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Insuficiencia cardíaca

versão On-line ISSN 1852-3862

Insuf. card. vol.5 no.4 Ciudad Autónoma de Buenos Aires out./dez. 2010

 

CASO CLINICO (Versão original)

Síndrome de Eisenmenger em paciente com comunicação interatrial
A propósito de um caso

Fábio Azevedo Simão1, Felipe Montes Pena1, Fernanda Arêdo Carvalho2, Carlos Augusto Cardozo de Faria3

1Especialización en Cardiologia Clínica. Universidad Federal Fluminense \ Hospital Universitario Antonio Pedro (HUAP). Niterói. Río de Janeiro. Brasil.
2 Pregrado Medicina. Universidad Federal Fluminense. Niterói. Río de Janeiro. Brasil.
3 PhD en Pesquisa Clínica. Universidad Federal Fluminense \ Hospital Universitario Antonio Pedro (HUAP). Niterói. Río de Janeiro. Brasil.

Correspondência: Dr. Felipe Montes Pena
Rua Mariz e Barros, número 71. apartamento 601. Bairro Icaraí. Cep 24220-120. Niterói. Río de Janeiro. Brasil.
E-mail: fellipena@yahoo.com.br ; fellipena@hotmail.com

Recebido: 28/06/2010
Aceitado: 25/09/2010

Resumo

A síndrome de Eisenmenger (SE) representa a forma mais avançada da hipertensão arterial pulmonar associada a defeitos cardíacos congênitos (DCC). Os adultos com DCC representam uma população em expansão que requerem cuidados médicos terciários a longo prazo. Em torno de 8% dos pacientes com DCC e 11% daqueles com shunt da esquerda para direita desenvolvem o quadro da SE. Os esforços no tratamento são direcionados para redução da resistência vascular pulmonar, shunt da esquerda para direita, cianose, morbidade e mortalidade. Apresentamos caso do sexo feminino, 41 anos, que apresentou quadro de cianose de repouso, edema de membros inferiores e defeito de septo atrial do tipo comunicação interatrial diagnosticado na ecocardiografia que foi abordado de forma medicamentosa com bloqueadores de canal de cálcio.

Palavras-chave: Hipertensão pulmonar; Eisenmenger; Doença cardíaca congênita

Introdução

Em 1897, Viktor Eisenmenger descreveu um paciente com cianose e dispnéia desde a infância que faleceu com hemoptise maciça aos 32 anos de idade. O exame post mortem apresentou defeito ventricular septal e doença vascular pulmonar grave1. Em 1958, Paul Wood descreveu o termo complexo de Eisenmenger que consistia em "hipertensão pulmonar em níveis sistêmicos com shunt reverso ou bidirecional em um defeito no septo ventricular". Subseqüentemente, o termo síndrome Eisenmenger tem sido usado para descrever doença pulmonar vascular e cianose resultante da conexão da circulação pulmonar e sistêmica (como em defeitos do septo atrial, septo ventricular, ducto arterioso patente e janela aortopulmonar)2.
Portanto, a síndrome de Eisenmenger (SE) representa a forma mais avançada da hipertensão arterial pulmonar (HAP) associada a defeitos cardíacos congênitos. Os adultos com doença cardíaca congênita (DCC) representam uma população em expansão que requerem cuidados médicos terciários a longo prazo. Aproximadamente 5 a 10% deles possuem HAP de gravidade variável, afetando a qualidade de vida, morbidade e mortalidade3.
Apresentamos caso de paciente de 41 anos do sexo feminino, que cursa com pressão de artéria pulmonar (PAP) muito elevada, edema de membros inferiores, cianose de extremidades e defeito de septo atrial, preenchendo os critérios para SE.

Relato do caso

Mulher, 41 anos, natural do Rio de Janeiro, foi admitida no hospital com quadro de dispnéia progressiva iniciada há seis meses com piora significativa nos últimos três meses aos mínimos esforços, dor pleurítica com tosse improdutiva e edema importante de membros inferiores.
Na história prévia relata hipertensão em tratamento medicamentoso, sopro cardíaco na infância e tabagismo. Ao exame físico na ausculta cardiovascular apresentava B2 hipofonética com sopro sisto-diastólico em foco pulmonar.
No restante encontrava-se taquipnéica, cianose de polpas digitais ao repouso e ventrículo direito aumentado na palpação do tórax.
Foram solicitado exames complementares como bioquímica, provas de atividade reumática, tireoidiana, eletroforese de hemoglobina e que estavam isentos de alterações. A telerradiografia do tórax foi solicitada e protrusão importante do arco da artéria pulmonar foi observada (Figura 1), na eletrocardiografia identificou-se bloqueio atrioventricular de 1º grau com bloqueio de ramo direito (Figura 2) e a ecocardiografia transtorácica (ETT) revelou aumento de átrios, regurgitação tricúspide importante, aumento de ventrículo direito, PAP de 123,7 mm Hg e fração de ejeção de ventrículo esquerdo (FEVE) de 47% (Figura 3), dados confirmados com realização posterior de ecocardiografia transesofágica (ETE) que demonstrou presença de comunicação interatrial (CIA) (Figura 4) com shunt direita-esquerda. No tomografia computadorizada de tórax o principal achado foi a protrusão de artéria pulmonar. (Figura 5) Ao realizar gasometria arterial em ar ambiente foi observado ph: 7,43 - pCO2: 23,4 mm Hg - pO2: 53,9 mm Hg e saturação de O2: 89,8%. Diante do quadro clínico proposto foi diagnosticada SE visto a PAP elevada, cianose de extremidades ao repouso, presença de CIA.


Figura 1. Protrusão do arco da artéria pulmonar à telerradiografia de tórax.


Figura 2. Alterações eletrocardiográficas conforme patologia descrita.


Figura 3. Demonstração ecocardiográfica da hipertensão pulmonar.


Figura 4. Ecocardiografia transtorácica com Doppler demonstrando a presença de comunicação interatrial.


Figura 5. Dilatação importante da artéria pulmonar visto sob tomografia computadorizada de tórax.

Optou-se inicialmente com tratamento medicamentoso, propondo o uso de diltiazem em dose progressivas de acordo com Consenso de Veneza4 720 mg/dia, furosemida 20 mg/dia e espironolactona 25 mg/dia. Após 15 dias de uso em doses progressivas de bloqueador de canais de cálcio, nesse caso diltiazem, ocorreu queda de 20% em PAP (98 mm Hg) mensurado por ETT realizado pelo mesmo operador prévio. A paciente atualmente encontra-se estável em acompanhamento ambulatorial.

Discussão

A incidência de DCC na população geral é de 1%. Em torno de 8% dos pacientes com DCC e 11% daqueles com shunt da esquerda para direita desenvolvem o quadro da SE5. O aumento da resistência vascular pulmonar pode ocorrer em 5 a 10% dos pacientes não tratados com defeito do septo atrial (DAS), predominantemente em mulheres. A patogênese da HAP em alguns pacientes é desconhecida. Como regra, consideramos a presença de SE quando o DSA é grande, não restritivo e na presença de cianose no repouso6. Na descrição do caso observamos conforme descrição da literatura, paciente do sexo feminino com HAP, CIA e cianose de repouso.
O exame físico destes pacientes é variado e podem revelar cianose central que pode ser influenciada devido aumento da resistência vascular quando submetido a maiores temperaturas, exercício, febre, grandes altitudes ou infecção sistêmica. Os sinais da HAP ao exame físico apresentam fechamento de válvula pulmonar palpável e componente de segunda bulha hiperfonético. O pulso arterial é normalmente palpável ou diminuído. Podem haver sopro diastólico de regurgitação pulmonar (Graham-Steel)7.
Em relação a propedêutica com exames complementares o telerradiografia do tórax apresenta artéria pulmonar proeminente, naqueles que possuem defeito do septo ventricular (DSV) o índice cardio torácico encontra-se diminuído, enquanto os portadores de DSA possuem cardiomegalia com dilatação de ventrículo direito secundário ao aumento da carga pressórica8. O ETT permite a identificação de anormalidades cardíacas ou valvulares. O Doppler associado permite a identificação de shunts. O ETE torna-se útil naqueles pacientes em que há dificuldade na identificação da pressão da artéria pulmonar ou na identificação dos defeitos septais9. A ressonância magnética pode identificar defeitos intracardíacos e ducto arterioso patente, particularmente naqueles com cirurgia cardíaca prévia. A ressonância magnética pode detectar shunts esquerda-direita ou bidirecionais, mas não possuem condição de quantificar o shunt. A cineangiocoronariografia é muito útil para detectar, localizar e quantificar o shunt e determinar a gravidade da doença vascular pulmonar, entretanto, tem caído em desuso visto os avanços na ecocardiografia que tem permitido realizar estas medidas10.
Os esforços no tratamento são direcionados para redução da resistência vascular pulmonar, shunt da esquerda para direita, cianose, morbidade e mortalidade. Estas medidas tem sido decepcionantes. Os bloqueadores de canal de cálcio reduzem a pressão arterial sistêmica e diminuem o shunt, o que pode levar a síncope e morte súbita. O seu uso é controverso, havendo relatos de boa evolução clínica e ao mesmo tempo má evolução em outros. A oxigenoterapia não é recomendada de rotina, mas é útil no pacientes com hipoxemia profunda, dispnéia em repouso ou atividade limitada11,12.
O prognóstico a longo prazo dos pacientes com SE é melhor que outras condições associadas a HAP, como a hipertensão pulmonar primária. Estes pacientes tem sobrevida de 80% em 10 anos, 77% em 15 anos e 42% em 25 anos. O prognóstico não é influenciado pela localização do defeito intracardíaco. As variáveis associadas com o pior prognóstico a longo prazo são síncope, pressão de enchimento de cavidade direita e hipoxemia grave13. O paciente descrito apresenta patologia pouco comum, com apresentação atípica, visto que a idade da paciente não é típica da patologia e a resposta ao tratamento com diltiazem em doses elevadas mantendo boa evolução clínica até o momento.

Referências bibliográficas

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