation. There were four representative factors, thus characterized: Cognitive and Behavioral Engagement (α = 0.8), Individual Interest (α = 0.7), Situational Interest (α = 0.7) and Emotional Engagement (α = 0.9), that explain 50.3% of data variability. The results attribute trust and credibility to scale and make it suitable for use in research that focuses on the interest and engagement of students in physics classes.

Keywords: Likert scale; Interest; Engagement; Physics Teaching.

Evidencias de validez de una escala para medir el compromiso y interés de los estudiantes en las clases de física

Resumen

Este trabajo presenta el proceso de elaboración y búsqueda de evidencias de validez de un instrumento en forma de escala Likert que pretende evaluar el interés y compromiso de los estudiantes de secundaria para llevar a cabo actividades didácticas de solución de problemas en la disciplina de Física. La versión final de la escala se compone de una afirmativa principal, "He participado en las actividades de resolución de ejercicios y problemas por qué ...", seguido por dieciocho artículos que la completan. La escala se aplicó a 377 estudiantes de secundaria. Se realizaron los siguientes análisis estadísticos: análisis factorial, con extracción de los componentes principales, análisis de consistencia interna y correlación de Pearson. Se encontraron cuatro factores representativos, caracterizados por: el compromiso cognitivo y conductual (α = 0,8), el interés individual (α = 0,7), el interés situacional (α = 0,7) y el compromiso emocional (α = 0,9), que explica el 50,3%  de la variabilidad de los datos. Los resultados atribuyen confianza y credibilidad a escala y la hacen apta para ser utilizada en investigaciones que tengan como foco el interés y el compromiso de estudiantes en clases de física.

Palabras clave: Escala de Likert; Interés; Compromiso; Enseñanza de la física.

Preuve de la validité d'une échelle pour mesurer l'engagement et l'intérêt des étudiants dans les cours de physique

Résumé

Ce travail présente le processus d'élaboration et de recherche de preuves de validité d'un instrument sous la forme d'une échelle Likert qui vise à évaluer l'intérêt et l'engagement des lycéens à mener des activités didactiques pour résoudre des problèmes dans la discipline de Physique. La version finale de l'échelle est composée d'un affirmatif principal, "a participé aux activités de la résolution des exercices et des problèmes parce que...", suivie par dix-huit éléments qui le complètent. L'échelle a été appliquée à un ensemble de 377 étudiants élèves du secondaire. Les analyses statistiques suivantes ont été réalisées: analyse factorielle, extraction des principaux composants, analyse de la consistance interne et corrélation Pearson. Quatre facteurs représentatifs ont été trouvés, ainsi caractérisés: l'engagement cognitif et comportemental (α = 0,8), l'intérêt individuel (α = 0,7), l'intérêt situationnel (α = 0,7) et l'engagement émotionnel (α = 0,9), qui représentent 50,3% de la variabilité des données. Les résultats attribuent la confiance et la crédibilité à l'échelle et le rendent capable d'être utilisé dans les enquêtes qui concentrent l'intérêt et l'engagement des étudiants dans les classes de physique.

Mots clés: Échelle Kert; Intérêt; Engagement; Enseignement de la physique;

 


1. INTRODU ÇÃO

No contexto educacional o interesse e engajamento dos estudantes com as atividades escolares é apontado pelos professores como um fator relevante no processo ensino-aprendizagem. Porém, no cenário latino americano, em particular no cenário brasileiro, observa-se que ainda há poucos estudos na área de educação que se dedicam a estudar de forma profunda essas variáveis. Interesse e engajamento são apresentados, na maioria dos estudos, como resultado de pesquisa de um elemento de envolvimento afetivo positivo dos estudantes e caracterizado de maneira qualitativa. De forma geral, essas variáveis ainda não constituem objetos centrais de pesquisa no campo da Educação Científica; embora já se tenha evidenciado sua impotência e relação com o processo de aprendizagem dos estudantes. Uma justificativa para poucas pesquisas que se dedicam a aprofundar estudo nestas áreas são os diferentes instrumentos indicados para obtenção de dados e/ou poucos recursos disponíveis para obtenção de informações sobre a qualidade do interesse e engajamento dos estudantes.

Segundo Renninger, Hidi e Krapp (1992), os estudos realizados sobre interesse no meio acadêmico são baseados em observações, questionários ou entrevistas. A maneira de se obter medidas do interesse é com a aplicação de testes formais ou informais, ou simplesmente entrevistas com os indivíduos envolvidos sobre os tópicos particulares de preferências. Também, são feitas observações da variação de comportamento e/ou testes, afim de se obter a percepção dos envolvidos na situação.

Nas pesquisas realizadas para identificar o engajamento dos estudantes no contexto escolar são apresentadas algumas metodologias para coleta de dados desta variável. Fredricks e McColskey (2012) fazem uma síntese das metodologias mais utilizadas nas pesquisas que visam investigar o engajamento no contexto escolar. Algumas das metodologias mais utilizadas são: experiências com pequenas amostras, autorrelato dos estudantes, entrevistas estruturadas ou semiestruturadas, observações diretas e listas ou escalas de verificações.

Fredricks e McColskey (2012) destacam que algumas das metodologias mencionadas são mais eficientes do que outras para obter dados correlacionados a uma determinada dimensão do engajamento. Por exemplo, autorrelato são propícios para detectar as percepções subjetivas dos estudantes, e dar acesso a uma dimensão específica do engajamento. Essas percepções normalmente não são diretamente observadas, já que muitas vezes os estudantes conseguem camuflar suas emoções. Além disso, o autorrelato é muito utilizado, pois se torna um instrumento prático e fácil de administrar em uma sala de aula. Os autorrelatos normalmente são apresentados na forma de escalas ou questionários. Porém, um dos problemas de instrumentos de autorrelatos é a possível falta de honestidade dos estudantes quando são colocados a apresentar suas respostas sem anonimato, podendo causar a falsa apresentação de suas percepções. Mas, um destaque positivo destes instrumentos é a facilidade e rapidez na coleta de dados e percepções dos estudantes. Porém, devemos salientar que é imprescindível que os instrumentos de autorrelatos devem oferecer confiabilidade ao pesquisador.

Neste sentido, com base em nossos referenciais para o entendimento de interesse e engajamento, no presente estudo apresentamos o processo de elaboração e validação de uma escala para medir interesse e engajamento dos estudantes para realizar as atividades didáticas de Resolução de Problemas nas aulas de Física do Ensino Médio.

2. INTERESSE E ENGAJAMENTO NO CONTEXTO ESCOLAR

Na área da psicologia da educação, o interesse é entendido como uma componente psicológica caracterizada por um elemento afetivo e outro cognitivo. No geral, percebemos que não se tem uma definição sobre interesse, porém se tem um entendimento de como observar o interesse. Segundo Hidi (2006) o interesse é uma “[...]variável emocional assim como um estado psicológico que ocorre durante interações entre indivíduo e o objeto de interesse, e é caracterizado pelo aumento de atenção, concentração e afeto.” (Hidi, 2006, p. 70, tradução nossa). A interação entre o indivíduo e objeto de interesse é variável, ou seja, depende de estímulos pessoais, como por exemplo: a conexão do indivíduo com a ação do momento, objetos, tarefas, eventos ou pensamentos em um grande meio social (Renninger, Hidi & KRAPP, 1992; Hidi, 2006).

De maneira geral os indivíduos experimentam momentos de interesse quando se percebe que são movidos por um prazer intrínseco e não por razões externas, além do interesse intrínseco pelo objeto ou situação. Os estudos sobre interesse destacam que, os estados de interesse se apresentam por meio de interações entre a pessoa e o contexto envolvido, e possuem duas classes de influências distintas (Renninger, Hidi & Krapp, 1992; Ainley, Hidi & Berndorff, 2002; Hidi, 2006; Tsai et al, 2008). A primeira desta classe, é atrelada as características da pessoa (sexo, conhecimentos prévios, experiências de preferência, conteúdos de preferência, entre outros – denominada interesse individual). A segunda desta classe, é referente as características da situação, ou seja, certas situações de aprendizagem são capazes de despertar o interesse e curiosidade independente das preferências pessoais – denominado de interesse situacional (Ainley, Hidi & Berndorff, 2002; Tsai et al, 2008).

Muitos autores destacam que o interesse individual está fortemente relacionado à estrutura motivacional do indivíduo, ou seja, é entendido como uma tendência para se ocupar com o objeto de interesse. O interesse individual é considerado relativamente estável e está associado com a aprendizagem (aumento de conhecimento), prova de emoções positivas e aumento de valores pessoais de referência (Renninger, Hidi & Krapp, 1992; Krapp & Prenzel, 2011). No contexto educacional, o interesse individual é entendido como uma predisposição, relativamente duradoura e individual, para participar de atividades e eventos com determinados objetivos. Interesses individuais gerais são definidos como um desejo para adquirir uma nova informação, procurar mais sobre o novo objeto, eventos, e ideias, não restringido a um conhecimento limitado (Ainley, Hidi & Berndorff, 2002).

O interesse situacional, diferentemente do interesse individual, é produzido a partir de estímulos, ou seja, situações ou objetos que permitem o envolvimento do indivíduo, e tende, em muitos casos, a ser compartilhado entre os indivíduos envolvidos na experiência. Como este interesse é produzido por estímulos do ambiente, em geral se observa que seu tempo de atuação é muito curto em relação ao do interesse individual. No entanto, observa-se que seus efeitos dão suporte ao interesse individual (Renninger, Hidi & Krapp, 1992). O interesse situacional é caracterizado pelo aumento da atenção e concentração, persistência e envolvimento afetivo e aumento da disposição para aprender (Renninger, Hidi & Krapp, 1992; Krapp & Prenzel, 2011). E ainda, pode promover aumento de compreensão e recordação de informações adquiridas nas situações de interesse (Ainley, Hidi & Berndorff, 2002). Segundo Hidi (1990), existem dois fatores que contribuem para o interesse situacional. O primeiro fator consiste nas estruturas das situações, ou seja, formas de apresentação da novidade, intensidade do envolvimento proporcionado e ambiguidade da situação. O segundo fator consiste nos recursos proporcionados pelos conteúdos envolvidos, como por exemplo a influência da atividade humana, fatores de relevância e temas de vida.

O engajamento dos estudantes com as atividades escolares integra um conjunto de fatores considerado importante pelos professores da educação básica. Na disciplina de ciências, em especial a física, esta importância dada ao engajamento não é diferente. Pesquisadores da área de ensino sinalizam para a importância do suporte social - professores, colegas de classe e/ou pais - para promover estados motivacionais nos estudantes e favorecer o processo ensino-aprendizagem (Wang & Eccles, 2012; Wang & Eccles, 2013; Clement, 2013; entre outros).

No contexto escolar, o engajamento pode ser entendido como uma relação que o estudante estabelece com as atividades escolares. Essa relação está sujeita a influências das interações dos estudantes e o contexto no qual a atividade é proposta. Neste sentido, observa-se que esta variável motivacional é maleável, ou seja, pode ser aperfeiçoada pelas diversas variáveis presentes no contexto escolar (Fredricks, Blumenfeld & Paris, 2004; Appleton, Christensons & Furlong, 2008; Faria, 2008; Julio, Vaz & Fagundes, 2011; Wang & Eccles, 2012; Wang & Eccles, 2013).

O engajamento é um conceito que se constitui de múltiplas características. De acordo com Fredricks, Blumenfeld e Paris (2004), o engajamento pode ter características comportamentais, emocionais e/ou cognitivas. O engajamento comportamental implica em apresentação de condutas positivas, observação e respeito as regras, participação e iniciativa em atividades escolares curriculares e extracurriculares (Fredricks, Blumenfeld & Paris, 2004; Julio, Vaz & Fagundes, 2011; Wang & Eccles, 2012; Wang & Eccles, 2013).

O engajamento emocional envolve as reações afetivas e emocionais positivas dos estudantes diante das atividades, dos sujeitos e de outros elementos que compõe o ambiente escolar e identificação com os valores e objetivos escolares. Esta variável pode ser percebida pela demonstração de emoções positivas (felicidade, bem-estar, satisfação, interesse, entre outras) ou negativas (desgosto, frustrações, desinteresse, entre outras), e também pela valorização estabelecida com os vínculos escolares (identificação com estilo de atividades, envolvimento espontâneo em atividades escolares curriculares ou extracurriculares, entre outras) (Fredricks, Blumenfeld & Paris, 2004; Julio, Vaz & Fagundes, 2011; Wang & Eccles, 2012; Wang & Eccles, 2013).

O engajamento cognitivo se caracteriza pelo investimento cognitivo dos alunos na aprendizagem, incluindo os esforços mentais, o uso de estratégias planejadas para atingir a aprendizagem, domínio de conceitos e a vontade de realizar os esforços necessários para a compreensão de ideias mais complexas e habilidades difíceis. Assim o desenvolvimento do engajamento cognitivo é caracterizado de forma mais geral como a motivação para aprender, ou seja, uma motivação interna baseada em estratégias de aprendizagem, investimentos e esforços pessoais para atingir o objetivo. O estudante engajado cognitivamente consegue planejar estratégias para executar suas ações e monitorar o seu próprio progresso (Fredricks, Blumenfeld & Paris, 2004; Julio, Vaz & Fagundes, 2011; Wang & Eccles, 2012; Wang & Eccles, 2013).

Portanto, com as caracterizações de interesse engajamento, apresentadas nesta seção, fica evidenciado seu papel importância no processo de ensino e aprendizagem dos estudantes. Aspecto esse que reforça a demanda de investigações voltadas ao contexto escolar que possam contribuir com a proposição de produtos educacionais ou de instrumentos de pesquisa úteis para a promoção e/ou o diagnóstico do interesse e do engajamento de estudantes em sala de aula. Sob esta perspectiva desenvolvemos o presente estudo focado na elaboração de uma escala likert fundamentada teoricamente e submetida a um processo de validação em contexto típico a que se destina.

3. METODOLOGIA

3.1. Desenvolvimento da escala

A escala desenvolvida ao longo desta pesquisa foi elaborada com base em outras seis escalas já validadas e utilizadas em diferentes estudos. Os itens que compõem a Escala de Medida de Engajamento e Interesse (EMEI), foram elaborados e/ou adaptados a partir de alguns itens de outras escalas voltadas a medida de interesse e engajamento em outros contextos. As escalas utilizadas para dar suporte a elaboração dos itens da EMEI são: Self-Conceptand Interest (Marsh et al, 2005), Lesson-Specific Measures (Tsai et al, 2008), Individual Interest Scale (Linnenbrink-Garcia et al, 2010), The Engagement Scales (Schaufeli et al, 2002), Latent Concepts Related to Student Engagement (Archambault et al, 2009) e Escala de Engajamento Escolar (Stelko-pereira, Valle & Williams, 2015).

A versão preliminar da EMEI foi submetida a uma a validação teórica e semântica (Baptista & Campos, 2010; Pasquali, 1997). A validação teórica foi realizada por meio da análise e discussão dos itens por dois pesquisadores, e a validação semântica foi feita em dois momentos. Em um primeiro momento os itens foram analisados por dois pesquisadores de forma à deixá-los próximos da linguagem dos estudantes respondentes. Em um segundo momento, foi solicitado que três estudantes do Ensino Médio realizassem a leitura preliminar da escala, para identificarmos possíveis interpretações errôneas dos itens e reestruturar a redação dos itens que geraram interpretações equivocadas.

A versão da EMEI submetida ao processo de validação continha uma afirmativa principal, “Participei da atividade de resolução de exercícios e problemas porquê...”, seguida de 33 afirmativas que completavam a afirmativa principal. O formato de apresentação da escala escolhido foi o formato de escala likert de cinco pontos. No processo de validação, os itens que compunham a escala foram arranjados de forma aleatória.

3.2. Procedimento de coleta de dados

A EMEI foi aplicada a 377 estudantes do Ensino Médio de duas escolas públicas estaduais da cidade de Joinville-SC, Brasil. A escala foi aplicada durante as aulas de Física das turmas participantes, sempre com a presença do professor em sala. Os estudantes levaram, em média, 20 minutos para responder a escala. A escolha destas escolas/turmas se deve aos seguintes aspectos: por fazerem parte da rede pública estadual, submetidas aos mesmos parâmetros curriculares; terem dado abertura para que a escala fosse aplicada; pelo fato dos professores trabalharem com a resolução de problemas de maneira bastante similar, isto é, focada nas proposições presentes nos livros didáticos adotados.

Após a coleta das respostas, foi realizada uma triagem para verificação dos questionários que seriam utilizados para a análise de dados. Nesta triagem eliminamos os questionários que haviam sido parcialmente respondidos ou que apresentavam o mesmo valor para todas as afirmativas. Assim, para a análise dos dados foram utilizados 371 questionários. Do total de questionários validados, 178 (47,98%) são do gênero masculino e 193 (52,02%) são do gênero feminino; 118 (31,81%) da primeira série, 122 (32,88%) da segunda série e 131 (35,31%) da terceira série do ensino médio. A média de idade destes estudantes é de 17,0 anos.

3.3. Procedimento de análise dos dados

Os dados obtidos com as respostas dos estudantes ao questionário forma transportados para o Programa Statistica, versão 8.0, para o procedimento das análises estatísticas previstas. Primeiramente, realizamos a análise fatorial com extração das componentes principais e com rotação varimax, buscando determinar o número de fatores existentes para o conjunto de dados. Em seguida, realizamos a análise de consistência interna entre os itens das subclasses, mediante a extração do alfa de Cronbach e a análise de correlação de Pearson.

4. RESULTADOS

A partir da análise fatorial encontramos sete fatores com autovalor maior que 1, conforme mostra a tabela 1:


Tabela 1: Extração dos componentes principais com autovalor maior do que 1.

Para auxiliar na decisão da manutenção dos fatores foi realizado o scree test, extraindo o gráfico dos autovalores representado no gráfico 1:


Gráfico 1: Gráfico de autovalores.

Observando o gráfico 1 acima e a tabela 1, percebemos que os itens da escala se agruparam em sete fatores com autovalor maior ou igual a 1,0. Em análises posteriores, tendo em vista o agrupamento dos itens e suas respectivas cargas fatoriais, concluímos pelo carregamento dos itens em quatro fatores. Baseados no agrupamento dos itens em torno de quatro fatores e no referencial teórico-conceitual sobre interesse e engajamento, foi possível nomeá-los da seguinte forma:

  • Fator 1 - Engajamento Cognitivo e Comportamental;
  • Fator 2 - Interesse Individual;
  • Fator 3 - Interesse Situacional;
  • Fator 4 - Engajamento Emocional.

Para que os itens fossem considerados componentes do fator, estabelecemos como critério que sua carga fatorial fosse igual ou superior a 0,30; sua coerência teórica; e a consistência interna dos itens, medida pelo alfa de Cronbach (retratado na tabela 2). Diante disso, quinze itens da escala original foram excluídos. Em um primeiro momento, pode parecer alto o número de itens a serem excluídos, no entanto, salientamos que em processo de elaboração e validação de escalas é comum a proposição de um número maior de itens em uma versão inicia, já prevendo-se possíveis exclusões de forma a se permanecer com a escala com os itens mais consistentes e pertinentes a medir os traços latentes das variáveis foco.


Tabela 1: medida do alfa de Cronbach para os fatores.

Todas as exclusões de itens da escala original se devem a razões teóricas, ou seja, os itens excluídos foram elaborados com a finalidade de medir uma variável, porém se agruparam a um conjunto de itens em outro fator. A seguir, detalhamos quais itens foram excluídos em cada fator e o motivo de exclusão, ressaltando a variável na qual o item de agrupou.

Na versão preliminar da escala elaboramos 7 itens para medir engajamento cognitivo, porém na análise fatorial 4 itens se agruparam ao Fator 1, e os outros três itens a outros fatores, dando razão a sua exclusão. Os itens excluídos foram: “Gosto de desafios que testam meus conhecimentos e a atividade me proporcionou isso”, que se agruparam com carga fatorial maior aos itens de medida de engajamento emocional (Fator 4); “Com a atividade percebi que aprendi o conteúdo que estou estudando”, que se agrupou com mesma carga fatorial aos itens de engajamento emocional (Fator 4) e engajamento cognitivo e comportamental (Fator 1); “A atividade me proporcionou trocar ideias com os colegas, fato que eu considero importante para aprender”, que se agrupou com itens elaborados para medir interesse situacional (Fator 3).

Para medir engajamento comportamental, na versão preliminar elaboramos 7 itens que se distribuíram em diferentes fatores, porém 3 deles se agruparam ao Fator 1 com boa carga fatorial. Desta forma o Fator 1 comporta tanto itens de engajamento cognitivo, quanto de engajamento comportamental, com boa consistência interna conforme demonstra o alfa de Cronbach (tabela 1). Os itens elaborados para medir engajamento comportamental excluídos são os seguintes: “Quis impressionar meus colegas” e “Quero que pensem que eu sou um bom estudante”, que se agruparam aos itens de interesse situacional (Fator 3); “Sou persistente em tudo que faço”, que se agrupou aos itens de interesse individual (Fator 2); “Preciso de notas para passar de ano”, que se agrupou com mesma carga fatorial a todos os fatores.

Para medir interesse individual foram elaborados 6 itens originalmente, sendo que 3 deles se agruparam constituindo o Fator 2. Os outros três itens foram excluídos, a saber: "Achei divertido participar desta atividade”, “O tipo de exercício abordado nesta atividade me ajuda no meu dia a dia”, que se agruparam a itens de engajamento emocional (Fator 4); e “Acho importante este tipo de atividade para aprender física”, que se agrupou aos itens de engajamento cognitivo e comportamental (Fator 1).

Para medir interesse situacional foram elaborados 6 itens originalmente, sendo que 3 deles se agruparam ao Fator 3. O restante dos itens foram excluídos e são: “Gostei da forma de resolução exigida pela atividade” e “Me envolvi na atividade e não percebi o tempo passar”, se agruparam a itens elaborados para medir engajamento emocional (Fator 4); e “O tipo de exercício abordado na atividade me envolveu na construção da resolução”, que se agrupou a itens de engajamento cognitivo e comportamental (Fator 1).

Para medir engajamento emocional foram elaborados 7 itens originalmente e 5 deles se agruparam ao Fator 4. Os outros dois itens foram excluídos: “Me sinto bem resolvendo os exercícios e problemas com meus colegas”, que se agrupou aos itens elaborados para medir interesse situacional (Fator 3) e “Me senti orgulhoso ao perceber que consegui resolver os exercícios e problemas propostos na atividade”, que se agrupou aos itens de engajamento cognitivo e comportamental (Fator 1).

Para complementar nossa análise verificamos a correlação existente entre os fatores, mediante ao cálculo da correlação de Pearson entre os escores médios das variáveis. Este resultado está descrito na tabela 2.

 


Tabela 2: Correlação de Pearson entre os escores médios das variáveis. Nível de significância (p): p <0,05.

Pelos resultados da tabela 2 constata-se que há correlação positiva entre os fatores. Isso evidencia que ao se promover maior interesse dos estudantes nas atividades escolares também tende-se a favorecer maior engajamento dos mesmos.

Após o levantamento das evidências de validade da escala, percebemos que de modo geral, os resultados indicam que a EMEI se mostra confiável para ser utilizada em estudos que visam avaliar o grau de interesse e engajamento dos estudantes nas atividades de Resolução de Problemas desenvolvidas nas aulas de Física.

5. DISCUSSÃO

A elaboração da EMEI teve como suporte inicial resultados obtidos em outras pesquisas, sendo que a maioria era destinada a elaboração e validação de instrumentos de medida de interesse e engajamento no contexto escolar. Destes trabalhos obtivemos suporte para elaborar e adaptar itens para a composição da versão preliminar da EMEI. Além do mais, com base nos resultados destes estudos, ficou evidenciada uma lacuna quanto à proposição de escalas de medida de interesse e engajamento para áreas especificas do conhecimento. Neste sentido, a elaboração e validação da EMEI contribuem diretamente com a área de pesquisa em ensino de Física, uma vez que, está destinada a medir o interesse e engajamento dos estudantes em atividades didáticas de Resolução de Problemas praticadas nas aulas de Física. Para além disso, a EMEI também pode ser utilizada pelos professores da educação básica que tiverem interesse em avaliar o interesse e engajamento de seus estudantes nas atividades de Resolução de Problemas propostas em suas aulas.

Na análise dos itens que compõem os quatro fatores da escala, percebemos que um elevado número de itens foi excluído. Acreditamos que este acontecimento é reflexo da proximidade e sutil diferença entre alguns itens propostos para medir estes fatores, já que os mesmos acabaram se agrupando com carga fatorial maior nos fatores que não correspondiam a finalidade de sua elaboração.

A análise fatorial exploratória revelou que a escala apresenta boas propriedades psicométricas, garantindo a validade da escala diante dos pressupostos teóricos. Os quatro fatores considerados, a partir dos resultados da análise, respondem por 50,3% da variabilidade total dos dados.

Os índices que indicam consistência interna dos itens de cada fator, medidos pelo alfa de Cronbach, foram significativos, atribuindo confiança e credibilidade à escala. Porém acreditamos que em uma validação mais rígida poder-se-ia buscar melhorar os índices da subclasse que se encontram muito próximos ao limite de corte (0,30). Assim, alguns itens dos fatores poderiam ser reelaborados. Também acreditamos que aumentar o número de itens para as classes de Interesse Individual e Interesse Situacional pode colaborar com a melhora desses índices.

Após a avaliação, a versão final da escala permaneceu com dezoito itens no total. Este conjunto de itens, permite uma versatilidade em seu uso. No quadro 1 apresentamos os itens que compõem a EMEI devidamente agrupados em suas a seus fatores. Os itens estão acompanhados de suas respectivas cargas fatoriais e numeração de correspondência.


Quadro 1: Distribuição dos itens por fator com a respectiva carga fatorial.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O interesse e engajamento dos estudantes nas atividades didáticas praticadas em sala de aula é apontado pelos professores como importante. Porém, são poucas as pesquisas que se propõem a avaliar essas variáveis e medi-las em diferentes situações.

Pesquisadores da área indicam alguns instrumentos para a coleta de dados, como, entrevistas semiestruturadas, questionários, escalas, observações, entre outras. Escalas de medida no formato de escala likert são um dos instrumentos mencionados por pesquisadores. Porém, em nosso levantamento bibliográfico, encontramos instrumentos que se propõem a medir o interesse ou engajamento, mas as propostas encontradas eram para contextos diferentes da escala desenvolvida e validada neste estudo.

Cabe destacar que uma das qualidades de escalas likert, a exemplo da que propomos neste artigo, é a agilidade na coleta de dados, permitindo tratamento quantitativo que poderá ser confrontado com resultados qualitativos expressos a partir de dados coletados por outros recursos metodológicos. Mas para isso, é fundamental que se tenha confiabilidade na escala e isso se obtém por meio de criteriosos processos de validação. A EMEI passou por um processo de busca de evidências de validade e sua versão final constituída por quatro fatores favorece credibilidade e confiabilidade para ser utilizada no diagnóstico do interesse e engajamento de estudantes em ações no contexto escolar.

Avaliar o interesse e engajamento dos estudantes em atividades didáticas de Resolução de Problemas, sob diferentes perspectivas didático-pedagógicas, possibilita conhecer e compreender a forma como os estudantes se relacionam afeto cognitivamente com estas atividades. A partir do conhecimento destes dados é possível intervir pedagogicamente para que se possa promover maior interesse e engajamento de estudantes em atividades escolares, e consequentemente, atingir maiores níveis de aprendizagem.

Desta forma, acreditamos que a EMEI possa ser útil para o diagnóstico do interesse e engajamento dos estudantes em atividade didáticas de Resolução de Problemas.

Cabe destacar que a EMEI poderá ser aprimorada de forma a fortalecer os fatores de medida de interesse individual e interesse situacional, que possuem apenas três itens associados a cada fator – número mínimo para a constituição de um fator. Mesmo assim, a consistência interna destes três itens, em cada um dos fatores, é boa atingindo um valor de 0,7 conforme expresso pelo alfa de Cronbach (conforme apresentado na tabela 1).

Desta forma este estudo contribui com as pesquisas necessárias para fortalecer aspectos que relacionam elementos afetivos e cognitivos no processo ensino-aprendizagem.

Notas al pie

1Apoio da UDESC e do CNPq.

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