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Avá

On-line version ISSN 1851-1694

Avá  no.27 Posadas Dec. 2015

 

DOSSIER

Dimensão e fluxo material das plantas em um terreiro de umbanda

 

Pedro Crepaldi Carlessi *

* Mestre em Ciências. Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). E-mail:
pccarlessi@gmail.com

Fecha de recepción del original: enero de 2016.
Fecha de aceptación: marzo de 2016.


RESUMO

Esta pesquisa discute sobre a dimensão material das plantas e das áreas de vegetação que integram o cotidiano de um grupo religioso alocado em um terreiro de umbanda da cidade de São Paulo-SP/Brasil1. A partir de um trabalho de campo de caráter etnográfico, apresenta-se duas situações empíricas em que pode-se perceber que as plantas não finalizam na superfície de suas folhas, mas justamente caminham no sentido de um certo transbordamento que perpassa e se estende para além do universo (ou "reino") vegetal. Propõe-se então pensar nas plantas em seu sentido relacional e a partir dos engajamentos que lhes caracterizam, condição que permite revisitar a ideia de 'cultura material', da qual as plantas mantém-se reféns ora da natureza, ora da cultura.

PALAVRAS-CHAVE: Flujo de Materiales; Naturaleza-Cultura; Religiones Afro-Brasileñas; Umbanda.

ABSTRACT

This paper discusses about the material dimension of plants and vegetation areas that make up the daily life of a religious group allocated in an umbanda's temple of São Paulo city (Brazil). From an ethnographic fieldwork, the study presents two empirical situations in which it may be seen that plants do not finalize on the surface of their leaves, but they precisely go toward a certain overflow that permeates and extends beyond the plant's universe (or "kingdom"). It is proposed, then, to think about the relations of the plants and the engagements that characterize them, a condition that allows revisiting a certain idea of 'material culture', which keeps plants either prisoners of culture or nature domains.

KEYWORDS: Material Flows; Nature-Culture; Afro-Brazilian religions; Umbanda.


Introdução

Neste artigo meu objetivo é dividir algumas observações que tenho feito em uma comunidade religiosa afro-brasileira alocada em um terreiro de umbanda da cidade de São Paulo. Os resultados aqui apresentados são fruto de um estudo mais amplo, desenvolvido ao longo da minha pesquisa de mestrado, em que procurei discutir diferentes formas de saber sobre plantas, tanto a partir de religiosos umbandistas como de cientistas botânicos, sobretudo no intuito de questionar alguns empenhos cientificistas calcados em modelos comparativos a respeito do termo sintético natureza. Se neste momento meu interesse se concentra em uma certa desnaturalização deste termo junto aos meus colegas biólogos e cientistas botânicos, julgo oportuno dividi-los também com os antropólogos inclinados aos estudos das religiões. Isso por que a materialidade, que me foi posta em cheque no terreiro de umbanda a partir da relação com as plantas, estabelece um importante campo reflexivo para pensarmos nas dinâmicas que envolvem humanos e não-humanos em função de práticas religiosas.

A partir de um trabalho de campo de caráter etnográfico2, conduzido durante nove meses de observação e participação nas cerimônias públicas e privadas do terreiro de umbanda 'Círculo de Irradiações Espirituais de São Lázaro' (CIESL), localizado na zona sul da capital paulista (Brasil), procuro apresentar como o pensamento relativista, apoiado em dicotomias como material-imaterial, real-imaginário, físico-mental, variações da clássica dicotomia natureza-cultura, não dá conta de apresentar as relações dos umbandistas com as plantas sem os eminentes riscos do reducionismo cultural ou biológico. Como linha de fuga para este problema, apresento minhas observações a partir de dois casos específicos, um ritual de 'desobsessão' seguido de um processo de cura com ervas e uma breve descrição da cidade mítica umbandista 'Aruanda', utilizando especialmente a ideia de "fluxo dos materiais", articulada pelo antropólogo britânico Tim Ingold (2012).

Meu objetivo está precisamente apoiado na ideia da matéria como algo provisório, o resultado dinâmico e efêmero de um processo que se constitui a partir da relação (Ingold, 2012; 2004), neste caso, entre homens, plantas e deuses, principalmente. Não busco, portanto, apresentar os significados que os umbandistas dão às plantas, mas justamente procuro apresentálas a partir das perspectivas próprias de seus anunciantes, digo, a partir dos engajamentos que constituem estas relações. Entender as plantas no sentido que Ingold (2012) têm sugerido, como o "emaranhado" dos muitos fluxos que às perpassam é, além de uma revisita ao que podemos entender como cultura material -que muito fundamenta o pensamento ocidental moderno- uma forma de subjazer o pensamento relativista e entendê-lo como uma "ficção filosófica", como indica Philippe Descola (2011:41), algo que não deve ser aplicado sem antes uma análise crítica, respeitosa e justa com as muitas formas de ser mundo.

Erva de poder, plantas e coisas plasmadas

'Plasmar' é uma atividade bastante comum no terreiro CIESL. Trata-se de um ato geralmente breve conduzido pelos médiuns3 do terreiro e que consiste no transporte de objetos do mundo dos espíritos para o mundo dos humanos, fazendo-os presentes naquela situação, por mais distantes ou desconhecidos que sejam. Explico melhor esta habilidade através do ritual de desobsessão para, em seguida, apresentá-la no sentido que me interessa neste momento, a respeito das plantas.

Desobsessão é um dos rituais mais emblemáticos neste terreiro, envolto de técnicas, ferramentas e práticas adquiridas após longos períodos de treinamento, sobretudo nas 'giras de desenvolvimento', cerimônia privada ao público e dedicada ao ensino e exercício das chamadas 'atividades mediúnicas'. De modo bastante geral a desobsessão consiste em um ritual de exorcismo, porém, em que o diálogo e negociação prevalecem à expulsão. Parte-se da ideia de que em certas circunstâncias, determinados espíritos podem aproximar-se dos humanos em um quadro de verdadeira obsessão: acompanham o humano dia e noite em suas atividades rotineiras, alimentam-se daquilo que o sustenta e, além disso, promovem discórdias, injúrias e outras maledicências. Pode-se dizer que a obsessão espiritual está para os umbandistas assim como o parasitismo está para os ecólogos (sobre este paralelismo de conceitos sem sobreposição, vide Cássia, Santos e Barros, 2014). Nesta interação entre dois seres diferentes, um deles -a parasita ou os espíritos malfeitores- mantém-se vivo à custa de outro -a hospedeira ou humanos obsediados-, prejudicando-o. Segundo me foi relatado neste terreiro, diversos são os motivos que levam a um quadro de obsessão espiritual, maiores ainda os males que podem ser causados por esta relação: dores, doenças, alucinações, perda de recursos financeiros, brigas e maus entendimentos afetivos, má sorte, violência, quadros depressivos; quanto maior a interação entre ambos, maiores os agravos. Nestes casos, a solução está em afastar o agente obsessor, atividade que acontece pelo ritual de desobsessão espiritual. Os médiuns incumbidos desta tarefa possuem a missão de, através de um breve contato físico realizado através de suas mãos com o corpo da pessoa obsediada, peças de roupa, joias ou mesmo o nome completo escrito em pedaço de papel, remover o agente causador das queixas trazidas pelo assistido.

Embora bastante empregada, no CIESL a desobsessão é tida como 'último recurso', utilizada apenas em condições extremas em que as demais tentativas de diálogo e afaste destes agentes já não se mostram mais suficientes. Nestas tentativas, os banhos de ervas são muito comuns, porém, como me disse o Exú Sete Sepulturas, "tem situaçoes que erva nao resolve mais, e ai nao adianta ficar passando banho e defumaçao, tem é que tirar o obsessor que está com a pessoa!". Vale me adiantar e dizer que 'erva' remete à categoria nativa desta comunidade para as plantas utilizadas em contexto ritual e que não envolve exclusivamente plantas no estado material mais comumente conhecido (vide Carlessi, 2016). Percebe-se pela fala do exú um dos motivos que levam os umbandistas ao contato íntimo e constante com as plantas: visto que os vegetais são tidos como transportadores de axé, energia vital sem a qual não há vida ou movimento, a interação com estes não-humanos, ao oposto do que é com os obsessores, aumenta e alimenta a vitalidade dos médiuns.

Na concepção deste grupo, não é só aos humanos que os obsessores podem prejudicar. Animais, imóveis, automóveis e outros bens materiais, seja qual for sua natureza, uma vez obsediados, também estão a mercê das ações dos obsessores. Do mesmo modo, não é apenas na forma humana que os maus espíritos se manifestam. Ao entrar em contato com o assistido4, muitas vezes os médiuns relatam encontrar facas, punhais, adagas, correntes, algemas, coleiras, armas de fogo e mais uma variedade de artefatos sádicos apontados como agentes manifestos e responsáveis pelo quadro obsessivo diagnosticado. Das conversas que tive com os médiuns aptos a esta atividade, pude perceber que poucos enxergam tais artefatos com o recurso da visão; aliás, por vezes a aptidão de enxergar elementos de outros mundos com os olhos foi-me colocada como rara e também desnecessária. Isso por que embora os artefatos não sejam vistos pelo recurso oftálmico, são percebidos em riqueza de detalhes por uma série de outros atributos em que é possível indicar com precisão o local em que se encontram, bem como o tamanho e a forma que possuem, prática desenvolvida ao longo do tempo. Como Mãe Sônia disse a um grupo de médiuns neófitos deste terreiro: "a espiritualidade está em tudo. Nós estamos nela e ela está em nós. Meu objetivo como mae de santo desta gira5 de desenvolvimento é dar os primeiros passos com voces neste treino e começar a desenvolver as faculdades que vao permitir voces tomarem contato com a espiritualidade" (Registro de campo).

A partir do momento em que os artefatos-obsessores são percebidos, os médiuns envolvidos na desobsessão tratam de plasmá-lo, dar a ele certa vida e removê-lo de uma vez por todas do corpo daquele que apresenta-se obsediado. Para tanto, corporeamente o médium que realiza esta atividade empenha grande concentração e esforço físico: no primeiro momento, através de um movimento circular das mãos, realizado na região em que pode perceber tal artefato, o médium sugere moldá-lo, levando certo tempo para isso; na sequência, já plasmado e transposto para o mundo dos humanos, o médium trata de removê-lo, geralmente em um gesto bruto -por vezes seguido de quedas ao chão, grunhidos, gritos sufocantes, escarros e vômito-, indicando a remoção do artefato-obsessor.

Quando digo "dar vida" a tais artefatos, talvez não utilize o termo mais adequado. Entendo que o agente obsessor já se encontrava vivo, afinal, foi capaz de promover importunos. Talvez seja mais apropriado dizer que ao plasmar coisas o médium umbandista permita o vazamento (Ingold, 2012) dos artefatos-obsessores, intensificando o elo entre os dois mundos. Isso porque, como mostrou a fala da Mãe Sônia, na concepção umbandista não há uma barreira entre o mundo espiritual e o mundo humano. Humanos, não-humanos e todas as coisas que existem transitam entre estes dois universos de modo que ambos, embora distintos, estão contidos um no outro de forma indissociável.

Embora invisíveis, os artefatos-obsessores são percebidos pelos humanos, que logo tratam de removê-los. É bastante certo que os umbandistas do terreiro CIESL distinguem ambos os mundos. O mundo espiritual é tido como ausente de forma estabilizada; já o mundo humano é descrito pelo grupo essencialmente em função da materialidade6. Por este motivo, no instante em que desejam permitir a continuidade do mundo espiritual para o mundo humano, tais objetos necessitam de uma forma, elaborada pelas mãos dos médiuns e materializada nas secreções aqui apresentadas. Todo modo, pude perceber que no terreiro de umbanda a forma é uma condição efêmera e quiçá importante, visto que a 'vida', de fato, é tida como uma vida espiritual, sendo a condição humana, uma breve passagem. No caso dos materiais em trânsito durante a desobsessão, a materialidade não é, ao menos, bem vinda: quando toma forma, geralmente através das secreções expelidas pelos médiuns que a trouxeram, as coisas plasmadas precisam ser queimadas; isso porque neste terreiro o fogo é tido como um portal entre os dois mundos. Munidos com um pouco de álcool, ateia-se fogo ao artefato expelido em forma de escarro, eliminando-o do terreiro e rompendo a continuidade entre os planos por este agente.

Com um pouco de treino e prática, materializar artefatos parece fazer parte da rotina deste grupo. O recurso foi acionado em diversas e inusitadas situações, desde procedimentos médicos nas sessões de 'medicina espiritual', em que toda a parafernália cirúrgica é acionada, até para fugir de paradas policiais no trânsito da cidade, onde uma 'capa de inviabilidade' nos permitiu a continuidade da viagem sem empecilhos. No que diz respeito às ervas, não diferente, estas também são passíveis de serem plasmadas. Sobretudo nas sessões de 'xamanismo' praticadas pelo grupo é que pude observar o emprego de ervas, mesmo sem enxergá-las.

Quando me refiro a xamanismo evoco aqui uma categoria utilizada pelo grupo para se referir a uma prática complementar aos rituais deste terreiro de umbanda, já bem apresentadas na literatura antropológica como "xamanismo urbano" (Magnani, 1999; 2005). Nesta modalidade (por vezes também referida pelo grupo como 'xamabanda'), busca-se através de um processo de semitranse chamado 'viagem', conduzido pelo toque ritmado de um tambor circular similar a um grande pandeiro (porém, sem platinelas), tomar contato e conhecimento de um mundo 'selvagem' e que supostamente abriga o íntimo de cada participante. Após as viagens, as vivências individuais são compartilhadas em grupo, discutidas e analisadas pelo pai-de-santo-xamã com o propósito de autoconhecimento, ou, como se diz no CIESL, de 'resgate do poder pessoal'. Digo que esta prática é complementar às atividades do terreiro pois este xamanismo, embora bastante aplicado, não abarca todos os integrantes desta comunidade religiosa. Seu emprego mantém-se restrito àqueles que buscam pela iniciação nesta prática, oferecida pelo dirigente do templo em sua instituição, chamada 'Aldeia Círculo das Tradições', atualmente localizada a poucos metros da atual cede do terreiro.

Em uma das viagens propostas nos primeiros estágios da iniciação ao xamanismo, os adeptos são orientados a viajar em busca da sua 'erva de poder'. Trata-se de fechar os olhos e no pulsar dos tambores deixar-se imergir no 'mundo xamânico' atrás daquela planta que comunga com o viajante propriedades particulares, geralmente relacionadas ao universo da cura. Cada participante retorna então das suas viagens com descrições sempre muito interessantes da flora deste mundo. Geralmente as plantas de lá são também encontradas no mundo daqui, e nestes casos os novos xamãs procuram mantê-las em cultivo. Isso porquê, sendo aquele vegetal a sua 'erva de poder', muitos são os poderes dela sob seu dono e vice versa. Desde protegê-lo contra algum mal até curá-lo de afecções graves, a relação da planta com o homem neste caso é particularmente íntima.

Em outros casos, porém, a erva descrita pelo iniciante não encontra correspondência com as plantas conhecidas no planeta terra. Nem sempre são verdes, nem sempre tomam forma vegetal, condição em que as descrições sempre ricas enchem de curiosidade aqueles que ouvem os relatos. Nestas situações, como o cultivo não é possível, 'plasmar' a erva é o caminho para tê-la meio aos rituais.

De volta ao terreiro, o xamanismo nos moldes aqui descritos integram sobretudo as giras de medicina espiritual, em que uma sala é arranjada para que um médium hábil nesta prática neoxamânica utilize seus recursos para atender aos assistidos do templo. O processo geralmente envolve a condução das viagens, seguida de uma longa conversa entre médium e assistido. Todo modo, quando se faz necessário complementar a viagem com alguma atividade própria do terreiro (como 'passe energético' e 'desobsessão', apenas para ilustrar alguns exemplos), os dois movimentos se entrelaçam. É nesse universo de continuidades metafísicas que a erva de poder sai do mundo xamânico e toma vida e forma pelas mãos dos médiuns de umbanda.

Em uma segunda-feira, dia da semana dedicado aos atendimentos de saúde na chamada 'gira de medicina', pude acompanhar um ritual de cura realizado por médiuns iniciados também nas práticas deste xamanismo. Nesta ocasião, três assistidos foram dispostos sobre esteiras de palha no salão principal do terreiro. Ao redor de cada um deles, um pequeno grupo de médiuns iniciantes se somou a um médium-xamã, responsável naquele momento pela condução dos cuidados com aquele assistido. Entre estes, me detive em um médium que expressava enorme concentração e certa distância do assistido, que repousava sob a esteira rodeada por velas de muitas cores, dispostas pelos médiuns incorporados em pretos-velhos e caboclos7. Em determinado momento, o médium solicitou a um colega que não participava ativamente do trabalho para que verificasse no jardim a disponibilidade de certa planta. Passou-se um intervalo de tempo razoável até o retorno do assistente, que informou não ter encontrado a planta nem no jardim, nem no estoque do terreiro, onde ficam alguns vegetais desidratados dos mais comuns. De prontidão, o médium-xamã respondeu que pela demora do colega a planta já havia sido utilizada, materializada através de suas mãos. Pude perceber que em determinado momento o médium curvara-se levemente e expressava manter em suas mãos uma espécie de cuia, da qual supostamente retirava algo e passava pelo corpo do assistido. Estava ali o bálsamo sagrado do enfermo, que trazida de outro mundo, agora materializada nas mãos de seu mestre, era livre para agir no mundo.

Onde mora o caboclo ?

O relato da erva de poder indica que as plantas neste terreiro transitam entre mundos que, embora invisíveis aos olhos, são passíveis de interação pelos umbandistas. As plantas, desse modo, são contínuas entre o plano humano e espiritual. Como tratarei de mostrar nesta próxima sessão, neste grupo a ideia de floresta também não se limita à materialidade das plantas; ao contrário, cria uma ruptura no espaço físico em que pessoas e divindades comungam um terreno contínuo entre o céu e a terra.

Mesmo esta bipartição, 'céu' e 'terra', embora por vezes se faça presente nos discursos umbandistas, não é vivida de modo antagônico. Diversas situações vividas em campo me indicam esta condição. Todo modo, centralizo a análise em um diálogo específico, tanto pelo preciosismo em certos detalhes como pela oportunidade privilegiada de entrevistar uma preta-velha.

Em certa quarta-feira acompanhava os trabalhos da mãe de santo Zizi, que mantinha uma sessão de passe e consulta vespertina, como horário alternativo aos consulentes - sobretudo idosos- que encontram dificuldades para dirigirem-se ao terreiro no período noturno, horário em que invariavelmente ocorrem as demais sessões. Nesta tarde presenciei o exato momento de desincorporação de um caboclo, divindade das mais comuns no terreiro de umbanda e que se manifesta através do processo de incorporação. O instante corriqueiro certamente não me chamaria atenção não fosse pela particularidade do local escolhido para a despedida do guia espiritual8: o lado externo do terreiro, meio ao jardim, condição pouco comum visto que de modo geral os espíritos finalizam as incorporações no salão principal do templo. Meio às plantas tratou de bradar e através de um pequeno salto para trás, desligou-se de seu companheiro humano. Tomei a passagem com a preta-velha:

Pedro (P): "Vó Maria, onde moram os caboclos?"

Vó Maria (VM): "Os caboclo moram na mata, fio. Voce num sabe?"

P: "É que vi um caboclo 'indo embora' no jardim e fiquei pensando..."

VM: "Caboclo mora na floresta, em Aruanda."

P: "Voce pode me dizer alguma coisa sobre Aruanda?"

VM: "Aruanda é a cidade onde moram os guia tudo. Todos os guia de umbanda vem de lá. Como é que se diz, é uma colônia espiritual..."

P: "Mas essa colônia é uma floresta?"

VM: "É também, fio. Tem floresta lá... é onde moram os caboclo, os pretovelho, os orixá..."

P: "E como é essa floresta?"

VM: "É uma mata, fio... igual essas de voces daqui. Tem muita arvore, muita! Tem também as ervas. Mas Aruanda é uma cidade espiritual.

P: "Entao em Aruanda além da cidade, existe a floresta?"

VM: "Nao é como aqui, fio, que tem floresta e cidade. É tudo Aruanda."

P: "Nao entendi."

VM: "Voce nao entendeu porque lá é um mundo diferente do de voces. Lá tem coisas parecidas, mas nao é a mesma coisa."

P: "Voce pode me dizer algumas coisas que sao diferentes?"

VM: "Lá a gente nao precisa de comida, de água. Num tem vício, tristeza. É um mundo muito bonito."

P: "E as plantas de lá? Sao como as daqui, que precisam de água, ou também vivem sem?"

VM: "É tudo espírito, fio! Num tem água porque água é uma coisa daqui da terra. Lá sao outras energias, é outra coisa."

P: "Aqui no terreiro se fala que os caboclos vivem na floresta. É na floresta de Aruanda eles vivem?"

VM: "É sim."

P: "Eles nao vivem na nossa floresta, a floresta dos humanos?"

VM: "Vivem na de voces e na de Aruanda. Elas tao junto."

P: "Quando eu estou na floresta eu também estou em Aruanda?"

VM: "Nao. O telefone toca só de lá pra cá..."

P: "Nao entendi."

VM: "Silencio..."

P: "E essas plantas que a senhora falou? As plantas que tem aqui também tem em Aruanda?"

VM: "Lá as plantas sao muito lindas."

P: "Mas sao as mesmas que tem aqui?"

VM: "Algumas sao, fio."

P: "E nesse caso, porque o caboclo escolheu ir embora no jardim?"

VM: "Aqui já se acabou tudo a floresta deles. Eles sao o espírito da floresta. Se nao tem floresta, nao tem caboclo, nao tem guia, nao tem nada. As planta tem muita força, fio. Voce tá vendo, tá fazendo teu estudo, aprendendo a religiao. Aqui nao tem floresta mas tem o jardim, é o nao é? Onde tem planta tem caboclo, preto-velho, orixá, exú, né?"

P: "Qualquer planta?"

VM: "Todas as planta. Umas melhor que outras."

O diálogo logo cedeu em função do decorrer da sessão, coordenada pela preta-velha9 que enquanto conversava e fumava cachimbo, observava os últimos afazeres daquela tarde. O fato que busco destacar nesta passagem é o caráter contínuo da floresta por entre os mundos. Assim como remeti a respeito do fogo nas práticas de desobsessão, as plantas são também elementos de intersecção entre o mundo dos humanos e dos não-humanos. A respeito da cidade metafísica Aruanda10, no terreiro de umbanda parece que toda e qualquer vegetação é capaz de criar este elo, como relata Mãe Janice: "se no terreiro existir uma folhinha verde, uma só, voces podem transformar ela numa floresta inteira e chamar todos os caboclos, ou entao transformar no remédio que a pessoa precisa..." (registro de campo). Este seria então um importante aporte dos vegetais à religião: permitir o fluxo entre mundos. Todo modo, não se trata de mundos distintos, "lá" e "cá". Os caboclos são de Aruanda, entretanto, a morada mítica não se encontra em meio ao céu, e sim em meio a terra, assim como Prandi (2005) observou a respeito dos iorubás africanos: "Os iorubás, como povo da floresta, pouco se interessaram pelos astros, que ocuparam posiçao importante nos sistemas religiosos de povos que viviam em lugares abertos e altos. (...) A morada dos deuses e dos espíritos dos iorubás, emblematicamente, nao fica no céu, mas sob a superfície da terra" (Prandi, 2005:6).

Sobrepostos e conectados, humanos e divindades vivenciam através do jardim do terreiro CIESL a intersecção entre mundos. Porém, como a pretavelha indicou, o telefone toca apenas de lá pra cá. Ou seja, os espíritos de Aruanda estão também no mundo dos humanos, embora os humanos não possam acessar Aruanda de modo direto. Apesar de não ser uma via de mão dupla, é nesse sentido que destaco o caráter contínuo da floresta. De modo semelhante se dá a concepção de nascimento e morte neste terreiro. Através do processo de 'reencarnação', fruto das raízes kardecistas, acreditase que antes de nascer em terra, os homens já existiam, habitando, porém, outros mundos. Digo outros, pois além de Aruanda -morada exclusiva dos guias e orixás- e do mundo xamânico, outras cidades espirituais foram-me relatadas e aos montes emergem na literatura romancista destinada a este seguimento religioso.

Somado a estes exemplos, o uso do tabaco no terreiro de umbanda também ilustra as continuidades que busco evidenciar a partir das plantas. Pai Bento, outro guia espiritual acompanhado durante o trabalho de campo, assim como Vó Maria e outros pretos-velhos, também fuma cachimbo, porém nunca cigarro, como me relatou: "pra voce ver, aqui no cachimbo é essa cumbuquinha de barro segurando a erva que queima, esse pino de madeira que leva a fumaça pra boca. É como macho e a femea. Cigarro nao tem isso, fio, fica só o fumo no papel. Cachimbo tem muita magia".

'Macho' e 'fêmea', 'barro' e 'madeira', 'fumo' e 'fumaça', são estas intersecções, nunca rompidas e sempre contínuas, que confere a magia qual o preto-velho comenta. No caso, entendo esta magia como a configuração de um microcosmo deste universo religioso expresso na própria ferramenta da divindade. Como podemos perceber, não cabe neste contexto pensar nas fronteiras entre o fumo e a fumaça, por exemplo, exatamente pelo fato da magia -para utilizar o termo do preto-velho- não estar contida em um destes polos, e sim na continuidade destas duas condições uma para a outra. Juntos, cumbuca e pino formam uma terceira coisa, um "emaranhado" (Ingold, 2012) da primeira com a segunda, em que a oposição deixa de fazer sentido e, em contrapartida, a união a torna plena.

PLANTAS E MUNDOS EM TRÂNSITO

Mesmo que breves, acredito que estes dois relatos fornecem dados suficientes para avançar a discussão a respeito da dimensão material das plantas no contexto religioso afro-brasileiro. Como já bem apresentado na literatura antropológica, as cosmologias religiosas afro-brasileiras se elaboram justamente a partir de movimentos e continuidades, como remete a própria ideia de axé anteriormente reportada. Neste sentido, cada organismo que integra uma comunidade-terreiro (digo, as plantas, pedras, orixás, guias espirituais, gentes e tantos outros) seria então uma diferente modulação do axé, em processos simultâneos de "concretizaçao, diversificaçao e individualizaçao", como bem apresenta Goldman (2005:14).

Ambientando esta condição para o contexto etnográfico apresentado, tenho pensado no terreiro de umbanda como um campo de relações absolutamente dinâmico, caracterizado e constituído justamente pela fluidez, contato e contágio entre seres de ontologias diversas que ali se apresentam e se elaboram. Sendo assim, ao mesmo tempo que as plantas transitam entre diferentes mundos (trazidas pelo ato de 'plasmar' coisas), são elas mesmas passaportes para o trânsito, que permitem, por exemplo, encontros e continuidades entre florestas, cidades míticas e ambiente urbano. No limite, posso dizer que estas plantas possuem "an inherent and irreducibly open-ended character", como indica Webb Kaene (2008:230) ao refletir sobre a dimensão material de artefatos religiosos.

É a partir da amálgama entre seres, tempos e espaços distintos que percebo a vitalidade e importância das plantas, indispensáveis à manutenção das práticas religiosas umbandistas. Dessa forma, o jardim do terreiro CIESL não simboliza a floresta sagrada dos caboclos, mas justamente, é o "nó" (Ingold, 2012), o encontro que permite a fluidez e interação de humanos e não-humanos, resguardados pelos conflitos, disputas e negociações ontológicas envolvidas nesta relação. Ainda que brevemente, Cabrera (2012) e Barros (1993) trazem também contribuições que asseveram a respeito desta confluência a partir das áreas de vegetação vividas pelo povo-de-santo (neste caso, a respeito dos grupos religiosos afro-cubanos e jêje-nagôs da Bahia, respectivamente).

Entendo que abdicar da materialidade enquanto concretude do mundo para questionar as fronteiras e engajamentos das plantas é um caminho produtivo contra os automatismos intelectuais de nossa tradição ocidental moderna, que apoia-se sobretudo em antinomias e bipartições para compor seus regimes de enunciação. Digo isso pois a experiência é irrefutável: o universo invisível que costumeiramente é apontado como próprio da cultura, aos umbandistas, é parte integrante daquilo que os cientistas entendem por natureza. Como lidar com este paradoxo sem cair nas armadilhas do reducionismo biológico ou cultural? Mantido no objetivo de indicar diferentes representaçoes do elemento vegetal, jamais fugiria da dicotomia que o próprio campo me levou a abandonar.

Em sua antropologia Tim Ingold têm procurado distinguir "materialidade" de "materiais em fluxo", argumento que muito entusiasma minha análise sobre plantas neste momento. Como argumenta o autor, "no conceito de materialidade, a divisao entre matéria e forma é reproduzida ao invés de colocada em questao" (Ingold, 2012:34), Ingold aposta então na ideia de continuidade e movimento para romper algumas dicotomias e invólucros característicos do pensamento moderno, tais como objetosujeito, indivíduo-ambiente, natureza-sociedade, categorias em oposição que mostram-se imprecisas quando pensadas em função das religiosidades afro-brasileiras.

Conclusão

Nesta análise procurei grifar algumas dimensões materiais que tangem o complexo religioso da umbanda paulista, dialogando sobretudo a partir de continuidades e de alguns fluxos que passam plantas. Procurei distinguir a categoria nativa 'erva' do termo sintético planta no sentido de indicar algumas dissensões entre ambos termos, resguardando sobretudo as particularidades ontológicas do primeiro. A proposta ingoldiana de suspender a materialidade das coisas e analisá-las no sentido dos "fluxos de materiais" e suas múltiplas dinâmicas relacionais se mostrou como um caminho interessante para descrever o mundo e as relações umbandistas com as plantas pela perspectiva própria de seus anunciantes, humanos e não-humanos. Para além de um exercício de alteridade, não apresentá-lo a partir dos pressupostos do relativismo cultural entendo ser um esforço em preservar a vitalidade destes mundos, constituídos a partir de realidades próprias, elaboradas a partir de um sistema interativo em que tanto a ideia de natureza como de cultura são simultaneamente elaboradas, de modo que distingui-las ou separá-las entre polos opostos cria certo alo distintivo qual a cosmologia umbandista parece não enquadrar-se. Neste aspecto, recuperar a categoria "naturezacultura" de Donna Haraway (2003) mostra-se como um empenho analítico também comprometido com esta pluralidade de mundos.

Visto que neste contexto etnográfico a condição urbana impõe limites à relação dos umbandistas com as plantas -vide também as notas de Silva (1995) a este respeito-, observa-se um movimento bastante interessante por parte dos adeptos de terreiro CIESL em permitir o fluxo dos vegetais para outras formas e matérias. Dessa maneira, se a materialidade fornece uma referência para o diálogo sobre plantas nas comunidades-terreiro, minha experiência leva a crer que este referente mostra-se eminentemente repetitivo (por vezes equívoco) caso seja tomado em função de sua concretude; todavia, considerado como o contrário, a dimensão que podese ter das ervas caminha no sentido de uma certa fluidez, que perpassa e se estende para além do universo (ou "reino") vegetal.

Notas

1 As ideias que apresento neste manuscrito foram recuperadas de uma comunicação oral por mim realizada durante a XVIII Jornadas Sobre Alternativas Religiosas en América Latina (2005) em Mendoza, Argentina. Desde então o material sofreu adequações e correções das quais muito agradeço a Isabel Cristina Moura Carvalho e Carlos Alberto Steil pelos comentários e apontamentos feitos à primeira versão.

2 Esta pesquisa acessa aquilo que o Estado reconhece como "conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético brasileiro", nomeado e resguardado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), cuja autorização para estudo se faz expressa através da publicação em Diário Oficial da União em 29 de maio de 2014.

3 Neste terreiro, a categoria corresponde tanto à uma denominação genérica, que se refere a todos os humanos hábeis no contato com espíritos, como também uma específica posição na estrutura sócio-religiosa, que organiza-se hierarquicamente a partir de 'mães ou pais de santo' (que subdividem-se em 'grandes' ou 'pequenos'), 'primeiros cambonos', 'iabás', 'ogãs' e 'médiuns', sendo este último o mais expressivo em número de adeptos.

4 Nome dado aos membros externos da comunidade religiosa, visitantes do terreiro, também chamados 'filhos-de-fé'.

5 Como chamam-se as cerimônias religiosas neste templo.

6 Refiro-me à "fisicalidade dura do mundo" (Olsen, 2003:88 apud Ingold, 2012:34), objetos enquanto forma-matéria.

7 Divindades que compõem o panteão umbandista.

8 "Guia", "guia espiritual" ou "entidade" refere-se aos espíritos que povoam o terreiro de umbanda, manifestos sobretudo através do processo de incorporação. Neste templo, existem treze "linhas" (castas) de guias espirituais: caboclo, pretovelho, erê ou criança, boiadeiro, baiano, marinheiro, malandro, cigano, médico, grande oriente, exú, pombogira e exú-mirim.

9 Refiro-me à "preta-velha" e não à "mãe de santo incorporada com preta-velha" respeitando as dissensões ontológicas postas pelos umbandistas nesta condição.

10 Para complementar a questão das cidades metafísicas na cosmologia religiosa afro-brasileira, vide o diálogo etnográfico que aqui se estabelece com a Jurema, praticada sobretudo no nordeste brasileiro e etnografada a partir da cidade de Alhandra-PB por Salles (2004).

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