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Revista de enseñanza de la física
Print version ISSN 0326-7091On-line version ISSN 2250-6101
Rev. enseñ. fís. vol.33 no.3 Cordoba Dec. 2021
INVESTIGACIÃN DIDÃCTICA
A aparéncia visual da contragao relativÃstica nos livros de fÃsica aprovados no Programa Nacional do Livro Didático-2018
The Visual Appearance of Relativistic Contraction in Physics Books Approved in PNLD 2018
Ricardo Capiberibe Nunes
Wellington Pereira QueirósJefferson Adriany Ribeiro da Cunha
instituto de FÃsica da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Cidade Universitária s/n° - CEP 79070-900 -Campo Grande, MS, Brasil.
2Instituto de FÃsica da Universidade Federal de Goiás, Av. Esperanza s/n° - CEP 74.690-900 - Goiania, GO, Brasil. *E-mail: ricardo.capiberibe@ufms.br
Recibido el 21 de junio de 2021 | Aceptado el 20 de septiembre de 2021
Resumo
Nesse ensaio verificamos como os livros de fÃsica aprovados Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) 2018 abordam o aspecto visual de corpos que sofrem contrario relativÃstica. Para isso fizemos uma ampla revisao de literatura, selecionando trabalhos sobre a aparéncia visual dos corpos que sofrem uma contrario relativÃstica e comparamos com as apresentadas nos livros didáticos do PNLD-2018. Infelizmente constatamos que 9 das 12 obras ainda usam figuras inadequadas para ilustrar a contrario relativÃstica. Portanto é urgente que os autores e professores se conscientizem deste erro conceitual e ele seja erradicado.
Palavras-chave: Ensino de ciéncias; Livros didáticos; Teoria da relatividade especial; Erros conceituais; PNLD 2018.
Abstract
In this essay, we verified how the physics books approved by the National Textbook Program (PNLD) 2018 address the visual aspect of bodies on a relativistic contraction. For this, we carried out an extensive literature review, selecting works on the visual appearance of bodies that suffer a relativistic contraction and comparing them with those presented in the PNLD-2018 textbooks. Unfortunately, we find that 9 of the 12 works still use inadequate figures to illustrate the relativistic contraction. Therefore, it is urgent that authors and teachers become aware of this conceptual error and it is eradicated.
Keywords: Science Teaching; Textbooks; Theory of Special Relativity; Conceptual Errors; PNLD 2018.
diferenra entre medir e observar (Ostermann, Ricci, 2002). Essa distingo é importante porque o fenómeno da contrario do comprimento, que pode ser inferido a partir das transformares de Lorentz, diz respeito aos processos de medida. Estudos sobre aparéncia dos objetos sobre efeito de uma contrario (Lampa, 1924, Penrose, 1959, Weisskopf, 1960, Boas, 1961, Scott, Vinner, 1965, Scott, Driel, 1970, Mathews, Lakshmanan, 1972, Sheldon, 1988, 1989, Terrell, 1989, Burke, Strode, 1991) mostram que em decorrencia da constancia da velocidade da luz (segundo postulado, proposto por Einstein), estes objetos nio aparentario estarem encurtados ou achatados, mas contorcidos. Posteriormente, esse fenómeno foi batizado de Efeito Terrell ou Efeito Lampa-Penrose-Terrell.
Em 2018. todos os livros didáticos de fÃsica aprovados pelo Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD-2018)3, dedicam pelo menos um capÃtulo para discutir fÃsica moderna, incluindo TRE. Por outro lado, há poucos trabalhos que promovem discussoes sobre o ensino de relatividade na educagio básica (SAMPAIO et al, 2019) e como ele vem sendo abordado nos LD4. Por essa razio, propusemos fazer uma análise do conteúdo de TRE todos os 12 LD de fÃsica aprovados pelo PNLD-2018, verificando se estio presentes incongruencias sobre a contrario relativÃstica levantada por Ostermann & Ricci (2002).
Para realizar essa pesquisa, inicialmente fizemos uma ampla revisio de literatura sobre os trabalhos que discutem a aparencia visual dos objetos que sofrem uma contrario relativÃstica (serio II). Estes dados compuseram o corpus teórico que utilizamos para analisar os livros didáticos, cujos detalhes se encontram na serio III, que trata da meto-dologia, e na serio IV, que onde apresentamos os resultados e os discutimos.
GostarÃamos de enfatizar que esse trabalho nio objetivou em desmerecer os LD e seus autores. Entendemos que o LD apresenta diversas dimensoes e por essa razio, esse trabalho é insuficiente para chegar a um veredito sobre a qualidade dos LD. Partimos do pressuposto de que nio há obra perfeita e nem completa, e que discussoes como esta servem de subsÃdio para melhorar o conteúdo dos LD e ajudar no processo formativo de educadores e estudantes da educario básica.
II. A APARENCIA VISUAL DOS OBJETOS EM UMA CONTRACTO RELATIVÃSTICAO conceito de contrarao dos corpos em movimento uniforme nio surgiu na TeorÃa da Relatividade. No final do século XIX, os pesquisadores conduziram diversos experimentos que procuravam evidenciar o movimento da Terra em relario ao éter (Whittaker, 1953, Miller, 1997, Martins, 1998, 2015). Um dos experimentos mais precisos, porventura foi aquele realizado em 1887, pelo fÃsico Abraham Michelson (1852-1931) e o quÃmico Edward Morley (1838-1923), utilizando um interferometro óptico (Poincaré, 1902, Whittaker, 1953, Miller, 1997, Martins, 1998, 2012, 2015). O resultado deste experimento indicava que era impossÃvel evidenciar o movimento da Terra em relario ao éter (Poincaré, 1902, Whittaker, 1953, Miller, 1997, Martins, 1998, 2012 2015).
Diante desse resultado inesperado, os fÃsicos George FitzGerald e Hendrik Lorentz propuseram, independente-mente, que se o braro do interferómetro sofresse uma contrario na direrio longitudinal do movimento da Terra, entio seria impossÃvel evidenciar o movimento da Terra em relario ao éter (Whittaker, 1953, Miller, 1997, Martins, 1998, 2015). Lorentz ainda tentou justificar essa contrario, afirmando que esta contrario poderia ocorrer porque o éter exerce uma forra sobre as moléculas (Lorentz, 1895), porém, Poincaré criticou essa abordagem considerando-a como ad hoc, e sugeriu que as pesquisas sobre o eletromagnetismo deveriam utilizar como premissa fundamental o principio da relatividade (Poincaré, 1900, 1902).
Em 1904, Lorentz conseguiu obter uma descririo eletrodinamica que previa que nenhum experimento poderia detectar o movimento da Terra em relario ao éter e cuja "única restririo é que a velocidade do sistema seja menor que a da luz" (Lorentz, 1904, p. 811). Nesse mesmo ano, Poincaré comentou, em uma conferencia em Saint sobre o atual estado da fÃsica teórica, que a eletrodinamica de Lorentz exigia que os corpos se contraÃssem na direrio longitudinal do movimento (Poincaré, 1904). E no ano seguinte, Poincaré demonstrou que a única eletrodinamica compa-tÃvel com o princÃpio da relatividade, era justamente aquela desenvolvida por Lorentz (Poincaré, 1905, 1906).
Em 1905, Einstein apresentou seu programa de pesquisa para fÃsica que seria orientado em duas premissas (postulados): o principio da relatividade e a constancia da velocidade da luz, além de uma rejeirio do conceito de éter. Em seu ensaio original, Einstein desenvolveu a cinemática e a eletrodinamica relativÃstica (que se mostrou equivalente aquela desenvolvida por Lorentz) (Martins, 2005, 2012, 2015). Assim como Lorentz e Poincaré, Einstein também pre-viu que os corpos em movimento deveriam sofrer uma contragao na diregao longitudinal, porém, enquanto para Lorentz e Poincaré, a contragao era um efeito real, para Einstein, era aparente (Martins, 2015).
Einstein também inferiu sobre a aparencia dos objetos em movimento uniforme. Ao comentar sobre o significado fÃsico das transformares do espago, Einstein (1905, p. 903) declara que: "ve-se assim que um corpo rÃgido cuja forma se apresenta esférica quando é medido em estado de repouso passa a ter a forma de um elipsoide de revolugao quando estiver em movimento, sendo observado do sistema em repouso." Posteriormente, essa interpretadlo foi generalizada e passou-se a afirmar que um objeto em movimento com uma velocidade próxima a da velocidade da luz, visualmente aparentaria como um "achatamento" na diregao longitudinal do movimento. Na célebre obra de divulgagao cientÃfica Mr Tompkins in Wonderland, de autoria de George Gamow (1939), publicada em 1939, a contragao do comprimento é ilustrada por meio da seguinte imagem (figura 1):
FIGURA 1. A representagao visual da contragao do comprimento na década de 30. Fonte: Gamow (1980, p. 18-19).
Entretanto, em 19595, Penrose fez um estudo criterioso sobre o aspecto visual de uma esfera em movimento e constatou que, ao contrário do que afirma Einstein, a esfera nao assumiria a forma de um elipsoide oblato:
Seria natural supor que, de acordo com a teoria da relatividade especial, um objeto se movendo com uma velocidade com-parável a da luz deveria parecer achatado na diregao do movimento por causa de sua contragao de FitzGerald-Lorentz. Será mostrado aqui, entretanto, que esse nao é o caso geralmente. Acontece, em particular, que a aparencia de uma esfera, nao importa como ela esteja se movendo, é sempre tal que apresenta um contorno circular a qualquer observador. Assim, uma fotografÃa instantánea de uma esfera em movimento rápido tem o mesmo contorno de uma esfera estacionária. (Penrose, 1959, p. 159)
Embora Penrose (1959, p. 139) tenha se restringindo ao estudo de uma esfera, as suas conclusoes podem ser aplicadas a qualquer corpo nao-esférico que esteja em movimento retilÃneo uniforme. Isso implica que aparencia visual dos corpos em movimento nao será um achatamento (ou um encurtamento) na diregao paralela ao movimento. Nesse caso, "A aparencia de tal objeto é sempre uma transformagao circular (ou seja, produto de inversoes) do que apareceria em alguma orientagao quando estacionário. Assim, as linhas retas parecem circulares (ou retas)." (Penrose, 1959, p. 139). No mesmo ano, essa conclusao foi corroborada por uma análise realizada pelo fÃsico James Terrell (Ter-rell, 1959, Miller, 1997).
Usando as transformagoes relativÃsticas, Terrell previu que um fenómeno mais surpreendente da mente do que Lorentz ou Einstein haviam suposto porque a diferenga nos tempos para a luz chegar a cámera em K de diferentes pontos no corpo sólido em k, faria com que o corpo em k fosse fotografado rotacionado, mas nao contraÃdo; na verdade, dependendo do estado de movimento do corpo, um observador em Kpode ver suas costas primeiro. (Miller, 1997, p. 251)
Os trabalhos de Penrose, em especial o trabalho de Terrell, encontrou boa recepgao na comunidade cientÃfica, sendo citado em publicares posteriores (Weisskopf, 1960, Boas, 1961, Scott, Vinner, 1965, Scott, Driel, 1970, Ma-thews, Lakshmanan, 1972, Sheldon, 1988, 1989, Terrell, 1989, Burke, Strode, 1991). Em 1965, os fÃsicos, G. D. Scott & M. R Viner, apresentaram qual seria a aparencia visual de um retÃculo quadriculado (figura 2) e de paralelepÃpedos (figura 3) em movimento uniforme com velocidades próximas da luz. E em 1970, D. Scott e H. J. van Driel, mostraram qual seria o aspecto visual de uma esfera reticulada em movimento uniforme com a velocidade próximas a da luz. Mais recentemente Kraus et al (2002), simularam a aparencia visual de uma esfera em movimento, conforme previsto pela Relatividade Especial e como seria se o efeito de contragao nao existisse (figura 4). Em 1972, P. Mathews & I. Lakshmanan, mostraram qual seria o aspecto visual de um cubo, em tres posigóes distintas, em movimento uniforme, para velocidades próximas a luz (figura 5). Em 2002, Kraus et al, mostraram qual seria aparencia visual do ciclista de Gamow (figura 6).
FIGURA 2. Aparencia visual de uma grade retangular sob uma contrario relativÃstica. Fonte: Scott & Viner (1965, p. 535)
FIGURA 4. (a) Uma esfera em repouso em relagao ao observador. (b) A aparéncia visual da esfera em movimento (v = 0,95c) sobre o efeito da contragao relativÃstica. (c) A aparéncia visual de uma esfera em movimento (v = 0,95c) se nao existisse o efeito de contragao relativÃstica. Fonte: Kraus et al (2002, p. 78).
FIGURA 5. As imagens na linha superior representam os cubos estacionários. Nas linhas intermediárias, vemos o efeito da contragao relativÃstica como eram concebidas por Einstein e Gamow. Nas imagens inferiores, vemos qual seria a aparéncia de uma contragao relativÃstica. Fonte: Mathews & Lakshmanan (1972, p. 173).
FIGURA 6. (a) ciclista Gamow em repouso. (b) Como Gamow imaginava que seria sua aparéncia a 93% da velocidade da luz. (c) A aparéncia visual do ciclista visto a 93% da velocidade da luz. Fonte: Kraus et al (2002, p. 78).
Portanto, a partir da década de 1960, estava claro que a aparencia de visual dos objetos sobre efeito de uma contrario de Lorentz nao era de um achatamento, mas uma transformadlo circular6 ou uma contorglo (Sheldon, 1988, 1989). à importante salientar que o Efeito Terrell é uma consequencia da finitude da velocidade da luz e ocor-reria mesmo na ausencia de efeitos relativÃsticos (Gourgoulhon, 2013, p. 158-163)7. Por essa razlo, ao discutir a contrallo relativÃstica é preciso diferenciar o ato de medir do ato de observar.
Como o observador que utiliza este referencia! medirá o comprimento L da régua sem ambigüidade alguma? Nao basta que um único observador, utilizando um sistema de referencia qualquer, olhe ou fotografe a régua em um certo instante t, e daà obtenha as coordenadas das duas extremidades da régua. Isto nao está correto devido a finitude da velocidade de propagando da luz. Os dois raios de luz provenientes dessas duas extremidades sao registrados como atingindo simultaneamente a retina do olho do observador ou o filme fotográfico, mas de fato foram emitidos de maneira nao simultánea: o que veio da extremidade da régua mais distante do observador ou da máquina fotográfica foi emitido primeiro que o outro. Medir as posigoes das extremidades da régua, portanto, nao é exatamente a mesma coisa que ver ou fotografar, como estamos acostumados a pensar cotidianamente. à fundamental distinguir precisamente o que se entende por medir na Relatividade Restrita daquilo que costumeiramente entendemos por ver, observar ou fotografar, sob pena de substituir nogoes precisamente definidas por outras vagas ou imprecisas. Assim, o observador precisará medir simultaneamente (para ele) as posigoes das extremidades da régua relativÃstica no referencial S utilizado. (Ostermann, Ricci, 2002, p. 1982-183)
Portanto, seria esperado que os livros didáticos que abordam Teoria da Relatividade Especial trouxessem essas informagoes para os educandos. Porém, a ampla pesquisa sobre como a contraglo relativÃstica estava sendo abordado em livros didáticos, no perÃodo de 1996 e 2001, realizada por Ostermann & Ricci (2002) mostraram que todos os livros analisados apresentavam a aparencia visual da contraglo relativÃstica como um achatamento ou encurtamento. Na-quela ocasilo, o conteúdo de fÃsica moderna, o que inclui Teoria da Relatividade, nlo era amplamente abordado nos livros didáticos nacionais (Ostermann, Ricci, 2002) e o artigo objetiva em "alertar para o fato de que o assunto nlo tem merecido o devido cuidado, fazendo com que os livros apresentem sérios erros conceituais, quando confundem medir com observar ou quando omitem tal distinglo, provocando má interpretadlo pelo leitor." Em 2018, todos 12 livros didáticos de fÃsica aprovados pelo PNLD-2018 apresentam uma seglo reservada a fÃsica moderna e, por isso, estabelecemos no presente estudo verificar como os livros didáticos de FÃsica apresentam o aspecto visual de uma contraglo relativÃstica e se os mesmos diferenciam os conceitos de medida e de aparéncia visual.
III. METODOLOGIANa seglo anterior mostramos que ao tratar o fenómeno da contraglo relativÃstica deve-se diferenciar o conceito de medida do conceito aparencia visual dos objetos. Do ponto de vista da medida, os objetos em movimento uniforme sofrem um encurtamento na direglo longitudinal ao movimento, porém, observadores externos terlo a impresslo que este objeto sofreu uma contorglo e nlo como um encurtamento (ou achatamento) na direglo paralela ao movimento. Esse fenómeno é o que convencionou-se chamar de Efeito Terrell (Sheldon, 1988, 1989). A partir dessa conclu-slo, passamos a analisar os capÃtulos que abordam de Teoria da Relatividade nos livros didáticos de FÃsica aprovados pelo PNLD-2018, listados na tabela I.
Para efetuarmos a análise procedemos de duas formas: (1) comparamos as figuras que representam a aparencia de uma contraglo relativÃstica com as imagens adequadas que apresentamos na seglo II. (2) na ausencia de figuras, analisamos como os textos descrevem o fenómeno da contraglo relativÃstica. Buscamos também evidenciar se os textos diferenciam os conceitos de medida e de aparéncia visual, conforme discutimos na seglo II.
Para cada obra analisada, atribuÃmos uma nomenclatura: C, quando o conceito é apresentado no livro de maneira correta; I, quando o conceito é apresentado no livro de maneira incorreta; A, quando o conceito nlo é apresentado no livro e A* quando o conceito é mencionado, porém nlo é discutido no livro. Por fim, após a análise, construÃmos uma tabela para sintetizar os resultados obtidos (tabela II).
TABELA I. Livros didáticos aprovados no PNLD-2018 que foram analisados. Fonte: | Autoral. | ||
Código | TÃtulo | Autor(es) | Ano |
A | FÃsica 3: Eletricidade, FÃsica Moderna | Biscoula, Boas, Doca | 2016 |
B | FÃsica: Eletromagnetismo, FÃsica Moderna | Guimaries, Piqueira, Carron | 2016 |
C | FÃsica 3: Interagio e Tecnologia (2016); D | Gongalves Filho & Toscano | 2016 |
D | FÃsica 3: Eletromagnetismo, FÃsica Moderna | Bonjorno et al | 2016 |
E | Compreendendo a FÃsica: Eletromagnetismo e FÃsica Moderna | Gaspar | 2017 |
F | FÃsica para o Ensino Médio 3: Eletricidade, FÃsica Moderna | Kamamoto & Fuke | 2017 |
G | FÃsica em Contextos 3 | Pietrocola et al | 2016 |
H | FÃsica por Aula 3: Eletromagnetismo - FÃsica Moderna | Barreto Filho & Silva | 2016 |
I | Conexoes com a FÃsica 3: Eletricidade - FÃsica do Século XXI | Martini et al | 2016 |
J | FÃsica, Ciencia e Tecnologia 3: Eletromagnetismo, FÃsica Moderna | Torres et al | 2016 |
K | Ser Protagonista - FÃsica 3 | Válio et al | 2016 |
L | FÃsica 3: Contexto & Aplicagoes | Máximo, Alvarenga, Guimaries | 2017 |
A pesquisa evidenciou que apesar dos esforgos do MEC e a constante reformulagao dos livros didáticos, os problemas conceituais apontados por Ostermann & Ricci (2002) ainda estao presentes na maior parte dos livros didáticos. A ta-bela II, sintetiza em quais obras foram encontradas as incongruencias.
TABELA II. Ficha de análise e quantificagio dos conceitos e episodios históricos. Fonte: Autoral.
Livros Didáticos AB C DEFGH | I | J K L |
Abordagem do conceito de contragio relativÃstica // A* / C // / | / | / A / |
No que diz respeito a aparencia visual dos objetos em uma contragio relativÃstica, somente a obra E apresenta o conceito de contrario relativÃstica de forma correta (C). A obra C fala apenas menciona a contrario do espado de forma extremamente suscinta.
As obras D, G, I, J e L apresentam imagens para ilustrar o efeito da contrario relativÃstica. Porém, essas imagens sao incorretas (/). Vejamos o porque. Na obra D, os autores utilizam a imagem de uma esfera se contraindo (figura 7), que está em desacordo com os resultados discutidos na segio 1 (compare com a figura 4).
FIGURA 7. A aparencia visual de uma contrario de uma esfera segundo a obra D. Fonte: Bonjorno et al (2016, p. 216).
Na obra G há duas imagens representando a contrario, a primeira se trata de uma questio para explorar o assunto (figura 8) e a segunda está nos exercÃcios, trata-se de uma questio do vestibular da UFRN, que pergunta qual será o aspecto visual de cubos em movimentos próximos a velocidade da luz (figura 9), veja que nenhuma das alternativas se assemelha aos aspectos visuais de cubos em movimento uniforme discutidos na segio 1 (compare com a figura 3 e com a figura 5).
Explorando o assunto
Quando o valor V é milito pequeño em comparaqao a c, o que ocorre com o vaÃor de 7? Quais sao as implicaqoes disso?
TÃpicamente se apresentam figuras como o desecho (Figura 8.24) para representar o aspecto visual de um objeto em movlmento com velocldade próxima á da luz. Esta é a aparéncla vlsual'de um objeto com velocidade relativÃstica? â â â â . â â
Figura S.24: Representado tÃpica de um objeto em movimento com velocidade próxima á da luz.
FIGURA 8. ExercÃcio sobre o aspecto visual de um carro em movimento uniforme na obra G. Fonte: Pietrocola et al (2016, P. 190).
FIGURA 9. Questao do vestibular da UFRN sobre o aspecto visual de um cubo em movimento uniforme apresentado na obra G. Fonte: Pietrocola et al (2016, p. 196).
Na obra I e na obra J temos, respectivamente, uma imagem de um carro em movimento representando a contrario relativÃstica (figura 10) e um hipopótamo dentro de um trem em movimento sobre o efeito de uma contrario (figura 11). As duas imagens destacam o aspecto de encurtamento (ou achatamento) e nao de contorno. Embora na figura 11, os autores nao afirmem que esta é a aparencia visual da contrario, como eles nao discutem a diferenga entre medida e aparéncia visual, o leitor poderá inferir que aquela seja a aparencia de uma contrario relativÃstica.
FIGURA 10. O aspecto visual de uma contragao relativÃstica na obra I. Fonte: Martini et al (2016, p. 241).
Figura 5*8 A contrajo relativÃstica do comprimento ocorre somente na dire^áo do movà mentó. Em (A), temos, para o ónlbus parado, Lâ, Em (B), temos, para o ónibus em movimento, L<L0 (contragáo do comprimento). (RepresentagSo sem escala, uso de cores-fantasia.)
FIGURA 11. Contrario relativÃstica na obra J. Fonte: Torres et al (2016, p. 193).
Por fim, na obra L, os autores utilizaram a imagem proposta por Gamow (figura 1) para ilustrar a aparencia visual de uma contrario (figura 12). Porém, como vimos na segao II, provou-se que essa ilustradlo é inadequada (compare com a figura 6).
Figura 9.4. Se a velocidade da luz fosse de algumas dezenas de quilómetros por hora, vivenciarÃamos efeitos relativisticos no nosso cotidiano. Na ¡lustrado do astrofÃsico George Gamow, o personagem Mr. Tompkins ve um ciclista a cerca de 90% da velocidade da luz. sofrendo contrajo na diregao de seu movimento. O personagem se pergunta como verÃa a cidade se estivesseno lugar do ciclista. Em razáo do primeiro postulado da teorÃa da relativldade especial, se existe uma lei dÃzendo que objetos em movimento contraem na diregao do movimento, essa contragáo também deve se aplicar ao referencial do ciclista.
FIGURA 12. O aspecto visual de uma contragao relativÃstica na obra J. Fonte: Torres et al (2016, p. 193).
As obras A, B, F, e H nao apresentam imagens para ilustrar o fenómeno da contragao, mas pecam por utilizar palavras que tratam como sinónimo os atos de medir e visualizar. Na obra F, após a dedugao algébrica da contragao do espago, os autores escrevem: "observe que esse efeito só pode ser visto na diregao do movimento relativo: a única dimensao da barra que sofre a deformagao. A largura e a espessura continuam preservadas." (Kamamoto, Fuke, 2017, p. 241, itálicos nossos). Na obra A introduz o conceito de contragao do espago discutindo a situagao em que um trem atravessa um túnel. Este túnel, a principio, possui um comprimento menor que o do trem em repouso, porém, devido ao efeito de contragao, para um observador em repouso em relagao ao túnel, o trem se tornaria menor que o túnel e por isso poderia sumir completamente. Esse problema também é abordado no segundo exercicio da segao Questoes Propostas.
Na obra B, quando os autores discutem o conceito de contragao, eles utilizam corretamente a palavra medir, porém, assim como na edigao de 1995, analisada por Ostermann & Ricci (2002, p. 187), "a obra peca em nao diferenciar claramente o que se entende por medir e observar, nem em distinguir a aparencia visual daquilo que é revelado pelas medidas de comprimento". Porém, a principal razao para inclui-la como incongruente, é por causa do exercicio 14, cujo enunciado é:
14. Um painel de propaganda tem formato retangular com 5 m de comprimento e 3 m de altura. Para que o formato desse painel parega quadrado para um viajante espacial, este deverá estar em movimento: a) em uma diregao paralela ao lado mais curto do painel. b) em uma diregao paralela ao lado mais comprido do painel. c) em uma diregao perpendicular ao lado mais comprido do painel. d) em qualquer diregao. (Guimaraes, Piqueira, Carron, 2016, p. 198)
Os autores sugerem como resposta correta a alternativa (b), porém como foi mostrado na segao 1, nao existe uma diregao de movimento em que a placa retangular aparente ser quadrada. Qualquer movimento relativÃstico fará que ela aparenta estar contorcida (veja a figura 2).
Na obra H, os autores fazem uma importante distingao entre a contragao do espago na perspectiva de Lorentz e Fitzgerald, como um fenómeno real que afetava a distribuigao molecular do material, e a na perspectiva de Einstein que esse fenómeno era apenas aparente e decorre das formas de medidas empregadas por diferentes observadores.
Vamos fazer uma última consideragao sobre os resultados obtidos. Será que, nos casos em que e observada a contragao do espago, ela é de fato real? Existe uma alteragao na estrutura dos materiais, nas moléculas que os compoem, ou trata-se de uma mera consequéncia da aparencia visual de um objeto em movimento? Essa pergunta também nao teve uma resposta imediata. A principio, teóricos como Lorentz acreditavam que a contragao era resultado da agao do éter sobre as forgas moleculares, que deveriam ser alteradas pelo movimento. Einstein, ao contrário, acreditava que a contragao se tratava de um mero efeito da aparencia visual dos objetos em movimento relativo, que é a interpretagao pregada, aceita e disseminada hoje pela Teoria da Relatividade. (Torres et al, 2016, p. 212, grifos nossos)
Como vimos na segao II, é verdade que Einstein acreditava que a contragao do movimento é de um mero efeito da aparencia visual dos objetos em movimento relativo, e que de fato os objetos aparentariam estar "achatados", mas essa concepgao provou-se equivocada. Infelizmente os autores nao fazem essa discussao e da forma como é apresentada, infere-se que a contragao do espago visualmente se assemelha a um encurtamento. Inclusive, o problema 15, da segao exercÃcios propostos reforga essa concepgao incongruente: "15. Um observador vé uma barra de 4 m de comprimento passando com uma velocidade igual a 0,6c em relagao a ele. Determine a medida do comprimento dessa barra. Resposta: 3,2 m." (Torres et al, 2016, p. 213, itálicos nossos)8.
Na obra K, o conceito de contragao do espago é apenas mencionado em uma breve frase: "de acordo com a nova teoria, para movimentos com velocidades próximas a da luz, ocorre a contragao do espago, enquanto o tempo se dilata." (Válio et al, 2016, p. 255). Como nao há discussao sobre o processo de medida e a aparencia dos objetos, classificamos como Ausente (A).
Por fim, convém discutir o caso da obra C. Dos 12 livros didáticos aprovados no PNLD-2018, essa é a única que nao apresenta um capÃtulo dedicado a Teoria da Relatividade. O texto aborda os conceitos básicos de relatividade no decorrer de cerca de duas páginas. A discussao sobre a contragao do espago é toda qualitativa e ocupa apenas um parágrafo. O conceito de contragao do espago é apenas mencionado a partir de uma discussao envolvendo o paradoxo dos gemeos. Como objetivo da análise era verificar a relagao entre medida e aparencia em uma contragao relativÃstica e essa discussao nao é feita pelos autores, optamos assina-la como A*.
V. CONCLUSOESApesar dos alertas Ostermann & Ricci (2002) sobre as incongruencias conceituais envolvendo o conceito de contragao relativÃstica, ela se mantém presente em algumas dos LD de fÃsica aprovados no PNLD-2018. Alguém poderia objetar que essas discussoes sao muito "avangadas", "complexas" ou "preciosismos" para uma aula de fÃsica no ensino médio. Concordamos com Ostermann & Ricci (2002, p. 188) que nao se trata de um mero detalhe ou preciosismo, cuja relevancia pode ser relevada por se tratar de um conteúdo introdutório adaptado a alunos de ensino médio, pois
Dado o caráter violador do senso comum intrÃnseco a Relatividade Restrita, tais tarefas sao inevitáveis ao professor. Omiti-las, simplesmente, é transmitir erroneamente o conteúdo, reforgando nao somente as concepgoes espontáneas que o aluno evoca da simples leitura do texto, mas também todas aquelas advindas do uso e abuso de temas da Relatividade Restrita na literatura nao-cientifica, no cinema e na televisao, correndo o sério risco de transformar educagao cientÃfica em ficgao cientÃfica. (Ostermann, Ricci, 2002, p. 188)
Por isso, é importante que o professor se atente a estes detalhes e os denunciem em sala de aula. Nao trata se de desacreditar o livro didático ou seus autores, mas mostrar aos alunos que as autoridades académicas podem cometer erros, que é importante buscar outras fontes e análises destas obras. Trata-se de cultivar nos alunos um ceticismo moderado, uma atitude crÃtica e reflexiva e ensinar os alunos como verificar informagoes. Esse tipo de exercÃcio é vital em uma realidade onde os discursos de pós-verdades e as fakes news fluem com uma facilidade nunca antes vista. Também esperamos que as discussoes feitas nesse ensaio cheguem aos autores e revisores de LD e aos técnicos do MEC, e esperamos que nossos próximos PNLDs essas incongruencias sejam erradicadas.
AGRADECIMINTOSO presente trabalho foi realizado com apoio da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS/MEC - Brasil.
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REVISTA DE ENSEÃANZA DE LA FÃSICA, Vol. 33, no. 3 (2021)
INTRODUCCIÃN
Em 2002, Ostermann & Ricci fizeram uma análise rigorosa sobre como os livros didáticos (LD) abordavam o conteúdo de Teoria da Relatividade Especial (TRE). Os autores evidenciaram que estes livros apresentam o fenómeno da contrario relativÃstica de forma incongruente, isto é, inadequada, pois confundem o conceito de medida com o conceito de aparéncia visual. Na maior parte das obras analisadas, os autores de livros didáticos nao parecem estar cientes da
O Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) é um projeto do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educa^ao (FNDE) do Minis-tério da Educado (MEC) do Brasil e compreende um conjunto de aroes para avaliar, aprovar e regular a distribuirlo de obras didáticas, pedagógicas e literárias, materiais de apoio a educado e congéneres, destinados aos discentes e docentes das escolas públicas de educado básica, instituiroes comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos e conveniadas com o Poder Público do PaÃs. (Brasil, s. a).
A dissertar§o de mestrado Neves (2014) fez uma ampla discussio sobre como relatividade especial é abordado nos LD aprovados pelo PNLD-2012. Jardim, Otoya & Oliveira (2015) analisaram como o conceito de massa é abordado nos capÃtulos destinados a relatividade nos LD aprovados pelo PNLD-2015. Silva et al (2019) discutiram os aspectos históricos e sobre Natureza da Ciencia abordados nos capÃtulos destinados a relatividade nos LD indicados no PNLEM-2015/2017.
Cronologicamente, foi o fÃsico austrÃaco Anton Lampa, em 1924, que apresentou a primeira análise criteriosa sobre a aparencia visual de uma haste em movimento. Na conclusao de seu trabalho, ele escreveu: "o cálculo do comprimento da haste móvel, portanto, requer, além do conheci-mento da velocidade da haste, a medigao do comprimento y' e dos ángulos." (Lampa, 1924, p. 148). Porém, foi só partir dos trabalhos de Penrose e Terrell, publicados em 1959, que esta interpretagao se tornou conhecida.
Esse tipo de transformadlo é chamado de inverslo e ela está associada ao isomorfismo entre o grupo de Homogéneo de Lorentz, SO (1,3) (e suas transformagoes) e o grupo de Mobius, PSL (C) (e suas transformagoes). Para detalhes ver: Penrose (1959), Scott & Viener (1965), Fock (1959, p. 377-384), Miller (1997, 209-258) e os capÃtulos 1.8 e 2.6 de Brown (2011).
"Se levarmos em consideragao apenas a finitude da velocidade da luz em uma teoria nlo relativÃstica (teoria galileana), uma esfera em movimento pareceria alongada na direglo do movimento, como ilustrado na Fig. 4. c. Porém, gragas a contraglo de FitzGerald - Lorentz, a esfera parece exatamente esférica. Também está claro na Fig. 4. b que a esfera em movimento parece ter sido girada, mostrando uma parte de sua face oposta a direglo do movimento." (Gourgoulhon, 2013, p. 162).
Esse exercÃcio é extremamente problemático. Mesmo que relevemos o fato de que os objetos em movimento uniforme se contorcem e nao se encurtam, o autor diz que o observador ve (mais precisamente, mede) uma barra de 4 metros. Oras, este valor aferido é justamente da barra "contraÃda". Logo, o comprimento da barra deveria ser maior (exatamente, 5 m) e nao menor (3,2 m). Esse valor só seria possÃvel se o enunciado do exercÃcio dissesse que o comprimento da barra no referencial próprio é de 4 metros. Trata-se de um erro conceitual crasso.