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Revista latinoamericana de filosofía

On-line version ISSN 1852-7353

Rev. latinoam. filos. vol.41 no.2 Ciudad Autónoma de Buenos Aires Nov. 2015

 

ARTÍCULOS ORIGINALES

As leis naturais em Hobbes

The Laws of Nature in Hobbes

 

Delamar José Volpato Dutra
Universidade Federal de Santa Catarina


RESUMO: O texto apresenta a interpretação de Strauss, segundo a qual Hobbes derivaria a lei natural do direito natural e contesta que ela seja uma interpretação consistente e acurada do direito natural em Hobbes. O texto avança a hipótese de que o predicado da lei é conjugado com a determinação da igualdade, ao passo que o direito tem como alicerce a liberdade. Liberdade e igualdade não parecem ser predicados facilmente conjugáveis. O texto aponta para uma clara opção do sistema de Hobbes pela igualdade. A lei que evita a igualdade da morte é o caminho seguro no qual o Leviathan precisa educar os súditos.

PALAVRAS-CHAVE: Direito natural; Liberdade; Igualdade; Hobbes.

ABSTRACT: The text presents Strauss's interpretation, according to which Hobbes would have derived natural right from natural law, and denies that this is an accurate interpretation of natural right in Hobbes. The text forwards the hypothesis that the predicate 'law' is conjugated with the predicate 'equality', while the predicate 'right' has a foundation in 'freedom'. Freedom and equality do not seem to be predicates easily conjugable. The text point out for a clear choice of Hobbes for a system of equality. The law prevents the equality of death, and it is the path in which Leviathan needs to educate their subjects.

KEYWORDS: Right of nature; Liberty; Equality; Hobbes.


 

1. Introdução

Strauss considera ter sido Hobbes o primeiro a distinguir direito natural e lei natural: “o primeiro a distinguir com clareza incomparável ‘direito’ e ‘lei’” (Strauss 1952: 157). Por isso, ele seria o fundador da doutrina da lei natural moderna: “Ele é o clássico e o fundador, especialmente, da doutrina da lei natural moderna” (Strauss 1965: 182). Este estudo pretende apresentar o conceito de lei natural (lex naturalis) em Hobbes, bem como a sua relação com o direito natural. Nesse sentido, se para Kant (MS: 239) ainda foi uma questão saber por que a filosofia moral, especialmente a filosofia política, não deveria ser chamada de uma doutrina dos direitos, mas uma doutrina dos deveres, para Hobbes, certamente, já não se trata mais de uma doutrina dos deveres (Strauss 1965: 182). A compreensão dessas formulações do pensamento de Hobbes está no coração do conceito de direito natural e de liberdade que ele defende.

2. O direito natural (jus naturale) no estado de natureza

A lei natural tem estirpe filosófica pelo menos desde Cícero (Cícero De re publica, livro III: 123). É exatamente em face da lei natural que Hobbes cunha o seu conceito de direito natural. De fato, no De Cive, ele afirma que a lei é um grilhão, ao passo que o direito é uma liberdade: “Há portanto uma grande diferença entre lei e direito —porque a lei são grilhões, enquanto o direito é liberdade, e por isso se diferenciam como dois contrários” (Hobbes 1642: cap. XIV, §3). Para Hobbes, direitos naturais não são constituídos pela lei, seja natural ou civil. Não, ele é um dos primeiros, senão o primeiro, a inaugurar a oposição entre ambos1.
A liberdade, para ele, é o que define o direito natural. Duas referências do início do cap. XIV do Leviathan são importantes para essa conceituação:
i) direito natural “é a liberdade que cada homem possui de usai seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida”;
ii) direito natural “consiste na liberdade de fazer ou de omitir”.
Como se pode perceber, pelo menos quatro conceitos são fundamentais na dicção do conceito de direito: o de liberdade, o de poder, o de vontade e o de autoconservação.
Segundo Gauthier, até a introdução do conceito de direito, no Leviathan, o homem fora tratado “somente como uma máquina de autoconservação” (Gauthier 1969: 34). Nesse sentido, como uma máquina que se mantém, o poder seria justamente a capacidade de movimento do corpo que se autoconserva. Nesse caso, o poder só não se identifica por inteiro com a liberdade e, portanto, com o direito, porque aquele pode ser tirado (take away) de alguém por impedimentos externos. Disso se pode concluir que a liberdade é justamente não sofrer impedimentos externos. “A liberdade, agora, tem de ser definida como poder potencial não impedido por condições externas” (Gauthier 1969: 64). Azada, portanto, a consequência de que o direito é a liberdade de usar à vontade o poder que alguém de fato tem. Melhor dito, o direito natural é igual à liberdade de usar à vontade o poder que alguém tem e que não seja tirado (take away) por impedimentos externos2. Se alguém pode (may) fazer algo, e esse poder não é tirado por impedimentos externos, então, ele tem o direito natural de usar tal poder, pois no estado de natureza não opera o conceito de justiça. A obrigação que pode viger em tal estado não estabelece vínculos externos. Segundo Gauthier, tal direito significa aquilo que o homem pode fazer (may do).
Nesse diapasão, Warrender defende que em Hobbes operariam dois conceitos de direito, um como pretensão moral contra os outros e outro como não ser obrigado a renunciar: “Hobbes usa o termo direito com dois significados distintos: (1) como aquilo a que pertence a alguém moralmente; (2) como aquilo que não se pode ser obrigado a renunciar” (Warrender 1957: 18). No primeiro caso, os direitos são o verso da medalha de deveres, são sombras de deveres. No segundo caso, os direitos são uma antítese dos deveres, ou seja, uma liberdade ou isenção de obrigação: “Ao passo que no sentido primeiro, direitos são sombras de deveres, no sentido presente eles são a antítese de deveres, sendo um direito uma liberdade ou uma isenção de obrigação” (Warrender 1957: 21). Quando Hobbes fala das verdadeiras liberdades dos súditos ou do direito a todos as coisas, a referência seria ao direito como isenção de obrigação (Warrender 1957: 20). Com efeito, ao se referir ao direito do súdito contra a punição do Estado o próprio Hobbes anota “[...] ninguém é obrigado a não lhe resistir” (Hobbes 1651: cap. XIV).
Desse modo, pode-se entender por que é paradoxal um empreendimento como o de Strauss que visa a fundamentar a obrigação, a lei natural, sobre o direito, porque ele teria que deduzir uma obrigação de uma liberdade que se define justamente como uma isenção de obrigação: “ele teria de ter sustentado obrigações com base em liberdades isentas de obrigação” (Warrender 1957: 21). A teoria do direito natural não é uma teoria do que os homens estão obrigados, mas do que eles não podem ser obrigados a fazer: “os direitos naturais não pertencem à teoria hobbesiana do que os homens são obrigados a fazer, mas à sua teoria do que eles não podem ser obrigados a fazer” (Warrender 1957: 21). Dito claramente, como bem se pode ler no texto de Hobbes, trata-se de uma oposição entre dever e direito, este definido como uma liberdade de não ter qualquer obrigação, “liberdade de obrigação” (Warrender 1957: 21), aquele como uma obrigação: “um dever é o que uma pessoa está obrigada a fazer; um direito é o que uma pessoa não poder ser obrigada a renunciar” (Warrender 1957: 21). Como já afirmado, ninguém pode ser obrigado a cometer suicídio, nem proibido de cometê-lo.
Diferentemente de Locke, portanto, o direito se constitui em um vácuo de obrigações:

O direito natural hobbesiano, distintamente daquele de Kant, não é dependente da capacidade de o homem obrigar um outro; o direito natural hobbesiano é unilateral no sentido de que ele representa o conatus natural ou o esforço que motiva um ser humano. Têm-se direitos na condição natural mesmo onde nenhuma pessoa possa ser obrigada. Ademais, o direito natural hobbesiano não é dependente da propriedade de si mesmo e de se imputar à própria pessoa as suas ações e, desse modo, por fim, não é dependente da aquisição de um tipo de responsabilidade natural pelo que faz. (Herbert 2009: 16)

Não fosse assim, ou seja, se o direito dependesse de haver obrigações, não poderia haver o direito a todas as coisas. Se há direito a todas as coisas, incluso aos corpos dos outros, é porque a noção de obrigação é estranha ao direito natural, tal qual definido por Hobbes, como já visto acima (Hobbes 1642: cap. XIV, §3). O cap. XXVI do Leviathan leciona que imputação e responsabilidade são conceitos cujo significado só faz sentido nos termos do contrato social, ou seja, eles são dependentes daquela mesma capacidade que permite a um corpo contratar e compreender as consequências deste ato, qual seja, a linguagem, o que exclui da imputação os animais, os débeis naturais, as crianças e os loucos. Portanto, trata-se de conceitos prenhes de normatividade, cuja operacionalização só é possível nos termos do contrato.
Talvez, para melhor explicar o direito natural seja mais interessante conectá- lo com a teoria hobbesiana da deliberação. A deliberação, para Hobbes, nos termos do cap. VI do Leviathan, é o suceder de apetite e de aversão, sendo que o último apetite ou medo é o que se chama vontade. Ou seja, melhor seria uma definição mais formal tanto de direito natural quanto de poder do homem, pois isso permitira atribuir como direito natural qualquer uso do poder do homem como meio para qualquer fim. Isso possibilitaria dizer que mesmo o suicida procura um bem, ainda que sob a sua ótica. Para tal, ter-se-ia que ver o que nele predominou, qual foi o último apetite ou aversão, de tal forma que nem sempre o medo da morte é a maior aversão que pode acometer um ser humano, como bem registrou o próprio Hobbes, já acima mencionado. Pode-se dizer, também, que nos textos anteriores ao Leviathan há uma conexão maior entre direito natural, reta razão e autoconservação, que ainda pode ser encontrada no Leviathan, mas há, igualmente, neste último, definições mais deflacionadas de qualquer conexão desse jaez. De acordo com Herbert, “Direito natural, para Hobbes, pertence ao homem como um indivíduo alienado radicalmente. É uma liberdade desenraizada de agir baseado nos próprios desejos e medos em um mundo onde não há soberanos para impor seja a leis de Deus, seja as suas próprias” (Herbert 2009: 16). A autoconservação não pode ser a finalidade e a justificativa do direito, pois o mecanicismo que tal determinação encontra o seu limite nos atos do sujeito que atentam contra a sua vida, como o suicídio. Isso não desdiz uma possível interpretação mecanicista de Hobbes. Apenas afirma se tratar de um mecanismo mais complexo do que um que está destinado exclusivamente a se autoconservar, mormente o conatus para tal. O ser humano é um mecanismo que tem vontade, cuja determinação remete ao último apetite ou aversão. Ainda que para a maior parte dos seres humanos, durante a maior parte do tempo, a aversão da morte seja maior do que qualquer outra aversão, não significa que ela seja assim todo o tempo em todos os homens.
Por isso mesmo, o fundamento da lei natural é a autoconservação, ao passo que o fundamento do direito é a liberdade, cuja definição é deflacionada a um mínimo de conteúdo, tanto que se trata de uma definição negativa, a qual só torna incompatível com a liberdade o impedimento físico. Ora, tal definição é compatível, por exemplo, com o suicídio, ao passo que se o fundamento para o direito fosse a autoconservação, o suicídio implicaria uma inconsistência. Obviamente, o direito implica também que a liberdade possa ser usada para a autopreservação, como bem observa Strauss, “Isso significa, o ‘direito natural’ é o primeiro fato moral ou jurídico que ocorre se se começa pela natureza humana, isto é, pelo apetite natural do homem. A ‘lei natural’ pertence a um estágio muito mais tardio do progresso da natureza humana ao Estado” (Strauss 1952: 155, fn). Segundo Strauss, é deveras difícil explicar um direito que não pressuponha nenhuma lei anterior e que preceda a todas as leis. Para se compreender o que poderia estar em questão em um tal caso, ele remete a uma formulação de Fichte, segundo o qual o direito original seria um direito absoluto, que se autojustificaria e se autoconstituiria e que, portanto, careceria de qualquer pressuposto anterior: “O direito natural retorna a si e se torna um direito que se autojusfica, autoconstituinte, isto é, um direito absoluto” (Fichte 2000: 108). De fato, Fichte distingue a liberdade pessoal e a autonomia moral. A primeira honra um princípio de livre-arbítrio indeterminado, ao passo que a autonomia moral pressupõe princípios mais substantivos de moral, como o imperativo categórico. Fichte fundamenta o direito original de forma não moral. Para tal, ele distingue a liberdade da pessoa e a sua autonomia moral. A liberdade da pessoa teria o seu fundamento na autoconsciência e não em determinações morais (Fichte 2000: 4). Contudo, ele não segue a tese de Hobbes de que não há liberdade da vontade ou que a liberdade da vontade é irrelevante para tratar da liberdade jurídica. Para Fichte, há uma correlação entre a liberdade da vontade e o conceito de direito. Se houvesse negação da liberdade da vontade não haveria sentido em se falar de direito, defende ele (Fichte 2000: 108). Portanto, Strauss está parcialmente correto ao citar Fichte como uma tentativa de dar significado ao conceito de direito de forma independente de considerações normativas ou morais.
Por conseguinte, o direito natural é o oposto da lei natural. Ainda que ambos possam vir a possuir a mesma finalidade, os meios de realização da mesma serão muito diferentes, pois aquele é liberdade e esta é obrigação. No estado de natureza, onde não há justiça ou injustiça, ele é um direito a tudo, a todas as coisas, incluso aos corpos dos outros. Já, a lei é uma ordem de paz e de autoconservação: ela proíbe matar e se matar. Segundo Schmitt, um direito fundamental é aquele que vale como anterior e superior ao Estado, como esferas de liberdade. O direito de resistência é o meio mais extremo de sua defesa (Schmitt 2003: 169). Por isso mesmo, eles são absolutos, pois não são informados pela lei (Schmitt 2003: 171).
Essa formulação de Hobbes desperta objeções como a de Strauss, de que pareceria algo incompreensível porque pairaria em um vácuo normativo, um vácuo de lei e de obrigação. Assim como Strauss, Finnis também pode ser considerado um outro exemplar desse registro: “Pressionado tanto quanto os objetivos de Hobbes, este contraste entre lei e direitos priva a noção de direitos virtualmente de toda a sua significação normativa” (Finnis 2005: 208). Como bem observa Hart, obrigações sempre tiveram preponderância sobre direitos: “Eles [juristas e outros] têm martelado todos os direitos com dúvidas céticas muito mais pesadas do que deveres ou obrigações” (Hart 2001: 162). Isso explicaria o estranhamento que a teoria de Hobbes propiciaria.

 3. A interpretação de Gauthier das leis naturais (lex naturalis): renúncia de direitos (jus), igualdade de liberdades

Segundo Gauthier e Lloyd, dentre os termos morais fundamentais em Hobbes, o conceito de lei natural, talvez, seja o mais difícil de explicar3. Nesse sentido, Lloyd procede a um detalhado estudo das propostas de fundamentação da lei natural. Ela sumariza quatro propostas de explicação dos fundamentos da lei natural, além de apresentar a sua própria que ela nomeia de interpretação da reciprocidade.
A primeira é a interpretação tradicional baseada no desejo, principalmente no desejo de autopreservação. Essa interpretação teria como defensores, dentre outros, Gauthier, Watkins, Nagel, Kavka, Hampton e Curley (Lloyd 2009: 153). O esquema geral dessa derivação seria o seguinte: “Desejo por autointeresse ou autopreservação + direito naturao => guerra de todos contra todos => desejo por paz => desejo dos meios necessários para a paz + meios necessários para a paz = leis naturais => submissão à autoridade civil” (Lloyd 2009: 153).
O segundo grupo de intérpretes defenderia que a lei natural teria a sua base em um comando divino. Sustentariam essa teoria Taylor, Warrender, Hood e Martinich (Lloyd 2009: 182).
A terceira interpretação é aquela de Gert, baseada na tese de que o dever de autopreservação seria um fim em si mesmo ditado pela razão (Lloyd 2009: 185). A tese de Gert é a de que a razão não seria só uma faculdade formal de cálculo, mas teria um conteúdo necessário, justamente a autopreservação (Gert 2001: 243).
Finalmente, a quarta interpretação é a definicional de McNeilly e Deigh (1996). O característico dessa linha de interpretação é que o intento justificatório não poderia contar com premissas sintéticas, mas só com aquelas analiticamente contidas nas definições dos conceitos (Lloyd 2009: 191, 195): “A interpretação definicional leva a sério o entendimento hobbesiano expresso da ética como uma ciência e sua concepção de ciência como procedente por inferências dedutivas a partir de definições” (Deigh 1996: 59). Para essa concepção, a ética de Hobbes não seria, nem constituída por imperativos categóricos, nem por imperativos hipotéticos. A ética de Hobbes independeria da sua psicologia, sendo sua base uma definição, não a natureza humana.
Tomar-se-á a interpretação de Gauthier como modelar de uma formulação tradicional da lei natural. No seu intento de esclarecer tal conceito, Gauthier começa pelo oferecimento da seguinte definição formal de lei natural:
“‘lei natural’ = ‘preceito que estabelece as exigências da (reta) razão’” (Gauthier 1969: 36).
Por seu turno, a definição material é por ele assim formulada:
“‘lei natural’ M = ‘preceito que estabelece o que é exigido para a preservação’” (Gauthier 1969: 52).
A lei natural estabelece, portanto, preceitos da razão para a finalidade principal posta pela natureza humana, qual seja, a sua preservação e bem-estar. Esta finalidade posta pela natureza, como já mencionado acima, pode ser entendida como uma espécie de inércia: “[...] quando uma coisa está em movimento, permanecerá eternamente em movimento, a menos que algo a pare” (Hobbes 1651: cap. II). Ora, a vida é um movimento, portanto, ela tende a continuar os movimentos vitais até que algo os impeça.
O Leviathan, cap. XIII, trata do estado de guerra característico do estado de natureza. O capítulo XIV, que introduz o conceito de lei natural, começa com a definição do que é o direito natural. Hobbes, então, argumenta que a causa do estado de guerra decorre do exercício do direito natural. No estado de guerra por ele descrito, a vida é miserável e não há injustiça. Ora, a formulação das leis naturais terá justamente conexão com essas duas determinações. Ela é apresentada como alternativa para o estado de guerra, como o seu oposto, a paz, e como restrição ao direito natural como condição da justiça. No Leviathan, a lei natural é definida de forma contrária ao direito natural, como sua negação, cujo desrespeito tem como consequência o estado de guerra. O oposto ao estado de guerra, a paz, depende da limitação do que ocasiona o estado de guerra, a saber, o direito natural a todas as coisas. Os termos de tal limitação serão determinados justamente pela lei natural.
No estado de guerra, três paixões conspiram para a paz: o medo da morte, o desejo de conforto e a esperança de consegui-lo pelo trabalho. Fica claro que aquilo que a razão sugere como remédio para tal estado são normas de paz: “E a razão sugere adequadas normas de paz” (Hobbes 1651: cap. XIII). Paz é a restrição de direitos para a convivência. Destarte, o cap. XIV do Leviathan sustenta que a lei natural é a norma que proíbe fazer o que seja destrutivo à vida ou omitir o que possa contribuir para preservá-la. A primeira lei ordena buscar a paz para viver todo o tempo que a natureza permite viver. A segunda lei ordena a renúncia ao direito a todas as coisas para sair do estado de guerra. Especificamente com relação a essa lei, Hobbes apela à regra de ouro como critério para tal renúncia. A terceira lei ordena que se cumpram os pactos firmados. Por fim, ele esclarece que as leis naturais são aquelas que tratam das normas que estabelecem a paz como meio de conservação das multidões, meios para uma vida pacífica, sociável e confortável. Portanto, não são pertinentes ao caso as leis que sejam meios para a conservação do indivíduo. Em suma, assim compreendidas, elas seriam conclusões ou teoremas relativos ao que contribui para a conservação e a defesa de cada um (Hobbes 1651: cap. XVI).
A justificação que Hobbes oferta, no Leviathan, para quase todas as leis naturais é que a desobediência das mesmas levaria ao estado de guerra. “A razão, governada e tornada razoável pelo medo da morte violenta, recomenda regras ou leis que, se obedecidas, irão resgatar o homem da condição natural, isto é, das implicações que se seguem de seu próprio desejo e medo não mediados” (Herbert 1994: 60). Se no Leviathan o argumento parece ser o de que não seguir as leis naturais conduziria ao estado de guerra, nos Elements e no De Cive é destacada a natureza de tais leis de serem normas de paz. De fato, nos Elements ele afirma que aquilo que for contrário à paz será também contrário à lei de natureza (Hobbes 1640: cap. 16, §10). Por exemplo, o reconhecimento da igualdade, exigida pela segunda, pela nona e pela décima leis de natureza, é justificada em razão da paz (Hobbes 1640: cap. 17, §1). No mesmo sentido, no De Cive, a lei natural é posta como condição da sociedade, da paz humana4.
Deveras, o direito de todos a todas as coisas não é melhor do que se não houvesse direito a coisa alguma, devido ao estado de guerra:

O benefício, para cada um, de sua própria liberdade não restringida é menos do que o custo da liberdade não restringida dos outros; é, portanto, uma boa barganha para cada um aceitar limites para a sua própria liberdade em troca da aceitação pelos outros de restrições similares às suas liberdades. (Gauthier 2001: 265-6)

A ordem da razão, portanto, é sair do estado de guerra, por causa da incerteza que afeta não só a vida, mas também a outros bens. O que caracteriza o estado de guerra é basicamente a incerteza com relação aos seus resultados: “Um estado geral de incerteza sobre os objetivos e intenções dos outros caracteriza o estado de natureza, de tal forma que uma preocupação pela nossa autopreservação força-nos a considerar as piores possibilidades” (Rawls 2007: 50). Segundo Hobbes, na incerteza da guerra, a vida do homem é solitária, pobre, sórdida, embrutecida e curta.
O argumento decisivo que Hobbes movimenta contra o louco em relação à terceira lei natural também pode ser analisado como sendo uma formulação da incerteza. Segundo Kavka, o argumento contra o louco mostra que o critério de racionalidade em Hobbes não é nem utilitarista e nem é uma análise caso a caso, mas é uma consideração da propriedade da regra de ser um meio de autoconservação (Kavka 1995: 21). O cerne do argumento, para ele, reside na noção de incerteza. Nesse sentido, esclarece, seriam quatro os elementos que caracterizam a racionalidade baseada na incerteza defendida por Hobbes no argumento contra o louco. Em primeiro lugar, o raciocínio seria sempre prospectivo (forward-looking), ou seja, o adimplemento de um contrato no presente seria sempre avaliado como um “meio para assegurar confiança e cooperação futuras por parte de outras pessoas” (Kavka 1995: 21). Em segundo lugar, as escolhas seriam feitas sob condição de incerteza, ou seja, os resultados que possivelmente adviriam das escolhas caso a caso não estariam disponíveis (Kavka 1995: 21). Em terceiro lugar, o jogo “jogar seguro sob incerteza” seria diferente de um cálculo de utilidade caso a caso:

É racional jogar seguro sob incerteza e evitar arriscar resultados muito ruins na esperança de obter ganhos incertos. Em particular, é irracional arriscar o ostracismo social pelo cometimento de uma violação ofensiva a uma regra moral fundamental (isto é, a lei natural) na esperança de obter ganhos relativos pequenos e incertos que poderiam advir de não ser pego por tal violação. (Kavka 1995: 21-22)

Portanto, o louco argumentaria a partir do benefício caso a caso e Hobbes responderia em termos de longo prazo. Em quarto lugar, seguir regras rigidamente, a longo prazo, seria mais seguro para a autoconservação:

Prevenção (ou seguir regras rigidamente) é racional no seguinte sentido: provavelmente alguém ficará melhor, em geral, seguindo rigidamente as regras morais principais em vez de pelo cálculo de riscos aceitáveis em ocasiões particulares, porque os erros e preconceitos de tais cálculos tenderão a levá-lo a tomar riscos excessivos em casos particulares. (Kavka 1995: 21-22)

Em suma, “visto que os benefícios da violação são incertos e os riscos de falha são graves, é racional, em termos puramente calculativos, jogar seguro e seguir a terceira (ou outra) lei natural em geral benéfica” (Kavka 1995: 23). Darwall também argumenta nesse mesmo sentido da incerteza (Darwall 1995: 76).
Desse modo, o jogo “jogar seguro sob incerteza” explica não só por que é racional cumprir os contratos no estado civil, mas também por que é racional fazer a guerra no estado de natureza, pois se tratam de perspectivas de sobrevivência a longo prazo sob circunstâncias diferentes: no estado de natureza tal perspectiva é quase zero, mesmo fazendo a guerra, ao passo que no estado civil é uma perspectiva alta.5 Decorre disso que o cumprimento dos contratos ditado pela terceira lei natural, incluso aí o contrato social, é posto como condição para a autoconservação e para a paz.
A incerteza advém da peculiar conjunção dos predicados da liberdade e da igualdade. Se os homens fossem livres, mas desiguais em força, não haveria estado de guerra de todos contra todos e nem haveria insegurança quanto ao resultado, pois o mais fraco não se arriscaria a desafiar o mais forte, sendo que, então, este dominaria naturalmente sobre os mais fracos. É nesse sentido que a saída do estado de natureza implica ter que renunciar a certas liberdades para que se constitua um poder soberano mais forte do que as partes, ainda que as leis de natureza, que certamente não obrigam o soberano, orientem-no, ordenem-no, a estabelecer a igualdade entre os súditos, como um meio para a paz. Ou seja, um sistema coercitivo é dependente da igualdade (Hart 1994: 198-199).
Liberdade e igualdade são predicados dos corpos humanos no estado de natureza, mas são assimétricas, porque a igualdade só se revela como um resultado das ações livres, ao passo que a liberdade é reconhecida já no uso do poder dos corpos. A igualdade só se mostra ao final, independentemente da diferença de poder de cada corpo, diferença esta irrelevante quanto a um resultado possível que a todos iguala, a morte. Assim, é a igualdade que movimenta a razão a ordenar a restrição da liberdade, de tal forma que o característico da razão é ser movimentada pela igualdade dos corpos. Tal determinação ela a conserva como métrica da própria lei natural que ela engendra. Se a liberdade é o que o corpo porta e a igualdade é o que se mostra pela morte do corpo, que só se efetiva pela sua consumação, entende-se por que a razão ordena a igualdade do uso do poder dos corpos, de tal forma que aquilo que torna igual os corpos não se efetive. A igualdade, portanto, é muito mais uma virtualidade que o próprio Hobbes afirma que a lei natural ordena seja reconhecida: “Portanto, se a natureza fez todos os homens iguais essa igualdade deve ser reconhecida” (Hobbes 1651: cap. XV). Já, a liberdade é uma efetividade, a não ser que o corpo se encontre a ferros. A igualdade acontece em uma possibilidade que se antecipa: da morte que a todos iguala à possibilidade de morrer. Assim, o que torna os corpos iguais é uma virtualidade. Logo, a igualdade da liberdade determinada pela lei natural é uma restrição à liberdade de uso do poder dos corpos, de tal forma a evitar o resultado derradeiro que a todos iguala. Desse modo, entende-se por que a igualdade é um predicado do estado do homem, do seu status, porque ela é uma determinação que opera na lei natural como disciplina da liberdade no uso dos corpos. A igualdade é exigida pela lei natural porque se mais alguém, além do soberano, restasse tão livre quanto é livre no estado de natureza, a paz não seria alcançada. Ora, como a igualdade só se mostra no estado de natureza pela morte, ela tem que ser antecipada como restrição imposta a todos para evitar tal resultado. Súdito é justamente aquele sujeito à vontade do poder soberano que a todos iguala no exercício da liberdade. Portanto, é um estado do homem. É a esse estado que a lei natural ordena a igualdade.
Interessantemente, Hart, quando apresentou o conteúdo mínimo da lei natural, fê-lo mediante a formulação de cinco truísmos: vulnerabilidade humana, igualdade aproximada, altruísmo limitado, recursos limitados, entendimento e força de vontade limitados. O interessante é que ele destaca a importância da igualdade para a explicação da necessidade do sistema jurídico (Hart 1994: 195).
A declaração da liberdade no Leviathan é uma aparição fugaz condenada à restrição pelos laços da igualdade da lei natural e civil. Aquilo que efetiva a igualdade é o medo da morte. O medo da morte é o início da sabedoria. Se o resultado pode ser o mesmo para todos os corpos, pouco importa a diferença de poder nos cálculos da razão de cada um, haja vista a igualdade dos corpos ser a possibilidade certa do fato da morte. Ao final, a liberdade é um direito contra a igualdade que a lei natural ordena como restrição, como contentamento pelo que é o mesmo. Para que a igualdade não se realize de forma trágica, como morte do corpo, que é o que a todos iguala, ela precisa se antecipar na disciplina das liberdades que ela restringe para todos. Em suma, a liberdade está a serviço da vontade, pois é um direito de usar do poder corporal como quiser. A igualdade está a serviço da vida, pois é na vida nua que ela se revela. Para Hobbes, a liberdade é dada, já a igualdade se revela como resultado das ações livres, do direito de todos a todas as coisas. Precisa-se de leis não por causa da liberdade, mas por causa da igualdade. A gravidade dos efeitos colaterais do funcionamento das liberdades mostra a necessidade de que a igualdade seja considerada. Tal consideração só pode se realizar como uma restrição da liberdade de todos. É isso justamente o que ordena a segunda lei de natureza. Eis por que lei e liberdade não podem senão se opor entre si, haja vista as determinações da igualdade serem contra a liberdade, pois as pessoas diferem em como querem usar as suas faculdades corporais. Vale anotar que a verdadeira liberdade do súdito, segundo o cap. XXI do Leviathan, não é a que se realiza pela lei natural; não, ela se realiza mediante aquilo que não pode ser renunciado frente aos ditames da lei natural.
O direito natural, que se autoconstitui de forma prévia e independente de qualquer lei, tem como seu elemento básico justamente a liberdade. É o funcionamento do direito natural que ocasiona o estado de guerra, no qual o predicado da igualdade ganha destaque de forma trágica. A resolução do problema também não deixa de ser trágica, já que a conjugação de ambos os predicados, para Hobbes, não é harmônica, mas conflitiva. Bentham bem registra tal caráter conflitivo:

A proposição, ainda que quase autoevidente, de que toda lei é contrária à liberdade, não é geralmente reconhecida: ao contrário, os zelotes da liberdade, de forma mais ardente do que esclarecida, construíram uma consciência de combate a ela. E como eles fizeram isso? Eles perverteram a linguagem e não irão empregar essa palavra segundo a sua aceitação comum. Eles falam uma linguagem que não pertence a ninguém: eles dizem, Liberdade consiste no poder de fazer cada coisa que não fere outro. Porém, é esse o sentido corriqueiro dessa palavra? A liberdade de fazer o mal, não é liberdade? Se não é liberdade, o que ela é, então? E de qual palavra deveríamos nos fazer uso ao falar disso? Não dizemos nós que a liberdade deve ser retirada das pessoas loucas e más porque elas abusam dela? (Bentham1838-1843: 542)

Como frisado, o exercício do direito natural, segundo a razão de cada um, tem como resultado o estado de guerra, por isso a lei natural ordena limitá-lo e ordena assumir algumas obrigações recíprocas para evitar tal resultado belicoso. Segundo Gauthier, “assim, Hobbes pretende erigir uma moralidade objetiva a partir das ruínas da prudência subjetiva” (Gauthier 1969: 90). Da liberdade que se determina pela métrica do apetite e da aversão há que se progredir para um ponto de vista comum a todos. Contudo, há que se chegar a tal determinação a partir da perspectiva de apetite e aversão de cada um:

Mesmo que o seu sistema moral providencie um ponto de vista comum para todos os homens, ainda assim cada homem tem de ver o que é comum como o resultado de sua própria preocupação particular com a sua própria preservação e bem-estar. Desse modo, cada novo passo no argumento é justificado para cada homem em termos de seu próprio bem. (Gauthier 1969: 90)

Ora, a aversão pela morte faz com que a preservação seja um interesse que todos têm, o que permite à razão formular normas de paz: “As leis naturais são máximas para a preservação do indivíduo, porém, elas se aplicam para cada indivíduo. Se cada homem se preservar a si mesmo, então, todos homens —a sociedade— serão preservados” (Gauthier 1969: 90).

 4. A relação entre direito natural e lei natural

Como visto acima, a lei natural proíbe as liberdades que geram a guerra, por exemplo, o homicídio, ordena atos para a paz, como o pagamento de tributos para manter uma força pública, e permite as demais liberdades. A discussão, em Hobbes, da relação entre a lei natural e o direito natural se assemelha àquela de quem veio antes ou ovo ou a galinha: “há uma controvérsia do tipo quem veio antes o ovo ou a galinha sobre se os direitos naturais são derivados da lei natural ou se a lei natural é derivada dos direitos naturais e que escritos essas tentativas de derivação têm lugar” (Curran 2007: 135). Tradicionalmente, pelo menos até Hobbes, em geral, a lei natural precedia o direito natural, sendo este derivado daquela, sendo Locke, para alguns, um típico exemplar dessa posição: “A teoria dos direitos de Locke é uma teoria dos direitos naturais com uma base de lei natural tradicional” (Curran 2007: 125), do que seria evidência a sua afirmação de que o estado de natureza é governado pela lei natural: “O estado de natureza tem uma lei natural que o governa” (Locke 1689: cap. 2, §6). Para o caso de Locke, defendem essa interpretação Curran, como visto, bem como Rawls (Rawls 2007: 118). Sem embargo dessa clássica interpretação, há quem discorde dela, como Zuckert, para quem, na filosofia de Locke, o fato primitivo residiria em o homem ser proprietário de si mesmo, de tal forma que ninguém teria um direito à sua pessoa, senão ele mesmo. É disso que ele derivaria a lei natural. Portanto, a lei natural é que seria derivada do direito natural e não vice-versa (Zuckert 1997: 695-733): “Contrariamente à impressão inicial, direitos não são derivados da lei natural, mas de algum modo independente dela” (Zuckert 1998: 272). Zuckert se baseia na seguinte afirmação de Locke para comprovar a sua tese: “todo homem tem uma propriedade em sua própria pessoa: a ela ninguém mais tem qualquer direito a não ser ele mesmo” (Locke 1689: cap. 5, §27). Segundo a sua interpretação, é essa tese de Locke que faz toda a diferença de seu pensamento em relação àquele de Hobbes: “Onde Hobbes afirma não haver propriedade natural ou um direito sem dever correlativo, Locke insiste na propriedade natural e, assim, na justiça natural” (Zuckert 1998: 276). Desse modo, se para Hobbes não há justiça no estado de natureza, porque não há o seu (own) de ninguém, pois este só é instituído pelo legislador, para Locke há justiça natural porque pelo menos um seu (own) existe no estado de natureza, qual seja, a propriedade de sua própria pessoa.
Seja como for, o modelo de Hobbes seria justamente o oposto deste que derivaria o direito natural da lei natural: “A teoria dos direitos de Hobbes não é uma teoria dos direitos naturais com a sua base na lei natural como a teoria muito mais famosa e celebrada de Locke” (Curran 2007: X). Nesse sentido, segundo a interpretação clássica de Strauss, a lei natural seria derivada do direito natural: “As duas inovações fundamentais que devem ser atribuídas a Hobbes, a subordinação da lei ao direito e o reconhecimento da significação plena da ideia de soberania, estão intimamente ligadas” (Strauss 1952: 158). Por isso mesmo Strauss considera Hobbes como o fundador da filosofia política moderna (Strauss 1952: VII). Tal caráter inovador adviria justamente da interpretação de que Hobbes derivaria a lei natural do direito natural.
De acordo com a interpretação de Strauss, a lei natural é uma consequência necessária do direito natural: “A ‘lei natural’ deve toda a sua dignidade simplesmente à circunstância de que é a consequência necessária do ‘direito natural’” (Strauss 1952: 155). Segundo ele, a lei natural anterior tinha por base a excelência humana, a busca de sua perfeição. Hobbes, diferentemente, alicerçaria a lei natural naquilo que mais predomina no ser humano, a sua paixão. Melhor dito, a lei natural deve ter por base a mais poderosa de todas as paixões, ou seja, aquela da autoconservação ou do medo da morte (Strauss 1965: 179-180). Segundo Strauss, o Estado se funda no direito à autoconservação, sendo a lei uma mera conseqüência (Strauss 1952: 157), haja vista ele subordinar a lei a tal direito (Strauss 1952: 158). O fato moral fundamental para Hobbes seria um direito, não um dever: “todos os deveres são derivados do direito inalienável e fundamental à autopreservação” (Strauss 1965: 181). Isso o leva à conclusão de que as leis de natureza não seriam propriamente leis, já que a sociedade e o próprio conceito de dever seriam caudatários da noção de direito (Strauss 1965: 181). Se a lei natural for interpretada desse modo, certamente, ela não passaria de um corolário do direito natural: “A lei natural assim entendida é meramente o corolário do direito natural hobbesiano” (Zuckert 2006: 63). Desse modo, a sua filosofia fundamentaria um individualismo radical e, por esta razão, ele seria não só o fundador da filosofia política moderna (Strauss 1952: 157), mas também o fundador do liberalismo: “se nós podemos chamar liberalismo aquela doutrina política que olha os direitos do homem como o fato político fundamental, como distintos dos deveres, e que identifica a função do Estado com a proteção ou a salvaguarda de tais direitos, nós devemos dizer que o fundador do liberalismo foi Hobbes” (Strauss 1965: 181-2).
Essa interpretação de Strauss, segundo a qual Hobbes derivaria a lei natural do direito natural, tem problemas. Primeiro, há que se verificar se a definição de direito natural tal qual apresentada por Strauss é a mais acurada. Para que a dedução da lei natural a partir do direito natural funcionasse, este último teria que ser definido pela autoconservação. Certamente, como visto acima, uma tal interpretação tem base sólida no pensamento de Hobbes. Para alguns, a autoconservação é como um fato físico, inerente a todos os corpos, vis-à-vis da vida não ser mais do que um movimento: “[...] a vida não é mais do que um movimento dos membros” (Hobbes 1651: introd.]. Segundo Barboza Filho, o movimento é uma característica física de todos os corpos. Ora, todo movimento exige energia para se manter, portanto, isso “faz parte da definição de que é ser uma coisa distinta e identificável” (Barbosa Filho 1991: 64). Desse modo,

Hobbes reconheceu não haver contradição entre a ideia de que os homens possuíam um direito natural de autodefesa e a ideia de que eles estavam sujeitos a restrições em suas condutas, como as estabelecidas pelas leis naturais. Pois, é evidente que, para Hobbes, o fim para o qual se pressupunha que os homens exerciam o seu direito natural, a saber, a sua defesa e preservação, permanecia como um fim que ele considerava que os homens assegurariam melhor por meio da sua ação em conformidade com os princípios fundamentais da paz, tais quais estipulados pelas leis naturais. (Covell 2004: 19)

Sem embargo dessas afirmações, Hobbes não define o direito natural como autoconservação. No início do XIV do Leviathan há três formulações do direito natural:

i) é a liberdade que cada homem possui de usai seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida;
ii) direito consiste na liberdade de fazer ou de omitir;
iii) a suma do direito de natureza, isto é, por todos os meios que pudermos, defendermo-nos a nós mesmos.

Como se pode perceber, em duas das referências há conexão com a autoconservação. Não obstante, a diferença específica do direito natural aparece na comparação que Hobbes faz entre ele e a lei natural. Pelo menos duas citações são importantes para isso, a primeira do cap. XIV do Leviathan e a segunda do De Cive, já citada acima: “De modo que a lei e o direito se distinguem tanto como a obrigação e a liberdade, as quais são incompatíveis quando se referem à mesma matéria” (Hobbes 1651: cap. XIV); essa reformulação do direito natural clássico já tinha sido sugerida por Grotius, que estabeleceu três sentidos para o termo direito: primeiro, como o que é justo; segundo, uma faculdade ou poder que se tem sobre si mesmo, chamada de liberdade; terceiro, como a lei que nos obriga a fazer o que é apropriado (Grotius 2001: livro I, caps. 1, III, V e IX, respectivamente).6 “Há portanto uma grande diferença entre lei e direito —porque a lei são grilhões, enquanto o direito é liberdade, e por isso se diferenciam como dois contrários” (Hobbes 1642: cap. XIV, §III).
Ora, como se pode claramente perceber, é a lei natural que porta conexão com a autoconservação. Portanto, se ele opõe direito e lei é porque aquele não pode ser definido pela autoconservação. Se tomarmos essas duas referências em conjunção com a sua definição de liberdade, pode-se perceber que para a tese da identificação do direito com a autoconservação fazer sentido, a liberdade deveria ser definida como uma função da autoconservação, mas ela não é, como se pode vislumbrar pelas citações seguintes:

Por liberdade entende-se, conforme a significação própria da palavra, a ausência de impedimentos externos. (Hobbes 1651: cap. XXI)

Há portanto uma grande diferença entre lei e direito —porque a lei são grilhões, enquanto o direito é liberdade, e por isso se diferenciam como dois contrários. (Hobbes 1642: cap. XIV, §III)

Conformemente a este significado próprio e geralmente aceite da palavra, um homem livre é aquele que, naquelas coisas que graças a sua força e engenho é capaz de fazer, não é impedido de fazer o que tem vontade de fazer. (Hobbes 1651: cap. XXI).

Essas referências comprovam que a autoconservação não é mencionada na definição da liberdade. São mencionados os impedimentos externos ao movimento, bem como a vontade (will to doe). Desse modo, pode-se concluir que o direito é definido como a liberdade de usar do poder que cada um tem do modo que quiser, inclusive para a autopreservação. Dito claramente, o direito é liberdade e não autoconservação. Autoconservação é uma das possibilidades da liberdade. Ou seja, o homem pode usar livremente do poder que dispõe para qualquer finalidade. Obviamente, a finalidade principal para a qual o poder é usado é para a autoconservação.
Por seu turno, a lei natural é uma regra que proíbe fazer o que destrói a vida de alguém ou proíbe omitir o que a preserva. Portanto, a lei não pode ser derivada do direito, como sustenta Strauss, nem vice-versa. Não obstante, ambas podem se sobrepor na finalidade da autoconservação. Ou seja, a liberdade do direito natural pode querer a finalidade da autoconservação. Contudo, em um caso a razão indicará a paz e em outro caso a guerra. Por isso, Tierney retoma a argumentação do De cive, na qual Hobbes opõe lei e direito, para contestar Strauss, já que não se poderia derivar grilhões a partir da liberdade (Tierney 2002). Nesse sentido, lei e direito se sobrepõem quando se trata da autoconservação, de tal forma que Hobbes não viu qualquer problema em juntar a ambos, lei e direito, em uma regra geral da razão que ordena a autoconservação, ainda que por meios diferentes, pela paz e pela guerra, a depender das circunstâncias. Ou seja, a lei contradita o direito, mas este pode ter como objetivo exatamente aquilo que a lei objetiva, a autoconservação, o que não significa que o direito seja fundamentado nessa finalidade.
Em suma, a lei natural não é deduzida do direito natural, mas da razão como uma faculdade que calcula meios. Direito e razão são predicados distintos para Hobbes. Aquele é definido como liberdade; esta como uma faculdade de calcular: “Pois razão, neste sentido, nada mais é do que cálculo” (Hobbes 1651: cap. V). Ora, a lei natural, afirma Hobbes, é um preceito ou regra geral da razão (Hobbes 1651: cap. XIV). Logo, forçoso concluir que lei natural e direito natural são determinações distintas. Ela é uma regra da razão; ele é liberdade.
Tierney argumentou que o impasse enfrentado por Hobbes em relação à oposição entre direito natural e lei natural poderia ser equacionado pela recuperação de um sentido de lei natural por ele obliterado, qual seja, aquele de uma permissão. Justamente essa lei permissiva é que funcionava, antanho, como fundamento do direito, por exemplo, do direito de propriedade. Para ele, Kant teria usado dessa formulação para dar conta precisamente do direito de propriedade (Tierney 2001).7 Sem embargo dessas formulações, ele alega que a razão pela qual Hobbes teria obliterado o mencionado sentido de lei natural se deveu à sua teoria da soberania. Sabidamente, pelo contrato social, todos renunciam ao seu direito natural a todas as coisas, menos o soberano, o qual continua tão livre quanto antes, sem nenhum vínculo obrigacional com os súditos, ou seja, há contrato entre os súditos, mas não destes com o soberano. Ora, se o direito natural fosse construído mediante o conceito de uma lei natural permissiva, isso implicaria que ao direito de alguém corresponderia o dever de um outro de respeitá-lo, justamente o que Hobbes não pode aceitar no caso da soberania, pois esta só tem sentido para ele se for absoluta, ou seja, se tiver a decisão final em todas as matérias sobre as quais houver conflito. Nesse sentido, ele sustenta que Locke seria justamente um exemplar diacrônico da teoria que Hobbes rejeitara.
Portanto, esse caminho da concepção de lei natural como permissão não parece promissor. Ainda que direito natural e lei natural possam manter relações, um não pode ser corolário do outro. O ponto é como unir duas determinações que Hobbes ao mesmo tempo opôs como definição, mas uniu sob uma regra geral da razão, ainda que uma união sob a forma de uma disjunção ou/ou. Isso ocorre porque ambas, paz e guerra, são tratadas como meios que a razão prescreve em relação a um fim específico em circunstâncias diferentes. Portanto, a razão ordena que, em não havendo paz que garanta a vida, ela pode ser preservada por outros meios, a saber, usar para essa finalidade do poder que cada um tem, particularmente a guerra, o que de fato ocorre no estado de natureza. Assim, a mesma razão que ordena a paz, permite também o uso do poder de cada um para a guerra: “A natureza deu a cada homem o direito de se proteger com sua própria força, e o de invadir um vizinho suspeito a título preventivo, e a lei civil tira essa liberdade, em todos os casos em que a proteção da lei pode ser imposta de modo seguro” (Hobbes 1651: cap. XXVI). É esse direito da guerra preventiva que a lei geral da razão permite. Porém, direito e lei não são deriváveis um do outro, mas ambos podem se sobrepor em razão de algo que pode vir a ser comum. Ou seja, se o direito natural é liberdade, pode-se dizer que, se houver uma deliberação da vontade de usar do poder que ela dispõe para a autoconservação, esta se torna um direito, haja vista ser um desdobramento da própria liberdade. Assim, à proposição de que o direito de autoconservação é primevo, “O direito à autopreservação é o primeiro direito natural e tem precedência sobre todo outro” (Williams 2003: 69-70), se deve dar uma interpretação conforme à tese da deliberação da vontade, no sentido de que é aquilo que geralmente predomina na deliberação da mesma. Em geral, a aversão última é aquela da morte. Contudo, o resultado será bem diferente a depender das circunstâncias. No caso da autoconservação ser buscada na ausência do Estado, o meio que a razão indicará será a guerra, mas, esta não é a única forma de buscá-la, nem, quiçá, a melhor, consideradas todas as circunstâncias, quando, então, a razão indicará a paz e a concórdia entre os homens como um meio mais eficaz para tal finalidade.

O pensamento da oposição entre a liberdade do direito natural e a igualdade natural marcará boa parte da discussão política posterior a Hobbes, não só a do liberalismo, mas também a do marxismo. Vale registrar que uma pretensa harmonia de ambas está longe de ser realizada (ver Dworkin 2000: 4-5).

NOTAS

1. Ver a esse respeito Volpato Dutra 2011a: 108-124 e Volpato Dutra 2011b: 439-453.
2. Para uma interpretação discordante desta ver Limongi 2009: 181-193.
3. Gauthier 1969: 35; Lloyd 2009: 100.
4. Hobbes 1642: cap. I, §1; cap. III, §I.
5. Por isso, não há sistema coercitivo internacional, pois há muitas disparidades entre os Estados, o que
explica por que se quer o controle da tecnologia sobre as armas atômicas (Kavka 1995: 23).
6. A esse respeito ver Volpato Dutra 2011b.
7. Ver também a esse respeito Volpato Dutra 2010: 147-164.

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Recibido: 08-2013;
aceptado: 05-2014

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