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Revista electrónica de investigación en educación en ciencias

versão On-line ISSN 1850-6666

Rev. electrón. investig. educ. cienc. vol.16 no.2 Tandil jun. 2021

 

Artículos originales

Estudo sobre a adaptação do material didático de Astronomia - O Diário do Céu - do contexto do Hemisfério Norte para o Hemisfério Sul

Study on the adaptation of the didactic material of Astronomy - The Diary of the Sky - From the context of the Northern Hemisphere to the South Hemisphere

Etude sur l'adaptation du matériel pédagogique d'Astronomie - Le Journal dans le Ciel - du contexte de l'Hémisphère Nord à l'Hémisphère Sud

Estudio sobre la adaptación del material didáctico de Astronomía - El Diario del Cielo - del contexto del Hemisferio Norte al Hemisferio Sur

Studio sull'adattamento del materiale didattico di Astronomia - Il Diario del Cielo - dal contesto dall'Emisfero Nord all’Hemisfero Sud

Telma Cristina Dias Fernandes1 

Roberto Nardi1 

Nicoletta Lanciano2 

1Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNESP - Campus de Bauru, SP. telcfernandes@gmail.com, nardi@fc.unesp.br

2Università La Sapienza - Roma - Itália. nicoletta.lanciano@uniroma1.it

Resumo

Este artigo descreve as primeiras das fases de uma pesquisa mais ampla, que se preocupa em minimizar a distância entre a produção acadêmica da área de ensino, no caso, de Astronomia, e os saberes e práticas de professores e alunos da Educação Básica. Intitulada “O Céu do Norte e o Céu do Sul - o ensino de Astronomia na Educação Básica: uma experiência cooperativa entre Brasil e Itália”, a pesquisa procurou interferir nesta realidade, à medida em que possibilitou a um grupo de professores das disciplinas de Ciências, Matemática, Física, Geografia e demais áreas afins, utilizar de variadas propostas metodológicas e de instrumentos didáticos, para a construção de conceitos referentes à Astronomia. Descreve-se aqui as singularidades encontradas durante as etapas de tradução e adaptação do material didático Il Diario del Cielo, originalmente idealizado para a realidade do Hemisfério Norte (Roma, Itália) e adaptado à realidade do cinturão tropical do Hemisfério Sul (Bauru, São Paulo, Brasil), procurando ampliar o debate sobre seu potencial e alcance para o trabalho com conceitos de Astronomia, na formação de professores do ensino básico, na área das ciências.

Palavras chave: Educação em Astronomia; Didática da Astronomia; Adaptação de Material Didático; O Diário do Céu; Formação de Professor

Abstract

This article describes the first of the stages of a most extensive research, which is concerned with minimizing the distance between the academic production of the science area, in this case, Astronomy, and the knowledge and practices of teachers and some of Basic Education. Entitled "The Northern Sky and the Southern Sky - Astronomy teaching in Basic Education: a cooperative experience between Brazil and Italy", it sought to interfere with this reality, as it enabled a group of teachers who taught present curricula of disciplines of Sciences, Mathematics, Physics, Geography and other related areas, using various methodological proposals and teaching tools, for the construction of concepts referring to Astronomy. Here are the singularities found during the stages of translation and adaptation of the teaching material Il Diario del Cielo.(The Diary of the Sky), originally idealized for the reality of the Northern Hemisphere (Rome, Italy) and adapted to the reality of the tropical belt of the Southern Hemisphere (Bauru, São Paulo, Brazil), trying to broaden or debate on its potential and scope for or work with Astronomy concepts, in a training program for teachers of basic education, in the area of science.

Keywords: Astronomy Education; Didactics of Astronomy; Adaptation of Teaching Material; The Diary of the Sky; Teacher Training

Résumé

Cet article décrit les premières phases d'une recherche plus large, qui se préoccupe de minimiser la distance entre la production académique dans le domaine de l'enseignement, dans ce cas, l'astronomie, et les connaissances et pratiques des enseignants et des élèves de l'éducation de base. Intitulée « Le Ciel du Nord et le Ciel du Sud - l'enseignement de l'astronomie dans l'éducation de base: une expérience de coopération entre le Brésil et l'Italie», la recherche a cherché à s'immiscer dans cette réalité, car elle a permis à un groupe de professeurs des disciplines des Sciences, Mathématiques, Physique, Géographie et autres domaines connexes, utilisent diverses propositions méthodologiques et instruments didactiques pour la construction de concepts liés à l'astronomie. Nous décrivons ici les singularités trouvées lors des étapes de traduction et d'adaptation du matériel pédagogique Le Journal dans le Ciel , conçu à l'origine pour la réalité de l'Hémisphère Nord (Rome, Italie) et adapté à la réalité de la ceinture tropicale de l'Hémisphère Sud (Bauru, São Paulo, Brésil), cherchant à élargir le débat sur son potentiel et sa portée pour travailler avec les concepts de l'astronomie, dans la formation des enseignants de l'éducation de base, dans le domaine des sciences.

Mots clés: Education in Astronomy; Didactique de l'astronomie; Adaptation du matériel pédagogique; Le Journal dans le Ciel; Formation des enseignants

Resumen

Este artículo describe las primeras fases de una investigación más amplia, que se preocupa por minimizar la distancia entre la producción académica en el campo docente, en este caso, la Astronomía, y los conocimientos y prácticas de profesores y alumnos de Educación Básica. Bajo el título “El Cielo del Norte y el Cielo del Sur - la enseñanza de la Astronomía en Educación Básica: una experiencia cooperativa entre Brasil e Italia”, la investigación buscó interferir en esta realidad, ya que permitió a un grupo de profesores de las disciplinas de Ciencias, Matemáticas, Física, Geografía y otras áreas afines, hacen uso de diversas propuestas metodológicas e instrumentos didácticos, para la construcción de conceptos relacionados con la Astronomía. Describimos aquí las singularidades encontradas durante las etapas de traducción y adaptación del material didáctico Il Diario del Cielo, originalmente concebido para la realidad del Hemisferio Norte (Roma, Italia) y adaptado a la realidad del cinturón tropical del Hemisferio Sur (Bauru, São Paulo, Brasil), buscando ampliar el debate sobre su potencial y alcance para trabajar con conceptos de Astronomía, en la formación de docentes de educación básica, en el área de ciencias.

Palabras clave: Educación en Astronomía; Didáctica de la Astronomía; Adaptación de material didáctico; El Diario del Cielo; Formación de profesores

Astratto

Questo articolo descrive le prime fasi di una ricerca più ampia, che si occupa di ridurre al minimo la distanza tra la produzione accademica nel campo dell'insegnamento, in questo caso, l'Astronomia e la conoscenza e le pratiche degli insegnanti e degli studenti dell'istruzione di base. Intitolata "Il Cielo del Nord e il Cielo del Sud - l'insegnamento dell'astronomia nell'educazione di base: un'esperienza cooperativa tra Brasile e Italia", la ricerca ha cercato di interferire in questa realtà, in quanto ha consentito a un gruppo di insegnanti delle discipline di Scienze, Matematica, Fisica, Geografia e altre aree correlate,si avvalgono di varie proposte metodologiche e strumenti didattici, per la costruzione di concetti legati all'Astronomia. Descriviamo qui le singolarità riscontrate durante le fasi di traduzione e adattamento del materiale didattico Il Diario del Cielo, originariamente concepito per la realtà dell'Emisfero Nord (Roma, Italia) e adattato alla realtà della cintura tropicale dell'Emisfero Sud (Bauru, San Paolo, Brasile), cercando di ampliare il dibattito sulle sue potenzialità e possibilità di lavorare con i concetti di astronomia, nella formazione degli insegnanti di istruzione di base, nel campo delle scienze.

Parole chiave: Educazione all'Astronomia; Didattica dell'Astronomia; Adattamento del materiale didattico; Il Diario del Cielo; Formazione degli insegnanti

1. INTRODUÇÃO

Por ser capaz de estabelecer relações complexas com o mundo que o envolve e, devido a várias razões e necessidades, como para a busca de alimentos ou abrigo, o ser humano, desde os tempos primitivos, em suas viagens por terra, e muito mais tarde, por rios e mares, procurava orientação pelos astros, bem como pelos acidentes geográficos de seu horizonte visível, para se deslocar, quando as condições ambientais assim o permitiam.

Com base nessas ideias, Scherma e Ferreira (2011) destacam que

Nos primórdios da existência humana, a orientação e a localização espacial eram habilidades necessárias para a sobrevivência, principalmente nos deslocamentos terrestres para a busca de refúgios e de alimentos. Ao longo dos séculos, com o conhecimento dos astros, com a invenção da bússola e com o uso dos mapas, a localização e a orientação se tornaram mais precisas, permitindo nortear o deslocamento de exploradores e navegadores de terras e mares, além de orientar-se em qualquer momento ou condição do ambiente. Atualmente, temos uma gama de informação sobre qualquer lugar, à disposição de muitas pessoas, através do SIG, da rede ciberespacial e do GPS (SCHERMA; FERREIRA, 2011, p. 236).

Nesse sentido, observar e representar o espaço celeste do lugar em que se vive é uma prática antiga da humanidade. Há registros históricos (MOURÃO, 2000) que mostram que desde épocas passadas as sociedades vêm desenvolvendo técnicas para mapear o céu de forma mais precisa e eficaz. Mas, qual é a importância de se olhar para o céu? E qual o valor, para esta prática, de se eleger como pontos de referência elementos do horizonte local do observador? Estas questões implicam em um grande número de respostas, que tanto justificam a importância dessas ações quanto a relevância do estudo de uma das mais antigas das ciências - a Astronomia.

Aprender sobre os fenômenos astronômicos, contextualizando-os e relacionando-os com questões locais e mundiais, segundo uma abordagem investigativa, articula-se com o que é observado diariamente no céu aqui e agora, com aquilo que se pensa, se sabe e se vê nos livros e nas simulações, uma vez que permite ao observador maior autonomia nas relações que envolvem a organização do tempo e a ordenação do espaço e demanda o domínio da conexão essencial entre o ponto de vista local geocêntrico e aquele heliocêntrico global.

Segundo uma perspectiva didática e educativa investigativa, o referencial topocêntrico pode ser empregado em atividades de ensino, nas escolas, concebidas, desenvolvidas e propostas a partir de elementos da Astronomia, dentre eles, a observação constante do céu e do entorno. E a partir de dados astronômicos levantados pelos alunos, é possível o reconhecimento de sistemas de referência ou de localização geográfica e orientação espacial, no tempo real dos eventos astronômicos, bem como desenvolver habilidades de explicar, descrever, comparar e representar as características do lugar em que vivem.

No entanto, esta perspectiva mostra-se bastante desafiadora, em especial, como afirma Autor3 (1996), quando aponta que apesar de o céu estar a todo tempo presente sobre o local onde habitamos, conhecemos, empiricamente, cada vez menos a respeito dele, seja em função do uso abusivo de imagens televisivas, da iluminação das cidades, ou até mesmo do atual ritmo de vida acelerado, em função do qual não nos tem sobrado tempo para essa ação.

No campo educacional, segundo a autora, ensinar e aprender sobre os fenômenos astronômicos passa indubitavelmente pela prática da observação ativa , direta e contínua do céu, que, como elemento astronômico, caracteriza-se no principal recurso de exploração dos fenômenos celestes. No entanto, esta prática também enfrenta desafios, haja vista, dentre um rol de fatores, a dificuldade do professor em gerenciar o contraste entre os tempos dos fenômenos astronômicos, dentre os quais se destacam o ciclo dia e noite, as estações do ano, o ciclo lunar, e os da escola, entre os espaços abertos para o céu e o confinamento das salas de aula, a necessidade de esperar por eventos, como os eclipses ou a passagem de um cometa, para não perder a oportunidade de registrar aqueles que não se repetem, por exemplo.

A presença de lacunas na formação destes professores referente aos estudos de Astronomia e seu ensino tem lhes gerado, dentre outros problemas, insegurança e insatisfação ao trabalhar com a temática; fragilidade na interação dos conhecimentos teóricos e práticos; falta de desempenho ativo e contextualizado nas situações experimentadas; impossibilidade de fazer avançar o debate acerca das questões abordadas; além do tempo restrito para pesquisas adicionais neste campo do conhecimento.

Estes pressupostos apontam para o necessário debate de questões atuais relativas à didática da Astronomia na formação acadêmica e continuada dos docentes, advindos das distintas licenciaturas, e esta pesquisa procura interferir nessa realidade, à medida em que possibilita a um grupo de professores trabalhar a educação fisico-matemática e científica, nos ambientes escolares, a partir da utilização de variadas propostas de metodologias e de instrumentos didáticos, para a construção dos conceitos referentes à Astronomia.

Nesse sentido, tais aspectos, além da complexidade e entrelaçamento de pontos de vista e de fatores de diferentes áreas do conhecimento, podem, na verdade, constituir o grande valor agregado do campo do ensino de Astronomia e uma valiosa oportunidade para a renovação do ensino de ciências.

2. AS POTENCIALIDADES DIDÁTICAS DO DIÁRIO DO CÉU

Objeto de análise e reflexão neste texto, Il Diario del Cielo, organizado a partir de resultados das atividades de pesquisa e ensino de Astronomia desenvolvidas no âmbito do Grupo de Pesquisa sobre Pedagogia do Céu, dá um novo sentido, muito próprio e desafiador, para as metodologias e práticas de ensino de Astronomia, contribuindo para que esta importante ciência se torne mais presente no cotidiano do estudante.

O Diário do Céu é um guia de observação do que ocorre com os astros no céu, dia após dia e noite após noite, sendo uma possibilidade de compreender o que é possível ver, a olho nu, sobre a mudança das posições dos astros com o passar do tempo, das horas e dos dias. É um convite a seguir o calendário, não somente para contagem do tempo, mas também, tendo presente a relação entre o Sol e a Terra, para dar significado, dentre outras, às palavras Equinócio e Solstício, Verão e Inverno, bem como para registrar as próprias descobertas.

O Diário é sobretudo um instrumento para guiar a observação direta e contínua dos astros, na natureza, de modo a promover e permitir a continuidade da atenção para os fenômenos astronômicos, na convicção de que esta continuidade e esta familiaridade, como por exemplo, com a Lua e suas posições no céu e suas formas que mudam dia a dia, possam ensinar mais do que um livro e uma lição verbal.

A exemplo do que ocorre há anos, com professores e alunos italianos, Il Diario del Cielo, instrumento pedagógico no formato de um diário escolar astronômico, criado originariamente para o Hemisfério Norte, foi traduzido e adaptado para uso na faixa tropical do Hemisfério Sul e utilizado, inicialmente em caráter experimental, durante o ano de 2016, por um grupo de alunos e professores em exercício na rede pública de ensino da Educação Básica, da região de Bauru, São Paulo (SP). Desde então, centenas de estudantes e dezenas de professores já participaram de um conjunto de atividades didáticas, utilizando O Diário do Céu como estratégia de ensino, empregue nas distintas edições anuais do curso de formação continuada, intitulado: O Diário do Céu - Introdução à Didática da Astronomia para Professores da Educação Básica, referente ao projeto de extensão universitária O Céu do Norte e o Céu do Sul - o ensino de Astronomia na Educação Básica: uma experiência cooperativa entre Brasil e Itália.

Cada edição atualizada de O Diário do Céu busca complementar as versões anteriores, sendo editada com refinamentos e acréscimos sugeridos por pesquisadores, professores e estudantes dos cursos de mestrado e doutorado do Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência, da Faculdade de Ciências da UNESP, Campus de Bauru, grupo de professores em exercício nas redes municipal e estadual da Educação Básica de Bauru e região e por documentos das áreas de Ensino de Ciências e Matemática.

Fruto de inquietações, em relação aos processos de ensino e de aprendizagem das noções de Astronomia, verificadas na prática docente, O Diário do Céu tem o objetivo de ampliar o debate e a cooperação entre os leitores, em especial, um grupo de professores da Educação Básica, que ensinam conteúdos presentes nos currículos das disciplinas de Ciências, Matemática, Física, Geografia e demais áreas afins, oferecendo um rico e fértil horizonte de possibilidades ao proporcionar espaço para criar, discutir, testar e analisar metodologias para o seu ensino, muitas delas inovadoras para os docentes, uma vez que não foram contempladas em sua formação inicial.

Nesse sentido, é propósito deste artigo investigar as singularidades encontradas ao longo das etapas de tradução e de adaptação do material didático Il Diario del Cielo (O Diário do Céu) relativas à observação sistemática do céu e do entorno, bem como aquelas necessárias à realização das atividades didáticas, envolvendo modelos astronômicos e suas relações de semelhanças e diferenças espaço-temporais entre as realidades dos contextos dos Hemisférios Norte e Sul, de modo a contribuir para dar significado ao conhecimento disciplinar referente à Astronomia a um grupo de profesores e alunos, dentro de um desenvolvimento longitudinal coerente em si mesmo e com a experiência cotidiana.

Figura 1: Livro Il Diario del Cielo original. 

Figura 2: Livro O Diário do Céu adaptado. 

3. A DESCRIÇÃO DO LIVRO IL DIARIO DEL CIELO

Il Diario del Cielo constitui-se em um guia prático, no qual alunos, professores e educadores são desafiados a registrar com regularidade diária, durante o ano escolar em uso, notas, pautas ou dados de observação direta dos fenômenos astronômicos, além de hipóteses, inferências, frases ou comentários, impressões e reflexões, questionamentos, perguntas, dúvidas, sugestões de conteúdos similares a serem pesquisadas, informações para checagem, imagens, dentre outras anotações, tanto de classe quanto extraclasse.

De acordo com Zabalza (2004), de modo geral, embora este gênero textual específico não exija o rigor acadêmico em sua escrita, o diário de aula, em específico, guarda, dentre outras características, a data e o horário de entrada das informações, as anotações detalhadas, com a narrativa diária das experiências pessoais, desenhos e outros signos, além da assinatura, evidenciando a autoria dos registros.

Para o autor, material didático dessa natureza pode ser um instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional para o professor, pois constitui um espaço reservado não somente para descrição do fenômeno observado, mas para o registro sobre a prática, revelando um caráter interdisciplinar a envolver distintas áreas do conhecimento, além de permitir aprimorar o trabalho diário e adequá-lo com frequência às necessidades dos alunos. Para o estudante, o registro no papel do que se observa diariamente no céu pode aumentar-lhe a possibilidade de testar hipóteses antecipadas, de formar hábitos com relação à linguagem da escrita e da leitura, de familiarizá-lo com os conteúdos, oferecendo-lhe novos desafios à medida que estes lhe exijam maior tempo de aprendizagem e aprofundamento gradual.

Referente à realidade brasileira, documentos voltados para a área educacional, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) apontam para a importância de registros como os propostos no Diário do Céu, como é o caso do desenvolvimento de um inventário para ampliar a orientação espaço-temporal do aluno, a sua conscientização dos ritmos de vida e a elaboração de uma concepção do Universo, com enfoque no Sistema Terra-Sol-Lua:

Os alunos podem desenvolver um inventário de astros e fenômenos observados no Universo e construir as referências para sua orientação, assim como o ser humano foi fazendo em suas andanças pela superfície terrestre. Paralelamente, os alunos podem ir consultando outras fontes de informação, com a orientação do professor, para gradativamente ganhar visões mais amplas do Universo, tendo o planeta como participante, conforme o que está proposto na primeira parte deste documento, construindo e reconstruindo modelos de céu e Terra. (BRASIL, 1998, p. 62).

No livro são apresentados, na forma de experiências e atividades práticas, temas como: o horizonte local visível, os horários do nascer, culminância e pôr do Sol e da Lua, a duração do dia de acordo com o período do ano e da latitude do local de observação, os fenômenos astronômicos equinócios, solstícios, as estações do ano, as fases da Lua, medidas angulares e o Globo Local Paralelo, bem como a construção e a utilização de modelos didáticos explicativos para a oferta de oficinas que ajudam a seguir as posições dos astros e das sombras, no espaço tridimensional e no tempo real dos eventos astronômicos, a fim de entender, em face ao que acontece no céu durante o dia e à noite, como é o céu no local em que se está, como será o céu em um outro lugar sobre a Terra ou como mudará com o passar do tempo em um mesmo lugar.

O instrumento didático Il Diario del Cielo, objeto do presente estudo, segue uma estrutura específica à localidade à qual se destina, apresentando, em suas versões, original, referente ao ano letivo de 2013-2014 , em Roma, na Itália, e a adaptada para a região de Bauru (SP), no Brasil, referente aos anos letivos de 2016, 2017 e 2018 , um rol de informações específicas voltadas para as noções de Astronomia, dentre as quais se destacam: (a) as coordenadas geográficas de latitude e longitude, a partir da localidade à qual se destinam, no caso, Itália (Roma 42ºN e 12ºE) e Brasil (Bauru 22ºS e 49ºO); (b) o valor do meridiano central do fuso horário que define a hora oficial, a partir do qual são regulados os relógios em todo o país, no caso, 15ºE, referente à posição da cidade de Catania, Itália (meridiano central do fuso horário da Europa Central) e 45ºO, referente à posição da cidade de Brasília, Brasil (IBGE, 2016); c) instruções para o ajuste da longitude e da latitude e da Equação do Tempo , com destaque para escalas de tempo - Tempo Terrestre (TT) e Tempo Universal (TU); (d) mapa político da Itália e do Brasil ; (e) nomes das constelações e suas abreviações; (f) mapas celestes mensais ; (g) propostas de atividades didáticas de observação direta e sistemática dos fenômenos celestes no início de cada mês; (h) propostas de construção e utilização de distintos modelos didáticos astronômicos explicativos apropriados à Astronomia Observacional; (i) espaço aberto ao final de cada mês, para registros variados dos alunos; (j) indicação dos dias da semana e dos meses do ano, de janeiro à dezembro; (k) indicação das Efemérides Astronômicas e as posições dos astros no céu (nascer, culminância e pôr do Sol e da Lua), de acordo com as coordenadas geográficas de latitude e longitude do local de observação; (l) pequenos mapas das conjunções ; (m) Janelas Astronômicas ; (n) indicação de fusos horários; (o) indicação da hora Legal e o decreto de Horário de Verão (quando houver); (p) instrução para o cálculo de Ano Bissexto (quando houver); (q) indicação de conjunções envolvendo o Sol, a Lua, planetas e/ou estrelas; (r) indicação dos instantes dos equinócios e solstícios e do início das estações; (s) indicação da entrada do Sol nas constelações zodiacais; (t) indicação das constelações e estrelas brilhantes: Aldebaran, Pollux, Regulus, Spica e Antares; (u) instantes das fases da Lua, apogeu e perigeu da Lua, eclipses (quando houver); (v) informações referentes à Astronomia Cultural por meio do conto mítico; (w) espaço reservado às anotações do professor e coordenador escolar; (x) informações sobre pesquisas, projetos e publicações do Movimento di Cooperazione Educativa (MCE), Roma, Itália. Além de conter todas estas informações, o Diário apresenta espaços para os registros dos alunos, com os dados coletados a partir de suas observações diárias de fenômenos astronômicos específicos, que ocorrem no céu, em momentos exclusivos do dia e/ou da noite.

Para o trabalho e obtenção dos referidos dados, o Diário do Céu oferece orientações para a utilização de variadas linguagens, dentre as quais, a escrita, a oral, bem como aquelas que recorrem a outras formas de comunicação, como imagens, desenhos, fotografías, sinais, símbolos, sons, cantos, e ainda o próprio corpo em movimento, como um instrumento de medida e de percepção do entorno, assim como de distintos instrumentos didáticos, ou modelos explicativos, apropriados à Astronomia Observacional, tais como: cartas celestes, quadrante, astrolábio, goniômetro, gnômon, rosa dos ventos, horizonte local, Globo Local Paralelo e esquema para observação da constelação de Órion, por exemplo. Nesse processo comunicativo destaca-se também a utilização dos softwares voltados para a observação astronômica, como o Stellarium, o Heavens-Above e o Skymaps e o site do Anuário do Observatório Nacional (ON) - Rio de Janeiro/RJ, para a determinação dos instantes e posições dos astros, com relação ao horizonte. A utilização destes programas de computador exige uma configuração precisa das coordenadas geográficas do local de observação, além daquelas relacionadas ao tempo, como: ano, mês, dia e hora, para o levantamento das efemérides do Sol e da Lua, para todos os dias do ano letivo, assim como para os instantes dos eventos astronômicos anuais, como os Equinócios e Solstícios, Afélio e Periélio e Perigeu e Apogeu.

Ressalta-se que a partir dessas informações geradas pode-se construir ainda as imagens dos pequenos mapas das conjunções, destacando o tempo e a posição dos astros com relação ao horizonte.

Conforme citado anteriormente, os Quadros 1 e 2, a seguir, representam os valores da correção em minutos da duração do dia, segundo a Equação do Tempo, variável no curso de um ano, caso a localidade em estudo não fique exatamente em cima do meridiano do fuso horário local. Para os referidos cálculos, o Diário dispõe dos dados de latitude, longitude e o valor do Meridiano Central do fuso horário que define a hora oficial da localidade habitual de observação.

4. ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

4.1. As Etapas de Tradução e Adaptação de Il Diario Del Cielo

Do ponto de vista metodológico, na proposta de trabalho com O Diário do Céu, a pluralidade de linguagens e os instrumentos didáticos são parte dos contextos de aprendizagem, utilizados para representar e comunicar ideias, estimular o levantamento de hipóteses e questionamentos, discutir, confrontar e refletir sobre o quê e como foi aprendido, com base em situações do mundo real, apoiar a mobilização de concepções e a criação de significados, construir representações pessoais e manter a atenção, representar crenças, perspectivas e histórias de outros, bem como apoiar o discurso da comunidade dos estudantes que constroem o conhecimento.

A princípio, para esta etapa, partiu-se do levantamento bibliográfico de apoio e referência ao estudo do idioma italiano que reunisse vocabulário e estruturas gramaticais confiáveis, buscando retratar com fidelidade e naturalidade a realidade linguística do contexto do livro original em italiano para o português (do Brasil).

Embora os dois idiomas envolvidos nesta situação de pesquisa guardem entre si a mesma origem latina, com muitas palavras e expressões cognatas, para além de uma tradução literal de palavras e frases, esta etapa exigiu o cuidado no tratamento das informações e atividades propostas no material didático traduzido, de modo que não fossem modificadas em sua essência, ao serem adaptadas à realidade local. Os resultados foram observados no momento da realização das atividades em conjunto, e à distância, integrando um grupo de professores e estudantes do Brasil e da Itália que aplicaram, em situação de intercâmbio, as atividades propostas.

A adaptação do material didático Il Diario del Cielo constituiu-se em uma nova elaboração ou um refinamento da fundamentação e das práticas propostas no livro, de modo a relacionar-se com as efemérides geradas a partir das coordenadas geográficas da localidade de Bauru, Brasil, faixa tropical do Hemisfério Sul, visando, essencialmente, contribuir para com a formação didático-científica dos professores e, posteriormente, para com a aprendizagem dos alunos da Educação Básica, buscando possibilitar-lhes o envolvimento em situações de observação ativa, direta e contínua, além de descrição e interpretação dos fenômenos da Astronomia, a partir de diferentes pontos de vista.

Tais ações permitem aos aprendizes visualizarem as relações entre conceitos espaciais, geométricos e geográficos, favorecendo a exposição do próprio ponto de vista e a escolha de um sistema próprio de referência, a fim de possibilitar a construção de uma visão mais ampla e coerente a respeito da sua posição no espaço e no tempo real, tanto físico, astronômico e geográfico quanto social, histórico, cultural e filosófico.

As observações do céu e do entorno seguem as orientações advindas das atividades propostas no início de cada mês, no Diário, às quais se pode dar continuidade nos meses seguintes do ano, de modo a exercitar a observação e a construção de um conjunto de instrumentos didáticos para a observação da esfera celeste, auxiliando de forma real a percepção e a compreensão dos estudantes do objeto observado.

Nesse sentido, a sequência das atividades de ensino proposta na versão original do Diário do Céu sofreu alterações nas versões atualizadas do Diário adaptado, na medida em que foi desenvolvida pelos professores e alunos. Tais alterações ocorreram, a princípio, devido ao calendário escolar em Roma, e em toda a Itália, iniciar-se no mês de setembro de um ano e findar-se no mês de junho do ano sucessivo, sendo os meses de julho e agosto reservados para as férias escolares, como no caso, do ano escolar de setembro de 2013 a agosto de 2014, distinguindo-se do calendário escolar brasileiro, cujo ano letivo inicia e termina em um mesmo ano, no caso, de fevereiro a dezembro, reservando-se os meses de janeiro e julho para as férias escolares, em grande parte do território brasileiro.

Além de apresentarem graus crescentes de complexidade e complementariedade, as atividades didáticas, sobretudo as cotidianas buscam, dentre outras características, delinear e analisar evidências, reconhecer padrões e ciclos, bem como identificar que relações estabelecem com as variações sazonais locais, possibilitando expandir os sentidos, de modo a acompanhar os referidos ciclos continuamente, refletir, posicionar-se e informar-se sobre o entorno e suas transformações, que caracterizam a paisagem, as pessoas e o estilo de vida de determinada comunidade, em uma certa região, ao longo do ano.

Dentre as atividades didático-pedagógicas propostas pelo Diário, apresentando temáticas da Astronomia Observacional, destacam-se: (a) Céu de Verão, para localizar no céu noturno as constelações que marcam o Verão no Hemisfério Sul, em especial, acompanhar o movimento da Constelação de Órion; (b) Ciclo Lunar, para observar e orientar o movimento da Lua no céu durante o ciclo lunar; (c) Medida de Sombra, para observar a relação trigonométrica entre a altura angular do Sol sobre o plano do horizonte local (sombra sobre o chão) e o raio de Sol; (d) Altura Angular, para observar, identificar e mensurar a posição e a distância angular de um astro com relação ao horizonte; (e) Mapa-Múndi Paralelo, para observar sobre o modelo, em tempo real, as sombras produzidos pelo Sol, em diferentes partes da Terra, e identificar os motivos do ciclo dia/noite e das estações do ano; (f) Céu de Inverno, para localizar no céu noturno as constelações que marcam o Inverno no Hemisfério Sul, em especial, acompanhar o movimento da Constelação de Escorpião; (g) Traços da Astronomia Cultural, para identificar elementos sócio-culturais locais voltados para o estudo da Astronomia; (h) Duração do Dia e da Noite, para verificar, por meio da observação continua do céu e da análise das efemérides presentes no Diário, a duração dos dias e das noites, ao longo do ano; (i) Janela Astronômica, para observar e identificar, em tempo real, a existência da relação precisa entre a hora e a altura do Sol acima do horizonte, em dado dia do ano e a uma dada latitude; (j) Goniômetro, para medir a altura angular do Sol com relação ao plano do horizonte e determinar a latitude do local da observação.

Dessa forma, conforme apresentado no Quadro 3, a seguir, o arranjo proposto para as atividades de ensino, na versão original do livro, apresenta como primeira atividade, para o mês de setembro, Oggi se vede la Luna?, referente à temática ciclo lunar, ao que corresponde a Hoje se vê a Lua?, para o mês de fevereiro, em especial para o ano de 2018.

Fonte: os autores (2020).

Quadro 3 Sequências dos temas desenvolvidos a partir das atividades didático-pedagógicas mensais propostas nos exemplares original, ano 2013-2014, e adaptado, ano 2018, do Diário do Céu

4.2. A análise das atividades de ensino propostas pelo Diário do Céu

Do ponto de vista didático, a articulação entre os elementos da observação do céu e do entorno e o uso de modelos didáticos astronômicos, dentre os elementos que caracterizam o Diário do Céu, busca dar maior sentido às experiências cotidianas, tornando acessível à percepção sensorial do observador o entendimento dos fenômenos astronômicos, em seus desdobramentos, que acontecem frequentemente ao seu redor.

Nesse sentido, segue-se a análise de duas, dentre as atividades de ensino propostas pelo referido material, visando contribuir para a discussão ou fazer avançar o debate acerca da didática da Astronomia no cotidiano escolar como um verdadeiro objeto de estudo da pesquisa em educação em ciências.

Acredita-se que as atividades e situações didáticas presentes no Diário podem facilitar o domínio conceitual dos professores de forma abrangente, ao mesmo tempo em que sua prática pode igualmente facilitar o ensino da Astronomia escolar aos alunos, tendo em vista sua capacidade de convergir elementos cognitivos, perceptivos, psicomotores e afetivos dos aprendizes.

Nesse sentido, a exemplo do estudo sobre o reconhecimento dos astros no céu, a atividade didática proposta no Diário original, para iniciar o mês de fevereiro, ainda Inverno no Hemisfério Norte, intitulada: Hai mai visto la grande costellazione di Orione?, aparece no Diário adaptado, com o título: Você já viu a grande Constelação de Órion?, correspondente à versão de 2018, no mês de janeiro, Verão no Hemisfério Sul, conforme apresentada no Quadro 3. Trata-se da observação, identificação e registro da constelação de Órion, destacando as três estrelas do cinturão de Órion, asterismo conhecido como “As Três Marias”, visível no céu de Verão, no Hemisfério Sul.

Figura 3: Imagens referentes à atividade sobre O Céu de Verão (Constelação de Órion) apresentadas no Diário original e no Diário adaptado. 

Visto do Hemisfério Sul, Austral ou Meridional, o céu noturno destaca, ao longo do ano, dentre as oitenta e oito mapeadas cientificamente, quatro constelações, que representam as quatro estações do ano, sendo que em cada estação, tem-se uma em destaque no céu: no Outono, a constelação de Leão; no Inverno, a de Escorpião; na Primavera, Pégaso e no Verão, a de Órion, melhor visualizadas, durante boa parte do ano, ao Norte do horizonte local, quando estão bem altas no céu (LANGHI, 2016).

Dentre as atividades que exploram a linguagem do mito como um recurso motivador e enriquecedor para o estudo dos conteúdos disciplinares de caráter antropológico, social e cultural, esta, em especial, ressalta elementos da figura do gigante e hábil caçador Órion, morto pela picada de um escorpião no calcanhar.

Apresentados a partir de distintas linguagens, e para além do senso comum, os mitos expressam elementos da cultura acumulada de sociedades precedentes, na tentativa de explicar as experiências humanas mediante ocorrências dos fenômenos naturais e sociais, favorecendo e objetivando o entendimento das experiências cotidianas análogas dos indivíduos. A partir dos mitos, segundo (CAMPBELL, 1990), entrelaçam-se a história, a cultura e a paisagem de estratificações milenares.

Nessa perspectiva, no campo educacional, o trabalho pedagógico com a contação do mito e a atenção aos aspectos antropológicos da observação dos fenômenos celestes representa valiosa oportunidade para o conhecimento e aprofundamento teórico-metodológico, em uma perspectiva intercultural, visto que potencializa o desenvolvimento de atitudes e valores fundamentais para o processo de formação de futuros docentes e daqueles em exercício, quando presente no projeto pedagógico implementado no ambiente escolar.

Também, nesta atividade, o ensino das noções de orientação espacial e localização geográfica mostrou-se fundamental para o desenvolvimento de um conhecimento espaço-temporal mais abstrato, construído por meio de observações, identificações, descobertas e explicações das singularidades do céu, como a localização de fenômenos astronômicos em espaços mais amplos.

Dessa forma, o Diário utiliza-se, por vezes, de modelos didáticos para mostrar arranjos estelares e conjunções “visuais” entre os astros, como a Lua, os planetas e as estrelas, em determinadas regiões do céu, orientando o estudante, de certa forma, como um calendário, ou como uma carta celeste, de modo a facilitar-lhe a localização dos astros na esfera celeste.

Esta atividade partiu da montagem de um instrumento didático astronômico simples, permitindo simular o movimento de translação da constelação de Órion, observado no céu, com o passar das horas.

A adaptação da imagem da constelação de Órion exigiu sua inversão e espelhamento, como se o observador estivesse olhando-a de “cabeça pra baixo”, quando comparada à imagem original, considerando a posição do observador, mais especificamente, a 22º Sul, para a localidade de Bauru (SP), Brasil, referente à linha do Equador.

Assim, enquanto a base do modelo original, posicionada à frente do observador, apresenta o horizonte Sul e a direção de translação da constelação de Leste para Oeste, da esquerda para a direita, a base do modelo adaptado, à frente do observador, apresenta o horizonte Norte e a direção de translação da constelação de Leste para Oeste, da direita para a esquerda. Alterações também podem ser identificadas na imagem adaptada da constelação de Órion, onde o posicionamento das estrelas foi invertido e espelhado, para obter a configuração vista no céu pelo observador a partir de uma localidade do Hemisfério Sul, conforme mostram as figuras 4 e 5, a seguir.

Figura 4: Imagem do modelo do movimento observado da Constelação de Órion apresentada no Diário original. 

Figura 5: Imagem do modelo do movimento observado da Constelação de Órion apresentada no Diário adaptado. 

Na sequência, a Figura 6 mostra as imagens referentes à montagem dos modelos da Constelação de Órion vista a partir (a) do Hemisfério Norte e (b) do Hemisfério Sul realizada com o grupo de professores e alunos que participaram do curso de formação docente: O Diário do Céu - Introdução à Didática da Astronomia para Professores da Educação Básica, em 2018.

Figura 6: Imagens referentes à montagem dos modelos da Constelação de Órion apresentadas (A) no Diário original e (B) no Diário adaptado, durante o curso de formação docente: O Diário do Céu - Introdução à Didática da Astronomia para Professores da Educação Básica, em 2018. 

Dentre as atividades didáticas propostas no Diário, destaca-se também aquela, originalmente, denominada, Come si sposta il Sole rispetto all’orizzonte e come varia l’ombra di uno gnomone? e indicada para o mês de abril, pós Equinócio de Primavera no Hemisfério Norte. No Diário adaptado é intitulada Como o Sol se move em relação ao horizonte e como varia a sombra de um gnômon?, correspondente ao mês de setembro, Equinócio de Primavera no Hemisfério Sul, de acordo com a versão de 2018, tratando da temática Janela Astronômica, que acompanha e investiga a simétrica trajetória observada do Sol acima do horizonte, em tempo real (ao longo dos dias do ano), de modo a registrar a variação da medida da altura angular do Sol, ou seja, o ângulo entre a direção dos raios do Sol e o plano horizontal, com o valor da latitude local, com o passar dos dias, em especial, nas datas dos Equinócios e Solstícios, conforme ilustra a Figura 7, a seguir.

Figura 7: Imagens referentes à atividade sobre Janela Astronômica apresentadas (A) no Diário original e (B) no Diário adaptado 

Do ponto de vista geométrico, tal atividade é muito rica e pode levar a trabalhar com relações trigonométricas que identificam a direção do meridiano do lugar (a linha Norte-Sul) e estabelecem uma referência espacial marcada no chão: um círculo de luz solar cercado de sombra, ou a sombra do próprio corpo ou de um gnômon, utilizado sobre tal linha marcam um momento no tempo, o do meio-dia local verdadeiro.

A Figura 7 utilizada para ilustrar essa atividade no Diário original foi alterada, quando da adaptação do material, visto que, idealizada para a realidade de Roma (42°N), Itália, localidade posicionada para além do limite do Trópico de Câncer rumo aos pólo Norte do planeta, a luz do Sol que entra pelo furo feito no papel escuro, preso na janela, vista totalmente e sempre ao Sul, em relação ao Equador Celeste (projeção do equador terrestre para o espaço), sobre o próprio horizonte, durante todo o ano, jamais alcançará o seu zênite, de modo que a sombra dos objetos expostos ao Sol ao meio-dia nunca desaparece.

Tal situação, no entanto, não se configura para a localidade de Bauru (SP) (22°S), Brasil (zona tropical do Hemisfério Sul), visto que entre os trópicos de Câncer e de Capricórnio (linhas geográficas imaginárias, que delimitam as zonas tropicais ao Norte e ao Sul do equador terrestre, com os valores de latitude correspondentes a 23º26'14"N e 23º26'14"S respectivamente) as sombras em torno ao meio-dia estão orientadas às vezes para o Norte, às vezes para o Sul. Na verdade, nesta região, em dois dias do ano o Sol estará exatamente ao Zênite, ou seja, sobre a cabeça do observador ou sobre os objetos e suas sombras não existem, ou desaparecem, ao meio-dia solar, variando essa hora em função da posição relativa do local com relação ao seu fuso horário. Nos dias sucessivos, se o Sol se move em direção Norte, a sombra do meio-dia está orientada para o Sul, e se o Sol se move em direção Sul, a sombra do meio-dia está orientada para o Norte. Isso dificulta a descrição de determinadas atividades de ensino, por exemplo, relacionadas com as direções cardeais porque torna necessária, nas áreas entre os trópicos, indicar a atenção para três distintas situações espaciais.

Já nos pontos da Terra situados sobre a linha do equador, quando há uma maior ou menor assimetria entre as situações do Sol a Sul e a Norte em relação ao Equador Celeste, as duas datas em que o Sol estará em seu completo zênite são as dos equinócios de março e setembro, separados entre si por cerca de 6 meses.

À medida que círculos de latitude se afastam do equador, em direção aos pólos geográficos Norte e Sul da Terra, a diferença entre as datas dos dois zênites solares vai se reduzindo, até que ocorra em um único dia do ano, na data do Solstício de Verão do respectivo hemisfério, ou seja, a altura angular do Sol, ao meio-dia solar, é máxima sobre o Trópico de Câncer (Hemisfério Norte), no Solstício de junho, bem como sobre o Trópico de Capricórnio (Hemisfério Sul), no Solstício de dezembro (COMINS; KAUFMANN III, 2010). Nesse sentido, para as atividades nas quais se pede para registrar a sombra do próprio corpo ou o raio de luz do Sol que passa através de um furo na janela voltada para o Norte ou para o Sul, há alguns dias, diferentes para cada latitude, em que o Sol está no Zênite ou muito próximo a este para o qual não tem sombra ou esta é tão pequena que é difícil identificá-la e registrá-la.

Dessa maneira, os diferentes pontos do amanhecer e do pôr do Sol registrados, nas datas anteriormente citadas, são aqueles que levam à síntese da altura angular do Sol sobre o plano do horizonte local, sendo possível prever quando e onde terá sombra ou ausência dela ao meio dia solar ao longo do ano, conforme ilustram as Figuras 8 e 9, a seguir.

JANELA PARA O NORTE Na localidade de Bauru- SP - (Hemisfério Sul), no intervalo de 8 de janeiro à 2 de dezembro de 2018, vemos o Sol ao Norte do Equador Celeste.

Figura 8:  Imagem referente à medida angular do Sol, adaptada do Diário original. 

JANELA PARA O SUL Na localidade de Bauru, São Paulo, Brasil - (H. Sul), no intervalo de 3 de dezembro de 2018 à 9 de janeiro de 2019, vemos o Sol ao Sul do Equador Celeste. Nesse intervalo de tempo, o Sol passa pelo zênite de Bauru - SP nos dias: Dia: 03/12/2018 Hora: 13:06:24 (Horário de Verão) - Dia: 09/01/2019 Hora: 13:23:41 (Horário de Verão)

Figura 9: Imagem referente à medida angular do Sol, de acordo com Diário original. 

No caso da Figura 8, deve-se criar uma imagem espelhada da original, de modo a representar a janela, a partir da qual, na maior parte do ano, vê-se o Sol ao Norte em relação ao Equador Celeste.

Uma segunda imagem, idêntica à do Diário original, foi utilizada, conforme ilustra a Figura 9, a seguir, mostrando a luz do Sol entrando pelo furo na janela voltada para o horizonte Sul em relação ao Equador Celeste, no intervalo de 3 de dezembro de 2018 à 9 de janeiro de 2019. Vale ressaltar que nesse curto intervalo de tempo, o Sol passou pelo Zênite de Bauru, São Paulo, Brasil, nos dias: 03/12/2018, às 13h06min24seg (Horário de Verão), e 09/01/2019, às 13h23min41seg (Horário de Verão).

O desenvolvimento desta atividade de ensino, a princípio, revela aos professores e alunos uma dificuldade específica das áreas tropicais, em torno ao equador terrestre, que é dada pela presença tanto da eclíptica (plano da órbita da Terra ao redor do Sol) quanto do Equador Celeste (projeção do equador terrestre para o espaço) em torno ao zênite do lugar. Para observar essas áreas do céu e organizar espacialmente o firmamento, é necessário que o estudante, utilizando-se do próprio corpo, busque estruturar percepções e construir imagens mentais que envolvam as relações espaciais, a localização de objetos, a partir das observações diretas, os deslocamentos e as distâncias, uma vez que, como afirma Almeida (2001), “A gênese da orientação espacial está no corpo, é a partir dele que, em primeiro lugar, os referenciais de localização devem ser determinados” (ALMEIDA, 2001, p. 43).

5. RESULTADOS OBTIDOS

Dentre os resultados obtidos, direta e indiretamente, a partir da realização das etapas de tradução e adaptação do material didático O Diário do Céu, destacam-se: (a) sua primeira edição em português, em 2016, bem como a atualização das demais versões do livro para os anos de 2017 a 2019; (b) a concepção e elaboração do Projeto de Extensão Universitária em Astronomia, intitulado O Céu do Norte e o Céu do Sul - o ensino de Astronomia na Educação Básica: uma experiência cooperativa entre Brasil e Itália; c) a elaboração e implementação da primeira proposta pedagógica do curso de formação de professores - O Diário do Céu - Introdução à Didática da Astronomia para Professores da Educação Básica, em 2016, assim como suas versões atualizadas para 2017 a 2019, que têm acontecido na UNESP, campus de Bauru, São Paulo; d) a abertura de campo de estágio para a formação docente de um grupo de graduandos e pós-graduandos, docentes universitários e pesquisadores, assim como para uma amostra de professores em exercício na Educação Básica, da rede pública do referido município, com vistas à proposição de novas metodologias para este nível de ensino nacional e estrangeiro e melhoria do ensino de Astronomia; (e) o envolvimento de dezenas de escolas e centenas de alunos no uso do Diário do Céu em observações diárias; f) a experiência de correspondências ocorridas entre professores e alunos brasileiros e italianos, utilizando recursos de comunicação e multimídia, como a troca de e-mails, para o envio de registros de imagens, textos e vídeos, com o intuito de estabelecer entre os participantes relações cooperativas e comparativas de semelhanças e de diferenças sobre os fenômenos que são observados diariamente no céu no local e em tempo real de observação, com aquilo que se pensa, se sabe, se vê nos livros ou em simulações, em um nível local e global; (g) a participação da pesquisadora (primeira autora deste artigo) em atividades acadêmicas sobre a Didática da Astronomia, com ênfase na investigação mais aprofundada dos fundamentos teóricos e metodológicos do projeto Il Diario del Cielo, do Movimento de Cooperação Educativa (MCE), em nível de formação doutorado, modalidade Estágio de Doutorado Sanduíche na Instituição Università Degli Studi di Roma "La Sapienza", Itália, com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) , sob a supervisão do Autor3, no primeiro semestre de 2017; (h) a tese de doutorado na área de Ensino de Ciências e Matemática da pesquisadora, de 2018, bem como as dissertações de Prado (2019) e Cavalcanti (2019), contemplando especificidades referentes ao projeto, de acordo com suas respectivas pesquisas. Dentre a construção de variados instrumentos simples voltados para a Educação Básica, para discutir, refletir e testar estratégias e práticas para o ensino de conceitos ligados à Astronomia, destacam-se ainda, como produção técnica desta etapa da pesquisa, i) o desenvolvimento dos materiais didáticos: Goniômetro do Sol e da Lua e Quadrante , adaptados para a realidade do Hemisfério Sul, a partir dos respectivos modelos originais em italiano. Tais resultados reforçam a busca em estabelecer uma rede cooperativa de pesquisas no campo da Didática da Astronomia, agregando instituições científicas e educacionais nacionais e internacionais, efetivamente incorporada aos processos de ensino e de aprendizagem escolar na área.

6. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

A adaptação da sequência de ensino do projeto italiano Il Diario del Cielo para a realidade de uma localidade da faixa tropical do Hemisfério Sul, bem como sua utilização como ferramenta conceitual, metodológica e didática em atividades de ensino e de aprendizagem de Astronomia têm favorecido, dentre outros aspectos, a percepção e a compreensão do objeto observado, uma vez que associa os conteúdos apreendidos na escola básica, como a matemática, a física, a astronomia, a geografia, a história, a arte, entre outros, e os procedimentos de observação direta e sistemática do céu, descrição, representação, localização geográfica e orientação espacial ao desenvolvimento cognitivo dos alunos, os quais possuem diferentes concepções de espaço, dentre os conhecimentos cotidianos, segundo a interação que estabelecem com o ambiente onde estão inseridos, mobilizando níveis distintos de conhecimentos para que a aprendizagem aconteça.

Ao relacionar os fenômenos astronômicos que ocorrem no céu com os acontecimentos cotidianos, o referido material didático busca contribuir para que a Astronomia se torne mais presente e significativa no dia a dia de professores e estudantes da Educação Básica.

Ressalta-se que o interesse didático do Diário do Céu reside na crença de que, uma vez traduzido em metodologias ativas e materializado no contexto escolar, permita a cada um entender, de forma autônoma e direta, no próprio espaço local e em tempo real, determinados fenômenos físicos.

Para tanto, de um modo geral, cabe ressaltar a importância e o papel decisivo dos processos de formação inicial e continuada voltados para o ensino de Astronomia, em promover o debate, a reflexão crítica e a busca de alternativas para a prática didática da Astronomia em função de demandas concretas do trabalho pedagógico. Este processo oportunizou às escolas envolvidas no projeto a repensar os locais e os horários do processo educativo, a utilizar-se de diversas linguagens, dentre as quais, além da escrita e da oralidade, o próprio corpo em movimento, como um instrumento de medida e de percepção multisensorial do entorno. Proporcionou ainda aprender a reconhecer, comunicar e entender como relativo o próprio ponto de vista e o sistema de referência particular, amparados em situações dialógicas, onde os diversos pontos de vistas se entrelaçam na construção de uma visão coerente e mais ampla a respeito da nossa posição no espaço e no tempo, tanto físico-astronômico quanto social, histórico e geográfico.

7. AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES; CAPES/PROCAD); Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financiero aos autores da pesquisa aquí relatada.

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Received: September 23, 2020; Accepted: May 17, 2021

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