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Sociedad y religión

versão On-line ISSN 1853-7081

Soc. relig. vol.29 no.51 Ciudad Autónoma de Buenos Aires jan. 2019

 

Entrevistas

“Tórnate lo que tú eres”: sobre la indisociabilidad entre religión y familia. Entrevista de Agustina Adela Zaros

Luiz Fernando Dias Duarte1 

1PPGAS/Museu Nacional/ UFRJ, Brasil

Luiz Fernando Dias Duarte llega puntualmente al encuentro en el Museu Nacional. Antes de comenzar la entrevista abre la ventana de su estudio que da al Jardín de las Princesas de la que era la Casa de Pedro II. Desde allí entrará un aire fresco, en la calurosa Rio de Janeiro, cuya brisa se escuchará durante toda la entrevista. Encima de su computadora sobre la pared hay un retrato de una mujer mayor vestida de blanco que mira a la cámara: es la matriarca de la familia que el antropólogo “acompaña” desde hace cinco generaciones. Fue una de sus principales informantes en Jurujuba, cuando comenzó a estudiar a las clases trabajadoras. Entre los libros distribuidos en estanterías que decoran el estudio se puede ver otra foto con sus estudiantes tomada en el patio interno del edificio, uno de los espacios más elegidos para las fotos grupales por diversas cohortes de estudiantes de maestría y doctorado en Antropología Social de esa institución.

En esta conversación el autor recorrerá su trayectoria académica, describirá cómo fue formarse durante la dictadura brasileña, los intereses de investigación que lo guiaron y los nuevos desafíos en los estudios de familia y religión.

La unidad de análisis objeto de la entrevista es la familia y los diferentes ejes que la atraviesan son la transmisión intergeneracional, el trabajo, las adicciones, la psicología y los proyectos de persona.

Sin embargo, esta entrevista -realizada en noviembre de 2017- cobra nuevos sentidos tras el incendio al Museu Nacional el año pasado, con el resultado de la pérdida de la mayor parte de la colección de objetos, obras de arte, libros e investigaciones, como consecuencia de los sucesivos recortes presupuestarios sufridos por la institución y la falta de políticas para preservar la memoria de dos siglos de historia latinoamericana.

A.Z: quais são os momentos mais importantes da sua trajetória como pesquisador?

L.F.D.D: Eu descobri a Antropologia um pouquinho tarde, em relação à idade com que hoje as pessoas entram na carreira. Eu não tinha feito ciências sociais, tinha feito direito, queria fazer a carreira diplomática. Mas isso era no começo dos anos 1970, em plena ditadura militar. Em um determinado momento desisti da carreira diplomática, pois não tinha condições de servir ao governo naquelas condições. E aí comecei a ver o que queria fazer, porque direito eu fazia só pro-forma; não tinha intenção de me tornar advogado. Então decidi fazer um curso de comunicação que era muito prestigioso na época, com intelectuais importantes e que me abriram o escopo para a leitura de Lévi-Strauss e de outros autores que fizeram sentido naquela época para mim (Bachelard, Bergson, Heidegger, Marx, etc.). Tinha uma influência muito forte do marxismo. Estou falando do começo dos anos 1970 e brilhava naquele ambiente o que se chamava naquela época de freudo-marxismo, muitas tentativas de fazer conexões entre a psicanálise e o marxismo. Foucault, já aparecia; mas o grande eixo era Louis Althusser, eram as novas leituras depois chamadas de “marxismo estruturalista”. Por outra circunstância de vida conheci as teses que eram feitas aqui no Programa de Antropologia Social, que era um programa recente na época – ele havia começado em 1968. Eu entrei no ano de 1974, já loucamente interessado pela antropologia, com as teses que havia lido, inclusive a tese da minha orientadora de mestrado Lygia Sigaud, que já faleceu. Fiz a seleção em 1973 e passei. Um momento crucial foi essa decisão de largar uma série de outras possibilidades de vida e me dedicar à antropologia. Ter conseguido passar aqui naquela seleção foi crucial, se não tudo teria sido diferente. Outro momento importante foi, no final do mestrado, no começo do doutorado, a minha conversão do marxismo a uma espécie de estrutural-culturalismo. O Sahlins tinha acabado de publicar Cultura e Razão Prática, que inicialmente me chocou muito, mas me fez começar a perceber coisas que não estava até então compreendendo. Um professor que esteve de visitante naquela época no Programa, Luiz Tarlei de Aragão, também já falecido, trouxe-nos o pensamento de Louis Dumont, as teorias de Louis Dumont, de que ele tinha sido aluno e orientando na França. Eu me encantei muito com as teorias de Dumont, e aí comecei o doutorado com Gilberto Velho, um personagem muito importante em minha carreira, que fazia uma conexão entre Dumont, de um lado, essa espécie de estrutural-culturalismo do Dumont, como eu às vezes chamo, e a antropologia norte-americana herdeira da Escola de Chicago, da Cultura e Personalidade, do interacionismo simbólico particularmente. Gilberto era muito amigo de Howard Becker, que esteve aqui como professor[3], e a inspiração paternal de Georg Simmel pairava no ar. Esse foi o ambiente do qual me nutri ao longo do doutorado.

A.Z: quantas pessoas faziam doutorado nessa época? Quantos colegas você tinha?

L.F.D.D: Na minha turma de mestrado éramos onze. Também estavam ali Regina Novaes, Eduardo Viveiros de Castro, Roberto Kant de Oliveira. Mas na de doutorado não tenho certeza; devia ser uma coisa por aí, uns 12. Já era bastante. Era um programa muito concorrido, ainda estávamos num ambiente muito marcado pela ditadura, os diversos outros centros de ciências sociais tinham sido arrasados pela repressão. Esse é um tema que foi muito trabalhado por nós aqui, o quanto é curioso que o Programa tinha sido criado no ano de 1968, um ano terrível, o ano do Ato Institucional número 5 (AI-5). Foi um ano de agravamento da ditadura iniciada em 1964. Foi em 1968 que se fechou totalmente o regime. As universidades foram duramente penalizadas, mas a antropologia no Museu Nacional estava nascendo. Acho que o Museu parecia uma coisa meio exótica, distante; as pessoas não perceberam bem o que estava acontecendo aqui. Nós conseguimos sobreviver e constituir aqui uma espécie de think-tank, um banco de cérebros que aos poucos foi construindo uma espécie de contra-discurso da ditadura. Nós conseguimos o apoio de frações das instituições de apoio à pesquisa que eram críticas do regime e de suas opções econômicas, sobretudo.

A.Z: então tinham financiamento?

L.F.D.D: Nós conseguimos financiamento para fazer coisas que eram totalmente contrárias ao regime. A minha dissertação de mestrado foi uma dissertação fundamentalmente marxista sobre o trabalho na pesca, a exploração dos trabalhadores na indústria sardinheira de Niterói, aqui do lado de Rio de Janeiro. E como o meu trabalho, boa parte dos demais trabalhos eram feitos nesse clima intelectual, nesse ritmo crítico. Um movimento muito forte foi o dos colegas que foram estudar no Nordeste, a situação social de onde provinha o grosso da migração rural-urbana que estava transformando o perfil demográfico do país. Estudaram as condições da expulsão do campo, as condições de exploração que tinham feito com que, de uma hora para outra, o Brasil tivesse passado de um país com maioria de população rural a um país com maioria de população urbana. A grande transição demográfica dos anos 1960-70. Esse ambiente de trabalho era muito instigante, muito estimulante. Embora eu tenha me aproximado mais então dos não marxistas, os marxistas me abriam o caminho para a influência forte de Pierre Bourdieu, que praticava um marxismo peculiar, misturado com M. Weber, com o estruturalismo etc. E do outro lado havia essa presença maior de Dumont. Mas compartilhávamos as influências clássicas da antropologia como um todo, pois havia um interesse muito grande em oferecer uma formação abrangente para todos os alunos. Que se lesse de tudo e que não houvesse tabus acadêmicos na formação de cada um de nós. Cada um ia seguir seu rumo, mas se ensinava todos os tipos de antropologia que existiam na época. Isso foi realmente muito estimulante. A minha tese de doutorado foi um pouco peculiar, porque eu era orientando de Gilberto Velho, que trabalhava com antropologia urbana e com classes médias, o que ele chamava de “aristocracia das camadas médias”, que eram os segmentos letrados, altamente cultivados, das elites urbanas. E ele orientou muita gente nessa área, que hoje está à nossa volta, dando continuidade àqueles ensinamentos (Gilberto Velho orientou exatamente 100 teses e dissertações). Mas eu comecei a trabalhar com uma população operária, um grupo popular, ainda que na perspectiva estrutural-culturalista do Dumont.

A.Z: era o mesmo grupo do mestrado?

L.F.D.D: Era o mesmo bairro, mas acrescentei também um outro bairro, longe de lá, como contraste, para comparação; e fiz outras incursões de pesquisa, junto com psicólogos e psicanalistas. A tese de doutorado foi sobre a noção de pessoa, sobre a categoria nativa de “nervos”, o que me exigia e abria um diálogo importante com o mundo psi. Um diálogo tenso mas importante. Eu procurava demonstrar que as classes populares não compartilhavam a representação do psicológico com que a psicanálise trabalha, que seria característica das classes médias, letradas, permeadas pela ideologia do individualismo. O sistema do “nervoso”, que eu procurei descrever, era outro modo de ser, outra visão de mundo, incompreensível para os psicanalistas que na época buscavam promover um movimento que se chamava “a psicanálise sobe o morro”, uma psicanálise popular, um atendimento terapêutico público. Isso estava muito em evidência no Brasil à época – e minha teoria desafiava um pouco esse movimento tão generoso. Tornei-me um pomo de discórdia, com minha teoria lida por esses segmentos da psicanálise voltada para a população de baixa renda, o mundo popular. Isso tudo foi muito instigante, foi muito forte, a tese teve muita repercussão, foi publicada logo em seguida. Infelizmente só no Brasil, já que eu não me atrevi a traduzir e publicar no exterior naquela época. Acho hoje que foi um grande erro; não marquei a posição do meu trabalho no exterior naquela ocasião. Teria rendido uma série de outros diálogos, de discursos interessantes; até porque o tema dos “nervos” era muito trabalhado pela Antropologia Médica mundial (mas sobretudo estadunidense). O trabalho circulou um pouco no mundo hispanófono, na Argentina sobretudo, por causa de conexões com colegas argentinos interessados no tema, mas não adentrou o mundo anglo-saxão, que era mais prestigioso e cultivava outras explicações para os fenômenos que eu estudara (vim dar um curso na UBA sobre esse tema da construção diferencial da pessoa em 1994, com o título de “Antropología de la Persona y de la Salud”). A partir daí eu fui me tornando também um especialista nas discussões a respeito do processo de psicologização das sociedades moderno-contemporâneas, discutindo então com outro grupo de colegas que tinham trabalhado com esse tema em geral, e com a psicanalização das camadas médias e superiores em particular. Coordenei durante alguns anos um grande projeto sobre a psicologização no Brasil, que consistia numa história da institucionalização dos saberes psi: psicologias, psicanálises, psiquiatrias etc. Orientei muito nessa área, e sempre com esse interesse de comparar as construções da pessoa, das formas da interioridade, da responsabilidade, do sentido da consciência de si; essas coisas que eu chamava de “antropologia da pessoa” – embora essa não seja uma categoria canônica da nossa disciplina. Esse foi um período bastante produtivo. Na pesquisa eu preferi, desde o começo, trabalhar diretamente com as famílias. Nunca trabalhei em instituições religiosas, médicas ou estatais; sempre trabalhei com as bases domésticas, locais – foi uma escolha metodológica fundamental. E, com isso, eu evidentemente tive muito contato com a totalidade da experiência de vida das pessoas, que incluía religião, família, sexualidade, moralidade, trabalho – tudo que faz a espessura da vida cotidiana das famílias no mundo real. Então a religião, certamente sob a forma do eixo religião-família, começou a me desafiar. Foi o período que correspondeu ao início do grande desenvolvimento do pentecostalismo. Quando comecei a trabalhar com as classes populares, havia, aqui e ali, os que se chamavam na época de “crentes”, que eram os convertidos às várias versões do pentecostalismo, particularmente às Assembleias de Deus naquela época; mas esse era um fenômeno secundário certamente. Que começou a se a avolumar notavelmente, havendo hoje uma enorme literatura etnográfica e analítica, buscando compreender porque, como, e em que circunstâncias esse processo veio a se dar. Pude acompanhar isso também no bairro de Jurujuba, inclusive na família principal de interlocutores, esse núcleo familiar a que eu me dediquei mais intensamente, e de que trato no livro Três Famílias (Duarte & Gomes, 2008).

A.Z: como acontecia o campo?

L.F.D.D: Houve períodos muito diferentes. Durante o mestrado eu morei lá, aluguei um barraco, já que é uma espécie de favela, um bairro popular pobre. Quando você olha de fora é como se fosse uma favela, mas não tem vários dos problemas das grandes favelas, não tinha violência local, o tráfico de droga era uma coisa muito discreta; mas, de um modo geral, trata-se ainda hoje de uma instalação social precária como a das favelas. Então aluguei um barraco lá e morei um tempo, isso era necessário porque tinha que fazer saídas de barco, porque, para acompanhar o trabalho da pesca, eu tinha que estar lá. Os barcos saem à noite, eu tinha que estar lá à noite, disponível para os ritmos do trabalho da pesca de sardinha. Foi um período muito intenso, em que fiz uma amizade muito intensa com essa família, os filhos, os netos, os bisnetos agora a esta altura, de dona Amélia. Ela em si já era um personagem que trazia a questão da religião de uma maneira muito vívida, ainda que de maneira muito ambígua. Ela morava com a família desse filho mais velho, que se tornou meu grande interlocutor, o Humberto, e tinha muitos netos. Era muito difícil saber exatamente que acontecera na sua história e ainda acontecia na cabeça dela, porque era uma agregada já, nessa idade; ela dependia totalmente da família do filho – e ela dizia que os netos não gostavam das “feitiçarias” dela. Havia um lado cultural afro-brasileiro que não era nunca muito claramente explicitado, mas ao mesmo tempo, o catolicismo popular. Ela era uma “rezadeira”, um papel muito comum no Brasil popular, tradicional, de mulheres que eram ao mesmo tempo parteiras e curandeiras. Ela era exatamente isso; mas ao mesmo tempo era uma liderança da igreja católica local, absolutamente envolvida numa irmandade religiosa (de que o filho e a nora também participavam).

A.Z: tudo isso convivia?

L.F.D.D: Perfeitamente: catolicismo popular, catolicismo oficial e um fundo afro-brasileiro que nunca consegui saber exatamente qual era, embora tivesse certeza de que existia. Eu a entrevistava na casa da família, e ela não queria falar dessas coisas porque pensava que a família não gostava, que os seus descendentes não gostavam. Então esse já era um dado fascinante. E eu acompanhei particularmente as conversões ou as resistências à conversão, as “passagens” religiosas nessa família. Uma família muito grande, muito extensa e intensa. Foi particularmente interessante se dar conta de qual dos filhos dela foi o primeiro que se converteu (ao pentecostalismo). Uma série de razões estruturais estava em jogo; e então eu comecei a perceber que eu poderia investir mais em aspectos que se tornaram cada vez mais relevantes. Escrevi sobre o que vim a chamar de efeitos de transgeracionalidade e de fratria. Efeitos que fazem com que – como ficou claro nesse caso –, de dois filhos homens (uma filha mulher já tinha morrido jovem), um mais forte socialmente (esse Humberto que era o chefe da família que eu acompanho até hoje) e um outro mais fraco, mais jovem, com problemas de trabalho, de bebida, este último foi o primeiro a se converter ao pentecostalismo. Era a criação de uma espécie de contracorrente, em que ele se viu apoiado na comunidade religiosa em que foi acolhido, conseguindo superar uma série de dificuldades pessoais e de sua família. Foi um efeito de reforço social muito importante e que já implicava em mudanças de atitude em face do mundo, como na questão da bebida sobretudo. O excesso da bebida é um dos elementos mais cruciais no mundo popular; era naquela época o elemento por excelência da distinção entre quem era legítimo e quem era ilegítimo, quem estava fadado a cair nas sarjetas, se perder etc. Depois as drogas sólidas foram se tornando mais presentes, mais generalizadas; mas creio que até hoje o álcool é um critério fundamental.

A partir daí comecei a trabalhar mais com a transgeracionalidade, que consistia nesse efeito de como se ia passando determinadas demandas psicossociais de geração em geração, em boa parte através da atitude da mãe em relação aos filhos. Agora já estou acompanhando a quinta geração dessa família. Não é todo dia; mas vou lá para os aniversários, para o Natal; tenho um vínculo pessoal e um vínculo de pesquisa. Estou sempre anotando as coisas que estão acontecendo; eles sabem disso, eles têm meus livros, eles sabem que sou pesquisador, e que tenho interesse nas coisas deles.

A.Z: de quando começou o mestrado, a passagem para o doutorado, o seu modo de fazer pesquisa, de estar no campo foi mudando? Teve coisas que você faz diferente?

L.F.D.D: Sim, eu só morei no campo durante o mestrado; isso tinha implicações não só porque eu era um iniciante que precisava se aprofundar naquele contexto e dominar o método etnográfico, como tinha essa dimensão do trabalho local que me exigia estar lá o tempo todo. Depois disso passei a fazer um trabalho intermitente; nunca mais morei em Jurujuba, ia às festas, fazer visitas, levar presentes para os casamentos e aniversários, ou mesmo visitar sem qualquer pretexto. Depois começaram as relações virtuais, e, até hoje, acompanho a página de facebook de duas das filhas de Humberto. Então essa relação foi mudando. Fiz pesquisa nesse outro bairro operário, no Meio da Serra, que é uma localidade que fica a meia altura entre o Rio e Petrópolis, uma antiga vila operária. Foi uma pesquisa dedicada, mas não morei lá, não havia condições de fazê-lo. Mas ia sistematicamente para acompanhar a vida local. Mas isso foi logo no começo do doutorado. Depois eu deixei de ir lá, porque pensei que não ia render mais aquele campo, a menos que me dedicasse totalmente a ele (havia outros problemas desafiadores lá, sobretudo no tocante à relação com a natureza).

A.Z: a ideia era fazer uma contraposição?

L.F.D.D: Era uma espécie de teste, uma comparação, para ver como se relacionavam alguns aspectos importantes de minhas hipóteses, particularmente a relação entre o trabalho e a condição de pessoa, que foi o eixo da transição do mestrado para o doutorado. Era uma antiga fábrica têxtil muito importante até os anos 1930, tinha sido fechada com a ruína da indústria têxtil de Petrópolis, e era um bairro operário da fábrica que se transformou em um bairro popular. Um lugar muito atraente, pois eu já tinha esse interesse na dimensão da natureza. Jurujuba é uma preciosidade nesse sentido, ela fica na entrada da Baía de Guanabara, junto à boca da Baía, ao lado da cidade de Niterói. Tem umas montanhas incríveis, tem os fortes militares, tem uma bela vegetação original. É claro que esse lado interno da Baía está totalmente poluído, mas há duas prainhas limpas, mais ao largo – tudo é muito imerso na natureza, entre o mar e a floresta. Eu escrevi logo no começo de minha pesquisa um artigo sobre isso, que se chama “De bairros operários sobre cemitérios de escravos” (Duarte, 1987), já que havia toda uma história sobre aquele lugar ter crescido sobre cemitérios de escravos, com certas flores (uma espécie de amarilidáceas) que nascem nas praias evocando aquele fato, toda uma relação intensa com a natureza: tanto a natureza marítima, marinha – que é absolutamente fundamental para eles, clã-ro–, como a natureza de terra, as plantas que se veem na terra desde o mar. Esse outro lugar, o Meio da Serra, também é um lugar incrível. Encontra-se à beira da primeira estrada aberta entre o Rio e Petrópolis, quando esta era a capital de verão da Corte Imperial. Foi o lugar onde se estabeleceu a primeira estrada de ferro do Brasil, ligando o fundo da Baía de Guanabara com Petrópolis. E uma das paradas era essa, justamente no Meio da Serra, entre encostas alcantiladas, cobertas pela Mata Atlântica, num trecho muito abrupto a cerca de 800 metros de altitude. Há ao lado a torrente de um rio que produzia a energia para a usina têxtil que funcionou na primeira metade do século XX e o caminho da estrada de ferro original, que foi desativada nos anos 1960. É um lugar extasiante. Os moradores têm muita relação com essa natureza, muito diferente de Jurujuba, com a caça, o plantio de hortas, coisas desse tipo. Já nessa época eu tinha um forte interesse pela natureza, particularmente vegetal, e pela paisagem, que é um tema com que trabalho de vez em quando[4]. Há um certo emaranhado entre essa natureza como experiência de vida, como sensação, e a natureza como representação e como dimensão cosmológica. Agora, por exemplo, o meu projeto de pesquisa registrado no CNPQ é sobre as noções de vida e natureza. Vou dar um curso sobre isso no ano que vem e meu foco será o de tentar puxar esses vários fios, das histórias das ideias, e de configurações cosmológicas contemporâneas: religião, família, sexualidade. Assim como o fio das sensibilidades relativas à natureza cultivada, do tipo jardins, parques etc. Para mim, algo amarra essas coisas todas, embora sejam focos que exigem trabalhos diferentes, exigem pesquisas diferentes, dedicações diferentes. Mas você estava me perguntando sobre os estilos de pesquisa de campo.

A.Z: foi o campo que mudou o pesquisador?

L.F.D.D: Mudei bastante, sem dúvida. E uma coisa importante é que passei, cada vez mais, a fazer pesquisa de campo através de meus orientandos. Já orientei mais de 70 teses e dissertações; então passei a absorver esse precioso material, o que é uma coisa muito curiosa: é como se você fizesse pesquisa junto com eles, você vai acompanhando a construção do material. Isso foi particularmente forte nessa área de religião e família a que passei a me dedicar após a pesquisa sobre a psicologização. Uma boa parte do material que usei para meus trabalhos dessa fase são coisas que advêm mais dessa experiência de orientação, talvez mais até do que da pesquisa direta, original. Mas eu sempre usei Jujuruba como uma espécie de contraponto próprio, meu. Aparece uma questão na tese que estou orientando aqui – e me acende a luz para ir verificar ou rever minhas notas sobre como é que está ocorrendo lá, no meu pequeno campo. É um estilo meio peculiar de pesquisa, mas funcionou razoavelmente até hoje. Agora estou precisando fazer um novo investimento, mais sistemático, porque tem havido grandes modificações no perfil religioso da família, nas gerações mais novas. O meu interlocutor principal está com doença de Alzheimer já há uns dez anos, o que me fez perder o contato direto com ele, que era uma pessoa extraordinariamente lúcida. Sua filha mais velha, um esteio da família e uma interlocutora excelente, já morreram àquela altura de um câncer fulminante. Já escrevi sobre Humberto, que aparece lá no livro Três Famílias com o nome dele mesmo – o que me autorizou a fazer. Tenho agora que mudar um pouco a estratégia, porque a família cresceu e se fragmentou muito, há vários filhos, netos e bisnetos, há opções de vida diferentes, com gente morando em outros lugares, distantes. Então se tornou muito complexo acompanhar a trama de toda a família. Percebo que estou precisando sistematizar o andamento dessas (duas) últimas gerações, verificar agora como é que estão vivendo. Em termos metodológicos, eu penso que esse foi o meu trajeto, que não tem nada de muito especial. Uma coisa que tentei fazer a certa altura foi usar a estratégia das fotografias. Em um determinado momento passei, além de trabalhar com família e religião nas classes populares, a trabalhar também com as classes médias e as elites, como uma estratégia de comparação. A partir daí comecei um investimento de pesquisa diferente, que era o de entrevistar pessoas do meu mundo social – utilizando eventualmente a estratégia do exame dos álbuns de fotografias familiares.

A.Z: aí chega a sua família?

L.F.D.D: Exatamente, aí cheguei a minha família, tanto no capítulo relativo a minha família paterna no Três Famílias, como naquele artigo que escrevi sobre um determinado eixo da minha família materna (Duarte, 2011). Mas este último já foi no bojo de um investimento de entrevistas com pessoas amigas ou indicadas por amigos, uma bola de neve sobre situações de família, que é o que aparece também no artigo recente em inglês (Duarte & Menezes, 2017); parte desse material está lá. Então houve também esse tipo de estratégia de pesquisa, parecida com a de Gilberto Velho, meu orientador de doutorado, que sempre trabalhou com entrevistas e observação no seu próprio mundo.

A.Z: e como foi entrevistar a sua própria família?

L.F.D.D: Como a família materna extensa praticamente já não existe mais, somos apenas eu, minha irmã e meu irmão – as gerações anteriores já tendo desaparecido há tempos –, usei apenas as memórias compartilhadas com meus irmãos. Da família paterna entrevistei algumas pessoas, mas também já não era mais uma família grande, estava diminuindo rapidamente, muita gente não se casou ou não teve filhos. Não era um grupo grande de pessoas a ser entrevistado, de modo que pude passar para eles algumas coisas escritas, para ver se concordavam ou não. Alguns corrigiram pequenas coisas, mesmo depois do livro publicado; um deles um dia me telefonou para dizer que tal dado específico sobre sua carreira não era exatamente o que expus. Foram entrevistas muito soltas, conversas entrevistantes, não havia um roteiro fechado, várias pessoas ficavam juntas às vezes; aí uma dizia uma coisa, ao que outra retrucava: “mas como você foi contar uma coisa dessas?”. Usei a estratégia das fotografias, mas não usei de maneira sistemática, eu dizia que estava fazendo uma pesquisa sobre família e que eu queria compor um acervo das fotografias de família. Como eu estava realmente compondo um acervo pessoal, estava escaneando tudo o que herdara de meus pais, levava as fotografias que eu tinha daquele segmento específico da família para mostrar, para compartilhar, pedindo para copiar os álbuns de família dos outros parentes, escaneando, e retornando para uma conversa em torno das fotografias. Isso foi parte da investigação, mas não focado sistematica ou reflexivamente no funcionamento específico do fenômeno “fotografia”. Era apenas uma estratégia – e cheguei a encomendar um banco de dados para trabalhar com acervos fotográficos, que nunca deu completamente certo, já que dava muito trabalho abastecer, armazenando as fotografias e preenchendo uma ficha com o personagem e as questões que emergiam de cada foto. “Fotografias de carnaval”, por exemplo, era uma das entradas – que teria rendido uma interessante análise, que não pude fazer. Tenho um acervo grande: só o banco das fotografias da minha família abarca mais de 10 mil fotos. Abastecer o banco de dados com todas essas fotos seria praticamente impossível. Com as fotografias das pessoas amigas, eu não pedia para escanear as fotos, mas compartilhava com eles a informação sobre os álbuns de família. Perguntava se eles existiam: como são? com quem estavam? quem da família os guardava? Essa é uma coisa que é interessante sempre: como é que se dá a gestão dos acervos fotográficos na cultura ocidental contemporânea. Há toda uma literatura interessante sobre isso. Esse nódulo de pesquisa com as classes médias letradas e com as classes superiores foi muito centrado numa estratégia centrada nas fotografias[5].

A.Z: sempre pensando nesta configuração da pessoa, o que tem que ver com as dinâmicas familiares?

L.F.D.D: É por isso que escrevi esse artigo sobre o Transpersonal Ether, para tratar dessa indissociabilidade entre religião e família. Não se tem como demarcar exatamente o que é religião e o que é família. É uma dimensão profundamente entranhada; embora haja, é claro, aspectos que são autonômicos em certos níveis. Mas a maior parte da vivência da pessoa imbrica essas duas dimensões. Sobre essa tensão entre herdar uma identidade e construir o seu futuro, há aquela famosa expressão do poeta Píndaro, repetida por Goethe e por Nietzsche, e que é sempre muito citada: “torna-te o que tu és”. Fazer-se a si mesmo, mas como alguém que você de algum modo já é – e que foi feito para ser.

A.Z: você tem categorias, como o conceito de nervoso, para pensar estas questões. Como articular as escolhas? Na sua literatura eu gosto muito quando você fala do “mercado de valores” que é flutuante e também quantos valores éticos são religiosos e quantos são laicos.

L.F.D.D: Esse foi um ponto em que investi bastante, numa época em que eu dirigi diversas pesquisas com orientandos e com auxiliares de pesquisa sobre as questões morais e éticas que vinham nos desafiando recentemente, sobretudo a respeito de sexualidade, gênero e família. Escrevi um artigo em que chamei a atenção para o fato de que parecia que certos valores laicos estavam funcionando mais como uma religiosidade do que os próprios valores da religião (Duarte, Jabor, Gomes & Luna, 2008). Que as pessoas escolhiam as religiões em função de valores laicos em que já acreditavam – e não o revés.

A.Z: que valores em particular?

L.F.D.D: Propus os dois eixos do “subjetivismo” e do “naturalismo”. O subjetivismo decorria de uma discussão que atravessou toda a minha carreira: a do individualismo, um dos eixos do pensamento de Dumont que me inspiraram. A reflexão sobre a ideologia do individualismo; em que medida ela serve como critério para aferição do grau de autonomia, independência e interioridade dos sujeitos sociais. Esse é um desafio muito grande, muito complicado. Na tese de doutorado eu já tinha formulado uma equação que era – como mencionei há pouco – a de que a ideologia do individualismo não atravessa a fronteira das classes populares, ela está restrita às camadas médias e superiores, veiculada como é pelo sistema educacional e pela “alta cultura”. As trajetórias que se pensam como individualizantes são as trajetórias que se dão nas classes médias e superiores. Nas classes populares ocorrem singularizações, personalizações, as pessoas têm projetos, têm evidentemente singularidades, se distinguem umas das outras, mas elas não estavam, pelo menos naquele momento histórico, envolvidas com a ideologia do individualismo, com aquele alto grau de desenvolvimento crítico, de “ampliação dos horizontes interiores” – como na expressão de Norbert Elias. Enfim, há uma série de caraterísticas da noção de pessoa como indivíduo que ali não me parecia estar presente. Essa era uma matéria desafiadora, porque a antípoda da ideologia do individualismo é a hierarquia, que privilegia a diferença e a complementariedade. Então o que eu estava postulando era que ali prevalecia um sistema holista ou hierárquico. Uma importante interlocutora, a antropóloga Tania Salem, fez depois uma crítica séria a esse meu modelo, que ela chamava de “paradigma holista” (Salem, 2006). Houve muita polêmica, muita discussão sobre isso. O que significa que não é uma situação fechada. O Dumont não é o único autor que trabalha com esse tipo de questão, mas eu penso que ele trabalha de uma maneira que me é mais consentânea. Mas você tem uma série de autores, o Anthony Giddens, o Raymond Williams, o Ulrich Beck, o François de Singly, o Richard Sennett, que trabalham de diferentes ângulos a questão do individualismo e da individualização.

A.Z: você dialoga com eles?

L.F.D.D: Vou investir num curso próximo para entabular esse diálogo, pois eu sempre tive uma certa antipatia por modelos muito funcionalistas. Eles vêm mais como a pessoa funciona na sociedade, do que como a pessoa se pensa a si mesma. O modelo com que eu trabalho é um modelo de autorrepresentação, de autoimagem, de projeto de vida e de identidade. Mas estou querendo conhecer um pouco mais aquele outro lado. Escrevi recentemente um artigo sobre a herança de Louis Dumont no Brasil (Duarte, 2017a) e me dei conta de que seria bom retomar essa questão com outros parâmetros. No livro Três Famílias a gente propõe uma solução, eu e minha co-autora, que é a da categoria de “autoafirmação”.

A.Z: seria o modo de achar o individualismo nessas classes?

L.F.D.D: Exatamente. Como é que uma pessoa se transforma em si mesma nesses meios. Entra aí outro tema sociológico bastante conhecido que é o da “ascensão social”. Há situações nas quais pessoas oriundas das classes populares se movem, se transportam para outras situações. Isso pode se dar, em primeiro lugar, pela acumulação diferencial econômica. Lá em Jurujuba existiam produtores que se tornaram ricos, tinham passado de pescadores para armadores (proprietários de grandes barcos) e tinham mudado de Jurujuba para apartamentos em bairros prestigiosos. Apresentavam uma acumulação diferencial com ascensão social no sentido estrito, quase exclusivamente econômico. Casos todos muito mal resolvidos socialmente, com dolorosas implicações nas gerações seguintes, ruína das famílias etc.

A.Z: o matrimônio era um caminho de ascensão?

L.F.D.D: Ali não era esse o caso. Trata-se de um mundo muito endogâmico, os casamentos se dão no mesmo ambiente, ou com variantes muito próximas daquele meio. A hipergamia é muito rara. Nesses meios também pode ocorrer ascensão pelo lado da militância política, quando você se insere em algum tipo de organização política, naquela época podia ser um partido de esquerda, um movimento social de esquerda, pode ser qualquer outra via hoje em dia. Liderança de uma associação de moradores, esses lugares em que você toma a consciência da sua capacidade de mobilizar o outro, uma liderança que projeta o sujeito para uma situação social na qual não se é mais a mesma pessoa que você era antes. Isso pode provocar dilemas e desafios muito intensos, como no caso do ex-presidente Lula, por exemplo.

O terceiro caminho se torna agora mais visível do que nunca: o da liderança religiosa. O pastorado pentecostal é uma forma de ascensão social inacreditavelmente eficiente. Há sinais muito interessantes, como o de usar sempre terno e gravata, o papel simbólico de ter e de usar terno e gravata. A tudo isso nós chamamos de processos de “autoafirmação”. São processos em que as pessoas não estão buscando mudar de classe, mas se estabilizar dignamente no seu próprio horizonte significativo. Mas quando se dão conta, elas percebem que, de alguma maneira, mudaram de classe ou estão em processo de mudança de classe, sem que isso fosse um projeto original, dessa maneira formulado. Nas camadas médias, cria-se o filho numa escola experimental, discute-se desde a gravidez se ele vai ser engenheiro ou advogado, se vai ser diplomata, se a pessoa vai ler isso ou aquilo, se vai ser artista, se vai fazer balé ou vai estudar inglês. Há todo um empreendimento para fazer com que o indivíduo se revele naquela pessoa. “Torna-te o que tu és”. São estratégias de disciplina no sentido de que elas se vêm como propiciadoras do pleno desenvolvimento do sujeito. O segmento mais modernizante opta inclusive por “ensinar para escolher”, por uma “educação para a liberdade”. Então é isso que faz a diferença entre o individualismo e a individualização nas camadas letradas e nas camadas populares.

Aqui o outro elemento fundamental é o do letramento universitário. Se alguém das classes populares consegue entrar na universidade – fazer a universidade ainda é aí uma coisa difícil – também é um processo de autoafirmação que se desencadeia e que vai acarretar um processo de mudança, talvez até de ascensão social. Mas é muito difícil. Veja-se o caso dos netos de Amélia. Humberto era uma pessoa muito voltada para o saber, tinha uma curiosidade infinita, era um homem com uma carreira extraordinária, mas nunca tinha passado de cabo na Marinha, onde trabalhara. A esperança dele era a de que os filhos fizessem o “vestibular” (o exame de seleção para a entrada nas universidades públicas), não era a de que eles fizessem direito ou medicina, era o de que eles fizerem esse vestibular, que eles entrassem para a universidade – um sinal marcante de uma autoafirmação bem sucedida. Nenhum deles acabou passando para a universidade – uma coisa que me impressionou muito. Olha que Humberto os estimulava muito; eu próprio dei muitas aulas para eles, durante o meu trabalho de campo. Hoje isso está mudando, os netos (de Humberto) já estão entrando na universidade. Mas estão entrando em quais carreiras? Isso preciso ver com mais atenção. Com as políticas de “ação afirmativa” o quadro está mudando um pouquinho; mas não sei ainda se foi o caso dessas crianças (que são de todas as cores possíveis). É claro que pode haver casos excepcionais de acesso ao universo do alto letramento. Uma criança que é apadrinhada pelos patrões da mãe, que não têm filhos e pagam seus estudos. Aí essa criança vai ter uma ascensão bem peculiar – como foi o caso do escritor Machado de Assis, ainda no século XIX.

A.Z: e a carreira militar?

L.F.D.D: O que acontece é que é muito difícil para os homens que vêm das classes populares ascenderem nas Forças Armadas brasileiras, já que há uma diferença muito forte entre o oficialato e o sub-oficialato. As pessoas das classes populares costumam entrar numa carreira de sub-oficialato (como foi o caso de Humberto), uma carreira que só vai até um certo patamar. O acesso ao oficialato depende de condições semelhantes às do sucesso na universidade.

Na Argentina ocorre algo de muito diferente, tanto quanto eu conheça. Uma sólida estrutura básica de letramento, uma boa estrutura de ensino universitário, permitiram que os filhos de migrantes atingissem uma posição de classe em que a individualização se tornou um mandamento. Mesmo que seus pais tivessem sido trabalhadores braçais.

Os amigos que fiz nos anos 1970 na Argentina, numerosos, eram quase todos filhos de imigrantes de diversas origens: judeus russos, catalães, galegos, calabreses etc. Suas famílias tinham vindo de todas as partes, seus pais eram gente que estava na fronteira entre o trabalho manual e o pequeno empresariado, gente que tinha uma pequena fábrica de sapatos, por exemplo; mas os filhos eram todos universitários, iam à ópera, estavam ligados na alta cultura, e estavam comprometidos com o desenvolvimento das suas individualidades. Eram indivíduos, já que se pensavam como indivíduos. No Brasil não é assim, nunca foi assim. A estrutura básica de ensino péssima, todo tipo de barreiras para vencer nas universidades, sempre foi tudo muito difícil para as classes populares. O quadro está mudando um pouco agora, mas ainda se tem que avaliar como é que está mudando, que avanços e distorções estão emergindo. As trajetórias individualizantes universitárias no Brasil da segunda metade do século XX ainda eram trajetórias de filhos das elites e das classes médias abastadas, de gente que já vivia num regime letrado, que já estava do lado de cá da fronteira da individualização. De um modo geral, percebe-se que o “processo civilizatório” (no sentido de N. Elias) avançou muito mais na Argentina do que no Brasil, em coisas do tipo: como saber andar, como saber se colocar num concurso, como saber falar corretamente. São processos de disciplina social que eu creio que foram muito mais generalizados na Argentina do que no Brasil. Embora para um membro das classes populares, o modo de falar seja marcadamente diferente, as possibilidades de se “civilizar” na Argentina são (ou foram?) muito maiores no que no Brasil. É claro que os processos históricos de deslocamento de populações e os preconceitos de marca (como o da cor) fazem parte desse processo. A escravidão africana afetou muito mais o Brasil, com efeitos indeléveis e perduráveis, mas a Argentina hoje também enfrenta mal o problema da migração andina – parece-me.

A.Z: Queria saber qual é a sua impressão da psicanálise na Argentina?

L.F.D.D: Esse é um elemento importante na minha carreira, tive muito diálogo com os estudiosos do fenômeno psicanalítico na Argentina (e alhures). Participo de um grupo internacional de discussão sobre a difusão da psicanálise que inclui o Mariano Plotkin, que escreveu Freud in the Pampas[6] e o Sergio Visacovsky, que discutiu as implicações políticas do movimento lacaniano na Argentina. Quando eu e Jane Russo coordenamos esse grupo de pesquisa sobre a psicologização (a que me referi antes) dialogamos muito com os argentinos, porque o desenvolvimento da psicanálise no Brasil se deu muito de mãos dadas com a psicanálise argentina, com um intenso e constante intercâmbio entre as duas comunidades. Estudamos bastante esse processo, o que permitiu que esse grupo se ampliasse internacionalmente: dispomos mesmo de uma revista online[7]. Mas eu interpreto a difusão da psicanálise justamente como um sintoma desse processo de individualização, da possibilidade de individualização mais intensa das camadas médias ascendentes. No Brasil o boom da psicanálise se deu nos anos 1980. Um colega, Sérvulo Figueira (1981), que tinha uma boa formação em ciências sociais e era psicanalista – ele foi da minha banca de doutorado inclusive –, escreveu alguns trabalhos muito interessantes nos começo dos anos 1980, quando estávamos discutindo muito através de Foucault e Dumont, com Gilberto Velho, qual era o sentido do boom da psicanálise naquele momento. Figueira tem um conceito de desmapeamento e outro de “socialização reativa”, de “regras de primeiro nível” e “regras de segundo nível”, que são muito esclarecedores dos mecanismos que estavam então em ação nas camadas médias urbanas brasileiras. Em princípio estava em jogo o fato de que a sociedade brasileira se estava modificando intensamente durante a ditadura militar (grosso modo, entre 1964 e 1986). Havia um ritmo desenvolvimentista radical, com grandes transformações da estrutura social, tanto urbana quanto rural. É o período em que Gilberto Velho estudou a constituição do bairro de Copacabana, no Rio de Janeiro: como é que Copacabana se construiu como um bairro de sonho para uma boa parte dos cariocas, um processo que já estava em curso antes da ditadura, mas que se acelerou rapidamente durante ela. O que Figueira analisava era que as pessoas se viam arrancadas dos seus meios de origem e colocadas em face do desafio de vivências sociais completamente díspares daquelas que tinham vivido antes, nas quais elas precisavam se remapear, encontrar novos padrões de subjetividade para sobreviver. Não havia uma passagem progressiva através das gerações, elas eram jogadas dos subúrbios da pequena burguesia para Copacabana, longe das famílias extensas, sem vizinhos conhecidos, no anonimato de um prédio de 400 apartamentos (por exemplo) – e elas tinham que se adaptar a esse novo regime de pessoa. A psicanálise, segundo Figueira, serviu muito para isso, para produzir uma espécie de flutuação ou alternação entre as novas possibilidade de vida, de reciclagem interior, em que se devia afastar dos preconceitos de origem, em relação à sexualidade ou à conjugalidade, por exemplo, para permitir essa expansão da interioridade que é essencial para o desenvolvimento da ideologia do individualismo.

AZ: nessas passagens as pessoas desejam só aquilo que podem ter?

LFDD: Exatamente: a questão da flutuação do desejo é essencial nesse processo. Esse papel acho que a psicanálise também teve na Argentina, mas talvez em outro patamar. Penso que não foi a toa que a psicanálise foi muito mais duramente atingida pela ditadura argentina do que pela brasileira. Não sei se hoje isso se percebe, mas foi um fenômeno muito notável, que eu acompanhei no grupo de amigos que cultivava em Buenos Aires. O Sergio Visacovsky trabalhou sobre a forma como os diferentes movimentos psicanalíticos lidaram com a repressão. Creio que lá a psicanálise representava, para os segmentos conservadores, uma espécie de sinal da ameaça modernizante, individualizante, anti-hierárquica. Tenho um casal de amigos muito próximos, psicanalistas argentinos, que tiveram que se exilar e refazer a carreira no Brasil. Outro casal teve que se exilar na Europa após uma experiência traumatizante de assalto da repressão a uma sessão de análise.

A.Z: A gente falou muito dos anos 1970, do começo da sua carreira, da ditadura, da psicanálise, falou de uma mudança nas famílias e na religião destas famílias

L.F.D.D: Sim, trata-se do pós-1968. Os anos 1970 são os anos em que se difunde mundialmente a contracultura desencadeada na década anterior; são uma década de intensa revolução moral e intelectual. Desafios imensos estouravam em todas as partes: Paris, Berkeley, Berlim etc. O Brasil atravessou os anos 1970 sob uma ditadura violenta e grosseira. Mas – por isso ou contra isso – também é o período em que a psicanálise se desenvolveu, e o Programa de Antropologia Social do Museu Nacional e a antropologia urbana de Gilberto Velho.

A.Z: é curioso que o Museu se manteve durante a ditadura.

L.F.D.D: Uma ditadura profundamente antagônica às ciências sociais, cujos luminares foram geralmente afastados das universidades e centros de pesquisa. Havia tortura, havia “desaparecimentos”, e havia o enorme desafio de se engajar ou não nos movimentos mais radicais de esquerda, de resistência. Aqui do Museu, creio que só Otávio Velho chegou a ser torturado, embora outros tivessem sido presos ou ameaçados de sê-lo. Eu era muito jovem na primeira fase da ditadura e vivia no espaço mais rarefeito de Petrópolis, uma cidade pequena. Mas vivi o ambiente da ditadura ao longo de todo o período de minha formação antropológica. O Programa organizou um seminário no ano passado sobre as memórias da antropologia sob a ditadura, que levou a um conjunto de depoimentos agora disponíveis na internet. Lá está o meu inclusive, sobre como é que foi fazer pesquisa naquele período, que tipo de dificuldades enfrentávamos (PPGAS UFRJ, 2014). No meu campo, Humberto tinha sido duramente atingido em 1964, tinha uma história penosa de penalização pela ditadura. Havia um clima de mal estar, de preocupação, que o atormentava quando o conheci. Ele tinha sido afastado das Forças Armadas, porque era ajudante de ordens do Ministro da Marinha do governo João Goulart. Quando caiu o regime, ele foi também arrolado, tornando-se uma pessoa visada pelo sistema, uma pessoa suspeita – além de uma pessoa economicamente arruinada. Muita coisa que ele me contava eu não gravava, nem registrava nos meus cadernos de campo, por medo de pegarem minhas notas e aquilo servir de alguma maneira para comprometê-lo mais ainda – e a mim também, é claro.

A.Z: foi ele que pediu?

L.F.D.D: Não: foi uma decisão minha, decorrente de tudo o que sabia acontecer à minha volta. Foi a coisa mais grave que me aconteceu no processo de pesquisa, porque de muita coisa eu acabei perdendo o registro. Meses, anos, conversando com uma pessoa, revisitando suas memórias, sem poder anotar redunda em graves perdas. Até porque, com outros interlocutores, eu fazia entrevistas ou conversas gravadas e mantinha abastecidos os cadernos de campo, como em situações normais.

A.Z: Agora o que você acha, quais são os desafios que têm a ver com os seus interesses, a família, a religião, o espírito do individualismo?

L.F.D.D: Tudo se tornou ultimamente mais complicado. Primeiro porque o mercado religioso brasileiro se tornou imensamente mais complexo; não adianta mais usar apenas as categorias de pentecostal e de neopentecostal, há muitas novas formulações, como as igrejas pentecostais “inclusivas”. Já orientei uma tese sobre esse movimento que aceita homossexuais, embora em certas condições. Há uma ampla gama de situações, particularmente desafiadoras no nível político. O Capitão Bolsonaro é pentecostal, o Prefeito do Rio, Marcelo Crivella, é pentecostal; enfim são situações absolutamente inacreditáveis, de ao mesmo tempo oferecer opções diferenciais para os fiéis e confluir para políticas unificadas altamente conservadoras, nos órgãos legislativos. Volto então a um ponto que tinha ficado perdido anteriormente na conversa: o da dificuldade de compreender exatamente os valores que estão sendo consumidos pelo povão, pelas classes populares neste momento, envolvendo elementos muito díspares. Um outro vetor que vem sendo fundamental, e que cresceu quase paralelamente ao avanço do pentecostalismo, é a força das quadrilhas de narcotráfico e o fenômeno quase que concomitante das milícias (sistemas de proteção/extorsão ligados ilegalmente às polícias). Quando eu começava minha carreira, houve um momento em que fiz uma pesquisa para a Fundação Ford com favelas no Rio. Isso já era por volta de 1984/85. Naquele momento algumas das favelas em que eu trabalhei no Rio viram suas lideranças serem assassinadas pelos bandidos para que tomassem posse das associações de moradores. Era um momento em que a situação apavorante que se vê hoje no Rio estava começando a se configurar. Como foram fenômenos de crescimento mais ou menos concomitante, foi inevitável estudar sua capilaridade subterrânea, até a descoberta de algumas relações muito concretas entre pentecostalismo e narcotráfico. Alguns estudos fantásticos têm nos apresentado à complexidade desafiadora dessas relações morais e práticas.

A.Z: Antes a gente falava das vias de ascensão; o que acontece com o narcotráfico?

L.F.D.D: Esse é outro ponto fundamental. O narcotráfico tem uma dimensão de identidades consumistas fortíssima; mas dificilmente se pode falar de ascensão ou mesmo de autoafirmação, já que as carreiras tendem a ser curtas e terminar tragicamente, sem possibilidade de transmissão intergeracional. Temos aí outra coisa curiosa, já que uma boa parte do narcotráfico carioca, pelo menos, tem uma opção preferencial pelo pentecostalismo. São frequentemente anti-afrobrasileiros ferrenhos. Existem pastores que atendem aos criminosos encarcerados ou gerenciam instituições de recuperação. Alguns são até suspeitos de conivência, já chegaram a ser presos. Existem trabalhos interessantes sobre isso. Assim como existem hoje grupos organizados de policiais evangélicos – também já estudados. É preciso fazer muita pesquisa hoje em dia para saber mais claramente como essas coisas se estão encaminhando ao mesmo tempo. Há agora uma maior abertura das universidades para carreiras universitárias vindas da população de baixa renda, eu não sei como isso está exatamente, é difícil ter dados abrangentes sobre todas essas variáveis. A UERJ[8], que é uma universidade importante que está quase fechando, como você sabe, ela acolhia muita gente de baixa renda. O processo deste programa de cotas atual para acesso à pós-graduação é diferente, porque quem chega até aqui já não é mais povão, já passou por um processo de autoafirmação de algum tipo. Por isso eu sou um pouco cético com todo o alarde ufanista que se faz com o nosso sistema (excetuada a situação dos alunos indígenas, que é muito peculiar). Compreender exatamente o que está fazendo com que as pessoas possam optar por essas diferentes vias é hoje um enigma extraordinário, exigindo muito mais pesquisa constante. Tem muito trabalho sendo feito, tanto com religião, quanto com violência, o acesso às universidades, as relações com o narcotráfico e a milícia – eu quase não dou mais conta dessa crescente literatura!

A.Z: pensava numa literatura de trabalhos de que você ainda dá conta nos seus artigos. Por exemplo, sobre a participação na política dos evangélicos, no Impeachment de Dilma; como esses valores de família e religião estão nos discursos.

L.F.D.D: Que provavelmente estão entranhados na população [como acabou se confirmando nas eleições presidenciais e parlamentares de 2018].

A.Z: Essas múltiplas escolhas, esse múltiplo mercado de que você fala. Esses discursos vão a todos esses pareceres?

L.F.D.D: Há uma pletora de discursos muito complicada, que se mistura com o que se passa na televisão aberta, um campo extremamente complexo. Há muitos canais de televisão que funcionam como canais religiosos. Por outro lado, há a controvertida Rede Globo, emissora mais influente, e que promove uma didática de modernidade moral e estética, sobretudo por meio de suas novelas. A televisão está presente em todos os lares brasileiros; mas que televisão? Como é que está sendo consumida? Que tipo de canais? E há ainda o rádio, as emissoras de rádio, com uma ampla gama de escolhas, incluindo inúmeras rádios evangélicas. A minha empregada, por exemplo, é batista, é protestante histórica, mas ela ouve o dia inteiro uma rádio pentecostal, que fica o tempo todo ligada. Aí você passa e ouve assim, na cozinha, um funk: – “mas você está ouvindo funk, Fulana?”. “Mas é religioso, é de Jesus” – retruca ela.

Então há hoje a construção de um mercado ideológico imensamente complexo. Essa configuração, Agostina, é muito fascinante e desafiadora porque o nosso futuro está sendo gestado nesse espaço. Escrevi um artigo, pelo qual tenho muito carinho, sobre outra dimensão desse processo (que é um tema a que eu gostaria de retornar) que é o dos efeitos de escalada (um fenômeno que já vi chamado posteriormente de backlash). Tem a ver com a teoria da cismogênese de Gregory Bateson: se existe um sistema ordenado a partir de determinada dicotomia ou par de oposições e um dos dois polos se afasta ligeiramente em certa direção, o outro polo também tenderá a se afastar na direção oposta, fazendo com que se tornem, os dois, cada vez mais antípodas. Na análise original de Bateson, ele reconhecia a existência de outros processos sociais concomitantes que faziam com que, em algum nível, se reequilibrasse o sistema. No Brasil, vejo isso estar acontecendo – num processo provavelmente muito mais generalizado hoje em dia; como, por exemplo, na relação entre o Islã e o Ocidente desde a criação do Estado de Israel. É o fato de que a modernização liberal, isso que os conservadores chamam de “humanismo”, tem crescido exponencialmente desde os anos 1970, com a flexibilização dos padrões de costumes e moralidades. A cada passo desse processo de afirmação do humanismo liberal corresponde uma reação de força intensa ou maior do outro lado. Considero que boa parte dos fenômenos a que estamos assistindo hoje no Brasil é devida a esse efeito de escalada moral antípoda (Duarte, 2009).

A.Z: e aí o que acontece com a família e a religião?

L.F.D.D: Família e religião são a dimensão oficialmente privada da cultura ocidental moderna, mas sempre em relação tensa com o mundo público, na prática. Você me lembrou disso quando comentou meu artigo sobre o Congresso Nacional (Duarte, 2017b), na votação do impeachment da ex-Presidente Dilma. Penso que o que está em jogo ali é em parte isso. Eu só trabalhei essa questão analiticamente no outro artigo, anterior; mas no fundo o que está em jogo também neste novo caso é isso. Há desafios prementes do setor modernizante da sociedade, a que corresponde um enquistamento, um esclerosamento cada vez mais forte dos setores tradicionais en torno dos valores da família e da religião. Mas não é qualquer família e religião, e sim aquelas que se representam como opostas aos valores que estão do lado modernizante. Foi por isso que editei um livro, com a participação de diversos orientandos ou pós-doutorandos meus, sobre as lutas legislativas relativas às “questões morais controversas” (Duarte et al., 2008). Esse grupo examinou o modo como vinham tramitando no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas de alguns Estados (Rio de Janeiro e São Paulo) projetos de lei sobre o que chamamos de “questões morais controversas”: homossexualidade, aborto, reprodução e inseminação artificial, eutanásia e ortotanásia. Nesse quadro, o que se via é como, dentre esses desafios, a homossexualidade parecia ter um particular papel no processo como um todo, como se fosse a pedra de toque crucial. É como se a homossexualidade enfeixasse uma liberalização radical do eixo moralidade, conjugalidade, sexualidade. Não é o homoerotismo em si que está em jogo, mas o efeito de liberalização generalizada na sociedade que a normalização dos comportamentos homossexuais parece ensejar. É como se sua presença pública legítima permitisse relativizar completamente todos os demais parâmetros da sexualidade, da conjugalidade, da moralidade familiar.

A.Z: porque mudam todas as dimensões, diferente de um aborto.

L.F.D.D: Todos os outros tópicos são delicados, mas são negociáveis ou têm um efeito moralmente tópico. Mas se a homossexualidade se torna aceitável, torna-se aceitável que haja casamento sem reprodução, que haja reprodução sem casamento (ou mesmo relação), que haja conjugalidade sem heterossexualidade; enfim produz-se um efeito aterrador como o da famosa frase do personagem de Dostoievski: "se não há Deus, tudo é permitido". O relegamento da homossexualidade a uma posição de abjeção está sendo fundamental na organização desse front moralizante que inclui boa parte do pentecostalismo (embora não todo), e boa parte do narcotráfico, que é muito moralista em relação à família. Os chefes, as lideranças das gangues, são imensamente ligados a suas mães e famílias de origem, mais até do que a suas namoradas, esposas ou filhos. Tania Salem escreveu um artigo muito interessante sobre essa relação mãe / filho-homem nas classes populares brasileiras. É como se se pudesse dizer que a família nas classes populares brasileiras se baseia na díade mãe-filho e não na de homem-mulher (Salem, 2004). São coisas a que já me dediquei e que continuam me desafiando. Ainda sobre esse efeito que eu trabalhei nesse artigo, é fato que nas democracias contemporâneas é muito frequente que as eleições sejam resolvidas por margens de diferença muito pequenas. O que será que explica tal fenômeno? Porque será que há essa tendência à produção de um equilibramento estatístico entre um contingente que é a favor de A e um contingente que é a favor de B. Os cientistas políticos devem ter tratado disso, mas não consegui achar nada esclarecedor. Então para mim é ainda um efeito da cismogênese batesoneana: é uma das possibilidades de explicação da subida do Capitão Bolsonaro como candidato à Presidência, da ascensão de uma extrema-direita brasileira que sempre imaginávamos ser residual. Na mesma medida em que a candidatura de Lula é mantida um tanto artificialmente (dada sua situação jurídica), o Bolsonaro vai subindo. Supõe-se que, se o Lula não puder ser candidato, o Bolsonaro vai se esvaziar – o que não é seguro, já que ainda haverá um candidato do PT, e o efeito de contraposição escalar continuará se afirmando; na mesma medida em que vai crescendo a posição A, a posição B vai tomando espaço[9].

É um efeito quantitativo a partir de esquemas qualitativos. Sinto o crescimento de um dilema moral que vai se tornar cada vez mais desastroso para o Brasil. É claro que o segmento de esquerda, o segmento liberal, o segmento favorável à liberdade, não vai poder se restringir e se calar, moderar sua luta apenas para não exacerbar a garra de seus oponentes, mas a tendência é que ele se mostre cada vez mais desafiado por um polo contrastivo e combativo.

A.Z: o Museu vai completar duzentos anos?

LFDD: O Museu Nacional foi fundado em 1818 por Dom João VI, Rei de Portugal e do Brasil, tendo funcionado inicialmente em um prédio no centro do Rio de Janeiro. Só quando caiu a monarquia é que veio a se instalar no Palácio de São Cristóvão.

O Museu foi integrado à Universidade do Brasil (que se transformou depois na UFRJ), nos anos 1940, mas no começo essa universidade não passava de uma federação muito frouxa de unidades, a velha Faculdade de Medicina, a velha Escola Politécnica, o Museu etc. Nos anos 1960 foi feita a chamada “reforma universitária”, bem tardia em relação à de Córdoba, e aí se integrou mais, tendo sido criada uma estrutura departamental. O Museu continuou sendo o típico “museu de história natural”, na classificação do ICOM. Ou seja, um museu que cobre antropologia, arqueologia, linguística, zoologia, botânica, paleontologia e geologia. É uma instituição difícil de gerenciar, de fazer se mover, porque cada um desses braços tem dinâmicas próprias. Em 1968, por uma conjunção de fatores a que não era estranha o personagem do antropólogo e político Darcy Ribeiro, criou-se aqui o Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social. Embora Ribeiro não tenha participado diretamente da abertura aqui no Museu, ele tinha mantido um curso de antropologia no Museu do Índio (do Serviço de Proteção do Índio – SPI), que, de alguma maneira, teve implicações para esse projeto. Havia no Museu um antropólogo sênior, Luiz de Castro Faria, que vinha de uma formação na antropologia dos “quatro campos” (antropologia biológica, arqueologia, linguística, etnologia); mas que era uma pessoa muito sofisticada e arguta. Ele fez uma aliança com o jovem Roberto Cardoso de Oliveira, que vinha de uma formação na sociologia paulista, onde tinha sido orientando de doutorado de Florestan Fernandes, e trabalhara com Darcy Ribeiro nos cursos do Museu do Índio (Peirano, 1992). Esse grupo fez um acordo com a Universidade de Harvard através do etnólogo David Maybury-Lewis, e obteve o apoio da Fundação Ford para a realização de projetos ambiciosos de pesquisa. Naquele momento, durante a ditadura de 1964, a Fundação Ford estava patrocinando no Brasil o fortalecimento das estruturas civis acadêmicas e universitárias – e o Programa foi uma das instituições beneficiadas. Uma dessas contradições peculiares da história. A minha dissertação de mestrado de fundo marxista, por exemplo, foi financiada pela Fundação Ford. Sempre cito isto para demonstrar que ela não exercia ingerência alguma no conteúdo do que apoiavam – felizmente. Mas chegamos a ser acusados por outros colegas na época de estarmos ao serviço do imperialismo, por meio da Fundação Ford.

O trabalho do Programa se iniciou em duas frentes: a primeira foi a do estudo das sociedades indígenas, reorganizando as várias frentes de estudos que estavam dispersas no Brasil, naquela época se concentrando sobretudo nos grupos Jê, que são uma das grandes configurações etnolinguísticas dos indígenas no Brasil. Esse é o período da formação de Roberto Da Matta, Roque Laraia, Julio Cesar Melatti, Alcida Ramos, toda uma geração de importantes antropólogos influenciados por David Maybury-Lewis. A segunda frente foi a do projeto Mudança e Emprego Social no Nordeste, que desenvolveu intenso trabalho de campo com uma série de situações nativas, para ver o que estava acontecendo no entorno da decadência da plantation açucareira. Uma terceira frente veio a se constituir, com a antropologia urbana de Gilberto Velho, de que eu acabei participando. Essa foi a estrutura original do programa durante certo tempo. Roberto Cardoso[10] teve que sair pouco depois, por um problema político administrativo aqui no Museu; Roberto Da Matta o substituiu como coordenador durante muito tempo depois, e, quando ele saiu para trabalhar nos EUA, estabeleceu-se um sistema de rodízio. O tempo do carisma original acabara, passando a se combinar com a burocracia universitária típica. Passamos a ter um sistema de sucessão regular de coordenadores. Em um determinado momento, pouco antes de abrir o doutorado, em 1977, conseguimos o apoio da FINEP, um órgão do Estado ligado ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), onde um economista com uma boa visão crítica ajudou a financiar certos programas de ciências sociais, como uma espécie de think-tank de contraposição às políticas do desenvolvimentismo socialmente devastador dos militares. Uma resistência constituída pela produção competente e massiva de conhecimento científico, passível de utilização contra as intervenções de engenharia social, de deslocamento maciço de populações, de abertura de grandes barragens e monumentais estradas – todas essas iniciativas de destruição tanto dos indígenas quanto das populações nativas não indígenas, assim como da pequena produção mercantil e do meio ambiente. O Programa contribuiu muito nessa área, e também no mundo urbano nacional, onde grassavam transformações e desafios sociais de idêntica importância.

AZ: desde esse momento inicial, do Museu Nacional como formação de antropólogos, você já orientou muitas teses. Agora neste momento tão diferente da pesquisa no país, o que você diz para seus orientandos?

LFDD: Realmente, Agostina, como creio já ter dito, orientei cerca de 70 teses e dissertações. Tivemos momentos diferentes ao longo de todo este período, em termos de horizonte acadêmico e de prognósticos de carreira. Houve um período muito difícil de incorporação das pessoas à carreira acadêmica; as universidades estiveram muitas sem vagas de trabalho. Os períodos dos governos de Fernando Henrique Cardoso foram muitos duros para a universidade, com muito poucos recursos. Os governos seguintes, dos dois mandatos de Lula, abriram uma série de possibilidades, abriram muitas universidades novas (que estão agora caindo aos pedaços por falta de recursos), que permitiram a abertura de muitas vagas. Até recentemente, eu praticamente não tinha nenhum ex-orientando que tivesse ficado sem ter encontrado um lugar na carreira, a menos que não o tivesse desejado. Houve um efeito suplementar interessante que foi o de termos, pela primeira vez no mundo acadêmico brasileiro, um descentramento em relação às grandes metrópoles; as pessoas passaram a fazer concursos em Fortaleza, Belém, Manaus, Campo Grande, o que está produzindo efeitos muito interessantes.

AZ: são professores ou há carreira de pesquisador?

LFDD: Não, não existe no Brasil a carreira de pesquisador, como na França ou na Argentina. Existem as bolsas de pesquisador do CNPq, que se somam aos salários universitários. O sistema de bolsas do CNPq e da CAPES é bastante amplo e complexo, embora esteja agora enormemente aquém das necessidades do mercado acadêmico. Para o início nas carreiras, o que tem sido utilizado há algum tempo são as bolsas PDJ, de pós doutorado júnior, possíveis até um certo número de anos depois do doutorado ou até que o beneficiário consiga ser aprovado em algum concurso da carreira universitária. Esse tem sido um recurso importante; eu, por exemplo, estou neste momento com dois pós-doutorandos bolsistas desse tipo. Isso faz com que as pessoas possam esticar um pouco o período de acesso ao mercado. Meu filho, que é da área de história social, passou por isso. Usufruiu de bolsa depois do doutorado durante um certo período, com o seu ex-orientador na PUC do Rio de Janeiro, mas chegou um momento em que ficou a descoberto, até conseguir passar num concurso para a mesma universidade. Naquele momento estávamos sem as bolsas de pós-doutorado da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), que se encontrava em plena crise financeira. É claro que o horizonte neste momento é patético, sendo difícil imaginar o que vai ser o destino desta crise política e econômica constante. A Argentina também teve muitos altos e baixos; lembro-me de ter ido dar um curso na UBA num momento em que as pessoas estavam muito deprimidas, havia professores que estavam dirigindo táxi para sobreviver, porque o salário não estava dando para nada; quando não se estava trabalhando ad honorem, essa categoria tão peculiar argentina. Depois melhorou muito, houve uma recuperação alentadora. Não sei como está agora.

A.Z: o que você acha das publicações cientificas, das revistas científicas?

L.F.D.D: O ponto fundamental atualmente é o do acesso público, o pomo da discórdia do campo editorial acadêmico mundial. Uma verdadeira luta contra as grandes empresas editoriais acadêmicas que cobram pelo acesso aos textos. Mas está havendo resistências importantes. Uns dias atrás, um grupo grande de acadêmicos alemães se recusou a continuar dando pareceres a revistas que não fossem de acesso público. Uma atitude forte e fundamental. Vai ser difícil a luta, porque os interesses econômicos são espantosamente altos. Mas também porque o próprio mundo acadêmico é mancomunado com isso há muito tempo. Como muitas das revistas mais prestigiosas são de acesso fechado e a gente luta por publicar nas revistas mais prestigiosas, acabamos fazendo o seu jogo. Eu já fui editor da Mana. Estudos de Antropologia Social, da revista aqui do Programa, e estou hoje ainda no comitê editorial. Temos discutido o que fazer com a nossa revista, que é considerada como do mais alto nível pela CAPES: se se continua publicando em papel ou se se passa a circular completamente online. Há a opção intermediária da impressão a pedidos, em que se faz uma publicação em papel em número estrito para enviar às bibliotecas e garantir a permuta internacional. Não é uma coisa ainda canonizada. No Brasil houve, nas ciências humanas, uma expansão talvez um tanto indiscriminada do número de revistas. Esse número alto decorre do fato de que um dos critérios para os programas de pós-graduação em ciências humanas ascenderem nos sistemas de avaliação da CAPES é o de manter a sua própria revista. Penso que isso provocou uma certa desregulação do sistema, há mais revistas do que é possível em termos de produto de qualidade disponível no Brasil contemporâneo. Mas de um modo geral as revistas que estão bem qualificadas continuam mantendo seu nível e são hoje sobretudo as revistas generalistas, a Mana, a Horizontes Antropológicos, a Revista de Antropologia, a Revista Brasileira de Ciências Sociais, a Sociologia e Antropologia. Há uma revista dos alunos da USP que é muito boa também (a Cadernos de Campo) e há aquelas especializadas, como a Religião e Sociedade, a Cadernos Pagu, que são revistas que se mantêm com ótimos padrões de qualidade. Um dos problemas que nós temos enfrentado com mais gravidade é o dos pareceristas. É uma dificuldade tremenda conseguir fazer a avaliação dos manuscritos, que os acadêmicos aceitem fazer pareceres e que os façam em tempo. E não é só o Brasil que enfrenta esse desafio. Sou do comitê editorial da American Ethnologist, que padece do mesmo problema. Os editores estão sempre preocupados. Houve uma grande discussão na American Ethnologist se havia alguma maneira de se contrapor a isso, de oferecer algum estímulo para as pessoas darem os pareceres. Um dos argumentos que foram levantados – e que penso que faz sentido – é que as avaliações do desempenho das carreiras acadêmicas levam muito pouco em conta o item dos “pareceres”. Com isso se prefere escrever um texto próprio, que vale 100 pontos, do que dar um parecer que pode valer dois. Um parecer é uma coisa delicada, um trabalho intelectual sério e exigente. Esse é o problema com que a gente tem vivido no dia a dia de todas as revistas. Outra questão é a da adoção ou não de dossiês temáticos. Tenho me manifestado junto à Mana no sentido de que ela deveria assumir a política de dossiês temáticos. Penso que ela funcionaria melhor do que no formato completamente aberto. Eu organizei recentemente dois dossiês temáticos[11], um para a Religião e Sociedade e outro para a Sociologia e Antropologia, que é do IFCS[12]. Achei tão interessante esse trabalho. Não foram os primeiros dossiês temáticos que organizei, mas eles me estimularam particularmente. Penso que o produto final apresenta uma unidade estimulante, e faz com que a revista seja consumida de maneira diferente, graças ao diálogo entre os artigos, essa coisa mais amarrada que ali se apresenta.

Outro ponto é o da língua de publicação. Nós acabamos de aceitar que se publique em espanhol na Mana, e no Brasil você tem a Vibrant[13], a Virtual Brasilian Anthropology, que só publica em inglês, artigos em inglês de brasileiros, o que é uma iniciativa muito interessante. É um órgão da Associação Brasileira de Antropologia (ABA).

A.Z: o que você acha de publicar em inglês?

L.F.D.D: Se você não publica em inglês você fica cantonado. Eu penso que fui muito tímido na minha carreira desse ponto de vista; traduzi pouco para o inglês os meus trabalhos. Se há uma coisa de que me arrependo na minha carreira é de ter me dedicado totalmente ao mercado interno, sem traduzir mais para o inglês. Penso que isso foi um grande erro. Há colegas que consideram que essa é uma atitude colonialista, achando necessário que se publique em tagalogue, swahili ou português. Não adianta, não há como ir contra isso: podemos nos esforçar por reforçar o mercado interno de cada língua nacional – tudo bem. Vamos continuar publicando em espanhol e português, é claro; mas defendo que se deva fazer um grande esforço em produzir versões em inglês. Brasileiros e argentinos, para se fazerem ouvir internacionalmente, têm que apresentar versões em inglês de seus trabalhos; nem o francês mais adianta. É verdade que o espanhol ainda tem muito mais chances de ser conhecido do que o português. Mas a comunidade é internacional, e a língua internacional, depois de ter sido o latim e o francês, é o inglês – por enquanto.

AZ: muito obrigado pelo seu tempo, foi um prazer.

LFDD: O prazer foi meu.

Agradecimientos

Agradeço a correção do português a Paula Gotelip.

Entrevista realizada durante meu período de pós-doutorado no PPGAS / MN / UFRJ. Agradeço imensamente ao professor Luiz Fernando Dias Duarte por esta conversa, pelo seu tempo, hospitalidade e generosidade.

Referencias

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[3]Howard Becker foi em duas ocasiões professor convidado do PPGAS através do programa da Fundação Ford; parte dessa experiência e sua relação com Gilberto Velho é contada em seu livro (2011: 50)

[4]Ver artigo sobre Roberto Burle Marx, um importante paisagista brasileiro, e o modo pelo qual construiu sua concepção do jardim tropical em Duarte (2011)

[5]O autor menciona o livro de Lomnitz e Perez-Lizaur (1987). É um trabalho sociológico sobre uma extensa família e tem um capítulo muito interessante sobre os acervos familiares, como vão passando intergeracionalmente fotografias, receitas, funções sociais. E também o trabalho de Cesar Carvalho (2005).

[6]Ver Plotkin, M. (2009, 2003, 2002), Plotkin, M & Visacovsky, S (2007), Russo, J (1993, 2001, 2008,2009).

[7]https://www.culturaspsi.org/

[8]Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

[9]Como se sabe agora, o candidato Jair Bolsonaro ganhou afinal a eleição presidencial de 2018, em um segundo turno, com boa margem de vantagem sobre o candidato do PT, substituto de Lula.

[10]Sobre a trajetória de Roberto Cardoso ver Alvarez, G. (2010).

[11]Dossiê sobre Luis Dumont: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=2238-387520170003&lng=en&nrm=iso. Dossiê sobre o “testemunho”: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=0100-858720160002&lng=en&nrm=iso

[12]Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro. http://www.ifcs.ufrj.br/index.php/departamentos/antropologia-cultural/14-departamentos/50-docentesantropologia

[13]http://www.vibrant.org.br

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