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Historia de la educación - anuario

versão On-line ISSN 2313-9277

Hist. educ. anu. vol.14 no.2 Ciudad autonoma de Buenos Aires. dez. 2013

 

ARTÍCULOS

A educação na alemanha nazista e seu papel na modulação de ideias e comportamentosi

 

Cleri Aparecida Brandt1, Prof. Dr. Jorge Luís Mialhe2

1 Professora da Educação Básica (Ensino Fundamental I) pela Prefeitura Municipal de Rio Claro; Graduada em Licenciatura Plena em Pedagogia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - UNESP – IB, campus de Rio Claro e Mestranda do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - UNESP – IB, campus de Rio Claro –São Paulo – Brasil.
Universidade Estadual Paulista – UNESP – IB, campus de Rio Claro
Cleri_brandt@hotmail.com
2 Professor assistente-doutor (efetivo) da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho- UNESP, campus de Rio Claro (SP – Brasil); professor doutor II do Curso de Mestrado em Direito da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) e supervisor dos Cadernos Jurídicos do Curso de Direito do UNISAL/Campinas, campus Liceu Salesiano.É membro da secção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil; associado ao Instituto Hispano-Luso-Americano de Derecho Internacional (Madri, Espanha) e da Sociedade Brasileira de História da Educação.
Universidade Estadual Paulista – UNESP – IB, campus de Rio Claro
profmialhe@hotmail.com


Resumo

O período correspondente ao Terceiro Reich (1933-1945), quando a nação alemã esteve sob o domínio do Regime Nazista, caracterizou-se pelo alto grau de intolerância, dominação, extermínio em massa e, também, pelo envolvimento "voluntário" de crianças e jovens, que desde a mais tenra idade foram educadas para o engajamento incondicional na luta pelos ideais nazistas. Para este fim, teorias – supostamente comprovadas – foram incorporadas a educação de modo a fazer dela o grande veículo condutor da dominação pretendida. Neste artigo, pretende-se, a partir da revisão bibliográfica, apresentar um estudo em torno do sistema educacional alemão durante o Terceiro Reich, enfocando seus pressupostos e direcionamentos, com o objetivo de buscar a compreensão sobre o real papel da educação na modelagem das ideias e dos comportamentos das crianças e jovens que viviam à época na Alemanha nazista. O material bibliográfico analisado trouxe diversas possibilidades que, apesar de não conclusivas, permitiram a compreensão em torno da eficácia dos mecanismos educativos utilizados pelos nazistas para atingir o fim pretendido. Pode-se concluir que a educação nazista cumpriu o papel que lhe fora atribuído, se encarregando de impregnar as mentalidades infantis e juvenis, transformando as crianças e os jovens alemães em "bons nazistas".

Palavras chave: Nazismo; Educação; Formação; Juventude; Dominação.

Abstract

The period corresponding to the Third Reich (1933-1945), when the German nation was under the domain of the Nazi Regime, has been characterized by a high degree of intolerance, domination, extermination in earth and, also, by "voluntary" involvement of children and young people, that from the earliest age were educated for the unconditional engagement in the fight by Nazi ideals. For this purpose, theories - supposedly proven - were incorporated into the education so as to make it the great vehicle driver's desired domination. This Article seeks to if, from the literature review, submit a study around the German educational system during the Third Reich, focusing on their assumptions and routings, with the objective to seek understanding about the real role of education in shaping the ideas and behavior of children and young people who lived at the time in Nazi Germany. The bibliographic material analyzed brought several possibilities which, although not conclusive, allowed the understanding around the effectiveness of educational arrangements used by the Nazis to achieve the intended purpose. It can be concluded that the Nazi education fulfill the role that attributed to him, if instructing him to impregnate the mentalities children and juveniles, transforming the children and the young German in "good Nazis".

Keywords: Nazism; Education; Formation; Youth; Domination.


 

Introdução

A educação – familiar ou institucional – sempre foi considerada de importância vital à formação do indivíduo, especialmente a partir da modernidade. A crença de se iniciar esta educação o mais cedo possível para se obter os melhores resultados não é nenhuma novidade e isso, conforme destaca Arendt (2001) baseia-se na suposta superioridade do adulto e nas relações de poder. A autora diz que

O papel desempenhado pela educação em todas as utopias políticas [...] mostra o quanto parece natural iniciar um novo mundo com aqueles que são por nascimento e por natureza novos. No que toca a política, isso implica obviamente um grave equívoco: ao invés de juntar-se aos seus iguais, assumindo o esforço de persuasão e correndo o risco do fracasso, há uma inversão ditatorial, baseada na absoluta superioridade do adulto, e na tentativa de produzir o novo como em fait accompli, isto é, como se o novo já existisse. Por esse motivo na Europa, a crença de que se deve começar das crianças se se quer produzir novas condições permaneceu sendo principalmente o monopólio dos movimentos revolucionários de feitio tirânico que, ao chegarem ao poder, subtraem as crianças a seus pais e simplesmente as doutrinam. (ARENDT, 2001, p. 225, 226)

As considerações apresentadas por Arendt (2001) são importantes no sentido de despertarem a atenção para os diversos movimentos tirânicos, em especial o nazista, que, para alcançar e se manter no poder, utilizou-se das mais diversificadas e sofisticadas armas de sedução das massas. Dentre essas armas, a modulação da educação – formal e informal –, envolta em promessas de glórias futuras e permeada de ilusões de superioridade do ser, no caso, da raça alemã, se mostrou como uma das mais eficientes na promoção do encantamento infantojuvenil. Partindo dessa premissa, pretende-se, a partir da revisão bibliográfica, apresentar um estudo em torno do sistema educacional alemão durante o Terceiro Reich, enfocando seus pressupostos e direcionamentos, com o objetivo de buscar a compreensão sobre o real papel da educação na modelagem dos comportamentos das crianças e jovens que viviam à época na Alemanha nazista.

Educação geral: concepções, conceitos e diretrizes

Durante o Terceiro Reich (1933-1945) houve uma crescente valorização da juventude alemã que, explicita ou implicitamente, tinha como objetivo atrair os jovens para o movimento e utilizar seu potencial a serviço do nacional-socialismo. Essa ideia já começava a se delinear no ano de 1927, na fala do Chefe da organização do National-Sozialistische Deutsche Arbeiterparteiii (NSDAP), Gregor Strasser, que bradava "Caiam fora, velhos!" (MICHAUD, 96, p. 291). Em 1934, o então chefe da Juventude Hitleristaiii (JH), Baldur Von Schirach, confirmava essa ideia ao dizer que "'só o que é eternamente jovem deve ter seu lugar (Helmat) em nossa Alemanha', e que ‘os homens interiormente velhos são a peste de um povo são'". (MICHAUD, 1996, p. 291). A fala de Schirach esclarece o verdadeiro sentido dado à juventude e revela o seu real significado no Terceiro Reich. Jovem na concepção nazista era todo aquele que compreendia, aceitava e internalizava as novas ideias e as novas metas que se instituíam na Alemanha com o novo regime, que se comprometia com e por elas. Hitler possuía plena consciência da dificuldade de transformar os alemães adultos em nazistas convictos, mas "a juventude, em compensação, pareceu-lhe um eldorado a ser conquistado a qualquer preço. O novo alemão seria formado na idade em que se é realmente maleável" (VITKINE, 2010, p. 58), portanto, todo o cuidado deveria ser transferido para os jovens de nascimento, que desde a mais tenra idade, seriam submetidos a uma educação que os moldariam em conformidade com o idealizado por Hitler. Uma das questões centrais dessa educação encontrava-se relacionada ao sangue e nesta questão, Hitler (1983) é categórico ao afirmar a importância da preservação de sua pureza. "A perda da pureza de sangue por si só destrói a felicidade íntima, rebaixa o homem por toda a vida, e as conseqüências físicas e intelectuais permanecem para sempre." (HITLER, 1983, p. 211).
Nesse sentido, a escola tornava-se o palco ideal para iniciar o trabalho de firmar na mente e nos corações dos jovens esse compromisso com a ideia e o Estado deveria assumir o compromisso de conduzir a educação, de forma a promover o aprendizado necessário para que esta conscientização em torno da raça se efetivasse de forma precisa e definitiva. Para Hitler (1983), a educação de todo o povo deveria ser dirigida pelo Estado de modo a preparar a infância, "desde os primeiros tempos" (HITLER, 1983p. 256) para que esta fosse capaz de "enfrentar a luta pela vida" (HITLER, 1983, p. 256) que a aguardava e que todo o cuidado deveria ser tomado para que não se formasse "uma geração de comodistas" (HITLER, 1983, p. 256). Todo esse trabalho educativo, de acordo as ideias do líder nazista, deveria ter início no lar, sob os cuidados atentos das mães, e continuado pelo Estado. Koch (1973) relata que, objetivando sintetizar os princípios que deveriam nortear a política nacional-socialista, bem como sua atitude em relação à juventude, Hitler declarou no ano de 1924, de maneira entusiástica, que a grande meta definida para o estado popular constituía-se em orientar o trabalho educacional para "[...] criar e treinar corpos saudáveis. O treinamento das faculdades intelectuais representa[va] apenas um objetivo secundário" (p. 9) e nisso também deveria ser enfatizado "em primeiro lugar, á modelagem e formação do caráter, sobretudo para desenvolver a força de vontade e a capacidade de tomar decisões, juntamente com pronunciado senso de responsabilidade" (KOCH, 1973, p. 9).
Importante considerar que Hitler possuía uma concepção bastante particular sobre os efeitos produzidos pela educação intelectual, o que o fazia proclamá-la como nociva. Assim, durante o Regime Nazista "o saber é poder foi estigmatizado como uma molesta fórmula de decadência burguesa." (BLEUEL, 1972, p. 153). No ano de 1932, o líder nazista formulou a receita de educação que pretendia para o futuro de sua juventude.

[...] "A educação geral é o veneno mais desintegrador e dissolvente já descoberto pelo liberalismo para a sua própria destruição. A plena liberdade educacional é um privilegio da elite [...]. Todo o complexo cientifico deve permanecer em constante seleção e controle. O saber é um recurso auxiliar de vida, mas não a sua própria razão de ser. E assim nos tornaremos mais conseqüentes, proporcionando a ampla massa dos níveis inferiores uma oportunidade de participarem dos benefícios do analfabetismo". (BLEUEL, 1972, p. 153). (Grifo nosso).

Embora Hitler ambicionasse ver sua ideia de educação plenamente concretizada, o tempo não lhe permitiu. Contudo, é inegável o fato de que o seu direcionamento foi impulsionado no sentido de se alcançar o fim desejado. Para isso, além de efetuar a nazificação das escolas já existentes, criou-se durante o Terceiro Reich, as escolas nacional-socialistas, para onde eram encaminhados todos os indivíduos em idade escolar que, por meio de um rigoroso aprendizado, eram submetidos à ordem e a disciplina, início da educação a que estariam subjugados, segundo palavras proferidas pelo próprio Hitler, durante a comemoração do Dia do Partido no ano de 1935, até o fim de suas vidas.

No futuro, o jovem homem ascenderá de uma escola para outra. Esta ascensão terá inicio na idade infantil e irá se encerrar quando o já veterano combatente atingir a idade madura. De então em diante ninguém dentre eles poderá dizer que em alguma época de sua vida atravessou uma fase em que teve de contar exclusivamente consigo mesmo. (BLEUEL, 1972, . 153).

Desde o inicio, o que de fato importava era incutir nas mentalidades juvenis que o primordial não era o interesse individual, mas o coletivo, e que este último deveria sempre sobrepujar ao primeiro. Assim, o jovem era privado da liberdade de decidir sobre sua vida e seu futuro, isso já não lhe pertencia; nem mesmo aos familiares era garantido esse direito. O que direcionava o caminho de cada jovem era o interesse geral, do povo e da nação. Era preciso que todo o povo fosse condicionado a dirigir sua vida em favor da coletividade e nada melhor que proceder a essa iniciação por meio dos jovens. "Em quem melhor inculcar esta posição e em condições de mais favoráveis perspectivas senão na entusiástica receptividade da juventude?" (BLEUEL, 1972, p.153). Foi por este motivo que não se postergou "um só minuto em basear nesta mesma juventude o proclamado Reich de Mil Anos e todo o futuro da nação". (BLEUEL, 1972, p. 153).
Um fator importante a se considerar e que possivelmente contribuiu para o direcionamento anti-intelectual da educação nazista, encontra-se relacionado ao pensamento de Hitler em relação aos professores e aos conhecimentos acadêmico-cientificos. Desde a juventude, o líder do NSDAP cultivava profundo desprezo pelos professores e pela vida acadêmica, desprezo que é explicitado por ele de forma clara em Mein Kampf, bem como nas conversas informais com os companheiros de partido. De acordo com os relatos dessas conversas apresentados por Shirer (2008), fica claro que este nutria verdadeiro asco pela classe docente que, em sua opinião, era, em sua maioria, composta por desequilibrados. Pode-se perceber inclusive, indícios de que alimentava certo rancor e que culpava os professores por seu fracasso escolar. Quando se referia a esses professores sempre o fazia de forma pejorativa, dizendo que "quase todos [...] eram ligeiramente malucos. [...] metade deles era constituída de anormais. [...] Eram, em sua maioria, um tanto ou quanto desequilibrados mentalmente" (SHIRER, 2008, p. 31).
A revolta de Hitler com seus antigos mestres aparece com muita evidencia em sua fala. [...] Nossos mestres eram tiranos absolutos. Não tinham simpatia alguma pela juventude; seu único objetivo era entulhar nossos cérebros e converter-nos em macacos eruditos, como eles próprios. [...]. (SHIRER, 2008, p. 31). Pensando a questão educacional pelo prisma da concepção alimentada por Hitler desde a juventude em torno da instituição escolar e dos professores, é perfeitamente compreensível que procurasse direcionar a educação no Terceiro Reich rumo à desvalorização do conhecimento intelectual e da classe docente. Para ele, a maioria dos ensinamentos escolares só servia para entulhar as mentes juvenis e, portanto, deveriam ser descartados em favor de aprendizados que realmente pudessem ser aplicados na vida prática.
Em Mein Kampf, Hitler (1983) expõe categoricamente o seu pensamento sobre como a educação deveria ser articulada e de que maneira o Estado deveria conduzi-la no sentido de atuar de forma decisiva na formação do individuo caracterizado como ser superior, o denominado Ariano. Para a formação desse indivíduo – do "super-homem" – o que deveria prevalecer não era o aprendizado intelectual, mas o aprimoramento do corpo, do caráter e da vontade; a educação intelectual seria um mero complemento. Na opinião de Hitler, a educação não deveria ficar restrita ao aprendizado teórico nas salas de aula, mas ser estendida para além da escola e dos conteúdos meramente intelectuais, sendo realizada "a maneira espartana, em grupos juvenis consecutivos treinados política e militarmente" (SHIRER, 2008, p. 336) e que teria como ápice, quando o jovem atingisse os dezoito anos, o trabalho compulsório e finalmente o serviço militar. "O trabalho da educação coletiva do Estado Nacionalista deve ser coroado com o despertar do sentido e do sentimento de raça [...] completada pelo serviço militar, que deve ser visto como a conclusão da educação normal de cada alemão. (HITLER, 1983, p. 266). Ainda de acordo com a opinião de Hitler, de maior importância era "a significação de atrair e depois treinar a juventude para o serviço ‘de um novo Estado Nacional'" (SHIRER, 2008, p, 336).
Portador de uma oratória carismática e persuasiva, Hitler em seus discursos, sempre procurava referir-se a "sua juventude" frisando a sua importância para a nação e expressando o seu desejo de – independente da aceitação dos pais – guiar a sua formação. A declaração feita por ele em maio de 1937, afirmando que "O novo Reich não entregará sua juventude a ninguém, mas tomá-la-á e lhe dará sua própria educação e criação". (SHIRER, 2008, p. 336), exemplifica claramente essa questão. E foi exatamente desta forma que se procedeu; a juventude alemã ficou de fato, sob todos os aspectos, condicionada as diretrizes do NSDAP, que era quem decidia qual pedagogia seria aplicada nas escolas, que conteúdos seriam ensinados, de que forma isso aconteceria e a cargo de quem ficaria a responsabilidade por ministrar esse ensino.
A partir dessa nova pedagogia, ideologicamente moldada de acordo com os pressupostos nazistas, procedeu-se o que Shirer (2008) denomina de nazificação de todas as escolas alemãs. Segundo este autor, com a nazificação, o Der Deutsche Erzicher – órgão oficial dos educadores alemães – colocou em prática algumas medidas que foram decisivas para a remodelação do sistema educacional, dentre elas, cabe destacar a modificação dos currículos escolares, a reelaboração dos manuais e a conversão do livro Mein Kampf em "infalível estrela polar pedagógica" (SHIRER, 2008, p. 336). A partir de então, o modelo educativo do Terceiro Reich se direcionaria segundo as diretrizes apontadas pela chamada bíblia nazista e o currículo escolar sofreria uma padronização para que os alunos de toda e qualquer classe social recebessem o mesmo ensinamento, visto que "Hitler achava importante que todos os alemães tivessem a mesma ‘visão de mundo' (em alemão, wietanschauung)". (BARTOLETTI, 2006, p. 40).
Em relação ao ensino universitário, este obedecia aos mesmos padrões educacionais dos demais, sendo as universidades, talvez, uma das mais envolvidas nas questões ligadas aos preceitos nazistas, pois, conforme destaca este autor, antes mesmo de o NSDAP chegar ao poder, as universidades alemãs já se configuravam como "os baluartes do nacionalismo" (KOCH, 1973, p. 101). A Liga dos Estudantes Nacionais Socialistas, instituída em substituição as entidades estudantis e que se encontrava subordinada ao líder da JH, tinha como missão "criar novo tipo de estudante, um novo tipo de professor universitário e um novo conceito de corpo de conhecimentos" (KOCH, 1973, p. 101), assim os exercícios físicos e o treinamento paramilitar adentraram as universidades tornando-se compulsórios a todos os jovens acadêmicos. A filiação dos estudantes nesta Liga era quesito obrigatório para o prosseguimento dos estudos.

Corpo Docente: treinamento especializado

Com os fins da educação definidos, fazia-se necessário implantar a nova política pedagógica, como também, convencer e trazer para o movimento todos os educadores. Essa tarefa não se mostrou das mais difíceis, visto que, a mudança pretendida não encontrou grande resistência por parte do sistema educacional alemão, pois muitos educadores se mostravam incomodados e decepcionados com a República de Weimar, por não terem conseguido o espaço esperado para promover a reforma do ensino, o que os deixava abertos às novas perspectivas oferecidas pela proposta nazista. Mas, apesar de descontentes e ansiosos por mudanças, os docentes somente se renderam após a eleição de 1933 e do incêndio do Reichstag. No entanto, a transformação do ambiente educacional começou a tomar corpo muito antes dessa rendição, pelas mãos de alunos membros da JH que agiam nesse ambiente, retirando e queimando quadros de personalidades políticas alemãs e substituindo as bandeiras da República de Weimar pelas do NSDAP.
Uma das primeiras providências tomadas pelo partido para por em prática a pedagogia nazista foi a nomeação no ano de 1934, de Bernhardt Rust, antigo mestre-escola provincial, amigo de Hitler e membro do Partido Nazista, para chefiar o Ministério da Ciência, Educação e Cultura Popular do Reich, o qual, conforme destaca Shirer (2008), comungava explicitamente das mesmas ideias anti-intelectuais de Hitler, sendo, portanto, talhado para a missão. Como ministro, Rust fora incumbido de cuidar da educação geral no Terceiro Reich, tendo como principal responsabilidade dar o direcionamento necessário ao ensino que seria ministrado às crianças e jovens em consonância com os pressupostos nacional-socialistas.
A partir da nomeação, Rust tomou algumas medidas visando cumprir com sua missão de reestruturar o sistema educacional, sendo que uma das primeiras constituiu-se em proceder a uma espécie de limpeza do corpo docente, removendo das escolas todos os professores não partidários do nazismo e os judeus. Sem considerar a capacidade intelectual ou pedagógica, esses professores eram substituídos por docentes nacional-socialistas, que, conforme sugere Koch (1973), eram melhores nazistas que professores. Com esta medida, todos os professores que não se adequavam as novas normas foram demitidos ou, conforme sugere Klemperer (1999), "aposentados" por serem enquadrados como "supérfluos". Já aqueles que se apresentavam dentro dos parâmetros educacionais nazistas, para continuarem no exercício da profissão, eram obrigados a participar de cursos especiais que os capacitariam ao ensino de acordo com as novas diretrizes pedagógicas. Esse treinamento era oferecido pelos departamentos de educação pública por meio de cursos rápidos em acampamentos de instrução, onde os educadores – este termo ganharia grande relevância à época – recebiam ensinamentos ideológicos, treinamento de defesa e esportes campestres, que, posteriormente, deveriam ser aplicados junto aos alunos. Mas, esse treinamento, apesar de compulsório, não era oferecido a todos os docentes; segundo Bleuel (1972), antes, estes necessitavam comprovar a sua identificação espiritual com o nacionalsocialismo por meio da aprovação em exames aplicados pelos nazistas.
Em junho de 1934, o Ministério da Educação expediu um decreto determinando que todos os professores fossem "‘reciclados nacional-politicamente' durante quatro semanas por ano, no campo comunitário" (KLEMPERER, 1999, p. 73). Esse programa de treinamento docente constituía-se em verdadeiro "adestramento especializado" (BLEUEL, 1972, p. 154) ministrado por meio de cursos, congressos, viagens e boletins editados pelo Instituto Central Alemão de Educação e Ensino. Os temas que integravam o programa ordenavam-se em: pré-história alemã, aspectos da história racial, arte popular, jogos esportivos, defesa pessoal e a missão educativa da mulher. Essa ordenação evidenciava "o tipo de teor pedagógico exigido pela natureza ideológica do nacional socialismo" (BLEUEL, 1972, p. 154). Porém, apesar de os temas se apresentarem sugestivos, "o contorno deste conjunto ideológico era demasiadamente vago e indeterminado" (BLEUEL, 1972, p. 154), não apresentando uma fórmula expressiva e significante em torno da real pedagogia que se pretendia instituir. A única certeza evidente era a radical marginalização do liberalismo, do materialismo, da objetividade cientifica e do intelectualismo.
A instituição compulsória da saudação nazista nas escolas foi outra medida tomada por Rust. A partir de então, todos os professores e alunos estavam obrigados a fazê-la no início e término de cada aula e em qualquer espaço escolar. Todas as manhãs, os alunos ficavam em forma e a aula era iniciada com um "‘Heil Hitler!' Não se ouvia mais o cumprimento dos professores, ‘Bom dia, meninos'". (BARTOLETTI, 2006, P. 40, 41). Essa saudação, a princípio, significava "a aptidão ao combate permanente que, desde a idade de dez anos, devia travar o soldado de uma idéia" (MICHAUD, 1996, p. 296 - Grifo do autor), no entanto, posteriormente, o seu significado foi ampliado, passando a ser para todos, mais que uma simples saudação à Hitler, mas, "sua saudação por Hitler, o ‘médico do povo alemão', o Salvador da Alemanha cuja "visão' ou ‘ideia' do Reich eterno e puro um dia se tornaria realidade" (MICHAUD, 1996, p. 296). Do momento em que se levantava até à hora de dormir "o jovem alemão [...] fazia a saudação hitlerista de cinquenta a 150 vezes por dia [...]" (MICHAUD, 1996, p. 295) e aquele que não a correspondesse estava sujeito a delação e consequente punição, visto isto ser considerado um grave delito. Ninguém encontrava-se a salvo, pais e demais familiares, professores, todos estavam sujeitos a denúncia. O perigo de delação se fazia tão presente, que os professores viviam em constante estado de vigilância, e não apenas em relação a saudação nazista, mas também, em suas falas durante as aulas. Esse temor era plenamente justificado, visto que, conforme sugere Evans (2011), qualquer gesto, atitude ou palavra impensada poderia resultar na detenção do professor, os próprios alunos, especialmente aqueles que não nutriam simpatia ou se sentiam perseguidos por determinado professor, se encarregavam de fazer a denúncia.
Mas não eram apenas estes os problemas enfrentados pelos professores, havia ainda a rebeldia e os desmandos de alunos membros da JH que lhes desferiam todo tipo de ataques e agressões, as quais, normalmente, acabavam impunes, pois como esses alunos sempre circulavam uniformizados, não poderiam ser repreendidos e muito menos castigados, visto isso significar "ofensa ao traje de honra" (KOCH, 1973, p. 92). Esses ataques, que se tornavam cada vez mais constantes, acabaram gerando queixas por parte de professores e pais, o que forçou o NSDAP a tomar algumas medidas na tentativa de coibir essas manifestações de rebeldia e restabelecer a ordem nos ambientes escolares. A primeira delas foi "forçar o maior número possível de jovens professores a servir na JH" (KOCH, 1973, p. 92); acreditava-se que isso possibilitaria maior cumplicidade entre professores e alunos e consequentemente, apaziguaria as relações. No entanto, a medida não se mostrou suficiente e o partido se viu obrigado a tomar atitudes mais drásticas, encaminhando uma severa repreensão a JH, determinando o fim da rebeldia juvenil.
A partir de 1933, os professores foram também, obrigados a filiar-se a Liga dos Professores Nacional-Socialistas, uma associação fundada em 1929 com a finalidade de ser "responsável pela execução da coordenação ideológica e política de todos os professores, de acordo com a doutrina nacional-socialista". (SHIRER, 2008, p. 337); dessa filiação dependia o seu futuro na profissão. Segundo Koch (1973), a partir da filiação, os docentes se viam sobrecarregados de atividades junto ao partido e à JH e com isso, sem tempo para cuidar das questões de ordem pedagógica, o que resultou em considerável queda na qualidade do ensino ministrado nas escolas. Qualquer admissão para a função docente passava pelo crivo do partido, que impunha aos candidatos a exigência de comprovar, além da sua procedência biológica – racial –, ter servido em alguma das bases do NSDAP – a SA, a Cooperação do Trabalho ou a JH. Além disso, todos deveriam prestar juramento público de fidelidade e obediência ao Führer. Para o ensino universitário as exigências eram ainda maiores, pois para esta etapa, era necessário obter uma licença para ensinar expedida pelo Ministério da Educação. Para obtê-la, os candidatos eram submetidos a um período de observação de seis semanas, onde eram analisados – política e ideologicamente – por técnicos nazistas. Diante de tantas exigências e dificuldades, bem como pela total desvalorização do intelecto propagada pelo partido, o prestígio das profissões acadêmicas – em especial, as ligadas ao magistério – despencou durante o Terceiro Reich, o que resultou na falta de pessoal apto e disposto a exercer o ofício docente. Na tentativa de minimizar esse quadro, o NSDAP, primeiramente, aboliu os exames de seleção e, em seguida, fundou os "Institutos para Treinamento de Professores" que, por meio de cursos rápidos, pretendiam formar pessoal – dentro dos princípios da JH – para suprir a demanda. A formação acadêmica para o exercício do magistério passou a ser considerada desnecessária, especialmente para os anos iniciais, visto que, os professores deveriam se limitar a ensinar "a juventude alemã a fazer contas, a ler e a escrever" (KLEMPERER, 1999, p. 90).
Posteriormente, no ano de 1939, a JH teve a oportunidade de participar "da remodelação dos cursos de treinamento para professores a fim de criar o ‘professor político'" (KOCH, 1973, p. 98). A partir de então, todos os jovens passaram a ser examinados nos ambientes educacionais em relação as suas aptidões. Caso se constatasse que determinado jovem possuía "capacidade para ensinar [era] encorajado a ingressar no magistério" (KOCH, 1973, p. 98). Essa preocupação em selecionar ou formar professores entre os alunos e membros da JH possuía caráter eminentemente político e ideológico, visto que, o seu principal objetivo era "criar um corpo docente unido e fortalecido pela filiação numa organização, um instrumento ligado à liderança política e que disseminaria uma forma política em todas as facetas da educação." (KOCH, 1973, p. 98) Toda essa nazificação do ensino trouxe consequências danosas para a educação alemã. Shirer (2008) afirma que "a história foi tão falsificada nos manuais e pelos professores [...] que chegou a ficar ridícula" (SHIRER, 2008, p. 337) e que, mais ridículo ainda, ficou o ensino da denominada Ciência Raciais, com suas pretensas teorias sobre a superioridade da raça alemã e consequente inferioridade do judeu, apresentado como raça subumana, responsável por praticamente todos os males existentes no mundo.
A ciência natural, herdeira de um passado brilhante, com nomes de destaque internacional, simplesmente entrou em colapso com o afastamento de boa parte de seus cientistas que, por não compactuarem com as ideias nazistas, foram demitidos, "aposentados" ou se auto-exilaram. Aqueles que permaneceram tentaram aplicar à ciência pura todas as aberrações nazistas e para justificar essas incorporações, alteraram as nomenclaturas acrescentando ao seu final a designação "alemã" – química-alemã, física-alemã, etc.. Como justificativa, alegavam que "a ciência como toda e qualquer criação humana, é racial e condicionada ao sangue" (SHIRER, 2008, p. 338). A partir dessa ideia, os nazistas construíram uma linha divisória entre as ciências, declarando que a única aceita como verdadeira era a considerada genuinamente alemã, e ser genuinamente alemã significava seguir, apoiar e possibilitar a comprovação necessária às teorias raciais por eles preconizadas; enquanto as demais – que escapavam, contradiziam ou discordavam dessas teorias – eram sumariamente descartadas, apontadas como falsas ou como tentativas judaicas para o domínio do mundo. Uma das vítimas desse pensamento foi o grande cientista de origem alemã, Albert Einstein (1879-1955), cuja formulação da Teoria da Relatividadeiv foi considerada pelos nazistas como mero charlatanismo. A explicação não poderia ser outra: Einstein era judeu e, portanto, segundo os preceitos nazistas, um ser inferior que não possuía capacidade inata suficiente para a compreensão da verdade, assim, jamais poderia conceber qualquer ciência que não fosse falsa.
Após a nazificação do ensino superior, o número de professores que reagiram contra os pressupostos nacional-socialistas pode ser considerado insignificante se comparado ao daqueles que a eles se renderam, manifestando total apoio a Hitler. Fato surpreendente, já que se esperava dos acadêmicos, por possuírem uma formação intelectual estruturada cientificamente, um posicionamento imbuído de maior lucidez. O resultado dessa adesão não poderia ser diferente, o que se observou foi uma grande redução no número de estudantes universitários, como também uma drástica queda na qualidade do ensino superior, cujos reflexos afetariam profundamente a Alemanha durante e após a Segunda Guerra. "Foi um espetáculo de prostituição que manchou a honrosa história da cultura alemã" (SHIRER, 2008, p. 340).

Programa didático

Para se falar em pedagogia nazista ou em seu programa didático-pedagógico faz-se importante primeiramente, conhecer a concepção de mundo vislumbrada pelos nazistas, bem como a concepção do sujeito que pretendiam formar. Em Mein Kampf, Hitler (1983), resume essas concepções em nacionalista e racista. Para os nazistas a educação possuía como única finalidade "transformar as crianças em bons nazistas" (BARTOLETI, 2006, p. 49).
Para por em prática esse novo modelo de educação que transformaria os jovens em bons nazistas, era necessário promover uma verdadeira revolução no sistema educacional e os nazistas o fizeram; assim que "assumiram o poder, passaram a controlar todas as escolas públicas, chamadas Escolas Nacionais. Jogaram fora os livros e lançaram novos. Mudaram os currículos de alto a baixo de forma a só ensinar ideias aprovadas pelos nazistas." (BARTOLETTI, 2006, p. 40). Nem mesmo as escolas católicas foram poupadas; os nazistas retiraram os crucifixos das paredes das salas de aulas, substituindo-os por quadros de Adolf Hitler. O significado implícito nessa substituição surge como óbvio: fazer com que os alunos não se esquecessem de que pertenciam ao Führer; que ele olhava por eles, que os observava atentamente para não permitir que se desviassem do caminho para eles traçado; substituindo o Cristo crucificado, mostrava a eles que a partir de então, possuíam um novo modelo a seguir.
Atendendo ao novo programa pedagógico, bem como aos fins que se desejava alcançar por meio da transmissão de seus conteúdos, iniciou-se por volta de 1935, uma verdadeira remodelação no ensino de todas as disciplinas. O programa, apesar de não se mostrar totalmente convincente, apresentava um conteúdo pedagógico claramente definido: "mentalidade combativa e operosidade corporal aliados a predicados raciais que seriam obtidos por meio de processos seletivos" (BLEUEL, 1972, p. 155). Esses objetivos, bem como os planos e os quadros de horários de aulas, foram dirigidos em conformidade com as novas diretrizes didático-pedagógicas elaboradas pelos órgãos educacionais nazistas. No entanto, a despeito de todo o esforço, nem todas as disciplinas se conduziram dentro do planejado, sendo observado o primeiro descompasso justamente com o ensino da História, por meio da qual, a princípio,

Os alunos deveriam instruir-se com os conhecimentos da história da "revolução nacional" e ao mesmo tempo exercitar-se na sua interpretação partidária oficial. [...] Adolf Hitler se apresentava como salvador por necessidade e submissão no centro. Mais tarde esta concepção foi ampliada: toda a história passou a ser focalizada sob o ponto de vista da raça nórdica, numa espécie de exaltação da marcha triunfal dos povos germânicos e das destacadas personalidades dos seus presentes lideres. (BLEUEL, 1972, p. 155)

Koch (1973), que vivenciou o aprendizado educacional nacional-socialista, afirma que, com a remodelação, essa disciplina viu-se "seriamente atingida. Todos os livros [...] foram submetidos à rigorosa revisão." (KOCH, 1973, p. 98).
Este autor relata que o seu primeiro livro de História no curso ginasial "começava com Adolf Hitler e acabava com Anibal. A história era exclusivamente político-militar, focalizando a luta contínua do povo alemão pelo poder e pela existência" (KOCH, 1973, p. 98). Em 30 de julho de 1933, expediu-se um decreto dispondo "as ‘Diretrizes para Livros Didáticos de História'" (EVANS, 2011, p. 304), a partir das quais deveria ser articulado o planejamento de todas as aulas de História, tendo como eixo central "o conceito de heroísmo em sua forma alemã, ligado a ideia de liderança" (EVANS, 2011p. 304). Klemperer (2009) afirma que "os nazistas transmitiam uma história da civilização completamente falsificada, fazendo com que o povo alemão se sentisse superior aos demais, ‘por vontade divina e direito', como Herrenmenschen (Super-homens) em detrimento dos demais povos." (KLEMPERER, 2009, p. 214). Um autor muito utilizado pelos nazistas para embasar a tese defendida por eles sobre a superioridade dos indivíduos alemães como sendo histórica e natural, foi o historiador romano Cornélius Tácito (33-120 d.C.), que em sua obra Germânia, traça "um perfil bastante lisonjeiro dos ancestrais alemães [descrevendo e enaltecendo] o primeiro herói nacional da Alemanha" (KLEMPERER, 2009, p. 214), Armínio e seus soldados, de maneira bastante honrosa. "A partir deles, os nazistas traçavam uma linha direta até Hitler e suas SA, SS e JH, passando por Lutero e Frederico, o Grande" (KLEMPERER, 2009, 214). A intenção parece evidente: comprovar e intensificar o ensinamento que deveria levar os jovens a incorporar a ideia do herói como modelo de comportamento e de conduta, reforçando também, a imagem de Hitler e de seus seguidores como os continuadores da missão heroica de construir uma nova civilização alemã mais pura e poderosa, constituída por homens especiais, os super-homens, os mais belos e perfeitos exemplares da espécie humana que, por direito, deveriam comandar o mundo. Na concepção nazista, o super-homem seria aquele indivíduo capaz de sair do anonimato e se destacar em meio à multidão, encontrando "a sua expressão na própria pessoa de Hitler" (HANNOUN, 1997, p. 127).
Seguindo o exemplo do que ocorria na disciplina de História, o ensino da linguagem passou por sérias reformulações. Suas aulas foram "[...] convertidas em uma profissão de fé. Valendo como uma nova ‘conscientização do germanismo' em marcha" (BLEUEL, 1972, p. 156), trabalho que era realizado por meio da poesia popular e propostas de redações "sobre tópicos como ‘Hitler: o realizador da unidade alemã', ‘a revolução nacionalista como o começo de uma nova era', ‘o filme O jovem hitlerista Quex como obra de arte' e ‘sou alemão (uma palavra de orgulho e dever)" (EVANS, 2011, p. 304), tema que buscavam, além de elevar o NSDAP com sua política falsamente pintada de apaziguadora, visava imprimir nos estudantes a convicção de que todos se encontravam sob a liderança do Führer e que, como alemães, tinham o dever de auxiliálo em sua revolução. O ensino da língua alemã também foi consideravelmente afetado com a remodelação didático-pedagógica, tendo, obrigatoriamente, "que enfocar os padrões de fala como um produto do ambiente racial, as palavras alemãs como instrumentos da consciência nacional alemã, e os tipos de fala como expressões do caráter" (EVANS, 2011, p. 308). Com a intenção de selecionar a literatura que ilustrasse "os laços que ligavam a comunidade na sua luta presente [passou-se] a ignorar os clássicos, em favor de um estudo da herança alemã e da comunidade alemã unida" (KOCH, 1973, p. 98). Contudo, a literatura existente não se apresentava condizente com o fim desejado, restando aos nazistas "duas alternativas: recorrer aos livros de guerra, escritos por nacional-socialistas ou por eles aprovados, ou uma volta aos clássicos, excluindo-se os que tinham sido escritos por alemães de fé judaica". (KOCH, 1973, p. 98).
De acordo com os pressupostos educacionais nazistas, todas as disciplinas deveriam se adequar e contribuir para a disseminação da política racial. Porém, era nas aulas de Ciências Naturais – em especial nas de Biologia – que os educadores encontravam as melhores condições para transmitir o conteúdo doutrinário e ideológico racial e dos fatores étnicos, demonstrando na prática a sua grande importância para a "futura projeção do Reich" (KOCH, 1973, p. 99). "Teorias absurdas e não verificadas eram introduzidas nos compêndios com o fito de produzir um ‘sentimento racial' e um ‘instinto racial' na juventude alemã" (KOCH, 1973, p. 99). Os ensinamentos ministrados por meio dessa disciplina dividiam-se, em: leis da hereditariedade e seleção e aprimoramento das raças. Segundo Michaud (1996), havia ainda, a disciplina de Ciências Raciais, por meio da qual os alunos eram iniciados naquilo que lhes era "racialmente estranho" (MICHAUD, 1996, p. 293), por meio do estudo embasado nos manuais de Rassenkunde e em diversas outras brochuras que, apesar de refletirem "as múltiplas e contraditórias concepções que os ideólogos nazistas tinham das noções de ‘povo' e de ‘nação' possuíam em comum incitar o próprio aluno a reconstruir o mito racial pela imagem e pelo texto". (MICHAUD, 1996, p. 294). Todos os exercícios contidos nesses manuais eram propostos com a finalidade de proporcionar aos alunos o aprendizado em torno do reconhecimento das características raciais que os habilitariam a distinguir o judeu do ariano.
O trabalho, inicialmente, era realizado por meio de personagens fictícios "extraídas de poemas, de romances ou de novelas" (MICHAUD, 1996, p. 294) e, em seguida, aplicado pelos alunos na vida prática, na observação das pessoas que faziam parte de seu circulo pessoal. Após esse trabalho de análise e observação, os alunos recebiam instruções de caráter mais prático, onde participavam de sessões de mensuração da caixa craniana que, segundo os teóricos nazistas, denunciaria o indivíduo não ariano. Emil Jörhs e Julios Schwab publicaram à época, diversas cartilhas destinadas à juventude alemã. Dentre elas, destaca-se a Rassenhygienischen Fibel (Cartilha da Higidez Racial), onde as sentenças relativas à pureza racial eram evidenciadas de forma natural e espontânea. Dessa forma, todas as crianças, independente da idade, eram submetidas à rigorosa instrução em torno dos aspectos considerados essenciais para a sua formação, como a "importância da origem de seus antepassados, da higidez racial e a caracterização dos povos, a influência nórdica e as opções genéticas, a seleção natural e sua antítese e ainda sobre a significação da campanha popular de natalidade". (BLEUEL, 1972, p. 156).
A preparação das crianças com vistas à "agressiva política de expansão do Führer: uma nação despojada de espaço" (BLEUEL, 1972, p. 156) era realizada nas aulas de Geografia, por meio de estudos que versavam sobre "termos de geopolítica, espaço vital, movimentos demográficos, expansão racial e aquisição de territórios coloniais". (KOCH, 1973, p. 99). O ensino dessa disciplina passou pela remodelação nazista em consonância com sua ideologia,

[...] sublinhando "os conceitos de lar, raça, heroísmo e organicismo". O clima foi ligado à raça, e os professores foram avisados de que o estudo do Oriente era uma entrada para a "questão judaica". Inúmeros livros didáticos de geografia propagaram conceitos como espaço vital e sangue e solo e difundiram o mito da superioridade racial alemã. Os mapas mundiais e os novos livros didáticos enfatizaram a importância da geopolítica, corroboraram implicitamente o conceito de "um povo, um Reich", ou traçaram a expansão das tribos germânicas através da Europa do leste e central na Idade Média. (EVANS, 2011, p. 309).

Mesmo o ensino de disciplinas de exatas – Física e Matemática –, que a primeira vista poderia parecer imparcial, foi direcionado para fortalecer o sentimento de raça. O ensino da Física foi reorientado "para tópicos militares como balística, aerodinâmica e radiocomunicação" (EVANS, 2011, p. 308), enquanto que o da matemática passou a ser enfocado sob o aspecto social, com todos os problemas elaborados de forma a exercer influência ideológica e aprendizado racial nas crianças.

Os livros didáticos de aritmética básica compilados sob a orientação do Ministério da Educação [...] começaram a aparecer a partir de 1935. Uma característica central desses livros foi a inclusão da "aritmética social", envolvendo cálculos elaborados para efetuar um doutrinamento subliminar em áreas-chave [...]. (EVANS, 2011, p. 309) [...] Uma pessoa mentalmente incapaz custa 4 Reichsmark por dia, um aleijado custa 5,5 Reichsmark por dia e um criminoso condenado, 3,5 Reichsmark. [...] dentro das fronteiras do Reich alemão 300.000 pessoas estão recebendo cuidados em instituições públicas. Quantos empréstimos matrimoniais de 1000 Reichsmark por casal poderiam ser concedidos anualmente, usando-se os fundos destinados a tais instituições? (KOCH, 1973, p. 100).v

A ideologia "nazista devia impregnar cada ensinamento para acostumar o aluno a distinguir o que era útil à sua ‘raça' daquilo que a ameaçava" (MICHAUD, 1996, 293-294), assim, a partir do decreto de 11 de julho de 1933, o racismo passou a fazer parte de todas as disciplinas, inclusive as artísticas. Por meio da censura, que existia abertamente em todos os sentidos durante o Terceiro Reich, o NSDAP se encarregava de selecionar os livros que poderiam permanecer nas bibliotecas públicas e nas escolas, proibindo a circulação das obras que fossem consideradas nãogermânicas, as quais eram incluídas em "uma lista negra" (BARTOLETTI, 2006, p. 47). Da censura inicial, os nazistas partiram para a total destruição de um precioso acervo de milhares de livros. Bartoletti (2006) relata que em dez de maio de 1933, uma grande marcha reunindo jovens universitários, membros da JH e da SS carregando tochas acesas, acompanhavam caminhões e carretas carregados de livros para serem destruídos. Todos esses jovens, em total frenesi, rasgavam e formavam pilhas enormes que em seguida eram incendiadas. Quanto ao ensino religioso, este pouco a pouco foi sendo suprimido da vida dos adolescentes até chegar a sua extinção com o afastamento do clero do corpo docente escolar e a substituição de suas aulas por "preleções sobre a doutrina nacional-socialista". (BLEUEL, 1972, p. 158).

Educação corporal: o primado do corpo.

Umas das maiores preocupações de Hitler em relação à educação dos jovens alemães estava voltada para o cuidado e o aprimoramento físico e do caráter. Para o líder nazista a educação oficial até então, cuidara apenas de sobrecarregar os cérebros infantis com assuntos que certamente seriam, em sua maioria, esquecidos e que o tempo despendido com o aprendizado científico e intelectual seria mais bem aproveitado se substituído por atividades – como a educação física – que contribuiriam para o enrijecimento corporal da juventude. A receita dessa educação é exposta em detalhes em Mein Kampf. De acordo com a teoria de Hitler (1983), a educação do povo, responsabilidade do Estado, deveria ser conduzida de forma a possibilitar a formação de corpos sadios e que, a cultura física era um requisito indispensável para a preservação da raça.
Klemperer (2009) relata que ao tratar da educação, Hitler colocava o preparo físico em primeiro lugar e que a sua expressão predileta era "körpoliche Ertüchtigung (capacitação física)" (KLEMPERER, 2009, p. 39). Hitler "valorizava o Exército do imperador Guilherme como a única organização saudável e vital de um volkorper (corpo do povo) apodrecido" (KLEMPERER, 2009, p. 39) e vislumbrava "no serviço militar, sobretudo, ou exclusivamente, uma educação para o desempenho físico. A formação do caráter é uma questão nitidamente menor: dominar o corpo é mais importante do que receber educação". (KLEMPERER, 2009, p. 39). Logo no início do Terceiro Reich, o Estado nacionalista cuidou para que a educação fosse direcionada de modo a priorizar o "cultivo de corpos medularmente sadios [em vez de] incutir mero saber" (BLEUEL, 1972, 158). As escolas a partir de então, passaram a dedicar de três a cinco horas semanais às aulas de ginástica e, visando deixar o programa mais atrativo, incorporaram diversos tipos de esportes, dentre eles, o boxe. Na opinião de Hitler (1983), esse era um esporte que jamais poderia ser esquecido, visto ser o mais eficiente para modelar a formação do jovem, pois a sua execução "requer decisões rápidas, e enrija e torna flexível o corpo, ao mesmo tempo" (HITLER, 1983, p. 256). Comprovando a importância dispensada pelo NSDAP a esse tipo de educação, Bleuel (1972) relata a influência exercida pelos chamados feitos esportivos na continuidade dos estudos, os quais eram elencados com destaque nos diplomas. O insucesso no adestramento físico ou a existência de moléstias corporais se tornava um grande empecilho para os jovens que almejavam ascender à níveis mais elevados de ensino.
Todo esse cuidado com a preservação da saúde física dos jovens possuía a função claramente definida pelo NSDAP, de seleção ideológica, destinando-se basicamente a educar a juventude sob a proteção do Estado para a vida comunitária e seu engajamento corporal, princípios claramente evidentes no programa "Ano da Terra" e nas escolas da elite nacionalsocialistas. O Ano da Terra foi um programa desenvolvido pelo NSDAP que possuía dois objetivos econômicos bastante específicos: aliviar o mercado de trabalho urbano que à época encontravase saturado, e suprir a carência de mão de obra junto à agricultura. De acordo com as normas do programa, quando os jovens concluíam a nona série eram imediatamente encaminhados ao trabalho no campo, onde permaneciam por um período de nove meses sob o comando de pedagogos do partido, realizando diversas atividades que se dividiam em dois períodos: pela manhã, os jovens auxiliavam os lavradores nos serviços agrícolas e à tarde, participavam de preleções onde aprendiam sobre questões raciais e históricas, ambas sob os enfoques étnicos e das migrações. Esse programa foi apresentado pelos nazistas como compulsório, no entanto, essa obrigação não alcançava a todos, havia certa seleção para se definir quem seria enviado ao campo e quem seria poupado. O que se percebe é que o foco estava nas crianças social e economicamente carentes, cujos pais não ofereceriam resistência a sua ausência prolongada do lar (seriam aqueles a quem Hitler abençoava com o beneficio do analfabetismo?) ou aos que, por motivos políticos ou de saúde eram considerados "ameaça em potencial" (BLEUEL, 1972, p. 158), o que os colocavam, de certa forma à mercê das determinações nazistas, e, portanto, sem escolha. Já as crianças cujas famílias possuíam "um nível mais elevado" (BLEUEL, 1972, p. 159) eram aliviadas dessa obrigação.
Voltando a questão da educação corporal por meio dos treinamentos físicos faz-se importante salientar que estes invadiram também os ambientes universitários. Segundo Gilles  (1985) e Klemperer (1999), o tempo dos estudantes universitários ficava cada vez mais reduzido para o estudo acadêmico em virtude dos treinamentos paramilitares e da participação compulsória nos diversos programas de trabalho determinados pelo NSDAP. Essas interferências foram responsáveis pela queda dos padrões acadêmicos dentro das universidades, cujas consequências no futuro, atingiriam implacavelmente a nação alemã nos setores técnicos e culturais.
Outro aspecto visado pelos nazistas com a primazia dada à educação física relacionava-se ao embelezamento da nação. Era preciso formar corpos perfeitos "a fim de se criar um novo ideal de beleza". (HITLER, 1983, p. 258) e isso não seria possível por meio da educação intelectual. Hitler (1983) salienta que, para se obter os melhores resultados e concretizar esse ideal de beleza, dever-se-ia proceder como fizeram os gregos no passado, criando uma "harmonia entre a beleza física, a espiritual e a moral" (HITLER, 1983, p. 255), pois, segundo o seu entendimento, foi isso "que tornou imperecível o ideal da beleza grega". (HITLER, 1983, p. 255). Nesse sentido, era preciso, além de exercitar o corpo, educá-lo, atuando na formação do caráter dos indivíduos – apesar de apontar que as qualidades reais do caráter são inatas, já nascendo com o individuo – a fim de que estes adquirissem as qualidades essenciais para o futuro êxito do Estado alemão, visto que, de acordo com a sua compreensão, a falta dessas virtudes foi a grande responsável pelo fracasso do exército alemão na Primeira Guerra.
Essa educação, primando pelo adestramento corporal, foi amplamente difundida nos meios educacionais, porém, era nas instituições criadas pelo NSDAP, para educar a juventude, que ela de fato se concretizava. Dentre essas instituições destacam-se as NAPOLA ou NPEA – National poltischen Erziehungs – anstaltenvi e as AHS – Adolf Hitler Schulenvii. As NAPOLA foram fundadas com a finalidade específica de "criar uma elite que pudesse preencher cargos em todas as esferas da vida alemã: política, administrativa, econômica, militar e acadêmica" (KOCH, 1973, p. 102), já as AHS, idealizadas e definidas como unidades da JH e totalmente financiadas pelo Estado, destinavam-se "explicitamente à criação dos lideres partidários" (KOCH, 1973, p. 102).

Educação feminina

A mulher alemã durante o Terceiro Reich recebia uma atenção bastante especial, porém, diferenciada; construiu-se em torno da mulher, uma imagem idolatrada, "a guardiã da raça ariana" (LENHARO, 1986, p. 69). O seu papel, de acordo com a concepção idealizada por Hitler, apesar de secundário em relação ao masculino, era de extrema importância para a construção da "nova" Alemanha. A ela caberia a sublime função de gerar aqueles que, futuramente, tomariam o destino da nação em suas mãos, trabalhando e lutando pela sua reconstrução segundo os moldes nazistas. Lenharo (1986) afirma que essa construção mitológica do perfil da mulher implicava a "restrição absoluta de seu espaço público de atuação" (LENHARO, 1986, p. 69), impondo a limitação de suas funções essencialmente à reprodução. Hitler (1983), apesar de declarar que a educação do sexo feminino deveria obedecer aos mesmos critérios propostos para o masculino, enfatiza de forma explicita o seu direcionamento com vistas à maternidade quando diz que "A preocupação principal, na educação das mulheres, é formar futuras mães" (HITLER, 1983, p. 259). Foi seguindo esse pressuposto que se delineou a pedagogia destinada às jovens, não ultrapassando os limites do preparo necessário à futura maternidade. Para ilustrar o que se oferecia e se esperava da mulher à época, Lenharo (1986) utiliza-se do "lema dos três K – ‘kinder (criança), kirche (igreja), küche (cozinha)'" (LENHARO, 1986, p. 70), evidenciando que a ela cabia a responsabilidade de "procriar, ensinar os valores fundamentais da nação, reservar-se apenas aos trabalhos domésticos". (LENHARO, 1986, p. 70).
Os princípios considerados essenciais eram enfaticamente impressos a educação das meninas desde a mais tenra idade para que estas se conscientizassem de sua condição de mulher, de sua posição nos espaços públicos e privados e principalmente, de sua nobre missão. A educação intelectual assumiu a condição de supérflua, chegando mesmo a ser considerada nociva, já que faria as jovens desperdiçarem preciosas energias que deveriam ser reservadas para o cumprimento da sublime missão que lhes aguardava. Para formalizar esses princípios, procedeu-se a uma drástica redução da cota educacional destinada ao sexo feminino. O resultado começou a ser observado já no ano de 1936, com a queda pela metade no número de meninas a frequentarem as escolas. E mesmo as jovens que conseguiam ter acesso ao restrito ambiente educacional, encontravam uma série de obstáculos para dar prosseguimento aos estudos acadêmicos, o que tornava o seu ingresso em instituições de nível superior praticamente impossível. Dentre esses obstáculos, destaca-se em primeiro lugar, a falta de investimentos no setor educacional superior feminino, visto ser considerado como desperdício. O aprendizado intelectual era entendido e apresentado pelos nazistas como um erro na vida da mulher, pois, "para gerar homens alemães altamente capacitados mulher nenhuma necessita[va] de estudos" (BLEUEL, 1972, p. 178). Dessa forma, iniciou-se um processo de eliminação dos ginásios para moças. Em algumas regiões alemãs, ainda se permitia o acesso de meninas em determinadas instituições educacionais de nível secundário, caracterizados como ginásios masculinos, porém, essa aceitação pouco acrescentava as perspectivas das meninas em relação ao futuro acadêmico, pois, apesar de fazerem parte do mesmo ambiente dos meninos, não recebiam as mesmas oportunidades, como, por exemplo, a frequência às aulas de latim, que eram substituídas por aprendizados mais condizentes com a sua condição: trabalhos manuais, biologia e ginástica. Essas eram as mesmas disciplinas que constavam do currículo permanente das Escolas Unificadas para Moças, estabelecimentos educacionais exclusivamente femininos que, a partir do quinto ano, oferecia às jovens educandas, duas possibilidades de continuidade dos estudos; a primeira seria o aprimoramento linguístico e a segunda, elevada a especialidade, consistia no aprimoramento dos talentos de dona de casa, e ao final, conferia as mocinhas "o famoso diploma do pudim" (BLEUEL, 1972, p. 179). No entanto, independente da opção, todas estavam obrigadas a comprovar suas aptidões em prendas domésticas, condição sine qua non à conclusão do curso. O propagado benéfico anti-intelectualismo feminino atingiu de forma drástica os estabelecimentos educacionais femininos, especialmente as Escolas Populares, onde as matérias denominadas de supérfluas foram eliminadas do currículo escolar. O seu ensino foi dirigido de forma a transmitir às estudantes conteúdos que, com um mínimo de alfabetização e de cultura livresca, pudessem ser aproveitados de forma imediata e prática "entre a cama e o banho, o fogão e o governo da casa" (BLEUEL, 1972, p. 179). Para tanto, bastava que as escolas proporcionassem as meninas conhecimentos em torno de algumas disciplinas chaves, como: anatomia, assistência social, teoria da hereditariedade, etnografia e por último, porém, não menos importante, o estudo da família. No mais, tudo poderia ser descartado.
No ano de 1934, o futuro das meninas alemãs começou a preocupar algumas abnegadas senhoras, membros de instituições ligadas ao NSDAP, como, a Ala Feminina do Nacional- Socialismo, a Frente de Trabalho da Mulher Alemã, a Diretoria da Juventude do Reich e o Instituto do Reich para a Mediação da Mão de Obra e Seguros de Desempregados, porém, essa preocupação não estava vinculada ao seu futuro educacional, mas ao profissional. No referido ano, considerável número de meninas concluiria os estudos e necessitariam de uma colocação no mercado de trabalho, que, saturado, não conseguiria absorver a todas. Preocupadas com a questão, essas instituições decidiram organizar um congresso que recebeu a denominação de Ano da Administração Doméstica, uma espécie de programa assistencialista que pretendia envolver as jovens em trabalhos voluntários junto a famílias desconhecidas, com as quais residiriam por um determinado período, auxiliando nas tarefas domésticas. Para justificar a iniciativa, alegava-se que o programa ofereceria às meninas a oportunidade de ampliar e aprimorar, por meio da vivência prática, os conhecimentos adquiridos na escola e no âmbito familiar em torno dos afazeres domésticos. Apesar de todo empenho em convencer as mocinhas da importância do projeto, o resultado foi um verdadeiro fracasso. Em 1941, graças à iniciativa de Hermann Göring, o programa passou de voluntário para compulsório, tendo a sua denominação alterada para Ano das Obrigações Domésticas. A partir de então, o recebimento dos certificados de conclusão dos cursos ginasiais e das Escolas Populares ficou condicionado à participação no programa. Quem não participasse perdia o direito de recebê-lo.
Praticamente como ocorria com o Ano da Terra, o Ano das Obrigações Domésticas afetava mais a vida das jovens pertencentes a famílias menos favorecidas financeiramente ou pertencentes às zonas rurais, cujas mães, além de não se encontrarem em condições de contestação, não dispunham de relações suficientes que lhes permitissem conseguir uma colocação adequada para suas filhas; essas eram as meninas que "as bênçãos do ano compulsório pretendia cumular de felicidade". (BLEUEL, 1972, p. 182). Esse empreendimento, como todos os outros articulados pelo NSDAP, tornou-se ineficiente e ao final, o pretendido adestramente em torno dos assuntos relativos às atividades domésticas acabou por limitar-se "às aulas dos bancos escolares, que eram preenchidas com pontos de crochê na feitura de panos de cozinha e algumas costuras de roupas de baixo." (BLEUEL, 1972, p. 183). No entanto, a sua influência foi decisiva no direcionamento da educação feminina, tornando o aprendizado intelectual para as meninas alemãs uma meta cada vez mais inatingível.
Em síntese, para as meninas alemãs, a escola passou a representar a continuação do lar. Toda a instrução oferecida a elas nos estabelecimentos de ensino que permitiam o seu ingresso não se ia além do adestramento formal das chamadas prendas do lar e da maternidade. Isso não significa que as portas das universidades se encontravam fechadas ao sexo feminino, porém, as dificuldades encontradas, diante do reduzido conhecimento intelectual adquirido na vida educativa, sem contar a impregnação ideológica a que eram submetidas desde a mais tenra idade, fazia com que poucas ousassem ultrapassar os limites delimitados pelo nacionalsocialismo, buscando uma formação acadêmica de nível superior.

Considerações finais

A realização deste trabalho teve como ponto de partida proceder a um levantamento de informações e argumentos em torno dos aspectos e dos fatores que envolveram a educação nazista – formal e informal – durante o Terceiro Reich, que fossem capazes de possibilitar a compreensão sobre os motivos que levaram os jovens alemães a seguirem e defenderem Hitler até o final. Analisando as questões relativas à educação idealizada no Terceiro Reich para a formação dos jovens alemães, pode-se compreender que esta se encontrava imbuída de objetivos claros e perfeitamente definidos. A sua concepção estava intimamente atrelada a concepção de mundo teorizada pelos ideólogos nazistas e por Adolf Hitler, para quem, a educação deveria servir exclusivamente para formar indivíduos fortes, saudáveis, portadores de grande capacidade e coragem para enfrentar desafios e tomar decisões, tendo como premissa o interesse coletivo, apregoado como sendo do völk. No entanto, o interesse que de fato deveriam corresponder e ter como objetivo maior de suas vidas era o interesse do Führer. Exemplo disso é a presença constante de sua imagem nas salas de aula lembrando que todos pertenciam a ele e que tudo deveriam fazer para corresponder as suas expectativas; o Führer se constituía no modelo que todos deveriam seguir para se tornarem indivíduos superiores.
Se a ideia de Hitler era fazer da nação alemã a maior potência do mundo, dominando e conquistando as demais nações, ampliando assim o espaço vital alemão, nada mais natural que promover a transformação dos jovens em soldados a seu serviço, em líderes capazes de lutar e de comandar os povos que pretendia dominar. E, quando mais cedo o trabalho de educação soldadesca fosse iniciado, melhores seriam os resultados futuros. Diante destas constatações, pode-se deduzir que os jovens alemães, praticamente desde o nascimento, encontravam-se submetidos a uma verdadeira domesticação, um adestramento mascarado de escolarização. Esses jovens se constituíam em material humano essencial à luta pelo poder pretendida por Hitler, dessa forma, era necessário trabalhar este material de modo a dar-lhe o formato necessário de acordo com os fins pretendidos. O trabalho formativo foi executado pelos nazistas com tal maestria que os jovens submetidos a ele, sequer questionavam a sua validade, acreditando piamente que todo o aprendizado que recebiam era de fato necessário, a maior e melhor contribuição para as suas vidas. Assim, pode-se compreender que a educação nazista cumpriu o papel que lhe fora atribuído, se encarregando de impregnar as mentalidades infantis e juvenis de forma definitiva, fez dos educandos "bons nazistas".

Notas

i O estudo apresentado neste artigo tem como base o trabalho de pesquisa realizado para a escrita do Trabalho de Conclusão de Curso intitulado "Regime Nazista: as teoria ideológicas e educacionais moldando a formação do indivíduo nazi", sob orientação do Prof. Dr. Jorge Luís Mialhe, apresentado no ano de 2011, à Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita- UNESP – IB, Campus de Rio Claro Filho, para a obtenção do Grau de Licenciado em Pedagogia.

ii Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães.

iii Hitler Jugend.

iv Giles (1985) relata que, devido à importância dos conceitos da Teoria da relatividade, o NSDAP começou a examiná-la na tentativa de isolar os chamados elementos arianos.

v Exemplo de problema constante nos livros de aritmética.

vi Institutos Político Nacional de Educação.

vii Escolas Adolf Hitler

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Recibido el 30 de junio de 2013.
Aceptado el 19 de septiembre de 2013.

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